CRITÉRIO CRONOLÓGICO E ANÁLISE INVESTIGATIVA DA CADEIA DE CUSTÓDIA

Cadeia de custódia, no contexto legal, refere-se à documentação cronológica ou histórica que registra a sequência de custódia, controle, transferência, análise e disposição de evidências físicas ou eletrônicas. De particular importância em casos criminais, o conceito também é aplicado em litígio civil - e algumas vezes mais amplamente no teste antidoping de atletas e em gerenciamento de cadeia de suprimentos, e.g. para melhorar a rastreabilidade de produtos alimentícios, ou para fornecer garantias que produtos de madeira se originaram de florestas gerenciadas sustentavelmente.

O termo, às vezes, também é usado nos campos de história, história da arte e arquivos como um sinônimo para procedência (significando a cronologia da propriedade, custódia ou localização de um objeto histórico, documento ou grupo de documentos), que podem ser um fator importante na determinação de autenticidade.

A perícia criminal, publicada pela SENASP em 2013, diz que: [1]

CADEIA DE CUSTÓDIA: sistemática de procedimentos que visa à preservação do valor probatório da prova pericial caracterizada."

Cadeia de Custódia em um Processo Penal

Diagnóstico da Perícia Criminal no Brasil

3 – A Cadeia de Custódia e a Forense Computacional

3.1 – Modelos de Cadeia de Custódia em Forense Computacional

4. – Casos de Trabalho Pericial de Grande Repercussão no Brasil

4.1 – Caso Isabella Nardoni

4.2 – Perícia na Operação Satiagraha

4.3 – Caso PC Farias

4.4 – Caso Celso Daniel

Cadeia de Custódia em um processo penal

Armazenando evidências

No que diz respeito à preservação das informações coletadas, a cadeia de custódia possibilita documentar a cronologia das evidências, quem foram os responsáveis por seu manuseio, etc. Procedimentos como: colocar lacres em evidências, restringir o acesso apenas aos profissionais responsáveis pela custódia etc. minimizam a possibilidade de manipulação indevida, tornando as evidências mais confiáveis. O Brasil não tem uma normativa geral sobre cadeia de custódia e o mesmo ocorre na grande maioria dos Estados, que ainda encontram fragilidades na gestão da atividade pericial.[2]

Diagnóstico da Perícia Criminal no Brasil

A ausência de uma normatização específica não quer dizer que as evidências coletadas prescindam de preservação. O Ministério da Justiça por meio da Secretaria Nacional de Segurança Pública realizou uma pesquisa sobre a situação da perícia no Brasil, trabalho intitulado Diagnóstico da Perícia Criminal no Brasil e que foi publicado em 2012.

O documento Diagnóstico da Perícia Criminal no Brasil foi escrito após uma análise dos órgãos periciais presentes em todos os estados brasileiros, este documento é escrito com capítulos sobre sete tópicos principais:

Estrutura Organizacional

Gestão da Informação

Recursos Materiais

Recursos Humanos

Funcionamento

Processo de Trabalho

Produtividade

A construção de cada um dos pontos do documento, [2] é feita por meio de uma análise inicial seguida por várias tabelas de dados que embasam a análise anteriormente exposta.

A lei 12735/2012 traz a necessidade de estruturação de equipes especializadas voltadas para o combate ao Cibercrime:

Art. 4º Os órgãos da polícia judiciária estruturarão, nos termos de regulamento, setores e equipes especializadas no combate à ação delituosa em rede de computadores, dispositivo de comunicação ou sistema informatizado.

Nos diversos tópicos há críticas às condições do trabalho pericial, no que diz respeito a: condições necessárias, metodologias, padronização de procedimentos, capacitação para que os órgãos periciais oficiais desenvolvam um trabalho a altura de sua importância e possam com isto melhor embasar a investigação policial e dar aos magistrados mais elementos para formar sua decisão.

Em 2013 foi publicado um documento intitulado Procedimento Operacional Padrão para a Perícia Criminal, ele procura criar um roteiro capaz de nortear o trabalho da perícia. São sugeridos procedimentos padronizados para:

Balística Forense

Genética Forense

Informática Forense ou Forense Computacional

Local de Crime

Medicina Legal

Papiloscopia

Química Forense

Os procedimentos devem ser adotados para atender tanto requisitos impostos pelo Código de Processo Penal quanto para obedecer às metodologias investigativas pertinentes a cada área pericial de atuação.

Cadeia de Custódia e a Forense Computacional

A evidência digital é complexa, volátil e pode ser modificada acidentalmente ou propositadamente depois de coletada, para que se consiga determinar se essa evidência sofreu modificações, torna-se necessário o estabelecimento de uma cadeia de custódia. O U.S National Institute of Justice[4] define cadeia de custódia como um processo usado para manter e documentar cronologicamente a evidência. Os documentos devem incluir nome ou iniciais dos indivíduos que coletaram as evidências, cada pessoa ou entidade que após a coleta teve acesso a evidência, data que os itens foram coletados ou transferidos, órgão e número do caso, nome das vítimas ou suspeitos, e uma rápida descrição do caso.

No Brasil o tema “cadeia de custódia” é pouco conhecido ou mal compreendido, em muitas ocasiões os trâmites complexos da cadeia são descumpridos ou tratados inadequadamente devido ao desinteresse de ser cientificamente rigoroso e, outras vezes, por simples ignorância acerca de sua importância.

Não há na legislação brasileira referência específica à cadeia de custódia do material. O Código de Processo penal (CPP) determina que a autoridade policial deverá providenciar para que não se alterem o estado das coisas e deverá apreender os objetos que tenham relação com o fato, estas condutas compõem a cadeia de custódia. No entanto não é mencionada diretamente a necessidade de manter uma cadeia de custódia, nem mesmo este termo está presente no CPP. Giovana afirma que o ciclo de vida da evidência digital está se tornando mais complexo e cada estágio aumenta a probabilidade de uma brecha violar a cadeia de custódia. O resultado é um cenário de dificuldade crescente para que o judiciário avalie a evidência e a considere genuína e confiável.

