Mediação, conciliação e arbitragem

 

 

Resumo: Evidencia-se que os métodos autocompositivos emancipam e empoderam as partes, sobretudo, por atribuir uma condição proativa para cada indivíduo contribuir para com a solução do conflito e, consequentemente, com a justiça e com o desenvolvimento da cidadania ativa. A gradativa substituição da cultura da judicialização para a cultura da consensualidade teve o amparo da Resolução 125 do CNJ, do CPC/2015 e da Lei da Mediação, potencializando as formas pacíficas para solucionar os conflitos de interesses.

 

Palavras-chave: Mediação. Conciliação. Arbitragem. CPC/2015. Constituição Federal brasileira de 1988. Acesso à Justiça.

 

 

 

 

Os métodos alternativos de conflitos são a mediação, a conciliação e arbitragem. A mediação e a conciliação podem ser judiciais e extrajudiciais, enquanto a arbitragem exclui a possibilidade de via judicial, mas há o prévio compromisso para aceitá-la e pode ocorrer em juízo.

 

A Lei 13.140/2015 trouxe em seu bojo o conceito de mediação como sendo técnica de negociação na qual um terceiro, indicado ou aceito pelas partes, que as ajuda a encontrar uma solução que atenda ambos os lados.

 

Aliás, o artigo 5º da mencionada lei prevê que a mediação deverá ser orientada pelos seguintes princípios, a saber: imparcialidade do mediador; igualdade entre as partes; oralidade; informalidade; a vontade das partes; busca do senso comum, confiabilidade e boa-fé.

 

Apesar de serem métodos compositivos muito parecidos, o CPC vigente, em seu artigo 165 fez uma diferenciação entre mediadores e conciliadores judiciais. E, segundo o CPC vigente, o conciliador atua preferencialmente em ações, nas quais não há nenhum vínculo entre as partes e, poderá sugerir soluções. Enquanto mediador atua nas ações nas quais as partes possuem vínculos com o fito de restabelecer o diálogo e permitir que estas proponham soluções para o caso concreto.

 

Lembremos que tanto da Lei da Mediação quanto o CPC vigente tratam a conciliação como sendo sinônimo de mediação, porém, na prática existe sutil diferença, pois a técnica usada na conciliação para aproximar as partes é mais direta, há efetiva participação do conciliador na construção e na sugestão de soluções compositivas. Já na mediação, o mediador interfere menos nas soluções e atua mais propriamente na construção do diálogo e da aproximação das partes.

 

A arbitragem é regulada pela Lei 9.307/1996 e depende de convenção das partes, em cláusula específica e expressa para ser aplicada. Com a opção pela arbitragem resta afastada a via judicial, e permitem que um ou mais terceiros, os árbitros, que geralmente detém vasto conhecimento da matéria em questão e decidam o conflito de interesses. Os árbitros atuam como juízes privados e suas de decisões têm eficácia de sentença judicial e não pode ser objeto de recurso.

 

Dos Conciliadores e Mediadores Judiciais

 

Art. 165 CPC/2015. Os tribunais criarão centros judiciários de solução consensual de conflitos, responsáveis pela realização de sessões e audiências de conciliação e mediação e pelo desenvolvimento de programas destinados a auxiliar, orientar e estimular a autocomposição.

 

§ 1º A composição e a organização dos centros serão definidas pelo respectivo tribunal, observadas as normas do Conselho Nacional de Justiça.

 

§ 2º O conciliador, que atuará preferencialmente nos casos em que não houver vínculo anterior entre as partes, poderá sugerir soluções para o litígio, sendo vedada a utilização de qualquer tipo de constrangimento ou intimidação para que as partes conciliem.

 

§ 3º O mediador, que atuará preferencialmente nos casos em que houver vínculo anterior entre as partes, auxiliará aos interessados a compreenderem as questões e os interesses em conflito, de modo que eles possam, pelo restabelecimento da comunicação, identificar, por si próprios, soluções consensuais que gerem benefícios mútuos.

 

LEI Nº 13.140, DE 26 DE JUNHO DE 2015.

 

Art. 1º Esta Lei dispõe sobre a mediação como meio de solução de controvérsias entre particulares e sobre a autocomposição de conflitos no âmbito da administração pública.

 

Parágrafo único. Considera-se mediação a atividade técnica exercida por terceiro imparcial sem poder decisório, que, escolhido ou aceito pelas partes, as auxilia e estimula a identificar ou desenvolver soluções consensuais para a controvérsia.

