Normalmente o direito brasileiro vive em constante avalanche normativa e a Lei 13.467 de 2017 trouxe um choque epistêmico sobre o ramo juslaboral brasileiro.
Muitas alterações foram trazidas pela nova lei tais como a nova equiparação salarial, a representação dos trabalhadores nos locais de trabalho, a ampliação da terceirização, da alteração do custo sindical, os efeitos da relativa mitigação da gratuidade de justiça no processo do trabalho e ainda a malfadada Medida Provisória 808, entre outros que foram os temas de debate e objeto da dita Reforma.
É fato que trouxe alegrias para alguns e tristezas para muitos, mas é preciso ter um senso de vigilância e alerta. Estamos diante de novas posições doutrinárias sobre a lei reformista da CLT e sobre as relações sociolaborais no Brasil.
Concordo com meu notável colega Marcelo Machado de que não se trata de uma autêntica reforma, pois, afinal, reconstruir a CLT significa aboli-la, e, finalmente é legar o Brasil do século XXI dois códigos diferentes um Código de Trabalho e um Código de Processo de Trabalho.
A intitulada reforma trabalhista brasileira é sofrível, feita sem debate, e nem mesmo, sem ter uma comissão de juristas capitaneada por um doutrinador do Direito do Trabalho. E, o resultado é mesmo desastroso.
Ademais, o legislador não satisfeito, após 11 de novembro de 2017, já conseguira aprovar as Leis 13.509 e 13.545, ainda em 2017, ainda em 2017, e também, as Leis 13.660 e 13.767, no ano de 2018 que também alteraram a CLT.
Nos principais pontos de alteração foram os seguintes: da suspensão de prazos processuais entre 20 de dezembro a 20 de janeiro de outro ano, em mimetismo ao Código Fux; passando pela equiparação da estabilidade gestante ao empregado adotante e a licença-maternidade, inclusive, para a empregada adotante ou que obtenha guarda judicial, além do pagamento do intérprete judicial pelo sucumbente, salvo se beneficiário da justiça gratuita (inclusive, às intenções da Lei 13.367), e, finalizando, até meados de dezembro de 2018, com nova hipótese de interrupção do contrato de trabalho.
Cogita-se que a ventilada reforma introduziu relações laborais liberalizante sendo ilustrada por uma carteira de trabalho com novo lay out verde e amarela, além da pretensão de extinção do Ministério do Trabalho, existente no Brasil, como pasta autônoma, desde os anos de 1930, outrora era chamada de Ministério da Revolução.
Por outro lado, há o enfrentamento heroico dos tribunais em face dos efeitos decorrentes dos dispositivos reformados da CLT, principalmente o STF na temática da constitucionalidade dos enunciados normativos alterados pela lei.
E, ao final de 2018, noticiou-se que a Procuradoria Geral da República ofereceu três pareceres contrários aos desígnios da Lei 13.467/2017, cada qual na Ação Declaratória de Constitucionalidade 58/DF e na Ação de Inconstitucionalidade 5.987/DF ambas tratando da correção monetária dos depósitos judiciais pelos índices de poupança e de atualização dos créditos decorrentes de condenação judicial pela TR - Taxa Referencial, que a PGR opinou como sendo violadoras do direito de propriedade, bem como na Ação Direta de Inconstitucionalidade 5.870/DF sobre a tarifação do dano extrapatrimonial, opinada como franca violadora da dignidade humana.
Também o TRT da Terceira Região (Minas Gerais) conduziu com resistência à Lei 1.3467, tendo inclusive editado a Súmula 72[1]. O TRT da 14ª Região (Rondônia e Acre) que já declarou no processo 0000147-84.2018.5.14.0000 a inconstitucionalidade do §4º do art. 791-A da CLT[2].
Aliás, a mesma questão permanece pendente de julgamento pelo Tribunal Pleno do TRT -3 em determinada arguição de inconstitucionalidade (ArgInc- 0011811-21.2018.5.03.0000).
Percebe-se que por todos os lados jurisprudenciais, a preocupação vem sendo a redução dos efeitos da gratuidade de justiça na nova feição dada à CLT, em contradição ao plexo normativo que existia na redação da CLT que trata de custas e emolumentos.
A consequência mais imediata a ser tratada em 2019, é aquili que denominam como ativismo judicial, ou ainda, o seu risco. E, a lei 13.467 é um campo amplo e fértil para tanto.
A propósito, o Presidente do STF já pauto para o próximo dia 12 de junho de 2019 ação e recurso que enfrentam pontos objeto da referida Reforma Trabalhista.
A ADI 5.826/DF, que tem em seu apenso a ADI 5.819/DF, irá se deparar com o contrato para prestação de trabalho intermitente; ao passo que o Recurso Extraordinário 635.546 (recurso autuado em 2011) com repercussão geral já conhecida, enfrentará o tema da terceirização, um dos pilares da Lei 13.467, que procedeu as alterações na Lei 6.019/1974, e a isonomia salaria entre os empregados terceirizados e a Administração Pública Indireta, no caso da Caixa Econômica Federal.
