Resumo:

Enfim, "Os Lusíadas, narrou as grandes navegações de Vasco da Gama, correspondem a um símbolo cultural e político para os lusitanos e conferem a dignidade e crédito à língua portuguesa como língua de cultura e nos remetem ao Direito no Brasil Colonial.

(...)"Por mares nunca de antes navegados

Passaram ainda além da Taprobana,

Em perigos e guerras esforçados

Mais do que prometia a força humana,

E entre gente remota edificaram

Novo Reino, que tanto sublimaram; (...)"

Palavras-chave: História do Direito. Direito Colonial. Forais. Ordenações do Reino. Brasil Colônia.

 

Os Lusíadas é, sem dúvida, a obra mais célebre da literatura portuguesa, de autoria de Luís de Camões e fala das conquistas lusitanas até a chegada de Vasco da Gama à Índia. O narrador da epopeia demonstra plenamente seu amor e veneração ao rei de Portugal, Dom Sebastião, e, também ao povo lusitano.

Em verdade, a obra integra o chamado classicismo[1] português, e já trouxe uma visão antropocêntrica, isto é, valoriza a razão e as conquistas humanas. Traz, paradoxalmente, elementos de semipaganismo ao reverenciar a cultura greco-romana e, também, a fé cristã. São dez cantos dotados de versos decassílabos de caráter narrativo e heroico[2].

"Vasco da Gama então conta para esse rei a história do povo lusitano, traça a genealogia dos monarcas portugueses e aproveita para “louvar dos meus a glória”. Fala do casamento entre “Anrique” (Henrique), um conde filho de um “Rei de Hungria”, com Teresa, filha do “Rei Castelhano” D. Afonso, casal que ganhou as terras hoje conhecidas como Portugal.

O primeiro rei português teve um filho, o príncipe Afonso, que levava o nome do avô espanhol. Mais tarde, o jovem se tornou rei e empreendeu uma guerra vitoriosa contra os mouros. Sancho I sucedeu ao pai. Depois Afonso II, ambos reis gloriosos. Porém, o próximo rei, Sancho II, é descrito pelo narrador como “manso e descuidado”.

A dinastia vai sendo mencionada por Vasco da Gama[3], com detalhes e façanhas de cada reinado, como o dos reis D. Dinis, Fernando e Manuel, por exemplo. Por fim, ele conta as próprias aventuras até desembarcar ali e receber a hospitalidade do rei de Melinde. Terminada a narrativa, Gama continua viagem e atinge os “mares da Índia”.

Porém, ainda precisa enfrentar a fúria do mar. E chega finalmente ao destino sonhado: a Índia. Lá, são recebidos com festa. No entanto, o narrador revela que o propósito dos mouros era “deter ali os descobridores/ Da Índia tanto tempo que viessem/ De Meca as naus, que as suas desfizessem”.

Gama fica sabendo da intenção dos mouros e parte rumo a Portugal, levando pimenta, noz, cravo e uma rota para a Índia. Antes de chegarem às terras lusitanas, os conquistadores param em uma ilha e são premiados pelos deuses com o amor de belas e sedutoras ninfas."

Existem três episódios em Os Lusíadas que merecem destaque por sua importância: o de Inês de Castro, o do Velho do Restelo e o do Gigante Adamastor.

O episódio de Inês de Castro aparece no Canto III, durante o relato de Vasco de Gama ao governante de Melinde. Trata-se da história proibido de Inês, dama de companhia da rainha, pelo Príncipe Dom Pedro. Ao saber do envolvimento do príncipe com ela e preocupado com a ameaça política oferecida por Inês, que tinha parentesco com a nobreza de Castela, o Rei Dom Afonso mandou executar a jovem.

O rei percebeu, então, que o amor de Inês por seu filho era sincero e decide mantê-la viva, mas o povo, representando o interesse do Estado, o obriga a executar a moça. Dom Pedro, ausente do reino na ocasião do assassinato, inicia depois de uma vingança sangrenta contra os executores e coroa o cadáver de Inês, aquele "que depois de morta foi rainha".

Já o relato sobre o Velho do Restelo encontra-se no Canto IV. Na praia lisboeta de Restelo, um velho profere um discurso poderoso contra as empresas marítimas de Portugal, que ele considera uma ofensa aos princípios cristãos, uma vez que a busca de fama e glória distantes contraria a vida de privações pregada pela doutrina católica.

O episódio do Gigante Adamastor que consta no Canto V, aparece quando Vasco da Gama e sua tripulação se dirigem ao Cabo das Tormentas ou da Boa Esperança, personificado pela figura de Adamastor. Esse gigante da mitologia grega se apaixonara pela ninfa Tétis que o rejeitara. Peleu, o marido de Tétis, transformou então o gigante em pedra. Mais, uma história de amor áspero e tirano, causa o infortúnio a quem se deixa levar por este.