 

Art. 2º A mediação será orientada pelos seguintes princípios:

 

I – imparcialidade do mediador;

II – isonomia entre as partes;

III – oralidade;

IV – informalidade;

V – autonomia da vontade das partes;

VI – busca do consenso;

VII – confidencialidade;

VIII – boa-fé.

 

§ 1º Na hipótese de existir previsão contratual de cláusula de mediação, as partes deverão comparecer à primeira reunião de mediação.

 

§ 2º Ninguém será obrigado a permanecer em procedimento de mediação.

 

Art. 3º Pode ser objeto de mediação o conflito que verse sobre direitos disponíveis ou sobre direitos indisponíveis que admitam transação.

 

§ 1º A mediação pode versar sobre todo o conflito ou parte dele.

 

§ 2º O consenso das partes envolvendo direitos indisponíveis, mas transigíveis, deve ser homologado em juízo, exigida a oitiva do Ministério Público.

 

LEI Nº 9.307, DE 23 DE SETEMBRO DE 1996.

 

Art. 3º As partes interessadas podem submeter a solução de seus litígios ao juízo arbitral mediante convenção de arbitragem, assim entendida a cláusula compromissória e o compromisso arbitral.

 

Art. 4º A cláusula compromissória é a convenção através da qual as partes em um contrato comprometem-se a submeter à arbitragem os litígios que possam vir a surgir, relativamente a tal contrato.

 

§ 1º A cláusula compromissória deve ser estipulada por escrito, podendo estar inserta no próprio contrato ou em documento apartado que a ele se refira.

 

§ 2º Nos contratos de adesão, a cláusula compromissória só terá eficácia se o aderente tomar a iniciativa de instituir a arbitragem ou concordar, expressamente, com a sua instituição, desde que por escrito em documento anexo ou em negrito, com a assinatura ou visto especialmente para essa cláusula.

 

Art. 13. Pode ser árbitro qualquer pessoa capaz e que tenha a confiança das partes.

 

§ 1º As partes nomearão um ou mais árbitros, sempre em número ímpar, podendo nomear, também, os respectivos suplentes.

 

§ 2º Quando as partes nomearem árbitros em número par, estes estão autorizados, desde logo, a nomear mais um árbitro. Não havendo acordo, requererão as partes ao órgão do Poder Judiciário a que tocaria, originariamente, o julgamento da causa a nomeação do árbitro, aplicável, no que couber, o procedimento previsto no art. 7º desta Lei.

 

§ 3º As partes poderão, de comum acordo, estabelecer o processo de escolha dos árbitros, ou adotar as regras de um órgão arbitral institucional ou entidade especializada.

 

§ 4º Sendo nomeados vários árbitros, estes, por maioria, elegerão o presidente do tribunal arbitral. Não havendo consenso, será designado presidente o mais idoso.

 

§ 4º As partes, de comum acordo, poderão afastar a aplicação de dispositivo do regulamento do órgão arbitral institucional ou entidade especializada que limite a escolha do árbitro único, coárbitro ou presidente do tribunal à respectiva lista de árbitros, autorizado o controle da escolha pelos órgãos competentes da instituição, sendo que, nos casos de impasse e arbitragem multiparte, deverá ser observado o que dispuser o regulamento aplicável.                           (Redação dada pela Lei nº 13.129, de 2015)        (Vigência)

 

§ 5º O árbitro ou o presidente do tribunal designará, se julgar conveniente, um secretário, que poderá ser um dos árbitros.

 

§ 6º No desempenho de sua função, o árbitro deverá proceder com imparcialidade, independência, competência, diligência e discrição.

 

§ 7º Poderá o árbitro ou o tribunal arbitral determinar às partes o adiantamento de verbas para despesas e diligências que julgar necessárias.

 

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) colabora através de normatizações para que a justiça pátria seja mais célere e eficiente. Os instrumentos de pacificação social e prevenção de litígio, a mediação e a conciliação fomentados pelo CNJ transformaram o cotidiano daqueles que buscam o Judiciário para fazer valer seus direitos. E, com essa iniciativa culminou com a edição da Lei da Mediação, a Lei 13.140/2015.

 

As referidas práticas se concretizaram graças à Política Nacional de Tratamento dos Conflitos de Interesses que foi instituída pela Resolução 125/2010 do CNJ.

