Dimensões da Crise do Capitalismo Contemporâneo
Resumo: O capitalismo contemporâneo é resultante de muitas transformações e também do processo dialético da legislação e da função do Estado no mundo globalizado. O capitalismo atual está associado à reestruturação produtiva, à globalização financeira e ao novo papel dos Estados.
Palavras-Chave: Capitalismo. Globalização. Neoliberalismo. Estado. Crise do Capitalismo
Estabelecer uma reflexão sobre o significado da atual crise do capitalismo nos remete, primeiramente, a alguns aspectos teóricos da crise embasados em Marx . Outro aspecto é o presente processo de globalização hegemônica e, ainda, analisar os elementos da particularidade brasileira.
Experimentamos atualmente a quarta onda de globalização . Porém, a globalização não é processo unívoco, há a presença de dois processos de globalização simultâneos, a saber: o processo de globalização hegemônico e o processo de globalização contra-hegemônico.
O hegemônico relaciona-se à busca de hegemonia por parte do poder das corporações internacionais, dos países hegemônicos, principalmente, os EUA e seu pensamento neoliberal, com sua crença no mercado plenipotenciário e no indivíduo como ente fundamental da sociedade humana.
Já o processo contra-hegemônico busca alternativas ao poder hegemônico, criando debate e movimento internacional em prol da diversidade cultural, da defesa da ecologia, dos direitos humanos e garantias sociais, da democracia radical, dos direitos das mulheres e alguns chegam a desejar a transição para outra sociabilidade, como é o caso do movimento eco-socialista e de tantas outras organizações e coletivos de esquerda.
Afinal, a virada do milênio significa um momento de expressivas transformações composto da queda do Muro de Berlim , com a volta de Macau para China, e a imersão em um universo de transformações estruturais cujas origens remontam aos anos setenta.
Há, ainda, a “Crise do sistema” de Bretton Woods , do padrão de financiamento da acumulação de capital, da forma do capitalismo do pós-guerra. Eis que a crise da matriz produtiva baseada na segunda revolução industrial e introdução de novas formas de produção da nova acumulação molecular digital.
A microeletrônica e a informática que trouxeram transformações tecnológicas, posto que incidem sobre o âmbito econômico e, progressivamente sobre o âmbito social. O que pode ganhar status de revolução tecnológica.
A crise atual do capital é a base do ideal neoliberal, quanto da busca de lucratividade pelos capitais globais. Os ideais neoliberais galgam a dimensão do ideal de globalização, na medida em que os capitais globais necessitam de flexibilidade, desregulamentação e destruição das amarras impostas pelos trabalhadores e seus sindicatos, a imposição de limites ao livre fluxo de capitais, a precarização e superexposição e superexploração do trabalho humano.
A crise geral como resultante da luta de classes e da concorrência entre os capitalistas, acaba por impor novos padrões tecnológicos e novas formas de exploração que reinventam a tecnologia e as formas de produzir.
A busca inesperada por mais valia relativa e absoluta reinventa a geografia mundial e colocam a China como grande fábrica do mundo . Enfim, o deslocamento da força de trabalho necessária ao capital, faz a Europa se enxergar envolta de rotunda crise estrutural.
O velho capital necessita preferencialmente de força de trabalho superexplorável, isto é, não lhe convém o Estado do Bem-Estar Social incapaz de lhe garantir expressivos níveis de exploração.
Assim, o capital reinventa a geografia econômica ao deslocar-se prioritariamente para China dotada de monumental contingência populacional apta à superexploração e, a outros países do mundo, que apesar de secularmente engajados na acumulação de capitais, pelo menos desde o período mercantilista, são agora chamados pelos disciplinados economistas das agências de fomento e regulação pelos emergentes.
Por globalização entende-se pela reordenação capitalista que fora desenvolvida com medidas de política econômica como sendo reposta à crise estrutural capitalista da década de setenta. A partir de 1978, a burguesia mundial conduzida pelos EUA e Reino Unido empreendeu em proveito próprio, com maiores e menores graus de sucesso, a modificação internacional, e a partir daí, no quadro de todos os países, das relações políticas entre as classes sociais. Deu-se o desmantelamento das instituições e estatutos que concretizavam o estado anterior das relações.