O que nos faz enfocar o Direito no tempo do Brasil Colônia. Lembremos que o Direito surgiu a partir do momento em que o homem começou a viver em sociedade. É por essa razão que a Ciência do Direito é uma das ciências sociais, e estuda as normas obrigatórias que são controladoras das relações entre as pessoas numa sociedade.

Enfim, as leis foram criadas para organização da sociedade, estabelecendo com clareza o que cada pessoa poderia ou não fazer. E, assim, determinam o certo e errado e, a princípio as leis se inspiravam em princípios religiosos e visavam legitimar a sociedade como era.

Devemos atentar que a regulamentação feita pelo Direito é de ordem positiva, legal, ao passo que a exercida pela Religião é de ordem moral. Tanto o Direito como a Religião atuam como controles sociais. E, mesmo sob o manto da laicidade, como é o caso da contemporaneidade e do Estado Democrático de Direito, percebe-se pela trajetória história de todas as Constituições brasileiras que a relação com religião era concreta, destaque-se que a vigente Constituição, veio a consolidar a liberdade religiosa.

Foi em 1.088, precisamente em Bolonha, na Itália que foi fundada a Universidade de Bolonha sendo a primeira universidade da Europa, o Velho Continente, onde se estudava direito, medicina e teologia. Em nosso país, a mais vetusta universidade é a de Manaus, fundada em 1909, hoje atualmente chamada de Universidade Federal de Manaus. Naquela época já existiam algumas instituições de ensino superior, mas, nenhuma era considerada universidade[4].

O Direito que existiu no Brasil entre 1500 a 1532, o denominado direito pré-colonial fora regido por leis de caráter geral e os Forais que centralizavam todo o poder nas mãos de Portugal e de seus dirigentes no Brasil. E, o período colonial durou até 1822, tendo se iniciado com o desembarque da primeira expedição europeia e se estendeu até a independência. Durante três séculos, o país era possessão de Portugal e nossos recursos foram exploradas, tanto recursos naturais como humanos em prol dos lusitanos.

O direito colonial surgiu através da imposição da vontade monolítica dos Reis de Portugal sobre as relações sociais e, assim, foram se formando as primeiras bases culturais e do ordenamento jurídico brasileiro.

Diferentemente, do que aconteceu com o direito dos povos antigos, que fora resultando de gradual evolução e da experiência do grupo de pessoas, no Brasil o direito foi imposto, e veio a formar as bases culturais e jurídicas. E, muitos contribuíram para a formação da cultural brancos, negros e indígenas.

Herdamos do mundo medieval do Velho Continente, as fontes e as jurisdições que era as mais diversas e coexistiam no mesmo continente. Então, existia o ius commune imposto pelo direito romano e o direito canônico[5], o direito do reino que era a fonte que manifestava a vontade do Soberano Rei e, existiam o ius proprium, o direito local ou das câmaras municipais.

O pluralismo jurídico, portanto, era a regra e, no cenário ultramarino essa dinâmica se manteve, mas, fora acrescidas por novos aspectos, vez que a realidade colonial era distinta da observada na Metrópole. Afinal, no Novo Mundo, existiam peculiaridades que vinham da geografia e que exigiam naturalmente regulamentações mais específicas, não sendo suficientes as leis gerais e a doutrina europeia.

O sistema jurídico que vigorou durante todo período colonial no Brasil era o existente em Portugal, isto é, as Ordenações Reais, compostas pelas Ordenações Afonsinas[6] (1446), as Ordenações Manuelinas[7] (1521) e, por derradeiro, fruto da união das Ordenações Manuelinas com as leis extravagantes em vigência, as Ordenações Filipinas[8] que surgiram como síntese e resultado do domínio castelhano. Tais Ordenações ficaram prontas ainda durante o Reinado de Filipe I, em 1595, mas entraram efetivamente em vigor somente em 1603, durante o governo do Rei Felipe II.

Logo no início da colonização do Brasil o direito era por meio dos forais que eram responsáveis de dar solução as questões locais. E, com a divisão das capitanias hereditárias, as funções judiciais foram dadas aos donatários que tinham como missão legislar, acusar e julgar.

E, ainda tinham pleno poder por tudo que estava em suas terras. Porém, esse sistema foi falho e assim, o governo colonial teve que se centralizar e ser coordenado por um Governador-Geral. O primeiro foi Tomé de Souza e, então a partir daí, começaram a surgir os oficiais jurídicos, os burocratas, legisladores, entre outros.

Os ouvidores-gerais tiveram bastante importância, nesse período, pois Portugal precisava de oficiais que aplicassem de modo eficaz o direito lusitano garantindo seus interesses.

Os governadores-gerais administravam a colônia, já os ouvidores tomaram o lugar dos donatários e eram responsáveis pela aplicação fiel da lei lusitana. Com o passar do tempo, foi necessário a entrada de mais oficiais da justiça, causando a divisão das tarefas e criando três instâncias responsáveis por trabalharem juntas na aplicação das normas.

O primeiro Tribunal foi criado na Bahia, em 1587, mas o primeiro Tribunal a ser implantado foi no Rio de Janeiro, em 1751.