Reitere-se ainda que diante de tantas demandas pendentes de decisões judiciais, se o ativismo judicial irá ganhar força no cotejo da compatibilidade da Reforma Trabalhista, aprovada em 2017, com o sistema constitucional de 1988
Entender o ativismo judicial aparece quando os juízes constitucionais se opõem a uma decisão política contida numa norma com base em critérios e racionalizações políticas, ainda que juridicamente fundamentados.
Quando os juízes constitucionais criam o direito do nada, ainda que para combater a inércia do legislador; quando os juízes constitucionais não se limitam a aplicar a Constituição Federal, ainda que de forma construtiva, visam complementá-la ou corrigi-la, ou ainda, quando os juízes constitucionais, mais que corrigem uma norma constitucional, a derrogam.
Com o sistema brasileiro de controle de constitucionalidade adota o modelo dual ou paralelo, onde todos os juízes e tribunais brasileiros possuem o poder de reconhecer a inconstitucionalidade de certa norma, seja mediante a via excetiva, seja como sendo objeto principal da ação, a despeito do conceito que se queira assumir sobre o significado de ativismo judicial, afirma-se que a lei reformista potencializa o risco que se convencionou a chamar a expressão está mais vinculada ao papel das Cortes Constitucionais.
A contramajoritariedade está no centro da questão que se propõe a perquirir sobre a legitimidade das instâncias jurisdicionais, que não foram e nem são eleitas, ao exercerem a função de verdadeiros legisladores negativos, abolindo ou afastando a incidência de leis que transpassaram o processo legislativo regular.
Em 2019 viver-se-á a tensão existente entre os que produziram a norma que se propôs alterar toda a base ideológica do direito laboral brasileiro e, aqueles que estão a avaliar se os escopos adotados abarcam as intenções sobrelevadas das normas constitucionais de 1988.
Outro notável professor Homero Batista alertou em seu Instagram que se deve manter a ética e a postura que os antepassados ensinaram, praticando a perseverança, e, mais do que tudo, segundo o jurista, não esmorecer na crença de que o mundo ainda possa mudar mais pela força da palavra do que força das armas.
[1] Entretanto, o pleno do TRT mineiro, ao editar a Súmula 72, considerou inconstitucional a expressão "ainda que beneficiário da justiça gratuita" expressa na regra reformista. Tendo em vista a concessão da justiça gratuita à trabalhadora, ela foi considerada isenta do pagamento das custas processuais.
[2][2] Na sessão ordinária do Tribunal Pleno, foi declarada a inconstitucionalidade de um trecho do parágrafo 4º do artigo 791-A da CLT (link para outro sítio), que versa sobre a condenação, em honorários de sucumbência, da parte beneficiária de gratuidade de justiça. A decisão foi tomada por maioria absoluta, nos autos do processo 0102282-40.2018.5.01.0000 (ArgIncCiv), e acompanhou o voto da relatora, desembargadora Giselle Bondim Lopes Ribeiro.
O trecho considerado inconstitucional é o destacado a seguir: “§ 4o Vencido o beneficiário da justiça gratuita, desde que não tenha obtido em juízo, ainda que em outro processo, créditos capazes de suportar a despesa, as obrigações decorrentes de sua sucumbência ficarão sob condição suspensiva de exigibilidade e somente poderão ser executadas se, nos dois anos subsequentes ao trânsito em julgado da decisão que as certificou, o credor demonstrar que deixou de existir a situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão de gratuidade, extinguindo-se, passado esse prazo, tais obrigações do beneficiário”.
De acordo com o artigo 791-A da CLT, incluído pela Lei 13.467/2017, a parte perdedora (sucumbente) deve pagar ao advogado da parte contrária honorários de 5% a 15% da condenação ou do valor da causa. O parágrafo 4º do dispositivo admitia, no caso de a parte vencida ser beneficiária da justiça gratuita, a utilização dos créditos provenientes da ação em que houve a condenação e de outras, para pagamento dos honorários sucumbenciais.
O incidente de arguição de inconstitucionalidade do § 4º do art. 791-A da CLT foi suscitado pela 3ª Turma do TRT/RJ, por ocasião de julgamento de recurso ordinário em processo oriundo da 18ª Vara do Trabalho do Rio de Janeiro.
Na ação, movida por uma fisioterapeuta contra um hospital particular do Rio de Janeiro, os pedidos foram julgados procedentes em parte. O juízo de origem deferiu honorários sucumbenciais a serem suportados pela reclamada, no percentual de 10%, ante os termos do artigo 791-A da CLT. Por outro lado, o juiz Marcos Dias de Castro deixou de condenar a reclamante em honorários advocatícios sucumbenciais, sob o fundamento da inconstitucionalidade do §4º do artigo 791-A da CLT, já que a demandante era beneficiária da gratuidade de justiça.