Modelos de Cadeia de Custódia em Forense Computacional

Alguns modelos foram propostos para manter uma cadeia de custódia (Carrier e Spafford, 2004) (Köhn et al, 2008) (Cosic e Baca, 2010), softwares especificamente criados para procedimentos de forense computacional podem adicionalmente fornecer melhor descrição das evidências, auditoria automática e gerar hashes criptográficos para verificação da integridade.

Na aplicação dos modelos para manter uma cadeia de custódia pode haver variação por conta do país, da legislação, da organização da justiça, do tipo do caso, dentre outros fatores, o importante é que esses modelos são capazes de conhecer melhor os personagens envolvidos e suas atividades no processo forense. Procedimentos que permitam ao investigador recuperar dados de computadores envolvidos em atos ilegais e usar estes dados como evidências em uma investigação criminal estão se tornando fundamentais para as agências de aplicação da lei. Tais procedimentos devem ser robustos tecnologicamente para assegurar que todas as informações probatórias foram recuperadas. Além disso, as evidências digitais devem ser tratadas de forma tal que se possa garantir que nada na evidência original foi alterado. Para a área forense, um caso em que os procedimentos e a possível contaminação das provas foram usados para absolver um indivíduo ocorreu no julgamento do jogador de futebol americano O. J. Simpson. Quando se fala de forense computacional a falta de boas práticas e procedimentos confiáveis são problemas sérios, é uma ciência nova e que trabalha com evidências voláteis que existem apenas em circuitos eletrônicos.[11]

Padronização da Forense Computacional

O trabalho na direção da padronização originou uma lista de princípios, que foram aprovados pela International Organisation on Computer Evidence - IOCE e que formam um guia de boas práticas de procedimentos em forense computacional.

Casos de Trabalho Pericial de Grande Repercussão no Brasil

Caso Isabella Nardoni

Ver artigo principal: Caso Isabella Nardoni

Edifício London

A morte da menina Isabella Nardoni comoveu o Brasil em 2008, a perícia da Polícia Civil de São Paulo foi fundamental para a condenação do casal Anna Carolina Jatobá e Alexandre Nardoni, madrasta e pai da menina, respectivamente. A menina Isabella foi lançada pela janela do sexto andar do Edifício London, em São Paulo, na noite de 29 de março de 2008. Há uma controvérsia quanto ao laudo pericial, mas o casal permanece preso. Segundo o resultado pericial, a menina foi jogada pela janela do quarto dos irmãos, ainda segundo a perícia ela foi cuidadosamente introduzida no buraco da rede de proteção que estava instalada na janela e, foi solta, caiu no gramado que fica logo abaixo da janela do quarto. Entre as qualificados do homicídio foi colocada a alteração do local do crime, atitude que visa dificultar o trabalho pericial.

Perícia na Operação Satiagraha

Ver artigo principal: Operação Satiagraha

Daniel Dantas

Em 2008 durante uma grande operação da Polícia Federal, denominada Operação Satiagraha, foram encontrados e apreendidos - no apartamento do banqueiro Daniel Dantas - discos rígidos que estavam com seu conteúdo criptografado. Após tentar desvendar o conteúdo armazenado nos discos e não obter sucesso, a Polícia Federal Brasileira solicitou ajuda da polícia federal americana, o FBI, que também não obteve sucesso após mais de um ano de tentativas.[15]

Revelações do delegado da Polícia Federal Carlos Eduardo Pellegrini, que atuou na Operação Satiagraha juntamente com o delegado Protógenes Queiróz (atualmente licenciado e exercendo mandato partidário), indicam que a PF apreendeu, no apartamento do banqueiro Daniel Dantas, documentos que comprovam o pagamento "de propinas a políticos, juízes, jornalistas" no valor de R$ 18 milhões.

Caso PC Farias

Ver artigo principal: Caso PC Farias

O tesoureiro da campanha para presidente de Fernando Collor de Mello em 1989, Paulo César Farias, conhecido como PC Farias foi encontrado morto, junto com sua namorada Suzana Marcolino, em uma casa de praia em 1996. Houve muita controvérsia e reviravolta em torno do caso. O legista Badan Palhares deu como resultado de seu laudo que Suzana Marcolino matou PC Farias e suicidou-se em seguida. O médico-legista alagoano George Sanguinetti, o perito criminal Ricardo Molina de Figueiredo e, mais recentemente, o perito Domingos Tochetto[17]afirmam que o casal foi assassinado.

Caso Celso Daniel

Ver artigo principal: Caso Celso Daniel

A morte do ex-prefeito de Santo André, Celso Daniel, foi outro caso em que houve grande repercussão e houve forte envolvimento do trabalho pericial. Várias pessoas que estavam ligadas de alguma forma, com o crime ou com o prefeito, morreram sob circunstâncias misteriosas, inclusive o perito responsável pelo caso, Carlos Delmonte Printes.

A preservação das fontes de prova é fundamental, principalmente quando produzida fora do processo.

O cuidado é necessário e justificado pois impede a manipulação indevida da prova, seja para incriminar, seja para isentar, alguém de sua responsabilidade.

A cadeia de custódia da prova garante espaço ao contraditório e um julgamento justo, no mais, “forma é garantia e limite de poder”.

Inovação legislativa, introduzida pela lei 13.964/2019, a cadeia de custódia das provas passa a ter previsão nos artigos 158-A ao 158-F do Código de Processo Penal, sendo definida como “o conjunto de todos os procedimentos utilizados para manter e documentar a história cronológica do vestígio coletado em locais ou em vítimas de crimes, para rastrear sua posse e manuseio a partir de seu reconhecimento até o descarte”.

O caminho percorrido pela evidência precisa estar devidamente documentado, é preciso que a sua coleta, seu manuseio, seu transporte, sua análise e seu armazenamento estejam documentados de forma cronológica a fim de garantir o caminho percorrido pela evidência, devendo estar devidamente documentado, sendo preciso que a sua coleta, seu manuseio, seu transporte, sua análise e seu armazenamento estejam documentados de forma cronológica a fim de garantir que não haja ilicitude na prova ou algo que a torna ilícita.

