Originalmente, Comedia e, só mais tarde, Divina Comédia por Giovanni Boccaccio é poema épico e teológico da literatura italiana escrito por Dante Alighieri no século XIV, sendo dividido em três partes, a saber: o inferno, o purgatório e o paraíso. Trata-se de uma cosmovisão medieval e que fatiava o universo em círculos concêntricos.
Há complexas explicações sobre o sentido do simbolismo empregado, sendo mesmo muito difícil saber qual o real significado da amada Beatriz, se seria o amor carnal, o Estado, a Igreja, o amor metafísico ou qualquer outro. Enfim, há sentidos sobrepostos, principalmente o moral, o alegórico e o místico.
Os círculos de inferno de Dante Alighieri, o autor da Divina Comédia, situam nestes todos os que atentaram contra as leis da natureza e provocaram danos à natureza humana. Há nove círculos de acordo com suas condutas, situados sobre os espectros de horror que tem influenciado a todas as gerações desde o Renascimento italiano até nosso presente.
A obra de Dante trouxe a definição de inferno para o mundo ocidental pois seu próprio autor teve de atravessar, em sonho, os três além-túmulos. O inferno, o purgatório e o paraíso que compõe as três partes de seu poema.
Logo na entrada do inferno, sem portas nem cadeados, há uma advertência: “Deixai toda a esperança, ó vós que entrais” O primeiro círculo era o limbo[1] que se destina para todas as almas sem batismo, sua punição, é eternidade sem a visão de Deus.
O segundo círculo seria o Bale dos ventos onde seriam feitos os julgamentos dos pecadores da luxúria por Minos, para que fossem encaminhados para o círculo correspondente aos seus pecados praticados em Terra e recebessem suas devidas punições e castigos. A luxúria era considerada o mais leve dos pecados, mesmo assim, a punição não é branda. Pois, serão arrastados pelo vento e arremessados contra as rochas do mundo subterrâneo por todo sempre.
O terceiro círculo era o Lago da Lama reservado aos pecadores da gula, ficavam atolados numa lama densa e debaixo de tempestades constantes, ficando sozinhos, sem poder falar uns com os outros, já que em vida, a alegria era pautada no conforto de comer sem limites. Os gulosos serão bombardeados por chuva, granizo e neve negra.
O quarto círculo conhecido como Colina da Rocha era o lugar dos avarentos e pródigos. Pois aqui as riquezas materiais vindas da vida terrena, se transformavam em enormes barras de ouro, que uns deveriam empurrar contra os outros, em oposição às suas atitudes em Terra.
O quinto círculo era o Rio Estige lugar para os pecadores da ira, onde a punição seria lutarem uns contra os outros na margem do rio, tendo Lúcifer[2] escondido abaixo da lama escuro.
E, ao se depararem com um de seus maiores rivais, deixa sua ira vir à tona, o que acaba marcando o início de sua transformação, pois ele buscava vingança pelo seu exílio em vida.
O sexto círculo era o Cemitério de fogo era destinado aos hereges, dentre os quais aqueles que não reconheciam a existência de Deus. Os pecadores eram confinados em túmulos abertos dos quais saiam fogo eterno, construindo um paradigma com a punição ofertada pela Igreja Católica a estes: a fogueira[3].
O sétimo círculo era o vale do Flegetonte destinado aos violentos, no entanto, existem três formas de violência, isto é, existem três vales, sendo estes, o primeiro para as almas que foram violentas com seu próximo, e o segundo voltado para os suicidas e, o terceiro para os que praticaram violência perante Deus.
Onde os assassinos são imersos no sangue que derramaram em vida terrena. Curiosamente a punição para os sodomitas e agiotas é a mesma, ou seja, ser arrastado por um escaldante deserto, sob intensa chuva de fogo por toda eternidade.
O oitavo círculo era o malleboge dividido em dez fossos, onde se pune os mais diversos pecadores, os simoníacos, ladrões hipócritas, corruptos, rufiões, sedutores, lisonjeiros, falsários e aqueles que disseminaram a discórdia em vida. Passaram o resto da vida tendo seus corpos roubados.
O derradeiro círculo é o lago Cócite que é um abismo gelado de Lúcifer, no qual se aplica a punição pelo pecado da traição, seja contra a própria família ou a pátria. O ódio dos pecadores que aqui habitam é tão potente que uns se alimentam dos cérebros dos outros.
No Círculo das Fraudes, os pecadores são separados em dez diferentes valas conforme o gênero de suas mentiras. Os hipócritas, por exemplo, são obrigados a vestir e carregar para sempre um pesadíssimo manto de chumbo.
Os criadores de intrigas sofrem ainda mais, pois, todos os dias, são trespassados por uma espada do queixo à virilha. Já os falsários são condenados a passar a eternidade sofrendo de febre e enxaqueca. E, se você costuma ser adulador de alguém, prepare-se: a punição será um mergulho perpétuo em excremento humano.
É provável que tal traição se refira a dos florentinos à sua pátria, dado que na época de Dante, e de seu exílio de Florença, a cidade era palco de lutas políticas pelo poder entre as diversas facções.
Esse nono círculo é dividido em quatro esferas correspondentes aos quatro tipos de traição: de parentes, da pátria, de hóspedes e de benfeitores. A punição para todos esses traidores é a mesma: ficar mergulhado em um lago congelado para sempre.