 

Diante da necessidade de instituir uma política pública de incentivo e de aperfeiçoamento dos mecanismos consensuais de solução de litígios, a Resolução 125/2010, ainda, permitiu a disseminação da cultura de pacificação social. O acompanhamento estatístico específico também integra as medidas previstas pela referida Resolução.

 

Os mecanismos permitem que o Estado cumpra o dever de propiciar o acesso à justiça a todo cidadão. O legislador ordinário positivou tais práticas autocompositivas no ordenamento jurídico brasileiro tanto que é possível afirmar que a Lei 13.140/2015 e o CPC de 2015 e a Resolução 125 do CNJ formam microssistema consensual de solução de conflitos.

 

A Conciliação atende à solução de vários tipos de conflitos, como pensão alimentícia, guarda dos filhos, divórcio, partilha de bens, acidentes de trânsito, dívidas em bancos, danos morais, demissão do trabalho, entre outras. No geral, o mecanismo atende questões que possam ser resolvidas por meio de acordos.

 

Para ser beneficiado por meio do recurso, basta procurar o tribunal onde o processo foi instaurado, o núcleo ou mesmo um centro de conciliação. Após comunicar a intenção de construir um acordo, haverá o agendamento da data da audiência. As partes envolvidas serão auxiliadas por um conciliador que vai ajudar a encontrar uma saída satisfatória.

 

No caso da Mediação, cuja solução inclui uma terceira pessoa, imparcial, para facilitar o diálogo entre os envolvidos, só é utilizada em conflitos multidimensionais ou complexos. Com natureza específica, a mediação não tem prazo definido e pode resultar em acordo ou não. Isso ocorre em função da liberdade que as partes têm para procurar outras soluções que sejam mais adequadas aos seus interesses.

 

A mediação é mecanismo de resolução de conflito de interesses onde as próprias partes constroem, em conjunto, um sistema de decisão, satisfazendo a todos os envolvidos e oxigenando as relações sociais, com a participação de um terceiro intermediando ou facilitando o alcance do entendimento. Entende-se que a mediação como processo em que os litigantes buscam o auxílio de terceiro imparcial que contribuirá na busca pela solução do conflito. Esse terceiro não tem a missão de decidir e nem à este foi dado autorização para tanto. Ele apenas auxilia as partes na obtenção da solução consensual.

 

Analisando, academicamente, a mediação traz a mudança do modelo perde-ganha para o modelo ganha-ganha. E, tenta quebrar alguns paradigmas tão enraizados em nossa sociedade, como a cultura da litigiosidade e necessidade de levar ao Poder Judiciário demandas que poderia ser solucionadas em um ambiente mais propício e com mecanismos mais apropriados.

 

A conciliação tem aspectos diferentes da mediação e exigiu maior cuidado do legislador e de seus atores. Porque a mediação possui finalidades precípuas e formalidades particulares que visam restaurar os vínculos afetivos ou de convivência. Na conciliação, o conflito é disciplinado de forma mais superficial e, busca-se, principalmente, a autocomposição, com o encerramento da disputa.

 

Na mediação é tratado o plano de fundo do conflito e, além de visar a resolução da controvérsia, tenta restaurar as relações sociais entre os envolvidos e, por isso, carece da intervenção de terceiro mais capacitado para solucionar a desavença.

 

A conciliação já é bem difundida em nosso ordenamento jurídico e, tem papel importante na solução amigável dos conflitos, ainda que não reduza, necessariamente, o número de processos e congestionamento no Judiciário brasileiro.

 

O instituto da conciliação ganhou maior ênfase com a criação dos Juizados Especiais Cíveis, situando-se como necessária etapa do procedimento. Apesar que tivesse havido inicial resistência, os resultados foram positivos e trouxeram credibilidade ao modelo e, atualmente, grande parte dos conflitos são solucionados ainda na audiência de conciliação, isto é, sem passar por uma decisão impositiva do juiz. Destaque-se ainda que a conciliação galgou previsão legal no vigente CPC e também em algumas legislações especiais.

 

Já a mediação, embora reconhecida e aplicada na teoria e na prática forense, ainda necessitava de força normativa que só se concretizou em 2015. Enfim, reconhece-se ser uma ousada alteração em relação ás tradicionais formas de solução de controvérsias, sem, contudo, significar a denegação de justiça ou da função do Estado de dizer o direito dentro do sistema judicial.