Com efeito, é corriqueira a violação da cadeia de custódia da prova principalmente quando colhidas por “não peritos”.

Dito isso, correlacionamos a análise ao artigo 33, da Lei 11.343/2006, lei de drogas, que tem por materialidade a substância ilícita relacionado a infração criminal.

Ocorre que as autoridades não atribuem nenhum valor à cadeia de custódia da prova nestes casos. Sobre o tipo penal analisado, a custódia da prova inicia-se no mais das vezes pelo agente da Polícia Militar, que oportunamente transfere essa custódia para a Polícia Militar, que oportunamente transfere essa custódia para a Polícia Civil, e que por sua vez remete ao perito para confecção de laudo preliminar.

Fato é que tudo isso se dá de maneira a contaminar a prova custodiada já que a imprescindível formalidade de transferência da posse do vestígio, e isso quase nunca é respeitado. Quem dera a “contaminação” fosse exclusivamente na transmissão. Em larga escala o vestígio está contaminado desde a colheita, vejamos.

Quanto à fixação, a lei exige descrição detalhada de onde estava o vestígio (prova), algo muito oposto aos casos práticos. Exemplifica o legislador que descrição detalhada é aquela feita por fotografia, croqui ou descrição minuciosa, o que não ocorre e, por conseguinte, deve ser considerado quebra da cadeia de custódia da prova nos termos do artigo 158-B, III, do CPP, por impossibilitar o contraditório.

Com relação ao acondicionamento, é exigência legal a anotação da data, hora e nome de quem realizou a coleta e o acondicionamento, algo raro na prática e que também leva a quebra da cadeia de custódia da prova nos termos do artigo 158-B, V, do CPP.

No que diz respeito ao transporte, é exigência que se identifique o meio, para se ter o controle de sua posse, como se sabe, isso não acontece e enseja a quebra da cadeia de custódia da prova nos termos do artigo 158, VI, do CPP.

A falta de zelo necessário com a prova, cega-nos com o evidente, que nos permite ver. Erroneamente somos levados a crer que o “evidente” dispensa prova, afinal, é evidente! E aqui está o perigo: o desamor do contraditório. Por isso, como relação as consequências da quebra da cadeia de custódia, pontual a lição de Aury Lopes Júnior:

Questão final é: qual a consequência da quebra da cadeia de custódia (break on the chain of custody?) Sem dúvida deve ser a proibição de valoração probatória com a consequente exclusão física e de toda a derivada. É a “pena de inutilizzabità” consagrada pelo direito italiano. Assim, havendo violação da cadeia de custódia da prova, a exclusão da prova é medida de rigor, já que estamos diante de uma regra clara e objetiva que violada leva à contaminação da prova.

A priori, entende-se cadeia de custódia como o conjunto de procedimentos adotados cujo objetivo é manter, preservar e documentar os elementos informativos, bem como a história cronológica de um crime como também o local de seu cometimento.

A cadeia de custódia é um tema de extrema importância, porém, não tinha a devida atenção posto que antes da vigência do pacote anticrime (lei 6.341/2019), o tema era tratado de forma superficial, esta novidade normativa trouxe à baila o tema com uma discussão mais aprofundada, chamando a atenção de juristas que se preocupam com o desenvolver deste procedimento uma vez que passou a ter previsão legal.

Um dos alicerces do código de processo penal, sem dúvida, é a prova pois, é através da mesma que se reconstrói as cenas de um fato passado, permitindo a construção de um convencimento que posteriormente se transformará em uma decisão, diante de tais fatos, a cadeia de custódia se destaca, pois, é a mesma que fornece os elementos probatórios necessários para a construção da prova.

O Estado, diante dessa situação deve atentar-se para as questões procedimentais e reforçar a rigorosidade da lei para que desta forma não haja nenhuma violação da cadeia de custódia em toda sua amplitude, exige-se, portanto, o estabelecimento de um procedimento regrado, documentando a sua cronologia existencial.

O presente trabalho busca o conhecimento técnico e a compreensão da importância do procedimento que envolve a cadeia de custódia, o surgimento das provas, as consequências de sua contaminação no processo penal bem como as devidas precauções a serem tomadas a fim de evitar a violação deste procedimento.

O hodierno trabalho trará o tema da cadeia de custódia desde a sua fundamentação legal, até a instauração de seus procedimentos a fim de se obter profundidade e clareza a respeito deste instituto de suma importância, assim, espera-se que este tema seja alvo de futuros debates pois, o mesmo ainda é carente de muitos estudos.

A CADEIA DE CUSTÓDIA NO BRASIL - CONCEITO E NORMAL LEGAL

De acordo com o jurista Ernesto Coutinho Júnior (2015, p. 774) “podemos definir cadeia de custódia como a sucessão de eventos seguros e confiáveis que tendo início na investigação mantém a integridade e idoneidade do vestígio até a sua utilização como elemento probatório”. Portanto, é de suma importância que os elementos probatórios encontrados na cena de um crime sejam devidamente preservados pois, serão os mesmos que indicarão com exatidão a cronologia dos fatos. Os mecanismos de preservação têm como principal finalidade conservar a veracidade da prova para que posteriormente a mesma possa ser utilizada em juízo caso não seja descartada.

A lei conhecida como pacote anticrime (lei 6.341/2019) trouxe em seu bojo, uma nova perspectiva a respeito da cadeia de custódia, trazendo consigo mudanças significativas no sistema de investigação preliminar no processo penal, desde o recolhimento dos vestígios até o seu descarte.

Surge com a intenção de tornar o tema sobre a cadeia de custódia mais popular, posto que anteriormente ele carecia de expressa regulamentação na legislação processual. Como consequência, a lei 6.341/19, inova, pois, consegue indicar de forma sistemática e uniforme uma produção probatória de melhor qualidade preservando direitos e garantias fundamentais.