O termo “crise estrutural” , tal como usado por Smith, indica uma fraqueza na acumulação de capital devido à ação, agora decisiva, da lei tendencial da taxa de lucro decrescente.
Segundo Murray Smith apud Prado, o capitalismo está evoluindo agora de uma forma precária em relação ao seu passado, mais bem sucedido. Afirma que esse modo de produção globalizado – e assim, os trabalhadores e os capitalistas em geral – sofrem das consequências de uma crise estrutural que tem três dimensões relacionadas entre si.
Há um aprofundamento da contradição entre o capital acumulado no passado e a sua lucratividade no presente; a produção de “mais-valor”, ou seja, a substância social que dá origem aos lucros, é insuficiente para remunerar de modo “satisfatório” o capital industrial e o capital financeiro, que se avolumaram sem cessar após a Segunda Guerra Mundial;
Persiste uma crise grave das relações internacionais entre as nações capitalistas: se, de um lado, as forças produtivas romperam os limites dos Estados nacionais; se se formaram cadeias de produção que agora englobam muitos países, por outro lado, a capacidade de solução dos problemas se concentra ainda nas próprias nações.
Há uma evidente “crise ecológica” que, decorre da contradição entre a civilização humana e as “condições naturais de produção”, isto é, entre o seu modo de apropriação da natureza e os fundamentos ecológicos da sustentabilidade das sociedades.
As políticas de liberalização, de desregulamentação e privatização que os Estados capitalistas adotaram um após ao outro, desde o advento do governo Thatcher em 1979 e Reagan em 1980, o que devolveu ao capital a liberdade perdida desde 1914, para mover-se à vontade dentro do plano internacional, quer entre países e continentes.
A produção atual está subsumida à lógica do capital financeiro que conseguiu liberdade ampla de movimento global e trafega à velocidade da luz pelos chamados mercados. Mas, não reside aí o centro da mudança.
O capitalismo contemporâneo se pauta por um capital de imagens que torna sua marca principal comandada por uma digitalização e molecularização o que mudou radicalmente a linguagem e as referências do próprio cotidiano e, ainda permite uma forma de capital que atua como virtual, ou seja, capaz de extrair mais-valia no momento do uso da força do trabalho, sem os constrangimentos típicos da era industrial, que criaram a virtualidade da classe que, requer sempre sua própria autoinvenção. É a forma suprema do trabalho abstrato, afinal, lograda pelo sistema capitalista reinante.
De fato, o capital virtual, a mercadoria virtual, assim como também o próprio ambiente de trabalho, isto é, pode ser um serviço, um efeito útil, uma marca, uma imagem, cuja produção são simultâneas à realização. É assim que o capital virtual renuncia à fábrica para a produção de valor.
Para Zygmunt Bauman uma das consequências da globalização é o surgimento de uma nova classe superior, rica e com mobilidade física e virtual. Os turistas que tanto viajam a trabalho como para mero desfrute e consumo de cultura; e de outro lado, o vagabundo que representa o pobre, que se desloca, mas é sempre indesejado. Tal fato ocorre impulsionado por mudanças nas tecnologias de informação e, suas consequências nas novas formas de ser do capital.
A localização forçada preserva a seletividade natural dos efeitos globalizantes. Amplamente notada e cada vez mais preocupante, a polarização do mundo e de sua população não é interferência externa, estranha, perturbadora aos processos de globalização – é, portanto, efeito dele. Já para o pensamento social crítico de Istvan Mészáros, o atual processo de globalização capitalista aprofunda também as contradições próprias à relação social “capital”.
De acordo com Mészáros o capital necessita expandir-se apesar e em detrimento das condições necessárias para a vida humana, levando aos desastres ecológicos e ao desemprego crônico, isto é, à destruição das condições básicas para a reprodução do metabolismo social. [...] Um sistema de reprodução não pode se autocondenar mais enfaticamente do que quando atinge o ponto em que as pessoas se tornam supérfluas ao seu modo de funcionamento.
A alienação dos meios de produção e do produzir é, simultaneamente, igualmente perversa metamorfose de tais meios de produção em capital. E, neste sentido, toda a maquinaria do atual estágio do capitalismo necessariamente serve mais aos propósitos destrutivos do que propriamente aos objetivos produtivos.