 

Em verdade, a desjudicialização de controvérsias e a autocomposição pelas partes do processo hoje é uma realidade nos grandes sistemas processuais como uma forma de resolver problemas estruturais da justiça, mas, acima de tudo, como efetivo meio de se atingir uma satisfação mais plena por parte dos envolvidos nos conflitos, destacando-se, neste último caso, os benefícios da mediação na pacificação social, trazendo maior legitimidade aos ajustes e também maiores chances de dirimir o dilema estabelecido.

 

Cumpre sublinhar que a conciliação já tinha estrutura legal consolidada no Código Buzaid, CPC de 1973, bem como em outras leis especiais. Ainda havia em nosso ordenamento jurídico grande disparidade entre as fontes legislativas que disciplinavam a conciliação e a mediação.

 

Registre-se também que a mediação fora legalmente introduzida em diversos ordenamentos jurídicos como na Argentina, no Uruguai, no Japão, na Austrália, na Itália, na Espanha, em França entre outros. O Conselho da União Europeia, inclusive, até emitiu a Diretiva 52, de 21 de maio de 2008 em que definiu a mediação como um processo estruturado no qual duas ou mais partes em litígio tentam, voluntariamente, alcançar por si mesmas um acordo sobre a resolução de seu litígio, com a ajuda de um mediador.

 

Em nosso ordenamento basta ler o preâmbulo da Constituição Federal de 1988, in litteris:

     “Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembleia Nacional Constituinte para instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte Constituição da República Federativa do Brasil.”

 

Tanto o Judiciário como os demais Poderes como o Executivo e Legislativo são igualmente responsáveis pela harmonia social, conforme se infere do próprio preâmbulo da nossa vigente Carta Magna. E, no artigo 4, VII prevê a solução pacífica dos conflitos como um princípio que rege as suas relações internacionais.

 

Não obstante, a conciliação e a mediação podem ser inseridas entre os mecanismos legítimos de acesso à justiça, previsto n artigo 5, XXXV, da CF/1988, na medida em que resolve a controvérsia da maneira adequada, e, portanto, mais justa. Assim, referem-se aos instrumentos capazes de solucionar conflitos de forma apropriada, de reduzir o número de processos judiciais e de combater o desvirtuamento da função judicial do Estado, conferindo, assim, uma leitura mais contemporânea do acesso à justiça.

 

A mediação e a conciliação também foram objeto do Segundo Pacto Republicano que foi assinado em 13.4.2009 pelos três Poderes da Federação,

em que, dentro os compromissos assumidos, constava o de fortalecer a mediação e a conciliação, estimulando a resolução de conflitos por meios autocompositivos, voltados a maior pacificação social e menor judicialização.

 

Assim, CNJ quando editou a Resolução 125/2010 depois alterada pela Emenda 2 de 2016 que trata da Política Judiciária Nacional de tratamento adequado dos conflitos de interesses outras questões, estabelece a criação de juízos de resolução alternativa de conflitos, verdadeiros órgãos judiciais especializados na matéria.

 

A Emenda do Senado classificou a mediação em judicial ou extrajudicial, pode ser prévia ou incidental, determinando, em seu artigo 34, que a mediação incidental ao processo fosse obrigatória, fixando o procedimento nos artigos seguintes. Em resumo, logo após a distribuição da petição inicial, o mediador receberia uma cópia do processo judicial e intimaria as partes para comparecimento em dia, hora e local designados por ele, quando então seria realizada a mediação.

 

Impactante mudança significou na estrutura do Poder Judiciário foi a criação, de uma audiência/mediação como ato inicial do procedimento comum, isto é, antes da apresentação da contestação pelo réu. Segundo o CPC vigente, o réu será citado para comparecer à audiência de conciliação ou mediação (artigo 334) e, somente com o encerramento do ato e em não tendo havido a transação, terá início o prazo para contestação (art. 335,I).º)

 

A referida audiência só não ocorrerá quando: a) quando o direito em debate não admitir autocomposição; b) se ambas as partes, expressamente, manifestarem o desinteresse na composição consensual (artigo 334, §4º). É vedado ao juiz dispensar o ato, mesmo que o acordo seja improvável. Ademais, a lei brasileira não admite recusa de apenas uma das partes, sendo que o não comparecimento injustificado ao ato será considerado ato atentatório à dignidade da justiça, aplicando-se multa de até dois por cento da vantagem econômica pretendida ou do valor da causa, revertida em favor da União ou do Estado.