Insta salientar que o reconhecimento técnico é de suma importância pois, evidencia a necessidade da preservação da prova, sem deixar dúvidas a respeito da sua originalidade. Adentrando a perspectiva formal da produção probatória, é interessante observar que com a sistematização da cadeia de custódia, fica mais acessível para defesa bem como para o ministério público enxergar com mais clareza a forma como os meios de provas estão sendo produzidos, diminuindo as chances de ter uma interferência direta no exercício da justiça. Carlos Edinger, na mesma toada, conceitua:

No terreno probatório, essas garantias partem da premissa de que a prova não é só a reconstrução do passado, mas também conta com um viés legitimador do processo, o qual, por sua vez, fundamenta limites epistemológicos, com o fim de que não se produzam juízos fáticos que não possuam nenhuma correspondência com a realidade. (EDINGER, 2016, p. 02)

Diante deste prisma, evidencia-se a intenção do legislador de preservar a prova através de procedimentos criteriosos a fim de deixar o tramite processual mais acessível e transparente para os envolvidos e retirar o descaso com o tratamento dos elementos probatórios. Antes da vigência da lei 6.341/19 cada instituto de criminalística poderia ter o seu próprio procedimento para a produção da prova e consequentemente muitas perícias se perdiam justamente por não haver um procedimento específico.

Essa aleatoriedade no procedimento de preservação da prova, consequentemente acarretava insegurança jurídica tendo em vista que muitas coisas poderiam acontecer no manuseio da prova que fora coletada, nunca se sabendo de fato se houve algum desvio de finalidade do elemento probatório que foi encontrado diante dos fatos ocorridos. Por óbvio que a sistematização da cadeia de custódia com a vigência do pacote anticrime não é a solução para todos os problemas, porém, tem-se com mais clareza um controle mais rígido a respeito da formação da prova.

Tais procedimentos serão abordados de forma minuciosa, nas páginas seguintes, com o intuito de entender detalhadamente as etapas inseridas pelo legislador, a fim de manter ao máximo a verdade dos fatos, que serão analisadas através dos vestígios ora deixados na cena de um crime.

CORPO DE DELITO- VESTÍGIOS MATERIAIS- LOCAL DO CRIME

É notório que a sistematização adotada pela lei (6.341/2019) foi necessária, pois, é um meio pelo qual o Estado exige uma postura organizacional do sistema para que ele realize uma prova cristalina. Entretanto, como visto anteriormente, além, dos meios sistemáticos previstos em lei é indispensável compreender o início da formação da evidência probatória, a mesma tem o seu início com a preservação do local do crime. Entende-se por local do crime a área onde o fato criminoso ocorreu.

Segundo Eraldo Rabello define-se local do crime como sendo:

A porção do espaço compreendida num raio que, tendo por origem o ponto no qual é constatado o fato, se entenda de modo a abranger todos os lugares em que aparente, necessária ou presumidamente, hajam sido praticados, pelo criminoso ou criminosos, os atos materiais, preliminares ou posteriores a consumação do delito, e com este diretamente relacionado. (RABELLO, 1996, p. 17)

O código penal disciplina em seu art. 6º, in verbis: “Considera-se praticado o crime no lugar em que ocorreu a ação ou omissão, no todo ou em parte, bem como onde se produziu ou deveria produzir-se o resultado”.

Outrossim, o código de processo penal, prevê em seu art. 70, in verbis: “A competência será, de regra, determinada pelo lugar em que se consumar a infração, ou, no caso de tentativa, pelo lugar em que for praticado o último ato de execução”.

Por haver distinções nas definições de local do crime, se faz necessária à sua diferenciação, para tanto, deve-se compreender as teorias adotadas pelo código penal, quais sejam: teoria da ação, teoria do resultado e teoria mista. A teoria da ação diz respeito ao lugar do crime, onda a ação ou omissão foi praticada. A teoria do resultado preocupa-se principalmente com o lugar onde foi gerado o resultado e por fim, a teoria mista ou também conhecida como teoria da ubiquidade que é junção das duas teorias (da ação e do resultado) esta teoria foi a adotada e é a mais utilizada na área criminal.

A teoria da ubiquidade ou teoria mista, diz respeito aos crimes que são cometidos a distância, ou seja, quando um crime for cometido em um país e o resultado é produzido em outro. Percebe-se que a aplicação neste caso, é residual por respeito ao princípio da soberania entre os países.

Diante desta perspectiva é relevante ressaltar que não há conflitos entre as teorias, pois, a teoria da ubiquidade tem a sua aplicação de forma especifica quando o crime envolver a distância entre países, conhecido também como direito penal internacional, enquanto a do resultado envolve crimes em comarcas diferentes, porém, dentro do mesmo território nacional, focando sempre no momento do último ato de execução.

Insta consignar que a área do local do crime deve ser isolada, a manutenção é imprescindível pois, é através dela que as autoridades competentes terão noção de como ocorreu o evento criminoso. É neste momento que se destaca a importância da presença das autoridades policiais que tem como objetivo garantir a inalterabilidade do local isolando-o, a fim de evitar qualquer contaminação na cena dos fatos, assegurando desta forma uma atuação eficaz dos peritos criminais. Na mesma toada o jurista Ernesto Coutinho, conceitua como deve ser a atuação policial:

“ O primeiro policial a chegar ao local deve averiguar se de fato existe a ocorrência que lhe foi comunicada. Para tanto, deve o policial penetrar no local do crime e dirigir-se até o corpo de delito, A entrada ao local imediato/mediato ao corpo de delito deve ser feita pelo ponto acessível mais próximo a este, de tal forma que a trajetória até o mesmo seja uma reta. Constatado o delito, o policial deverá retornar para a periferia do local do crime, percorrendo a mesma trajetória que o levou até o corpo de delito no sentido inverso, o percurso deverá ser memorizado pelo policial visto que posteriormente deverá ser comunicado aos peritos. Toda a movimentação dos policiais para averiguar o ocorrido deve ser meticulosa e absolutamente nada deve ser removido das posições que ocupavam quando da configuração final do crime”. (COUTINHO, pág. 656)

Na mesma perspectiva, o código de processo penal em seu art. 6, inciso I, prevê: “ logo que tiver conhecimento da prática da infração penal, a autoridade policial, deverá: dirigir-se ao local, providenciando para que não se alterem o estado de conservação das coisas, até a chegada dos peritos criminais”.