Além das guerras, registra-se também aumento na velocidade de obsolescência das mercadorias produzidas de modo que temos uma taxa decrescente de uso de todos os bens produzidos nunca dantes verificada na história.
Portanto, é preciso considerar que o atual processo histórico de acumulação de capital tem por resultante o aumento colossal da velocidade de rotação do capital, ou seja, o tempo em que o capital se transforma em mercadoria e, ao completar o ciclo, retorna às mãos dos capitalistas e investidores.
Isto é, enfim, a causa e efeito do aumento da velocidade de inovações tecnológicas e, um dos perversos aspectos de tal movimento é o fato da necessidade cada vez menor de trabalhadores no processo produtivo em razão de adoção de máquinas e automação nos processos mais eficientes para enfrentar a permanente concorrência e a luta de classes, e vai, transformando a classe trabalhadora, progressivamente, em classe supérflua, seja pela mera e simples extinção de cargos ou funções, seja pelo corte de custos, com a eliminação de postos de trabalho..
Paradoxalmente, significativa parte da população trabalhadora se vê transformada em supérfluo em relação às engrenagens supermodernas de uma sociedade de alta tecnologia em que o capital se transformou em imagem.
Em paralelo, o aumento da produtividade do trabalho e da rotação do capital que o acompanha, ao reduzir a taxa de utilização das mercadorias produzidas, seja pelo lançamento de novos produtos ou similares, seja pela planejada obsolescência dos mesmos, transforma crescentemente as mercadorias em dejetos ou entulho, provocando desmensurado aumento da destruição ambiental (KEMPF, 2009).
Assim, naturalmente os seres humanos são vistos como “recursos humanos” ou mão-de-obra, e a natureza como “recursos naturais” inesgotáveis para um processo irracional de produção de massas crescentes de lucros para os acionistas das corporações.
Com natural desdobramento, as populações mais carentes e pobres são as mais afetadas, pois simultaneamente sofrem o impacto do aumento do desemprego estrutural e da devastação ambiental, com a proliferação de doenças, a favelização urbana, a falta d'água e de saneamento básico, além de crescimento das desigualdades sociais que atingem o mundo todo.
É possível inferir o surgimento de nova pobreza e a devastação ambiental são duas faces da mesma moeda que representa o processo de produção destrutiva da nova fase do capitalismo globalizado e refletem um momento histórico de crise civilizacional.
O Estado passa a ser pressuposto da acumulação de capital. E, o Estado neoliberal , diferentemente da retórica de seus seguidores, não é alijado do processo de acumulação do capital, ao revés, desempenha a função precípua como agente articulador entre o âmbito econômico sob seu domínio e o capital financeiro internacionalizado.
Atua como engrenagem na unificação transnacional dos esquemas de valorização financeira, ligando as frações do capital global internacionalizado ao capital local que garante sua base de sustentação política para garantir a reprodução ampliada.
Assim, convergem os interesses dos blocos de capital privado local , internacional e estatal, sempre garantidos pela notável capacidade mediadora do Estado.
O contemporâneo momento de crise do capitalismo deve ser compreendido dentro de sua dialética cíclica. Afinal, tais ciclos refletem a história da exploração do proletariado e, ultimamente há o surgimento de bolhas. É o caso da bolha pelas empresas pontocom e, também há a bolha das hipotecas.
Cumpre ainda, perceber o caráter anárquico da produção capitalista, pois ao promover uma série de modificações no setor produtivo, seja, introduzindo máquinas mais modernas e promovendo maior racionalização dos procedimentos, o capitalista emprega menos força de trabalho e, por consequência, extrai menos mais-valia, reduzindo seu lucro por unidade produzida.
A redução do lucro por unidade é compensada pela elevação de quantidade de unidades produzidas que, ao final, pela elevação do volume de vendas, aumentando progressivamente o lucro total do investidor.
Infelizmente, o neoliberalismo não se monstra eficiente para resolver a atual crise do capitalismo.
O neoliberalismo não passa do velho liberalismo revivido Friedman, confessadamente, reformulou as proposições clássicas para incorporar os conceitos macroeconômicos de inspiração keynesiana e os instrumentos econométricos que permitem rejeitar hipóteses improváveis.