Outro aspecto relevante no direito colonial brasileiro foi a vinda da Inquisição que buscava converter os nativos ao cristianismo e prender os homens acusados de heresia. É evidente então a participação do direito canônico na consolidação do direito brasileiro e na sociedade, uma vez que este regulava as condutas de acordo com os interesses da elite.

As Ordenações[9] Filipinas tiveram vigência no Brasil até 1822, quando foi proclamada a independência. E, começou em 1603.

A chegada da Família Real Portuguesa fugindo da fúria de Napoleão Bonaparte começou o processo de transformação no país, criou-se as primeiras universidades, as primeiras instituições financeiras, inclusive com relação à questão do um sistema oficial de publicação de normas, no início daquele século, Portugal tinha sérios problemas políticos com França e seus outros vizinhos europeus, e por outro lado a colônia Brasil estava sofrendo ataques de outros países como Holanda, por exemplo, a Coroa Portuguesa necessitava demarcar melhor o terreno, ou seja, tentar evitar as invasões constantes no litoral, a família Real Portuguesa chegou ao Brasil, no ano de 1808.

O surgimento dos primeiros cursos jurídicos no Brasil ocorreu em 1827 com a promulgação da Lei de 11 de Agosto de 1827, tendo sido criadas duas faculdades de direito: uma em Olinda, que deu origem à Faculdade de Direito da Universidade Federal de Pernambuco e outra em São Paulo que deu origem à Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo.

A primeira turma de bacharéis em ciências jurídicas formou-se em 1832. Em 1852, o curso foi transferido do mosteiro de São Bento para o palácio dos antigos governadores, prédio reformado situado no alto da Ladeira do Varadouro, em Olinda, que ficou conhecido pelo nome de Academia.

No Brasil Colônia o direito esteve a serviço do empreendimento capitalista da Metrópole. Na esfera pública: seja na regulamentação da distribuição das terras e da legitimação da escravidão, seja na organização administrativa do serviço público, concentrando todo o poder nas mãos do rei e de seus delegados; e, na esfera particular, manteve a estrutura hierarquizada da família e das relações pessoais portuguesas que estavam lastreadas no direito romano ou no direito canônico.

O sistema colonial entrou em decadência, principalmente pelo desejo do povo de quebrar vínculos com Portugal. Muitas revoltas ocorridas no Brasil foram reflexos dessa insatisfação, como: Revolta de Beckman: (1684), Guerra dos Emboabas (1708-1709), Guerra dos Mascates (1710), Rebelião de Vila Rica (1720).

Além dessas revoltas ocorreram movimentos separatistas como a Inconfidência Mineira (1789) e a Conjuração Baiana (1798). A era do Brasil-Colônia teve fim no dia 7 de setembro de 1822 quando D. Pedro declarou a Independência do Brasil.

O jushistoriador português António Manuel Hespanha foi um dos principais proponentes de um direito brasileiro local próprio, baseando sua tese num conjunto de decisões jurídicas e documentos legais da época. Críticos, como a historiadora Laura de Mello e Souza apontam uma falta de contextualização apropriada, particularmente na aplicação do conceito de "Antigo Regime" à colônia.

Observado num primeiro momento a preponderância de imperialismo colonizador cuja finalidade era pautada na exploração de recursos naturais, imposição de  cultura, costumes e ordenações  jurídicas voltadas para satisfação de interesses próprios, isso era e foi de fato  o  nosso processo de  formação que  carrega características  e vícios  até os dias  atuais, que  ao  longo  do  processo  de  mudanças  de  governo,  que  vai  desde  o período colonial  até o republicano, ganharam apenas faces diferentes, entretanto o sistema jurídico sempre esteve atrelado e manipulado por aqueles que estiveram no poder.

A frase literária de Alfredo Bosi, sobre o retrato social no Brasil-colônia, in litteris: “(...) povos de origem tribal em diferentes estágios culturais, todos eles beirando, porém, o neolítico, despossuídos  por  completo  de uma  regulamentação  realmente  jurídica,  mas  antes  dominados ainda pelo império da norma indiferenciada de cunho sagrado”.

Era, pois, o direito português que deveria construir a base de nosso direito nacional sem maiores competições.  Também no âmbito jurídico temos aqui mais uma ocupação do que uma   conquista.

Nos países colonizados os limites foram definidos, a economia organizada e a sociedade administrada a partir dos interesses e necessidades das metrópoles.

Assim, observa-se que o Colonialismo motivou a estrutura econômica dos países produtores de matérias-primas, e o Estado Colonial influenciou as estruturas institucionais e políticas que depois resultaram nos Estados independentes. A herança política do Colonialismo acompanha os países ex-coloniais, isto é, o Estado Colonial era tipicamente um Estado administrativo autoritário (BOBBIO, 2000).

Os colonizadores ao chegarem ao Brasil tomaram posse das terras dos nativos indígenas, sentindo-se legitimados a ditarem-lhes os rumos em todos os sentidos.