Após a devida análise do local do crime os peritos criminais devem averiguar os vestígios materiais que foram encontrados no local do crime. Entende-se por vestígio, todo sinal indício ou pista deixado no cometimento de um crime, por conseguinte a existência de um vestígio pressupõe a presença de um agente provocador que ocasionou o seu surgimento.

A presença destes vestígios indica a sua materialidade, ou seja, a prova da existência de um crime, esta materialidade é entendida como corpo de delito, toda estrutura delituosa deixada no local do crime (cadáver, armas, sangue) que forma um conjunto que pode ser denominado como “corpo”. O corpo de delito será examinado pericialmente para averiguar a materialidade deixada no local do crime, este exame denomina-se exame de corpo de delito.

Outrossim, insta salientar que corpo de delito e exame de corpo de delito não são sinônimos, tendo em vista que corpo de delito se trata da materialidade encontrada na cena do crime, enquanto exame de corpo de delito trata-se do exame pericial para averiguar esta materialidade que posteriormente poderá ser utilizada como uma prova ou não.

O código penal em seu art. 158 do CPP, prevê: “Quando a infração deixar vestígios, será indispensável o exame de corpo de delito, direto ou indireto, não podendo supri-lo a sua confissão do acusado”. Ao analisar o referido artigo, observa-se que o mesmo faz menção ao corpo de delito direto e indireto.

O corpo de delito direto é realizado por exame pericial que é a forma cientifica mais próxima de se atestar a existência de um crime ou não, enquanto o corpo de delito indireto é o que se fundamenta em prova testemunhal quando não é possível encontrar vestígios que auxiliem na resolução do caso. Conforme prevê o art. 167 do CPP, in verbis: “não sendo possível o exame de corpo de delito, por haverem desaparecido os vestígios, a prova testemunhal pode suprir-lhe a falta”.

A prova testemunhal de fato não é a ideal, tendo em vista que afasta uma suposta prova que seria analisada de forma cientifica obedecendo toda sistematização elencada em lei. Entretanto, a prova testemunhal é utilizada como um escape para evitar impunidades, por mais que exista a possibilidade de erro ao testemunhar a morte de alguém, o código entende que se trata de uma maneira suplementar, desta forma o código penal aceita o exame de corpo de delito indireto para fins de condenação.

Conforme conceitua Gustavo Noronha de Ávila :

“Enxergar com os olhos da testemunha: eis um dos desafios comuns ao juiz durante o processo penal. Apesar desta dificuldade e todas possíveis “impurezas”, advindas deste tipo de prova, não é possível prescindir de sua existência. Isto porque existem crimes, especialmente os materiais, que dificilmente poderão ser analisados de outra forma a não ser pela testemunha. O homicídio é um exemplo claro desta situação. Ao presenciar os fatos, certamente a testemunha o interpreta de acordo com a sua própria vivência que na maior parte das vezes não é a mesma do juiz. É necessário, portanto, um certo afastamento para consegui-lo. ” (NORONHA, PAG 03)

Justamente por existir essa dificuldade, o CPP trouxe em seu art. 132 os deveres e direitos da testemunha, onde tem-se por objetivo padronizar as ações das testemunhas com o objetivo de ter uma noção maior sobre o conteúdo do testemunho, minimizando a possibilidade de falso testemunho, que inclusive é crime. Diante deste prisma, prevê o art. 132 do CPP:

“Salvo quando a lei dispuser de forma diferente, incumbem a testemunha os deveres de:

Se apresentar, no tempo e no lugar devidos, a autoridade por quem tiver sido legitimamente convocada ou notificada, mantendo-se a sua disposição até ser por ela desobrigada;

Prestar juramento, quando ouvida por autoridade;

Obedecer às indicações que legitimamente lhe forem dadas quanto a forma de prestar depoimento;

Responder com verdade as perguntas que forem dirigidas.

CADEIA DE CUSTÓDIA DOS VESTÍGIOS MATERIAIS, COLETA, TRATAMENTOS DOS DADOS, ANÁLISE

Os vestígios materiais encontrados na cena do crime, deverão ser devidamente protegidos, custodiados, para que não haja qualquer tipo de interferência no elemento probatório que foi encontrado. A custódia dos vestígios materiais dar-se-á, inicialmente pela coleta que serão analisados como suposta prova, enquanto os que não forem utilizados serão descartados.

A lei é clara concernente a coleta de vestígios e diz que a mesma deverá ser feita preferencialmente por perito oficial, conforme prevê o art 158-C: “ A coleta dos vestígios deverá ser realizada preferencialmente por perito oficial, que dará o encaminhamento necessário para a central de custódia mesmo quando necessária a realização de exames complementares”.

Por conseguinte, todos os vestígios coletados tanto em sede de inquérito policial, quanto em sede de processo penal deverão ser remetidos para a central de custódia que existe em cada instituto de criminalística. Após a coleta dos vestígios materiais, o mesmo passará pelo tratamento que tem como objetivo entender o conteúdo de cada vestígio material, a fim de manter o devido cuidado de seu respectivo conteúdo.

O tratamento dos dados após a coleta, tem previsão legal no art. 158-B e tem o seu início no acondicionamento, conforme prevê a lei, in verbis:

Acondicionamento: procedimento por meio do qual cada vestígio coletado é embalado de forma individualizada, de acordo com suas características físicas, químicas e biológicas, para posterior análise, com anotação da data, hora e nome de quem realizou a coleta e o acondicionamento (BRASIL, 2020).