O programa neoliberal se assemelha ao keynesiano, mas com evidente caráter antioperário e com muito maior alcance. O aumento do desemprego, que para o keynesiano é uma necessidade desagradável e, que por isso, deve ser tolerado apenas enquanto estritamente indispensável, torna-se para o neoliberal um objetivo estrutural.
Conforme leciona Paul Singer in litteris:
“Por tudo isso, não tem sentido falar em uma “etapa neoliberal do capitalismo”. Na realidade, o neoliberalismo não passa de uma reação da classe capitalista ao impasse da estagflação. Esta resultou do descompasso entre o poder adquirido pela classe trabalhadora de impor aumentos de salários e a não responsabilidade dos trabalhadores pela condução das empresas e da economia. O pleno emprego dos anos dourados deu ao operariado poder de pressão por ganhos pecuniários, mas não lhe deu informações confiáveis sobre o real estado da economia e sobre a capacidade das empresas de absorver os custos decorrentes dos aumentos reivindicados”.
Referências
BALANCO, Paulo; PINTO, Eduardo Costa. Dimensões do capitalismo contemporâneo: alguns aspectos do debate acerca do Estado-nação e do "novo imperialismo". Disponível em: https://core.ac.uk/download/pdf/6357253.pdf Acesso em 13.2.2021.
BAUMAN, Zygmunt. Globalização: As Consequências Humanas. Rio de Janeiro: Editora Jorge Zahar. Tradução de Marcus Penchel, 1999.
BOURDIEU, Pierre. O poder simbólico. Lisboa: Difel, 1989.
BRAND, ULRICH e SEKLER, N. (org.). Diante da crise global. Horizontes do pós-neoliberalismo. Riode Janeiro, EdUERJ, 2010.
CORSI, Francisco Luiz; CAMARGO, José Marangoni; DOS SANTOS, Agnaldo. (ed.) Os dilemas atuais do Brasil e da América Latina. Disponível em: https://ebooks.marilia.unesp.br/index.php/lab_editorial/catalog/book/98 Acesso em 12.2.2021.
FIORI, J. L.,LOURENÇO, M. S. & NORONHA, J. C. (Orgs.) Globalização: o fato e o mito. Rio de Janeiro: EdUERJ, 1998.
GENNARI, Adilson Marques. Brasil: crise estrutural, pandemias, políticas sociais e adura realidade conjuntural. Disponível em: https://revistas.marilia.unesp.br/index.php/RFM/article/download/10664/6852/36133 Acesso em 13.2.2021.
KEMPF, Hervé. Para salvar o planeta, livrem-se do capitalismo. Lisboa: Ana Paula Faria Editora, 2009.
LIMA, Aline Joyce Leal; DOS SANTOS, Sydilene Moana. O sistema do Capital e suas Crises. Disponível em: http://www.joinpp.ufma.br/jornadas/joinppIV/eixos/1_Mundializacao/o-sistema-do-capital-e-suas-crises.pdf Acesso em 13.2.2021.
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Resumo: O capitalismo contemporâneo é resultante de muitas transformações e também do processo dialético da legislação e da função do Estado no mundo globalizado. O capitalismo atual está associado à reestruturação produtiva, à globalização financeira e ao novo papel dos Estados.
Palavras-Chave: Capitalismo. Globalização. Neoliberalismo. Estado. Crise do Capitalismo
Estabelecer uma reflexão sobre o significado da atual crise do capitalismo nos remete, primeiramente, a alguns aspectos teóricos da crise embasados em Marx . Outro aspecto é o presente processo de globalização hegemônica e, ainda, analisar os elementos da particularidade brasileira.
Experimentamos atualmente a quarta onda de globalização . Porém, a globalização não é processo unívoco, há a presença de dois processos de globalização simultâneos, a saber: o processo de globalização hegemônico e o processo de globalização contra-hegemônico.
O hegemônico relaciona-se à busca de hegemonia por parte do poder das corporações internacionais, dos países hegemônicos, principalmente, os EUA e seu pensamento neoliberal, com sua crença no mercado plenipotenciário e no indivíduo como ente fundamental da sociedade humana.
Já o processo contra-hegemônico busca alternativas ao poder hegemônico, criando debate e movimento internacional em prol da diversidade cultural, da defesa da ecologia, dos direitos humanos e garantias sociais, da democracia radical, dos direitos das mulheres e alguns chegam a desejar a transição para outra sociabilidade, como é o caso do movimento eco-socialista e de tantas outras organizações e coletivos de esquerda.