No início da colonização, as principais fontes econômicas no país eram os metais preciosos e a extração do pau-brasil, em seguida iniciou-se o cultivo de terras para agricultura, refletindo a economia da metrópole.

Os colonizadores detinham os meios de produção, o domínio das propriedades, dos engenhos e das fazendas, além disso, o trabalho era escravagista e nesta condição se encontravam os negros e os indígenas

Portanto o Brasil foi colonizado sob a inspiração doutrinária do mercantilismo e integrante do Império português, refletindo assim os interesses econômicos da Metrópole.

A colonização feita pelo processo de exploração criou as condições para a agricultura tropical centrada economicamente em torno do cultivo de terras, “transformando-se numa grande empresa extrativa” a fornecer produtos primários aos centros europeus. Nessa perspectiva só poderia gerar produtos tropicais que a Metrópole pudesse revender e lucrar no mercado europeu. “Para Portugal, o Brasil deveria servir seus interesses; existia para ele e em função dele” (WOLKMER, 2010).

Para o estudo da história do Direito e do processo de formação das Instituições Jurídicas no Brasil Colonial e de seus atores sociais, faz-se necessário analisar a situação cultural em Portugal no período correspondente, além, do papel que nela desempenharam as instituições educacionais e do direito, e do modo como esta cultura se transplantou para o Brasil, como forma e tipo de colonização. Pois que a herança colonial (patrimonialismo e mentalidade conservadora) marcou profundamente o desenvolvimento posterior da sociedade brasileira, tanto no Império quanto mais tarde na República.

A gestão da Colônia se faria através da Metrópole, cabendo-lhe tornar efetivos os princípios do mercantilismo, principalmente através da constituição de monopólios. É no sistema monopolista que reside o núcleo de toda essa conjuntura.

O monopólio do comércio pela Metrópole visava, naturalmente, impedir que outras nações europeias pusessem em risco, com a concorrência, aqueles privilégios advindos da restrição comercial, tão lucrativa aos comerciantes portugueses que não encontravam, no seu reduzido espaço, satisfação para sua ambição (WOLKMER, 2010).

“O modo de produção e a formação social surgiram e se consolidaram como uma etapa da transição que ocorreu na Europa Ocidental, entre aproximadamente finais de século XV (regime feudal) e século XVIII (sistema capitalista). As transformações econômicas e sociais nesse período foram comandadas por grupos ascendentes e enriquecidos, provenientes do comércio e das práticas mercantis” (WOLKMER, 2010).

Enquanto o trabalho servil (forma obrigatória de trabalho própria do feudalismo) desaparecia na Europa, os europeus recriaram a escravidão em suas colônias (VITA, apud WOLKMER, 2010).

Tal transformação no Estado português teve suas origens na Revolução de 1383 e representou o fortalecimento do estado nacional no continente europeu com a consequente centralização monárquica e a codificação do direito (FAORO, 1979).

No centro dessa sociedade e detendo todo o poder central estava a realeza, que não se importava com a segurança ou o desenvolvimento da população; o rei era o senhor de toda a riqueza comercial, territorial e de empreendimentos, mantendo sempre servos que a ele se curvavam por relação de dependência e confiança; é o que Faoro define como “patrimonialismo estamental” (1979).

Nesse contexto o direito, símbolo do poder real, teria importante papel a desempenhar. Dessa forma Portugal edificou sua base teórica, na qual o processo político também se apoiava, em princípios próprios e ideias concernentes à sua concepção de Estado. No entanto os legisladores lusitanos utilizaram-se também dos ensinamentos jurídicos do direito romano (CAMPOS, 1960).

Tal concepção de Estado vinda de Portugal, baseada numa monarquia patrimonial, onde o soberano é detentor dos bens, das riquezas e, também, do quadro administrativo, que a ele se ligava por relações pessoais de confiança, estará na formação das instituições político-jurídicas brasileiras.

Tal aliança do poder aristocrático da Coroa com as elites agrárias locais permitiu construir um modelo de Estado resultante da imposição da vontade hegemônica do Império colonizador e que defenderia os intentos de segmentos sociais donos da propriedade e dos meios de produção.

Em suma a colonização brasileira foi marcada pelo mercantilismo econômico e pela administração centralizadora burocrática, além da mentalidade calcada na racionalidade escolástico-tomista e nas teses do absolutismo elitista português. E, como lembra Wolkmer herda-se uma estrutura feudal-mercantil embasada em raízes senhoriais que reproduziam toda uma ideologia da Contrarreforma (2010).

O processo cultural que se exercia sobre o Brasil pela Metrópole foi devido em parcela primordial à Companhia de Jesus, que fundada no âmbito das transformações da Contrarreforma, vai se estabelecer como uma grande empresa educacional e em especial no país como principal elemento de formação cultural

Importante movimento posterior foi a renovação cultural pombalina que influenciaria ideologicamente a Colônia brasileira e “as bases para a modificação do Estado, restaurando a autoridade pública, fraca, corrupta e atrasada” (FAORO, 1969).