Após o acondicionamento, temos o transporte que é o ato de transferir o vestígio de um local para o outro utilizando as condições adequadas como (embalagens, temperatura, veículos) conforme prevê a lei:

Transporte: ato de transferir o vestígio de um local para o outro, utilizando as condições adequadas (embalagens, veículos, temperatura, entre outras), de modo a garantir a manutenção de suas características originais, bem como o controle de sua posse ( BRASIL, 2020)

Na mesma toada, temos o recebimento do vestígio material encontrado no local do crime, a lei conceitua o recebimento como:

Recebimento: ato formal de transferência da posse do vestígio, que deve ser documentado com, no mínimo, informações referentes ao número de procedimento e unidade de polícia judiciária relacionada, local de origem, nome de quem transportou o vestígio, código de rastreamento, natureza do exame, tipo do vestígio, protocolo, assinatura e identificação de quem o recebeu. (BRASIL, 2020)

Após o recebimento, inicia-se o exame pericial em si, com a liberdade de ter manipulação do vestígio de acordo com o conteúdo de cada elemento que fora encontrado no local do crime:

Processamento: exame pericial em si, manipulação do vestígio de acordo com a metodologia adequada às suas características biológicas, físicas e químicas, a fim de se obter o resultado desejado, que deverá ser formalizado em laudo produzido por perito;( BRASIL, 2020)

Posteriormente ao exame pericial e as devidas conclusões a respeito do resultado desejado, o próximo passo é o armazenamento que é a guarda dos elementos probatórios:

Armazenamento: procedimento referente à guarda, em condições adequadas, do material a ser processado, guardado para realização de contraperícia, descartado ou transportado, com vinculação ao número do laudo correspondente; ( BRASIL, 2020).

Por fim, tem o procedimento de descarte que ocorre quando existe a liberação do vestígio, quando o mesmo não é útil para fins de investigação, entretanto, como prevê a lei, necessita de autorização judicial: procedimento referente à liberação do vestígio, respeitando a legislação vigente e, quando pertinente, mediante autorização judicial”

IMPORTÂNCIA DA PRESERVAÇÃO DO MATERIAL CUSTODIADO

É importante observar a visão criteriosa do legislador ao entender que cada vestígio material possui sua peculiaridade e que, portanto, necessitam de tratamentos diferentes, desde o seu acondicionamento até o seu descarte, essa sistematização é de suma importância pois, evidencia a importância da preservação do material custodiado e trata com a devida seriedade os vestígios materiais que posteriormente serão utilizados como prova.

Entende-se que prova é um elemento constitutivo de um ato que tem como objetivo evidenciar a verdade dos fatos. No processo penal vigora o princípio da verdade real, que diz que ninguém poderá ser condenado se não houver provas que liguem o autor ao cometimento do crime. Neste contexto, o material custodiado é de fundamental importância pois, consegue abordar através de seus procedimentos uma ordem cronológica e factível para dar convicção ao julgador que se encontra diante do caso concreto.

A preservação da prova é fundamental pois, trata-se da verdadeira condição da validade da prova, logo, tem influência direta no exercício democrático de direito, pois, é através de sua preservação que origina-se uma prova cristalina que consegue transmitir credibilidade, integridade e prestabilidade, auxiliando o direto a ampla defesa bem como o direito a acusação.

Diante desta perspectiva, é valido acrescentar que a prova não pertence a acusação e nem a defesa, mas, ao processo. Prova, portanto, é produzida pelo crivo do contraditório, posto que o código penal adota o princípio da presunção de inocência como garantia processual penal conforme prevê a CF/88 em seu art. 5º, LVII: “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória”.

A manutenção da cadeia de custódia evita que alguém seja julgado baseado em uma convicção incerta, ela fornece toda conexão com o fato criminoso mediante provas, que devem ser devidamente respeitadas, obtendo-se portanto, fatos e não mais projeções do que poderia ou não ter ocorrido, a sua devida preservação traz certeza ao julgador e afasta maiores dúvidas na hora da decisão do magistrado caso não existisse uma prova material mas, sim apenas testemunhal.

CONSEQUÊNCIAS DA QUEBRA DA CADEIA DE CUSTÓDIA

A cadeia de custódia é um procedimento que garante direitos fundamentais como o direito a acusação e o exercício da ampla defesa, justamente por possuir tamanha importância é que se faz necessária à sua preservação. Entretanto, mesmo com a sistematização prevista em lei, nem sempre essa preservação é realizada com a devida atenção, ocorrendo neste instante a violação, quando isto ocorre há uma interferência direta no exercício democrático de direito, comprometendo o processo.

A violação ocorre quando há o surgimento de uma prova ilícita pois, a mesma afeta diretamente a cronologia dos fatos, tornando-os inverossímeis. Por esta razão, é necessário reforçar a importância da preservação das fontes da prova, pois, se não houver a devida atenção aos procedimentos elencados em lei desde a colheita até o seu descarte, bem como a preservação do corpo de delito que deve permanecer em seu estado original a fim de evitar qualquer alteração ou destruição no vestígio encontrado, isso afetará o processo como um todo e consequentemente sofrerá a proibição de valoração probatória, posto que o juiz não poderá julgar o mérito de um processo fundado em provas eivadas de contaminação.

Na mesma toada, Carlos Edinger, conceitua:

“ A quebra da cadeia de custodia leva a quebra da rastreabilidade da prova. Isso, por sua vez, leva a perda da credibilidade daquele elemento probatório. Afinal, se eu desconheço a proveniência daquela prova, se desconheço por quem aquela prova passou e do que foi feito com ela nada impede que ela seja objeto de manipulação e seleção unilateral das provas, realizada por agentes do Estado ou, até eventuais corréus que apresentem acusações reciprocas e versões divergentes. Ainda, sem a intervenção da autoridade jurisdicional e controle das partes processuais, o material probatório indevidamente descartado ou alterado poderia conter prova de defesa capaz de conduzir a absolvição dos acusados”. (EDINGER, pg. 06)

Esta postura gera em nossa sociedade a ideia de insegurança jurídica, pois, compromete a credibilidade da instauração do processo penal bem como das autoridades que se comprometem na resolução do caso. Diante desta perspectiva, a CF/88 em seu art. 5º, inciso LVI: “são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos”. Ademais, o código penal em seu art. 157 § 1º, veda a utilização de provas que foram derivadas de provas ilícitas, in verbis: São também inadmissíveis as provas derivadas das ilícitas, salvo quando não evidenciado o nexo de causalidade entre umas e outras, ou quando as derivadas puderem ser obtidas por uma fonte independentemente das primeiras”.