Afinal, a virada do milênio significa um momento de expressivas transformações composto da queda do Muro de Berlim , com a volta de Macau para China, e a imersão em um universo de transformações estruturais cujas origens remontam aos anos setenta.
Há, ainda, a “Crise do sistema” de Bretton Woods , do padrão de financiamento da acumulação de capital, da forma do capitalismo do pós-guerra. Eis que a crise da matriz produtiva baseada na segunda revolução industrial e introdução de novas formas de produção da nova acumulação molecular digital.
A microeletrônica e a informática que trouxeram transformações tecnológicas, posto que incidem sobre o âmbito econômico e, progressivamente sobre o âmbito social. O que pode ganhar status de revolução tecnológica.
A crise atual do capital é a base do ideal neoliberal, quanto da busca de lucratividade pelos capitais globais. Os ideais neoliberais galgam a dimensão do ideal de globalização, na medida em que os capitais globais necessitam de flexibilidade, desregulamentação e destruição das amarras impostas pelos trabalhadores e seus sindicatos, a imposição de limites ao livre fluxo de capitais, a precarização e superexposição e superexploração do trabalho humano.
A crise geral como resultante da luta de classes e da concorrência entre os capitalistas, acaba por impor novos padrões tecnológicos e novas formas de exploração que reinventam a tecnologia e as formas de produzir.
A busca inesperada por mais valia relativa e absoluta reinventa a geografia mundial e colocam a China como grande fábrica do mundo . Enfim, o deslocamento da força de trabalho necessária ao capital, faz a Europa se enxergar envolta de rotunda crise estrutural.
O velho capital necessita preferencialmente de força de trabalho superexplorável, isto é, não lhe convém o Estado do Bem-Estar Social incapaz de lhe garantir expressivos níveis de exploração.
Assim, o capital reinventa a geografia econômica ao deslocar-se prioritariamente para China dotada de monumental contingência populacional apta à superexploração e, a outros países do mundo, que apesar de secularmente engajados na acumulação de capitais, pelo menos desde o período mercantilista, são agora chamados pelos disciplinados economistas das agências de fomento e regulação pelos emergentes.
Por globalização entende-se pela reordenação capitalista que fora desenvolvida com medidas de política econômica como sendo reposta à crise estrutural capitalista da década de setenta. A partir de 1978, a burguesia mundial conduzida pelos EUA e Reino Unido empreendeu em proveito próprio, com maiores e menores graus de sucesso, a modificação internacional, e a partir daí, no quadro de todos os países, das relações políticas entre as classes sociais. Deu-se o desmantelamento das instituições e estatutos que concretizavam o estado anterior das relações.
O termo “crise estrutural” , tal como usado por Smith, indica uma fraqueza na acumulação de capital devido à ação, agora decisiva, da lei tendencial da taxa de lucro decrescente.
Segundo Murray Smith apud Prado, o capitalismo está evoluindo agora de uma forma precária em relação ao seu passado, mais bem sucedido. Afirma que esse modo de produção globalizado – e assim, os trabalhadores e os capitalistas em geral – sofrem das consequências de uma crise estrutural que tem três dimensões relacionadas entre si.
Há um aprofundamento da contradição entre o capital acumulado no passado e a sua lucratividade no presente; a produção de “mais-valor”, ou seja, a substância social que dá origem aos lucros, é insuficiente para remunerar de modo “satisfatório” o capital industrial e o capital financeiro, que se avolumaram sem cessar após a Segunda Guerra Mundial;
Persiste uma crise grave das relações internacionais entre as nações capitalistas: se, de um lado, as forças produtivas romperam os limites dos Estados nacionais; se se formaram cadeias de produção que agora englobam muitos países, por outro lado, a capacidade de solução dos problemas se concentra ainda nas próprias nações.
Há uma evidente “crise ecológica” que, decorre da contradição entre a civilização humana e as “condições naturais de produção”, isto é, entre o seu modo de apropriação da natureza e os fundamentos ecológicos da sustentabilidade das sociedades.
As políticas de liberalização, de desregulamentação e privatização que os Estados capitalistas adotaram um após ao outro, desde o advento do governo Thatcher em 1979 e Reagan em 1980, o que devolveu ao capital a liberdade perdida desde 1914, para mover-se à vontade dentro do plano internacional, quer entre países e continentes.