As reformas pombalinas limitaram largamente a jurisdição do clero, os jesuítas foram expulsos de Portugal em 1759, restringiram os benefícios da nobreza, incrementaram o poder econômico da burguesia e impulsionam a reformulação do ensino e do modelo universitário, alcançando a Universidade de Coimbra

Assim em fins do século XVIII começaram a chegar ao Brasil ideias representadas pelo iluminismo pombalino e as primeiras manifestações do liberalismo engendradas por Portugal.

O direito a exemplo da cultura brasileira, não foi produto da evolução linear e gradual de uma experiência comunitária, como ocorreu com a legislação de alguns povos mais antigos. 

O processo colonizador, que era o projeto da Metrópole, instalou e impôs numa região habitada por populações indígenas toda uma tradição cultural alienígena, segregador e discricionário, além de um sistema de legalidade deveras avançado sob a ótica do controle repressor e de efetividade formal.

“O empreendimento do colonizador lusitano, caracterizando mais uma ocupação do que uma conquista trazia consigo uma cultura considerada mais evoluída, herdeira de uma tradição jurídica milenária proveniente do Direito Romano”.

Das raízes culturais da legislação brasileira, dos três grupos étnicos constitutivos de nossa nacionalidade, apenas a do colonizador luso trouxe influência dominante e definitiva à formação jurídica do Brasil.

Os indígenas apesar de terem contribuído para a construção da nossa cultura, o mesmo não aconteceu quanto à origem do Direito nacional, uma vez que os nativos não conseguiram impor seus “mores” e suas leis, participando como recorda Wolkmer (2010), mais como objeto do direito real, ou seja, objetos de proteção jurídica.

Quanto ao primeiro momento da colonização no Brasil – 1520 a 1549 – foi marcado por uma prática político-administrativa feudal, designada como regime das Capitanias Hereditárias. As primeiras disposições legais desse período foram as Cartas de Doação e pelos Forais:

As cartas de foral constituíram uma consequência e um complemento das de doações; mas estas estabeleciam apenas a legitimidade da posse e dos direitos e privilégios dos donatários, ao passo que aquelas eram um contrato enfitêutico, em virtude do qual se constituíam perpétuos tributários da coroa, e dos donatários capitães-mores, (...) que recebessem terras de sesmarias.

Os forais eram documentos jurídicos, concedidos pela Monarquia, que indicavam direitos e deveres aos possuidores para receber tributos, proteger pessoas e bens da terra, aplicar penas aos delitos e contravenções, indicar foro de julgamento e detenção (SODRÉ, apud WOLKMER, 2010).

Diante do fracasso das capitanias, tratou a Metrópole de dar à Colônia outra orientação administrativa chamada de sistema de governadores-gerais, surgindo dessa forma a utilização de certo número de prescrições decretadas em Portugal, que reuniam desde Cartas de Doação e Forais das capitanias até Cartas-Régias, Alvarás, Regimentos dos governadores gerais, legislação canônica, ius Commune e a mais importante compilação que unificar o Direito lusitano, as Ordenações Reais.

O Direito vigente no Brasil - Colônia deu-se com a transferência da legislação portuguesa contida nas compilações de leis e costumes conhecidos como Ordenações Reais, que englobavam as Ordenações Afonsinas (1446), as Ordenações Manuelinas (15219 e as Ordenações Filipinas (1603), e embora tais não tenham chegado a códigos no sentido moderno, dispunham as matérias em cinco livros: I. Cargos e atribuições públicas, civis e militares. II. Legislações referentes ao clero e à nobreza. III. Processo civil. IV. Direito Civil: obrigações, contratos, propriedade e família. V. Direito Penal e Processo Penal: previa a pena de morte, tortura como meio de obter a confissão, mutilações, marcas de fogo, açoites, degredo, etc. (GUSMÃO,1986).

Ainda houve a promulgação de Leis Extravagantes, a versar sobre matérias comerciais, como letra de câmbio, seguros, câmbio marítimo).

Com as reformas pombalinas houve importante inovação, que minimizava a autoridade do Direito Romano, da glosa e dos arestos, a Lei da Boa Razão (1769) que definia regras centralizadoras e uniformes de interpretação e aplicação das leis, no caso de omissão, imprecisão ou lacuna, dessa forma apenas recorrendo àquele direito subsidiariamente.

O direito no Brasil colonial esteve marcado por uma estrutura econômica sustentada por práticas mercantilistas e escravistas, numa moldagem político administrativa semifeudal, patrimonialista e elitista, em que historicamente nega o direito do nativo da terra para incorporar e impor o Direito alienígena colonizador.

Ao lado disso, para que esse ordenamento colonial funcionasse foi necessário todo um aparato institucional: profissionais (juízes, ouvidores, escrivães) e instâncias processuais (Administração da Justiça, Tribunal da Relação, Casa da Suplicação, etc.).

