O dever do Estado, a importância da polícia e o papel da sociedade
A violência está tomando conta do Brasil de norte a sul do país, e tem assustado as pessoas, brasileiros e estrangeiros que residem no país, os quais se sentem inseguras e com medo. A impunidade tornou-se infelizmente uma realidade para o cidadão infrator, que não mais respeita a lei previamente estabelecida, e muitas vezes ironiza em suas ações o Estado de Direito, para que muitos mais se assemelha as histórias de Matrix do que qualquer outra coisa.
O Estado Moderno foi instituído para que a autotutela, o olho por olho dente por dente fosse abandonada, ou seja, deixar de lado a lei do talião, e ainda que os conflitos sociais fossem resolvidos com base apenas e tão somente na lei, que é o instrumento mais importante para efetiva aplicação da Justiça, que deve pacificar a lide e possibilitar em vida em sociedade, com a observância dos direitos e garantias fundamentais.
As pessoas estão morrendo como se existisse no país uma guerra, ou melhor, uma guerrilha urbana. As famílias sentem dor, mas muita dor, ao comparecerem no Instituto Médico Legal, IML, para o reconhecimento de um ente familiar, que foi morto em um assalto ou mesmo em um seqüestro. Nesses momentos, surge a seguinte pergunta, até quando, mais e mais brasileiros terão que morrer?
O art. 144 da CF estabelece que, “A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos policiais”. Assim, não se pode permitir que a violência seja a regra na sociedade brasileira, e a tranqüilidade e a paz social uma exceção, que possa alcançar algumas famílias ou alguns eleitos que possuem condições econômicas para contratarem seguranças ou empresas especializadas em segurança pessoal. A integridade física é um direito que deve ser efetivamente preservado. As pessoas não querem promessas, elas precisam de uma proteção que seja efetiva.
A força policial é uma das mais importantes Instituições do Estado. Segundo Javier Barcelona Llop, “as forças policiais têm como missão a preservação, a manutenção e restauração da segurança e da ordem pública” (Policía y Constitución, Madrid: Tecnos, 1997, p. 195). O desenvolvimento da sociedade, a geração de novos empregos, e ainda a vinda de investimentos, dependem da estabilidade política, social e econômica. Se o país tem como característica a violência, isso significa a perda de investimentos e o aumento das desigualdades sociais. Afinal, nenhum investidor estrangeiro quer investir seu dinheiro onde os direitos fundamentais não são efetivamente respeitados.
Por força do texto constitucional, não é apenas o Estado que é o responsável pela segurança pública, mas todas as pessoas que integram a sociedade. Nesse sentido, é chegado o momento de uma maior participação dos cidadãos nas atividades de segurança pública, que são essenciais para a vida em sociedade e a busca da realização dos objetivos nacionais.
As associações de moradores e outras instituições sociais devem participar ativamente das atividades desenvolvidas pela Delegacia de Polícia e a Companhia de Polícia Militar do Bairro. Os serviços de denúncia, os chamados Disque Denúncia, devem ser incentivados e as políticas municipais de segurança precisam ser uma realidade, inclusive com a criação de uma Secretária Municipal de Segurança Pública, com um chefe de Polícia Municipal, caso seja necessário para a diminuição dos índices de violência.
Ao invés da unificação da Polícia Militar com a Polícia Civil, o Estado deve incentivar uma integração entre as Polícias Civis e as Polícias Militares, cada qual com o Ciclo Completo de Polícia e com uma competência previamente delimitada. As Guardas Municipais devem receber o Poder de Polícia, inclusive atuando em determinados crimes de menor potencial ofensivo de forma integral, ou seja, com direito ao ciclo completo de Polícia. Os Municípios que tiverem mais de 500.000 habitantes e rendimentos para tanto devem possuir uma Guarda Municipal efetiva e se for o caso um Poder Judiciário Municipal. Somente desta forma o princípio federativo estará sendo observado de forma efetiva.
O sistema penitenciário passa por uma crise que tem sido acompanhada de perto pela imprensa e noticiada pelos principais jornais do país, a qual está representada pelas diversas rebeliões e a falta de vagas para os cidadãos infratores que foram presos pela Polícia. Mas, essas questões não podem impedir o Estado de responder por suas obrigações sob pena de responsabilidade na forma do art. 37, § 6o, da CF. Além disso, os presos devem trabalhar durante o cumprimento da pena, sob pena de que cada dia não trabalhado poderá representar um dia a ser adicionado ao cumprimento da pena.