A produção atual está subsumida à lógica do capital financeiro que conseguiu liberdade ampla de movimento global e trafega à velocidade da luz pelos chamados mercados. Mas, não reside aí o centro da mudança.
O capitalismo contemporâneo se pauta por um capital de imagens que torna sua marca principal comandada por uma digitalização e molecularização o que mudou radicalmente a linguagem e as referências do próprio cotidiano e, ainda permite uma forma de capital que atua como virtual, ou seja, capaz de extrair mais-valia no momento do uso da força do trabalho, sem os constrangimentos típicos da era industrial, que criaram a virtualidade da classe que, requer sempre sua própria autoinvenção. É a forma suprema do trabalho abstrato, afinal, lograda pelo sistema capitalista reinante.
De fato, o capital virtual, a mercadoria virtual, assim como também o próprio ambiente de trabalho, isto é, pode ser um serviço, um efeito útil, uma marca, uma imagem, cuja produção são simultâneas à realização. É assim que o capital virtual renuncia à fábrica para a produção de valor.
Para Zygmunt Bauman uma das consequências da globalização é o surgimento de uma nova classe superior, rica e com mobilidade física e virtual. Os turistas que tanto viajam a trabalho como para mero desfrute e consumo de cultura; e de outro lado, o vagabundo que representa o pobre, que se desloca, mas é sempre indesejado. Tal fato ocorre impulsionado por mudanças nas tecnologias de informação e, suas consequências nas novas formas de ser do capital.
A localização forçada preserva a seletividade natural dos efeitos globalizantes. Amplamente notada e cada vez mais preocupante, a polarização do mundo e de sua população não é interferência externa, estranha, perturbadora aos processos de globalização – é, portanto, efeito dele. Já para o pensamento social crítico de Istvan Mészáros, o atual processo de globalização capitalista aprofunda também as contradições próprias à relação social “capital”.
De acordo com Mészáros o capital necessita expandir-se apesar e em detrimento das condições necessárias para a vida humana, levando aos desastres ecológicos e ao desemprego crônico, isto é, à destruição das condições básicas para a reprodução do metabolismo social. [...] Um sistema de reprodução não pode se autocondenar mais enfaticamente do que quando atinge o ponto em que as pessoas se tornam supérfluas ao seu modo de funcionamento.
A alienação dos meios de produção e do produzir é, simultaneamente, igualmente perversa metamorfose de tais meios de produção em capital. E, neste sentido, toda a maquinaria do atual estágio do capitalismo necessariamente serve mais aos propósitos destrutivos do que propriamente aos objetivos produtivos.
Além das guerras, registra-se também aumento na velocidade de obsolescência das mercadorias produzidas de modo que temos uma taxa decrescente de uso de todos os bens produzidos nunca dantes verificada na história.
Portanto, é preciso considerar que o atual processo histórico de acumulação de capital tem por resultante o aumento colossal da velocidade de rotação do capital, ou seja, o tempo em que o capital se transforma em mercadoria e, ao completar o ciclo, retorna às mãos dos capitalistas e investidores.
Isto é, enfim, a causa e efeito do aumento da velocidade de inovações tecnológicas e, um dos perversos aspectos de tal movimento é o fato da necessidade cada vez menor de trabalhadores no processo produtivo em razão de adoção de máquinas e automação nos processos mais eficientes para enfrentar a permanente concorrência e a luta de classes, e vai, transformando a classe trabalhadora, progressivamente, em classe supérflua, seja pela mera e simples extinção de cargos ou funções, seja pelo corte de custos, com a eliminação de postos de trabalho..
Paradoxalmente, significativa parte da população trabalhadora se vê transformada em supérfluo em relação às engrenagens supermodernas de uma sociedade de alta tecnologia em que o capital se transformou em imagem.
Em paralelo, o aumento da produtividade do trabalho e da rotação do capital que o acompanha, ao reduzir a taxa de utilização das mercadorias produzidas, seja pelo lançamento de novos produtos ou similares, seja pela planejada obsolescência dos mesmos, transforma crescentemente as mercadorias em dejetos ou entulho, provocando desmensurado aumento da destruição ambiental (KEMPF, 2009).