A justiça no Brasil colonial assinala uma notável semelhança com a ordem jurídica portuguesa, que por sua vez tinha origens no direito romano-germânico. Wehling (2004) atenta que além da estrutura formal da justiça, seu traço invariável foi o de existir um esforço centralizador por parte da autoridade real, com a adoção de uma legislação superveniente, de origem estatal, longe de possuir exclusividade como fonte do direito, aplicada pela magistratura e um esboço do Ministério Público.

A administração da justiça no período das capitanias hereditárias era realizada pelos senhores donatários, que como possuidores soberanos da terra, exerciam as funções de administradores, chefes militares e juízes.

Os donatários detinham amplos poderes, exercendo diretamente a jurisdição civil e criminal, podendo nomear um ouvidor (também tabeliães, meirinhos e escrivães) para essas funções específicas, dirimindo assim os conflitos entre os habitantes da capitania.

Com o advento dos governadores-gerais o cenário muda com a criação de uma justiça colonial e formação de uma pequena burocracia composta por um grupo de agentes profissionais, o que foi possível na medida em que as antigas capitanias se transformam em espécie de províncias unificadas pela autoridade do mandatário representante da Metrópole. Com a reforma político-administrativa impõe-se um sistema de jurisdição centralizadora controlada pela legislação da Coroa (WOLKMER, 2010)

A primeira autoridade da justiça colonial foi o cargo particular de ouvidor (orientação das Cartas de Doação), designado e subordinado aos donatários das capitanias por um prazo renovável de três anos. Eram meros representantes judiciais dos donatários com competência em ações cíveis e criminais.

Em 1549, com a implantação do primeiro governo-geral (Tomé de Souza) e com alargamento das responsabilidades burocráticas e fiscais, os ouvidores passam a ouvidores gerais com maiores poderes e independência, diminuindo os poderes dos donatários de fazer justiça.

O cargo de ouvidor-geral acabou sendo um dos mais importantes durante a segunda fase da colonização, junto com o de governador-geral e o de provedor-mor da fazenda.

A organização judiciária, a exemplo da estrutura portuguesa, apresentava uma primeira instância, formada por juízes singulares distribuídos nas categorias de ouvidores, juízes ordinários (leigos, eleitos pelo povo ou pela Câmara Municipal, sendo o processo oral e sumaríssimo) e juízes especiais.

Estes se desdobravam em juízes de vintena, juízes de vintena, juízes de fora, juízes de órfãos, juízes de sesmarias, etc. A segunda instância composta de tribunais colegiados agrupava os chamados Tribunais de Relação (inclui Desembargo do Paço, Conselho da Fazenda, Mesa da Consciência e Ordem) que apreciavam os recursos ou os embargos, tendo seus membros chamados de desembargadores e suas decisões de acórdãos. O Tribunal de Justiça Superior, de terceira e última instância, com sede na Metrópole, era representado pela Casa de Suplicação, espécie de tribunal de apelação (CARVALHO, 1980).

 

 A Justiça brasileira no período colonial é composta:

1ªInstância

 Juiz de Vintena, Juiz de paz para os lugares com mais de 20 (vinte) famílias, decidindo verbalmente pequenas causas cíveis, sem direito a apelação ou agravo (nomeado por um ano pela Câmara Municipal); Juiz Ordinário Eleito na localidade, para as causas comuns. Juiz de Fora Nomeado pelo rei, para garantir a aplicação das leis gerais (substituía o ouvidor da comarca).

2ª Instância

Relação da Bahia Fundada em 1609, como tribunal de apelação (de 1609 a 1758, teve 168 desembargadores) Relação do Rio de Janeiro Fundada em 1751, como tribunal de apelação;

3ªInstância

Casa da Suplicação Tribunal supremo de uniformização da interpretação do direito português, em Lisboa. Desembargo do Paço Originariamente fazia parte da Casa da Suplicação, para despachar as matérias reservadas ao rei, tornou-se corte autônoma em 1521, como tribunal de graça para clemência nos casos de penas de morte e outras. Mesa da Consciência e Ordens Para as questões relativas às ordens religiosas e de consciência do rei (instância única).

O primeiro Tribunal da Relação foi criado em 1587 para atuar na Colônia, não chegou a entrar em funcionamento, pois o navio que trazia os dez ministros nomeados acabou não podendo zarpar de Portugal.

Após, o governo da Metrópole constituiu um segundo Tribunal da Relação, oficializado para ocorrer na Bahia, regulamentado em 7 de março de 1609, que foi abolido temporariamente por Alvará de 1626 devido a invasão dos holandeses, restaurando-se apenas em 1652.

Outro Tribunal da Relação no Brasil foi no Rio de Janeiro pelo Alvará de 1751. Após ainda foram criados: no Maranhão em 1812 e em Pernambuco em 1821, subindo os feitos, nos casos de apelações e agravos das decisões desses Tribunais, para a Casa de Suplicação. Ainda inerente ao organismo judicial da época, tivemos as Juntas de Justiça, referidas no Regimento de Tomé de Souza, adquirindo notoriedade pelo Alvará de 1765 tornando-se extensivas a todo território do Brasil onde houvesse ouvidores.