 

O CPC/2015 não inclui a remuneração dos mediadores/conciliadores como despesas processuais, deixando a dúvida sobre se eles são detentores de cargo público ou se receberão pela tabela fixada pelo tribunal, conforme os parâmetros do CNJ. Poucos tribunais brasileiros regulamentaram o tema.

 

O artigo 82 afirma que caberá à parte interessada o pagamento da despesa com a remuneração de mediadores ou conciliadores. Assim, se o autor e o réu demonstrarem desinteresse e houver acordo, as custas serão deliberadas noa to, mas, se não houver acordo, o vencido pagará a despesa final (vide o artigo 82, §2º do CPC/2015).

 

O CPC também estabelece como órgãos responsáveis pelas audiências os Centros Judiciários de Solução Consensual de Conflitos (artigo 165), nos termos disciplinados pelo CNJ. Todavia, com exceção de alguns Estados que se encontram mais avançados, grande parte dos Tribunais brasileiros ainda não absorveu a necessidade de priorizar a política da conciliação e não criaram os CEJUSC's em quantidade suficiente para atender essa demanda que a nova codificação impôs.

 

Lembremos que além da estrutura física, os Tribunais precisam capacitar os conciliadores e mediadores criando o cadastro. E, de fato, se as audiências forem feitas por servidores, estagiários ou voluntários, indicados pelo juiz ou pelo Tribunal sem a prévia e devida capacitação, certamente poderá comprometer qualitativamente a função da norma.

 

Ainda, registre-se que a maioria dos Tribunais não conta com verba para a implementação dos mecanismos consensuais de resolução de solução de disputa. E, por essa forma, os fatores legislativos e estruturais podem dificultar sobremaneira a eficácia da audiência inaugural.

 

 

QUAL TIPO DE CONFLITO PODE SER RESOLVIDO COM A CONCILIAÇÃO OU A MEDIAÇÃO? Vários tipos de conflitos podem ter uma solução por meio de acordo, como:

 – pensão alimentícia;

 – Guarda dos filhos;

 – Divórcio;

 – Partilha de bens;

 – Acidentes de trânsito;

 – Dívidas em bancos;

 – Danos morais;

 – Demissão do trabalho;

 – Questões que envolvam comércio ou relação de consumo;

 – Questões de vizinhança;

 Entre outras.

 

É verdade que o conflito seja oriundo da própria interação social, sendo-lhe necessário um olhar mais aprofundado do que uma análise processual, deve-se buscar formas pacíficas para solucioná-lo.

 

Deve-se refletir sobre o conflito, sob a perspectiva sociológica de Simmel o direito fundamental ao acesso à justiça, os principais aspectos das mudanças da cultura da judicialização para a cultura da consensualidade, que ensejaram a Resolução 125 do CNJ, o CPC vigente e a Lei da Mediação.

 

Conforme Cheron, Zanella e Moya (2019, p. 705), o sociólogo Simmel “[…] situa os conflitos enquanto fatores de progresso e desenvolvimento, na medida em que obrigam a sociedade à superação de situações de contingência, produzindo realizações consideráveis, não verificáveis em circunstâncias de aparente harmonia coletiva.

 

Desse modo, analisar o conflito apenas como algo negativo é equivocado, por ignorar a possibilidade de se retirar algo de positivo dele, visto que “[...] o conflito não é algo que deva ser encarado negativamente, mesmo sendo impossível uma relação interpessoal plenamente consensual. Isso porque, cada pessoa é dotada de uma originalidade única, com experiências e  circunstâncias existenciais personalíssimas.”

 

Para atender e solucionar conflitos comunitários, surgiu a mediação extrajudicial comunitária que se configurou como eficiente mecanismo de exercício da cidadania, pacificação e inclusão social, indo além do acesso à justiça em qualquer de suas instâncias.

 

Com as transformações tecnológicas, tornou-se mais fácil a comunicação e interação social, por outro lado, nesse novo cenário de relações sociais, também, tornou mais fácil o surgimento de conflitos que perpassam as fronteiras, agregando complexidade.]E, na modernidade líquida de Bauman, a sociedade é marcada pela instantaneidade, em que o tempo é importante e não pode ser desperdiçado, ao contrário do espaço que se mostra irrelevante. Com isso, acabam surgindo novos direitos substantivos, novos tipos de conflitos, bem como as novas formas de resoluções Online Dispute Resolution (ODR).