Diante deste contexto, Ernesto Coutinho Júnior, conceitua:

“ A prova ilícita ou obtida por meios ilícitos enquadra-se na categoria da prova vedada. A prova é vedada sempre que for contrária a uma especifica normal legal, ou a um princípio do direito positivo, mas, a vedação pode ser estabelecida quer pela lei processual, quer pela lei material, no campo das proibições da prova, a tônica é dada pela natureza processual ou substancial da vedação: a proibição tem natureza exclusivamente processual quando for colocada em função de interesses atinentes a lógica e a finalidade do processo; tem pelo contrário; natureza substancial quando, embora servindo imediatamente também a interesses processuais; é colocada essencialmente em função dos direitos que o ordenamento reconhece aos indivíduos, independentemente do processo.”(COUTINHO,2015 PAG 60)

Neste sentido, quando ocorre uma violação da cadeia de custódia, a prova deverá ser considerada ilícita pois, desrespeita o devido processo legal bem como afronta a constituição federal conforme previsto anteriormente, originando, portanto, em sua quebra, todas as provas colhidas bem como os elementos constitutivos deverão ser considerados nulos e desentranhados do processo caso esteja em andamento.

Entretanto, é importante destacar que existem exceções no que tange a produção de provas ilícitas, a mesma reside quando for produzida pro-réu com fundamento no art. 5º,LV visando a proporcionalidade, pois, permite uma análise entre bens e direitos que foram violados, a atividade probatória não possui portanto, um caráter absoluto. Na mesma toada, Ernesto Coutinho, prevê:

“A teoria dominante hoje é a da inadmissibilidade processual das provas ilícitas, colhidas com infringência a princípios ou normas constitucionais, vem, porém, sendo atenuada por outra tendência que visa corrigir possíveis distorções ao qual a rigidez da exclusão poderia levar em casos excepcionais de gravidade, ou seja um critério de proporcionalidade, em caráter excepcional e em casos extremamente graves, tem-se admitido a prova ilícita baseando-se no princípio do equilíbrio entre valores fundamentais contrastantes. Reconhece a possibilidade de utilização, no processo penal da prova favorável ao acusado, ainda que colhida com infringência a direitos fundamentais seus ou de terceiros. “(COUTINHO, 2015 página 63)

O objetivo de evidenciar o tramite da formação da cadeia de custódia desde o local do crime, seus procedimentos bem como a importância de sua preservação e a consequência de sua violação. A cadeia de custódia permite estabelecer procedimentos que garantem a integralidade da prova que consequentemente ampara o magistrado a julgar com mais segurança. O julgamento deverá sempre ser pautado em provas factíveis que transpassem credibilidade seja por meio de prova material ou testemunhal, devendo o juiz estar atento ao processo, para que em casos de violações possa intervir.

Portanto, é de suma importância que este procedimento seja devidamente preservado, sendo respeitados todos os procedimentos elencados em lei e previstos no presente artigo, a fim de evitar uma violação na cadeia de custodia, que ocorrendo consequentemente a prova deverá ser desentranhada do processo por não ser possível aferir a sua credibilidade. Insta salientar que este cuidado não tem justificativa na perspectiva da bondade humana, mas, sim da necessidade social de se constituir uma prova séria, que passe credibilidade para o magistrado, a fim de evitar qualquer contradição e insegurança jurídica.

Destaca-se portanto, a importância da vigência da Lei nº 13.964, pois, a mesma conseguiu regularizar a cadeia de custódia e todo seu procedimento, estruturando dessa forma a sua ordem cronológica que forma-se por uma sequência de elos, essa visão panorâmica a respeito do processo desde o seu início até de fato a constituição da prova baseando-se no corpo de delito, transmite de certa forma mais convicção, sem dúvidas, é uma forma de passar segurança tanto para o autor do crime quanto para o réu, bem como para os profissionais envolvidos. Quando se tem ordem na execução dos procedimentos o erro é detectável com mais facilidade, ajudando, portanto, a parte mais fragilizada que poderia ser prejudicada caso não houvesse aparato jurisdicional.

Era comum antes da vigência do pacote anticrime muitas pericias se perderem seja por falta de um procedimento especifico, seja por insuficiência técnica ou até mesmo por desvio de conduta e manipulação da coleta. Por conseguinte, o que obtinha eram provas totalmente desalinhadas, pericias realizadas sem fundamento, descartes realizados sem prévia averiguação, desrespeito com o corpo de delito. Por óbvio que a regulamentação não cessa todas as hipóteses de violação, até porque se fossemos analisar por este prisma teríamos chegado ao ponto ideal, a perfeição, onde nenhuma mudança seria necessária, pelo contrário, a cadeia de custódia ainda precisa se desdobrar para compreender melhor as quebras de sigilos telefônicos, de acesso de dados, quebra de sigilo bancário que são feitas de forma indevida, cominando também em uma prova ilícita, pois, viola direito à privacidade. É uma inovação que traz um pouco mais de segurança, antes ter uma perspectiva de como os procedimentos acontecem do que insegurança da aleatoriedade que tínhamos antes.

A cadeia de custódia quando devidamente instaurada respeita os princípios da ampla defesa e do contraditório, do devido processo legal bem como da inadmissibilidade de provas ilícitas, conforme prevê o art. 5 da CF/88, incisos LIV, LV e LVII. Portanto, a cadeia de custódia não se restringe tão somente a um conjunto de procedimentos, ela é a concretização do processo penal frente aos princípios consagrados em nossa constituição federal.