Cabe destacar que com a criação e funcionamento do Tribunal da Relação no Brasil consolidou-se uma forma de administração da justiça centrada na burocracia de funcionários civis preparados e treinados na Metrópole, não mais efetuada pelo ouvidor-geral.

Resta ainda dizer que o acesso à magistratura era uma função privilegiada, com certos procedimentos de triagem e critérios de seleção baseados na origem social, por se tratar como menciona Wolkmer (2010) “da “espinha dorsal” do governo real”. A administração real escolhia os profissionais da justiça na sociedade portuguesa, com predominância de indivíduos de origem social específica (Schwartz, 1979).

Durante o período da colonização portuguesa podemos verificar a prevalência da reprodução de um sistema jurídico patrimonialista, repressivo que sustentou a organização produtiva escravista. A formação jurídica do Brasil foi atrelada a um passado econômico e colonial com implementação de uma política discriminadora, marcada por uma historicidade conciliadora e por um desenvolvimento nem sempre compatível com as necessidades e exigências do país.

No processo de formação de nossas instituições destaca-se a herança colonial burocrático-patrimonialista, marcada por práticas nitidamente conservadoras. Destarte, a produção jurídica esteve associada à satisfação dos intentos das minorias oligárquicas pouco democráticas, individualistas e subservientes às forças e imposições do mercado internacional.

A moderna historiografia na hispano-américa e no Brasil tem se ocupado frequentemente do problema da existência de um direito colonial, ou no nosso caso, de um direito luso-brasileiro. Como preliminar, a discussão precisa extrapolar o âmbito restrito da elaboração e/ou aplicação de instrumentos normativos específicos para o mundo colonial, entendendo-se como tal, desdobramentos ou particularidades dentro do quadro de um direito nacional português.

O Direito na abordagem proposta não se limita ao direito positivo, resultando da compreensão dialética entre a sua legitimidade e efetividade (BOBBIO, 2000) e/ou reconhecendo a pluralidade do mundo de “produção das normas (“não coerentes”, “não intencionais”, etc.) (HESPANHA, 2010). Pluralismo de ordenamentos, fontes não hierarquizadas segundo critérios emanados exclusivamente do Estado e importância do direito particular frente as disposições gerais são, pois, traços diferenciais do nosso universo de análise.

No ordenamento jurídico estudado coexistem basicamente três ordens jurídicas: o direito secular comum (tradição romanística); o direito canônico e o direito secular próprio (direito do Reino) (HESPANHA, 1998), no qual nenhuma delas pode ser tomada de forma autônoma.

Caberia ainda lembrar o que Bobbio chamou de “falsa sinonímia” entre o poder, “potência legalmente atribuída” e a autoridade, as “possibilidades de ser e de fazer” (BOBBIO, s/d), no sistema normativo do mundo moderno que se apresenta “múltiplo e variado”, com o equilíbrio entre diversas fontes do direito (leis, costumes,, etc.), a convivência de vários direitos (pátrio, canônico, romano) e forte incidência de normas diretivas, definidas como aquelas que “impõem ao destinatário a obrigação não de respeitá-las, mas de as ter presentes, delas se desviando apenas com base numa justificação fundamentada”.

Muitos conflitos depois, a Câmara se dirige ao Rei (2.7.1667) e “pedem o reconhecimento da inocência” e “premiasse aos que pelo Real serviço, amor da pátria, bem comum da república” (Idem, p. 68-69), apelo que não era estranho ao soberano, que em Carta Régia de 6.2.1677 mandava o Regedor das Justiças “que prestasse aos culpados o favor que no caso coubesse”, pois, numa manifestação da bondade real “dignou-se apenas a reprová-los”.

As revoltas coloniais foram movimentos típicos da modernidade, se inovaram na reação a exploração colonial, seus instrumentos mercantilistas e até mesmo, as restrições a representação política e a ascensão social (FIGUEIREDO: 1996), renovavam traços de permanência, pois se a Europa conheceu a consolidação da aristocracia e do absolutismo, levando alguns autores a identificar um processo de refeudalização, na colônia se anunciava de foram cada vez mais evidente a incorporação de um teor contratualista às relações com a Coroa.

 

 

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[1] O classicismo é um movimento cultural que valoriza e resgata elementos artísticos da cultura clássica (greco-romana). Nas artes plásticas, teatro e literatura, o classicismo ocorreu no período do Renascimento Cultural (séculos XIV ao XVI). Já na música, ele apareceu na metade do século XVIII (Neoclassicismo). O Classicismo Português ou também Renascimento em Portugal corresponde ao período de apogeu da nação, marcado por grandes acontecimentos, dentre os quais se destaca a expansão ultramarina. Veja um de seus símbolos: A Torre de Belém localizada na entrada do porto de Lisboa e construída no século XVI simboliza a época das grandes navegações portuguesas.

