Direito contemporâneo
Com o estudo da contemporaneidade jurídica, verificam-se verdadeiras heranças advindas da modernidade, como exemplo, pode-se citar a permanência das Constituições, com a diferença de que as percepções sobre os códigos mudaram conforme o paradigma. A pós-modernidade elevou também a centralização do homem ao ápice quando instituiu os direitos do sujeito em uma visão mais individual enquanto vínculo constitutivo com a modernidade. O aparato dos serviços públicos e a burocracia estatal foram novidades do período, e um ponto que atraiu minha atenção foi a diversidade de correntes e visões jurídicas que despontaram nessa época, como o positivismo institucionalista, que busca na sociedade o referencial do direito, a crítica política do Estado, que tem em Karl Marx o seu precursor, e o positivismo normativista, de forte formalismo e constitucionalismo, que nitidamente se expressa na concepção kelseniana.
Uma passagem da obra de Paolo Grossi, “Mitologias jurídicas da modernidade”, proporcionou um olhar diferenciado aplicado à história do direito. Na obra, ao se embrenhar em um estudo meticuloso sobre a modernidade, Paolo Grossi afirma que apesar da laicização e de um amplo desenvolvimento das ciências servirem como motivadores de uma desconstrução das antigas mitologias que permeavam o mundo do direito, a mudança de tempo histórico não foi o suficiente para aniquilar os mitos jurídicos. Pelo contrário, eles consistem em verdadeiros pilares do período moderno. Para fundamentar essa ideia, o autor recorre ao jurista Santi Romano, cuja influência é inegável na formação de Grossi, e percebida pelos elogios que ele tece em referência ao pensador admirado. Todavia, não concordo plenamente que o teor da outra leitura indicada se situa no plano do direito contemporâneo, posto que traz uma perspectiva detalhada que ainda se insere na modernidade enquanto estimuladora das ideias que somente surgiriam de fato na contemporaneidade, mas de toda forma, é um texto bem minucioso e completo, de fácil e necessária compreensão.
De forma a voltar o olhar para uma interface brasileira da contemporaneidade jurídica, pode-se encontrar reflexões sobre os movimentos sociais na Constituição de 1988 a partir do ponto de vista dos povos negros do Brasil e a respectiva influência de movimentos norte-americanos semelhantes. A mobilização antirracista pré-constituinte contou com manifestações artísticas e utilizou-se da mídia e da imprensa como veículos divulgadores de sua voz. Uma singularidade que o Direito da época ganhou com tais pensamentos, foi a Comissão da soberania e dos direitos e garantias do homem e da mulher, cuja consolidação partiu da participação popular, o que demonstra o redimensionamento jurídico com o intuito de atender o indivíduo em seus direitos previstos. Cabe mencionar ainda que a Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948, se configura como um dos principais documentos jurídicos fundados na contemporaneidade.
A pós-modernidade jurídica foi marcada por um dilema entre o sistema específico de normas, contendo uma norma fundamental, e o relativismo de outras ordens normativas até então em exercício, como a moral e os resquícios da religião. Isso instituiu um pressuposto jurídico de interrelação hierárquica entre Constituição, lei e sentença em um esquema piramidal. Percebe-se a partir de então uma maior rigidez no sentido formal, mas por outro lado, uma flexibilização do conteúdo, que possibilitou um olhar diferenciado para o sujeito e uma preocupação com as minorias e com as vulnerabilidades, premeditando novos princípios de justiça social. A maior integração regional de um mundo altamente globalizado impactou na aplicação jurídica ao indagar se a história do direito ultrapassaria as fronteiras. Em última análise, a contemporaneidade se responsabilizou por ressignificar antigos entendimentos, lançando um olhar para futuro e buscando prevenir as mazelas sociais que podem acometer os povos humanos. Por conta disso, a Carta da ONU, a cláusula colonial da DUDH, a Convenção de 1960 e os pactos coloniais foram imprescindíveis elementos que desenharam o escopo contemporâneo, que diferenciou os direitos humanos daqueles outrora tidos como fundamentais.
Disciplina: História do Direito