Outrossim, é de fundamental importância que o tema seja mais discutido posto que a cadeia de custódia é a rainha das provas, é graças a esta série de procedimentos e de um esforço coletivo de profissionais capacitados que se consegue exercer a justiça pautando-se em uma perspectiva clara a respeito da formação da prova e garantindo consequentemente segurança jurídica nos tribunais.

Por todo exposto, conclui-se que a cadeia de custodia é um procedimento essencial para o exercício democrático de direito posto que implica diretamente na formação da prova que será utilizada para convencimento do magistrado, tendo interferência direta no exercício democrático de direito, posto que, o Direito não se preocupa tão somente com a obtenção da prova em si mas, sim com a qualidade da prova que é realizada para que desta maneira a justiça possa ser exercida de forma eficaz, prevalecendo a harmonia social.

Na formação do conjunto dos elementos probatórios, a cadeia de custódia é de extrema importância, já que tem como principal objetivo, preservar as informações coletadas, possibilitando a documentação e a ordem cronológica das evidências, quem foram os responsáveis por seu manuseio.

Na área forense, todas as amostras são recebidas como evidências. São analisadas e o seu resultado é apresentado na forma de laudo para ser utilizado na persecução penal. As amostras devem ser manuseadas de forma cautelosa, para tentar evitar futuras alegações de adulteração ou má conduta que possam comprometer as decisões relacionadas ao caso em questão.

O detalhamento dos procedimentos deve ser minucioso, para tornar o procedimento robusto e confiável, deixando o laudo técnico produzido, com teor irrefutável. A sequência dos fatos é essencial: quem manuseou, como manuseou, onde o vestígio foi obtido, como se armazenou, por que se manuseou. De acordo com o CPP, a cadeia de custódia da prova começa logo após o conhecimento do fato criminoso:

Art. 6º. Logo que tiver conhecimento da prática da infração penal, a autoridade policial deverá:

I – dirigir-se ao local, providenciando para que não se alterem o estado e conservação das coisas, até a chegada dos peritos criminais;

II – apreender os objetos que tiverem relação com o fato, após liberados pelos peritos criminais;

III – colher todas as provas que servirem para o esclarecimento do fato e suas circunstâncias.

O CPP dispõe ainda que a autoridade policial deve garantir a conservação da cena do crime, manipular indícios do local do fato, de forma a garantir da robustez da investigação. Vejamos o disposto pelo art. 170 do Código de Processo Penal:

Art. 170. Nas perícias de laboratório, os peritos guardarão material suficiente para a eventualidade de nova perícia. Sempre que conveniente, os laudos serão ilustrados com provas fotográficas, ou microfotográficas, desenhos ou esquemas.

Outra demonstração da necessidade de se estabelecer a cadeia de custódia na análise de vestígios seria no procedimento de busca e apreensão realizado pela autoridade policial e seus agentes. Da mesma forma, o modo como se encontraram os objetos, a manipulação e a armazenagem são questionamentos a serem utilizados pela defesa, no intuito de enfraquecer as provas produzidas.

Percebe-se que a cadeia de custódia não é exclusividade do perito criminal, mas sim de todos os envolvidos na localização e produção de provas: delegados, agentes, escrivães, papiloscopistas.

Dessa feita, adentraremos agora no problema na quebra da cadeia da custódia da prova, já que a referida situação ocasiona a não preservação integral das provas, e assim afeta a credibilidade dos meios e, fatalmente, acarretará nulidade de todo o processo. Nesse sentido, vejamos a lição de Marinho:

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O Estado também não tem apenas o dever de preservar a integridade e idoneidade da prova, mas, também de mostrar a história da prova, ou seja, a sua origem, sua natureza, como foi coletada, hora e data de cada ato, como foi acondicionada, transportada, armazenada e analisada com registro de todos os atos integrante da cadeia de custódia. Desse modo, podemos dizer que a prova fora produzida de forma transparente e com qualidade, permitindo assegurar a memória de todas as fases.

No mesmo diapasão, Alberi Espindula leciona sobre a cadeia de custódia de prova que:

Claro está que a finalidade da cadeia de custódia é para assegurar a idoneidade dos objetos e bens escolhidos pela perícia ou apreendidos pela autoridade policial, a fim de evitar qualquer tipo de dúvida quanto à sua origem e caminho percorrido durante a investigação criminal e o respectivo processo judicial. Importante esclarecer que a cadeia de custódia não está restrita só ao âmbito da perícia criminal, mas envolve desde a delegacia policial, quando apreende algum objeto e já deve observar com rigor tais procedimentos da cadeia de custódia. Podemos voltar mais ainda: qualquer policial, seja ele civil ou militar, que for receptor de algum objeto material que possa estar relacionado a alguma ocorrência, deve também – já no seu recebimento ou achado – proceder com os cuidados da cadeia de custódia. E essas preocupações vão além da polícia e da perícia, estendendo-se aos momentos de trâmites desses objetos da fase do processo criminal, tanto no ministério público quanto na própria justiça. Os procedimentos da cadeia de custódia devem continuar até o processo ter transitado em julgado.

Desse modo, percebe-se que uma das feições mais difíceis na obtenção das fontes de prova é justamente conseguir preservar a integridade de todo um processo que foi realizado minuciosa e sigilosamente, e que, se não for preservado, comprometerá todo o conjunto de elementos que foram colhidos.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em 10 out. 2020.

BRASIL. Lei nº 13.964, de 24 de dezembro de 2019. Aperfeiçoa a legislação penal e processual penal. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2019/lei/L13964.htm. Acesso em 10 out. 2020.

COUTINHO, Ernesto. Técnicas Penais e Processuais Penais de defesa. São Paulo: Cronus, 2015.

EDINGER, Carlos. Artigo acadêmico: Cadeia de custódia, rastreabilidade probatória. São Paulo, 2016.

RABELLO, Eraldo. Curso de criminalística. João Pessoa, PB, 1996.

NORONHA, GUSTAVO. Falsas memórias e sistema penal: a prova testemunhal em xeque. Rio de Janeiro, 2013.

ERNESTO COUTINHO JÚNIOR
Enviado por ERNESTO COUTINHO JÚNIOR em 21/08/2022
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