As críticas ao sistema de segurança pública devem estar voltadas para a melhoria da qualidade dos serviços que são prestados à população, art. 37, caput, da CF. A sociedade e os meios de comunicação devem incentivar a união entre o Estado e o cidadão no combate à violência na busca da diminuição do número de homicídios, latrocínios, roubos, furtos, extorsão mediante seqüestro, que produzem um saldo negativo, o qual somente pode ser comparado a epidemias e as guerras. O Brasil não está em guerra, mas por ano no país morrem mais de 50.000 pessoas vítimas da violência.
A polícia canadense tem incentivado a participação dos cidadãos nas questões de segurança pública por meio do serviço policial voluntário. O Brasil também poderá incentivar os jovens e mesmo os adultos a participarem das tarefas relacionadas com a manutenção da ordem pública em seus diversos aspectos, segurança pública, tranqüilidade e salubridade pública. O mesmo caminho tem sido seguido pelo NYPD, Departamento de Polícia de Nova Iorque. Neste sentido, por quais motivos o Brasil não pode adotar o mesmo procedimento?
A Sociedade, o Estado e a Polícia, devem estar juntos na busca da paz, no intuito de diminuir a violência que tanto atormenta a maioria da população brasileira, que não mais aceita ser refém dos infratores em suas próprias residências, o que não afasta a possibilidade de serem vítimas de roubos, homicídios ou mesmo seqüestros em seus lares, que segundo o art 5o., inciso XI, da CF, “é o asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem o consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial”.
As transformações na comunidade devem ocorrer por meio da educação e a modificação dos paradigmas. A impunidade deve ser afastada da crença do infrator, que deve respeitar a lei e ter a certeza que será punido pelos crimes praticados. A polícia deve caminhar ao lado da coletividade e esta deve acreditar em seus policiais e colaborar diretamente com o Estado para o combate a criminalidade. Somente a união entre os diversos grupos sociais é que permitirá que o Brasil seja um país melhor, respeitado no exterior, e não mais objeto de questionamentos em razão da violência que tem tomado conta das principais cidades do país.
O serviço voluntário nas forças policiais deve sair da teoria e tornar-se uma realidade, o que permitirá que os policiais, civis, militares e federais, que desenvolvem serviços administrativos fiquem a disposição para a realização de atividades operacionais. O jovem que for dispensado do tiro de guerra poderá colaborar com a sociedade em trabalhos junto à administração policial, as escolas públicas, participando de projetos contra as drogas, educação no trânsito, entre outros.
O cidadão que conhece a realidade do seu bairro e participa de questões que lhe dizem respeito se sente valorizado como pessoa, e percebe que tanto a Polícia como o Estado estão próximos da realidade social e participam ativamente para a sua melhoria. A sociedade não pode e não deve ser excluída das discussões dos temas que são importantes e deve colaborar com as autoridades na busca do bem comum e do interesse público.
A violência no Brasil somente será modificada com uma melhor distribuição de renda, saúde, educação, igualdade de oportunidades, que exigem investimentos nos setores sociais, na geração de novos empregos, e ainda na busca dos investimentos estrangeiros. Mas enquanto essas questões não são resolvidas, os efeitos da violência devem ser combatidos. O aumento das penas que devem ser aplicadas aos infratores com o surgimento de leis mais severas não significa necessariamente a diminuição do número de crimes. O que não deve existir é o senso de impunidade, que traz como conseqüência o aumento do número de crimes que colocam em perigo, à vida, à liberdade, à integridade, à propriedade e à segurança.
Por fim, a segurança pública também deve ser levada para as Escolas e Faculdades, como forma de se preparar os jovens e os educadores para participarem das atividades de Estado. A sociedade, a Polícia e o Estado, unidos serão capazes de encontrarem as soluções necessárias para a construção de um país onde a liberdade, a igualdade e a fraternidade, possam ser uma realidade ao alcance de todas as pessoas que vivem no território brasileiro de norte a sul.