É a gravidade da traição que irá determinar a profundidade do mergulho no gelo. Aos traidores mais importantes (entre eles, celebridades como Judas e Brutus) restará um lugar de honra, onde são devorados eternamente pelo próprio Demônio.
Alighieri conseguiu se libertar de todos os pecados do Inferno. Ao final, Dante avistou Lúcifer e o descreveu como uma figura de três cabeças, suas asas batiam sem parar, era um lugar gélido, sem qualquer resquício de vida, que mostra o Inferno, propriamente dito, como um lugar opostamente diferente daquilo que se prega nas crenças populares.
Dante, por ter passado pelos nove círculos, deseja encontrar o caminho para Deus. No final da jornada, após também conhecer o Purgatório, um novo caminho o aguarda, para sua esperança, o Paraíso, completando assim, sua viagem pelos três além-túmulos e sua trajetória de purificação.
É exatamente no sétimo círculo onde se situa aqueles que são culpados por ter usado malícia em suas ações. Dessa forma, os violentos, situados no primeiro nível, estão os homicidas, os tirados, os violadores contumazes e os bandidos. Haveriam de viver submerso em um rio de sangue fervente, o Flegetonte, que simboliza o sangue que eles derramaram em sua longa estadia na terra.
Já os Centauros representam a violência bestial, serão seus eternos custódios. Se fosse aplicável a alegoria, poderíamos situar nesse inferno os que exerceram a violência genocida. Sem maior dificuldade, encontraríamos Gerardo Machado, Anastásio Somoza, Pérez Jiménez, Rija Pinilla, Fulgêncio Batista, Rafael Stroessner e, ainda, a horda de militares liderados por Castelo Branco em março de 1964 e, que desferiram o brutal golpe de Estado no Brasil.
O atual Presidente da República resolveu reivindicar o golpe militar de março de 1964 e, dispôs que em todos os quartéis e unidades militares se recorde essa gesta gloriosa que tanto custara a vida de milhares de pessoas na nossa pátria.
Estamos condenados a retornar aos círculos do inferno para experimentarmos o retrocesso horrendo de enaltecer a tortura e torturadores.
Em abril de 2020 a Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD) denunciou o Presidente Jair Bolsonaro ao Tribunal Penal Internacional (TPI) com sede em Haia, onde iniciou suas atividades em julho de 2002, processando e julgando pessoas acusadas de genocídio e crimes contra a humanidade e, também delitos de guerra.
Justificou a ABJD a denúncia em face do cometimento de crime contra a humanidade ao adotar atitudes irresponsáveis que, por ação ou omissão colocam a população em risco, diante a pandemia de coronavírus, responsável pela Covid-19, que provoca sintomas graves com falência respiratória que pode ser letal.
Ao publicamente relatar que a Covid-19 é “mera gripezinha”, coloca em risco além de si próprio, seus familiares e demais pessoas com as quais tiver contato. E, recentemente desautoriza o atual ministro da Saúde quanto a decisão em adquirir a vacina chinesa.
No atual cenário brasileiro temos população suficiente para lotar todos os noves círculos do Inferno de Dante, e ainda, vai haver excedente para o Purgatório.
Referências;
VASCONCELOS, Yuri. Como é o mapa do inferno? Disponível em: https://super.abril.com.br/mundo-estranho/como-e-o-mapa-do-inferno/ Acesso em 22.10.2020
BÜGER, Letícia. Os nove círculos do inferno na Divina Comédia de Dante. Disponível em: https://artrianon.com/2017/04/28/os-nove-circulos-de-dante/comment-page-1/ Acesso em 22.10.2020.
ALENCAR, Christine. Que tal uma voltinha no inferno? Disponível em: https://laparola.com.br/o-inferno-de-dante-alighieri Acesso em 22.10.2020.
NUNES, Paulo. Para qual círculo do inferno você vai? Disponível em: http://obviousmag.org/cafe_com_paradoxo/2015/para-qual-circulo-do-inferno-voce-iria.html Acesso em 22.10.2020.
[1] No limbo, Dante encontrou Ovídio, Homero, Sócrates, Aristóteles e Júlio César. Já no Lust Dante encontrou Aquiles, Paris, Tristan, Cleópatra, Dido entre outros.
[2] Etimologicamente, Lúcifer significa portador da luz e vem da junção das palavras latinas lux (luz) e fero (carregar). Acima de tudo, esse anjo rebelde teve como maior pecado sua vaidade. Basicamente, ele se deixou levar por sua beleza e alta posição na hierarquia celeste. Então, orgulhoso, ele decidiu que queria construir seu trono acima de Deus e convenceu um terço dos anjos a apoiá-lo.
[3] A fogueira das vaidades, ou em italiano: Falò delle vanità era a queima de objetos condenados pelas autoridades como causadores de pecado. A frase célebre geralmente invocada é a de 7 de fevereiro de 1497, quando os defensores do padre dominicano Girolamo Savonarola angariaram e publicamente queimaram milhares de objetos tais como cosméticos, obras de arte e livros em Florença, no última de dia carnaval.
Tais fogueiras não foram idealizadas por Savonarola, mas eram atos comumente associados aos sermões ao ar livre de São Bernardino de Siena durante a primeira metade do século.
Tais fogueiras não foram idealizadas por Savonarola, mas eram atos comumente associados aos sermões ao ar livre de São Bernardino de Siena durante a primeira metade do século.