Assim, naturalmente os seres humanos são vistos como “recursos humanos” ou mão-de-obra, e a natureza como “recursos naturais” inesgotáveis para um processo irracional de produção de massas crescentes de lucros para os acionistas das corporações.
Com natural desdobramento, as populações mais carentes e pobres são as mais afetadas, pois simultaneamente sofrem o impacto do aumento do desemprego estrutural e da devastação ambiental, com a proliferação de doenças, a favelização urbana, a falta d'água e de saneamento básico, além de crescimento das desigualdades sociais que atingem o mundo todo.
É possível inferir o surgimento de nova pobreza e a devastação ambiental são duas faces da mesma moeda que representa o processo de produção destrutiva da nova fase do capitalismo globalizado e refletem um momento histórico de crise civilizacional.
O Estado passa a ser pressuposto da acumulação de capital. E, o Estado neoliberal , diferentemente da retórica de seus seguidores, não é alijado do processo de acumulação do capital, ao revés, desempenha a função precípua como agente articulador entre o âmbito econômico sob seu domínio e o capital financeiro internacionalizado.
Atua como engrenagem na unificação transnacional dos esquemas de valorização financeira, ligando as frações do capital global internacionalizado ao capital local que garante sua base de sustentação política para garantir a reprodução ampliada.
Assim, convergem os interesses dos blocos de capital privado local , internacional e estatal, sempre garantidos pela notável capacidade mediadora do Estado.
O contemporâneo momento de crise do capitalismo deve ser compreendido dentro de sua dialética cíclica. Afinal, tais ciclos refletem a história da exploração do proletariado e, ultimamente há o surgimento de bolhas. É o caso da bolha pelas empresas pontocom e, também há a bolha das hipotecas.
Cumpre ainda, perceber o caráter anárquico da produção capitalista, pois ao promover uma série de modificações no setor produtivo, seja, introduzindo máquinas mais modernas e promovendo maior racionalização dos procedimentos, o capitalista emprega menos força de trabalho e, por consequência, extrai menos mais-valia, reduzindo seu lucro por unidade produzida.
A redução do lucro por unidade é compensada pela elevação de quantidade de unidades produzidas que, ao final, pela elevação do volume de vendas, aumentando progressivamente o lucro total do investidor.
Infelizmente, o neoliberalismo não se monstra eficiente para resolver a atual crise do capitalismo.
O neoliberalismo não passa do velho liberalismo revivido Friedman, confessadamente, reformulou as proposições clássicas para incorporar os conceitos macroeconômicos de inspiração keynesiana e os instrumentos econométricos que permitem rejeitar hipóteses improváveis.
O programa neoliberal se assemelha ao keynesiano, mas com evidente caráter antioperário e com muito maior alcance. O aumento do desemprego, que para o keynesiano é uma necessidade desagradável e, que por isso, deve ser tolerado apenas enquanto estritamente indispensável, torna-se para o neoliberal um objetivo estrutural.
Conforme leciona Paul Singer in litteris:
“Por tudo isso, não tem sentido falar em uma “etapa neoliberal do capitalismo”. Na realidade, o neoliberalismo não passa de uma reação da classe capitalista ao impasse da estagflação. Esta resultou do descompasso entre o poder adquirido pela classe trabalhadora de impor aumentos de salários e a não responsabilidade dos trabalhadores pela condução das empresas e da economia. O pleno emprego dos anos dourados deu ao operariado poder de pressão por ganhos pecuniários, mas não lhe deu informações confiáveis sobre o real estado da economia e sobre a capacidade das empresas de absorver os custos decorrentes dos aumentos reivindicados”.
Referências
BALANCO, Paulo; PINTO, Eduardo Costa. Dimensões do capitalismo contemporâneo: alguns aspectos do debate acerca do Estado-nação e do "novo imperialismo". Disponível em: https://core.ac.uk/download/pdf/6357253.pdf Acesso em 13.2.2021.
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CORSI, Francisco Luiz; CAMARGO, José Marangoni; DOS SANTOS, Agnaldo. (ed.) Os dilemas atuais do Brasil e da América Latina. Disponível em: https://ebooks.marilia.unesp.br/index.php/lab_editorial/catalog/book/98 Acesso em 12.2.2021.
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