Aplicação do princípio do contraditório no IPM
O IPM por definição legal e doutrinária tem por objetivo apurar os indícios de autoria e materialidade de uma infração prevista no Código Penal Militar, ou nas Leis Especiais Militares, colhendo os subsídios necessários para que o Ministério Público possa oferecer a ação penal militar.
A prática de um ato que não esteja previsto nas leis militares, como por exemplo, o aborto, que não consta no CPM, Decreto-lei nº 1001, de 1969, traz como conseqüência a atipicidade do fato, e também a falta de justa causa para o oferecimento da ação penal.
O Ministério Público, titular da ação penal militar, não se encontra vinculado a abertura de um IPM para que possa oferecer a ação penal. Basta a existência de indícios de autoria e materialidade para que o promotor de Justiça ou Procurador da República possa oferecer a ação penal, com base inclusive em provas ou documentos oferecidos pela própria vítima.
No atual processo penal, denominado de constitucional, a vítima tem sido relegada a um segundo plano, muitas vezes marginalizada, como se fosse culpada pelos atos praticados pelo infrator, que desrespeita as leis previamente estabelecidas pelo Poder Legislativo. No Estado de Direito, onde existe uma proteção ao acusado, se faz necessário o estabelecimento de regras voltadas à preservação da integridade das pessoas que sofrem uma ação violenta, ou mesmo ilegal, prevista na lei penal, comum ou militar.
Se a vítima apresentar uma acusação que não seja verdadeira, com o intuito de prejudicar o acusado, em razão de questões pessoais, caberá ao Ministério Público denunciá-la pelo crime de denunciação caluniosa previsto no CP, ou no CPM. O sistema processual estabelece as regras essenciais para o exercício responsável dos direitos e garantias fundamentais.
No vigente sistema processual, o acusado é obrigado a depor, apesar de seu depoimento não ficar sujeito ao compromisso legal. O valor do interrogatório é limitado, uma vez que a própria confissão judicial, ou extra-judicial, não é suficiente para que o infrator seja condenado pelo Juiz ou Tribunal.
O Ministro Francisco Campos na mensagem enviada ao então Presidente da República, Getúlio Vargas, exposição de motivos, esclarece que a confissão do acusado não é prova suficiente para que este seja condenado, sendo indispensável à produção de outras provas para que a culpabilidade fique devidamente demonstrada.
O Inquérito Policial Militar possui assim como o Inquérito Policial a característica de ser inquisitivo, mas isto não significa que a pessoa objeto de investigação ficará sujeito a atos incompatíveis com a atual processualística A fase policial ainda que de forma restrita encontra-se subordinada aos princípios constitucionais.
A CF de 1988 estabeleceu que o acusado poderá permanecer em silêncio em seu interrogatório policial. Neste sentido, não existe impedimento para que reperguntas sejam feitas após as indagações do presidente do Inquérito Policial, civil ou militar.
A Lei Federal nº 10.792/2003 que alterou a sistemática do interrogatório em juízo deve ser aplicada ao inquérito policial, que tem por objetivo fornecer os elementos necessários à propositura de uma ação penal, comum ou militar.
A nova Lei não disse expressamente que o interrogatório realizado na Polícia ficaria sujeito ao contraditório, mas a sua aplicação nesta seara é decorrente dos princípios que regem o atual processo penal, comum ou militar. Além disso, se o indiciado pode ficar em silêncio, ou até mesmo mentir em seu interrogatório, qual o prejuízo para Administração Pública, ou mesmo para o andamento das investigações se o advogado por intermédio do Delegado de Polícia, ou Oficial das Forças Armadas, ou Forças de Segurança, apresentar suas reperguntas ?
Os defensores do caráter inquisitivo do inquérito policial poderiam afirmam que as investigações ficariam prejudicadas, ou que haveria um prejuízo na busca dos elementos, indícios, de autoria e materialidade. Segundo a doutrina, o ônus da prova no processo penal pertence a quem alega, e não cabe ao próprio acusado oferecer as provas necessárias para a demonstração de sua culpabilidade.
A busca das provas não pode e não deve se limitar ao depoimento do acusado, e nem mesmo ao depoimento das testemunhas. As provas técnicas, que em regra não se repetem em juízo, são essências para a demonstração da culpabilidade, e elucidação dos fatos imputados a uma pessoa.
Neste sentido, não existe nenhum prejuízo na realização de reperguntas quando do interrogatório realizado na fase policial. O Delegado de Polícia como presidente do Inquérito Policial, ou o Oficial como presidente do Inquérito Policial Militar, poderão indeferir as reperguntas que considerem impertinentes, ou divorciadas dos fatos que estão sendo apurados.
O Juiz quando da realização do interrogatório em juízo, realizado em sessão pública, interroga o acusado, que inclusive poderá se retratar de sua confissão realizada na Polícia, e até mesmo apresentar uma nova versão. Percebe-se, que o interrogatório como meio de prova possui um alcance limitado, e a aplicação do princípio do contraditório que foi estabelecido por intermédio da Lei Federal não modificará a sua substância.
Na realidade, a participação do advogado no interrogatório realizado na fase policial afastará eventuais alegações de coação por parte dos agentes policiais, que muitas vezes são apresentadas pelos réus como forma de desacreditar o trabalho sério realizado pelas autoridades policiais, civis ou militares.
Por fim, o acolhimento do princípio do contraditório no interrogatório realizado na fase policial por enquanto depende da discricionariedade das autoridades policiais, que poderão indeferir ou não a realização de reperguntas apresentadas pelos advogados regularmente constituídos.
Antes do advento da Lei Federal, a maioria dos juízes não permitia a realização de reperguntas, impedindo o exercício do contraditório. A evolução da processualística modificou a sistemática até então adotada, passando a permitir a realização de reperguntas por parte do MP e da Defesa.
O inquérito policial é essencial na busca da apuração dos fatos e deve permanecer no sistema processual brasileiro, mas ao mesmo tempo deve acompanhar a evolução, o aperfeiçoamento da ciência penal e processual penal, que são essenciais na preservação do Estado de Direito
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