 

A mudança de paradigma da cultura do litigio para a cultura da solução consensual de conflitos, não ocorre de forma repentina nem brusca, essa mudança se desenvolve gradualmente. A possibilidade de buscar os métodos alternativos para tratar o conflito e resolvê-lo por mediação, ou conciliação, judiciais, ou extrajudiciais, com um papel mais ativo entre as partes, amplia o acesso à justiça.

 

No contexto da crise do Judiciário e com o crescimento de mecanismos consensuais de conflitos, o CNJ por meio da Resolução 125, de 29 de novembro de 2010 e, observou-se que a mudança da cultura da judicialização para a cultura do consenso foi gradual e pode ser verificada no relatório Justiça em Números de 2020.

 

De acordo com o doutrinador Didier Júnior (2017) o CPC de 2015 ratificou a consagração de um sistema de justiça multiportas, oferecendo métodos alternativos que podem ser autocompositivos, quando a solução se desenvolve através do diálogo e negociação entre as partes, com a ajuda de um terceiro sem poder decisório, ou heterocompositivos, quando caberá a um terceiro a decidir o conflito entre as partes.

 

A mediação não tem como objetivo primordial o acordo, e sim a satisfação dos  interesses, dos valores e das necessidades das pessoas envolvidas na controvérsia.

As pessoas passam, de forma emancipada e criativa, a resolver um conflito pelo diálogo cooperativo, na construção da solução como, por exemplo, na área de família (GUEDES, 2019).

 

Conclui-se que a autocomposição engrandece o sistema de justiça pela abordagem que é feita do conflito, visto que a decisão não recai sobre os sujeitos do conflito, na realidade, é por eles construída de forma dialogada e consensual, qualificada pela autonomia da vontade, por meio dos métodos da autocomposição, mediação e conciliação, bem como conseguindo acompanhar os avanços tecnológicos e sociais.

 

Por isso, tais métodos emancipam e empoderam as partes, sobretudo, pela condição mais ativa de cada indivíduo na contribuição para solução do conflito e, consequentemente, com a justiça e com o desenvolvimento da cidadania ativa.

 

Referências.

 

 

BAUMAN, Zygmunt. Modernidade líquida. Tradução de Plínio Dentzien. Rio de Janeiro: Zahar, 2001

 

CABRAL, Trícia Navarro Xavier. Ordem Pública Processual. 1ª edição., Brasília: Gazeta Jurídica, 2015.

 

DIDIER JÚNIOR, Fredie. Curso de direito processual civil: introdução ao direito processual civil: parte geral e processo de conhecimento. 19ª. ed. Salvador: Juspodivm, 2017.

 

FISS, Owen. Um novo processo civil: estudos norte-americanos sobre jurisdição, constituição e sociedade. Coordenação da tradução Carlos Alberto de Salles. Tradução de Daniel Porto Godinho da Silva, Melina de Medeiros Rós. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004.

 

GALVÃO FILHO, Maurício Vasconcelos; WEBER, Ana Carolina. Disposições gerais sobre a mediação civil. In: PINHO, Humberto Dalla Bernardina (Org.). Teoria Geral da Mediação à Luz do Projeto de Lei e do Direito Comparado. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008, p.03-58.

 

GUEDES, Denyse Moreira. O acesso à justiça através dos novos métodos de resolução de conflito: o empoderamento do indivíduo. In: FREITAS, Gilberto Passos de; YAGHSISIAN, Adriana Machado; CARDOSO, Simone Alves (org.). Métodos consensuais para solução  de conflitos: abordagens multidisciplinares em torno da paz. Santos: Editora Universitária Leopoldianum, 2019. p. 55-64. Disponível em: https://www.unisantos.br/wp-content/ uploads/2019/06/metodos-consensuais-v2.pdf. Acesso em: 24.5.2024.

 

MARTINS, Dayse Braga; PESSOA, Larissa Rocha de Paula. A Mediação de Conflitos e a Cultura do Consenso na Justiça Brasileira: Do Empoderamento à Cidadania. Revista do Direito Público. Londrina, volume 17, n.2, p. 235-251, outubro de 2022.

 

 

PINHO, Humberto Dalla Bernardina de. Mediação – a redescoberta de um velho aliado na solução de conflito. In: PRADO, Geraldo (Org.) Acesso à Justiça: efetividade do processo. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005.

GiseleLeite
Enviado por GiseleLeite em 19/08/2024
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