[2] Assim como a Odisseia, de Homero, o poema de Camões é composto de cinco partes: Proposição, Invocação, Dedicatória, Narração e Epílogo. Na Proposição — que aparece no Canto I, da primeira à terceira estrofe —, o autor nos apresenta o tema de seu poema: a viagem de Vasco da Gama às Índias e as glórias do povo português, comandado por seus reis, que espalharam a fé cristã pelo mundo. A segunda parte – também no Canto I, quarta e quinta estrofes – consiste na invocação das musas do rio Tejo, as Tágides. Essa é mais uma indicação de que Camões retirou seu modelo da cultura greco-latina.

[3] O capitão do navio, Vasco da Gama, narra ao rei de Melinde a história de Portugal, em que se inserem as figuras de grandes heróis da história portuguesa e os episódios de Inês de Castro, do Velho do Restelo e do Gigante Adamastor.

 

[4] A chegada da família real portuguesa ao Brasil é um marco importante para que o país começasse a escrever sua história no Ensino Superior.  A corte desembarcou no Brasil no dia 22 de janeiro de 1808. Nesse mesmo ano, surgiram as duas primeiras escolas brasileiras de Medicina. Nem um mês após a chegada de D. João VI, assinou o documento para a criação da Escola de Cirurgia da Bahia, em 18 de fevereiro, em Salvador.  Pouco depois, em 2 de abril, outro decreto criou a Escola Anatômica, Cirúrgica e Médica do Rio de Janeiro, que era abrigada no Hospital da Misericórdia. Mais tarde, foi a vez das faculdades de Direito conseguirem seu espaço no Brasil. As duas primeiras foram abertas pouco antes da Independência do Brasil, em agosto de 1827, já com a atuação de D. Pedro I. Por meio de um decreto imperial, foram fundadas a Faculdade de Direito de Olinda, que virou Faculdade de Direito do Recife, hoje pertencente à Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), e a Faculdade de Direito de São Paulo, atual Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP).

[5] O canônico, direito antigo que, haurindo do Direito Romano, criou, durante a Idade Média, um corpo jurídico, de que derivou grande parte do direito ocidental. O brasileiro, que herdou a influência germânica e francesa, que produzira importante corrente jurídica: o direito continental. Canônico é um adjetivo que caracteriza aquilo que está de acordo com os cânones, com as normas estabelecidas ou convencionadas. Canônico tem especial significado quando se refere à Igreja Católica Romana, acompanhando diversos elementos ligados à Igreja: vinho canônico, rito canônico, oração canônica, lista de santos reconhecidos pela igreja etc.

[6] As Ordenações Afonsinas foram a primeira grande compilação das leis esparsas em vigor. Criadas no reinado de D. Afonso V, que reinou em Portugal de 1438 a 1481, são divididas em cinco livros que tratam desde a história da própria necessidade daquelas leis, passando pelos bens e privilégios da Igreja, pelos direitos régios e de sua cobrança, pela jurisdição dos donatários, pelas prerrogativas da nobreza e pela legislação especial para os judeus e mouros; o livro IV trata mais especificamente do chamado direito civil; e o livro V diz respeito às questões penais.

[7] As Ordenações Manuelinas foram publicadas pela primeira vez em 1514 e receberam sua versão definitiva em 1521, ano da morte do rei do rei D. Manuel I. Foram obra da reunião das leis extravagantes promulgadas até então com as Ordenações Afonsinas, visando a um melhor entendimento das normas vigentes. A invenção da imprensa e a necessidade de correção e atualização das normas contidas nas Ordenações Afonsinas foram justificativas para a elaboração das novas leis. A estrutura de cinco livros foi mantida, algumas leis foram suprimidas e/ou modificadas e um estilo mais conciso foi adotado.

[8] As Ordenações Filipinas, ou Código Filipino, foram editados em Portugal no início do século XVII. Entretanto, permaneceram em vigor no Brasil até 1917, quase um século após a independência do Brasil em 1822. As razões que levaram a esse fato inusitado, bem como a influência que as Ordenações exerceram e ainda exercem sobre nossa legislação são examinadas neste artigo. Da mesma forma, salienta-se que, embora os dispositivos das Ordenações Filipinas tenham sido revogados há muito tempo, alguns dos paradigmas ou a visão de mundo que as imantavam permanecem ainda hoje na sociedade brasileira.

[9] Essa lógica político-religiosa da época colonial, é necessário voltar às suas origens que remontam ao medievo. Naquele contexto havia a concepção de que o rei tinha dois corpos: um natural, essencialmente igual ao de qualquer pessoa, e outro místico. O primeiro, sujeito às imperfeições de nascimento ou adquiridas, e o segundo, perfeito e imortal. Kantorowicz (1998) demonstra que tal doutrina resultou de uma construção histórica e mostra como conceitos utilizados pelos teólogos da Idade Média para caracterizar a Igreja ou o próprio Cristo foram sendo lentamente adaptados e transferidos da esfera religiosa para o campo da política e do direito.

GiseleLeite
Enviado por GiseleLeite em 24/01/2023
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