Primeiramente, cumpre aduzir que conceituar é uma tarefa ingrata e difícil. Afinal, o conceito tem a intrincada missão em doutrina, pois se arrisca a realizá-la poderá, sem dúvida, pecar por presunção, ou por imaginar que a definição esquadrinhada é a mais perfeita e completa de todas ou simplesmente representar uma verdade jurídica absoluta.
 
Ou, ainda por omissão, acreditando plenamente que a enunciação simples demais apesar de ser a mais didática, em verdade, se traduz apenas em uma conceituação simplória.
 
Entende-se por contrato um negócio jurídico por meio do qual as partes declarantes, limitadas pelos princípios da função social e da boa-fé objetiva, autodisciplinam os efeitos patrimoniais que pretendem atingir, segundo a autonomia de suas próprias vontades.
 
Não se poderá cogitar em contrato, realmente, sem que se tenha por sua pedra fundamental a manifestação de vontade. Sem o "querer humana", conclui-se que não existe negócio jurídico. E, por sua vez, não havendo negócio, portanto, não existirá contrato.
 
É cediço que toda manifestação de vontade deverá ser acompanhada da necessária responsabilidade na atuação do contratante, derivada do respeito às normas superiores de convivência, com assento na própria Constituição Federal da República do Brasil.
 
Através da perspectiva civil-constitucional, observa-se que o contrato corresponde a espécie mais relevante de negócio jurídico, somente se afirma socialmente se entendido como um instrumento de conciliação de interesses contrapostos, manejado com vistas à pacificação social e ao desenvolvimento econômico. Conclui-se, ainda, que podemos considerá-lo como instrumento de realização e, não propriamente, de opressão. Infelizmente, não é pouco comum que um dos contraentes pretenda usar o contrato como açoite, visando subjugar o outro contraente por ser a parte economicamente mais frágil, transgredindo frontalmente a função social do contrato.
 
É importante frisar que todo contrato deverá observar a uma função social. Pois constata-se que este negócio jurídico serve como inegável meio de manifestação do direito de propriedade e, este último fora, conforme a Constituição Cidadã de 1988, devidamente socializado, ipso facto, o contrato também acabaria por sofrer idêntico processo.
 
A dicção constitucional vigente é explícita e condiciona que a livre iniciativa deve mesmo ser exercida em consonância com o princípio da função social da propriedade (art. 170,III), e, uma vez entendida que a propriedade representa assim o segmento estático da atividade econômica, portanto é razoável entender que o contrato, enquanto segmento dinâmico, implicitamente igualmente resta afetado pela cláusula da função social da  propriedade, afinal, o contrato revela-se como poderoso instrumento de circulação de riqueza, que nada mais é, do que a própria propriedade.
 
Evidentemente, tal fenômeno de socialização de institutos jurídicos do direito privado não é inédito e nem recente. Clóvis Beviláqua, ao disciplinar a temática, apesar do enfoque historicista, já sublinhava tal aspecto, e, em sua clássica obra intitulada de "Direito das Obrigações", já expôs interessante lição. 
 
O contrato é como um conciliador de interesses colidentes, e exerce uma função pacificadora dos egoísmos em luta. Sendo essa a primeira e mais nobre função social do contrato. E, o contrato corresponde ao direito, substitui a lei entre as partes, no âmbito restrito do negócio por este regulado.
Mas, o contrato não é o único fator de pacificação dos interesses, porém, é o mais geral e o mais forte, mas torna-se impossível desconhecer que também lhe cabe tal relevante função socializadora.
 
Advirto que a dimensão socializante do contrato não se restringe à noção de harmonização de interesses contrapostos. E, nem só nesse aspecto, firma-se a denominada função social.
 
Na medida que se deu o crescente processo de constitucionalização do Direito Civil, fatalmente foi necessário o redimensionamento da função social da propriedade bem como toda ideologia assentada sobre o contrato que passou a ser revista, segundo um referencial de respeito à dignidade da pessoa humana.
 
Portanto, em um real Estado democrático de Direito, o contrato somente atenderá à sua função social quando, que sem prejuízo ao livre exercício da autonomia privada, a saber:
1. respeitar a dignidade da pessoa humana, traduzida e reunida sobretudo nos direitos e garantias fundamentais;
2. admitir a relativização do princípio da igualdade das partes contratantes, somente aplicável aos contratos verdadeiramente paritários, o que atualmente são minoria;
3.consagrar uma cláusula implícita de boa-fé objetiva que está presente em todo contrato bilateral sendo impositiva de deveres anexos de lealdade, confiança, assistência, confidencialidade e informação;
4. respeitar o meio ambiente;
5. respeitar o valor social do trabalho.
 
 
Enfim, diante de todas essas circunstâncias acima elencadas e reunidas, moldam o princípio da função social do contrato, conforme prevê o artigo 421 do Código Civil brasileiro.
 
Doutrinariamente cumpre destacar que o reconhecimento deste princípio não significa a negação da autonomia privada e a da livre iniciativa. Ao revés, significa, sua reeducação.
 
Com notória desenvoltura Nelson Nery Jr, aduz in litteris:  "A função social do contrato não se contrapõe à autonomia privada, mas com esta se coaduna e se compatibiliza. À conclusão semelhante se chegou na Jornada de Direito Civil, como se pode verifica: Jornada 23: A função social do contrato, prevista no artigo 421 do Código Civil vigente, não elimina o princípio da autonomia contratual, mas atenua ou reduz o alcance desse princípio, quando presentes interesses metaindividuais ou interesse individual relativo à dignidade da pessoa humana".
 
Numa perspectiva mais estrutural, reconceituamos o contrato, com apoio de Pablo Gagliano Stolze e Rodolfo Pamplona Filho, visto genericamente como um negócio jurídico bilateral, por meio do qual as partes, visando atingir determinados interesses patrimoniais, convergem as suas vontades, criando um dever jurídico principal (de dar, fazer ou não fazer), e, bem assim, deveres jurídicos anexos e decorrentes da boa-fé objetiva e também dos deveres jurídicos anexos, decorrentes da boa-fé objetiva e do princípio superior da função social.
 
Não se poderá apresentar uma definição de contrato, doutrinariamente desligado de sua concepção ética e social.
 
A natureza jurídica do contrato, conforme já se mencionou, é uma espécie de negócio jurídico. A corrente voluntarista que tanto prestigia a declaração de vontade, é prevalente no direito pátrio, consoante o artigo 112 do CC/2002. Convém destacar que existem ferrenhas críticas dirigidas à corrente voluntarista. Pois não é verdadeira a premissa de que o declarante sempre manifesta a sua vontade dirigida a um determinado fim desejado e previamente conhecido.
 
No caso de conversão substancia (na ocorrência de medida sanatória do ato nulo ou anulável), por exemplo, as partes celebram um determinado negócio jurídico inválido, mas que, por força do princípio da conservação, poderá ser convertido em outra categoria de negócio, caso contenha os pressupostos de validade deste último (um contrato de compra e venda de imóvel, nulo por inobservância da forma pública, por exemplo, pode-se converter em promessa de compra e venda que admite o instrumento particular). E, in casu, não se pode afirmar que o negócio resultante da conversão fora pretendido e, ainda assim, não se nega a sua natureza negocial.
 
Persiste o busilis por faltar significado prático ao final, a tarefa de se saber ao certo se prevalece a vontade interna ou a vontade declarada. Caso o negócio jurídico, enquanto manifestação humana seja destinada a produzir os fins tutelados por lei, trata-se de fruto de processo cognitivo que se inicia com a solicitação do mundo exterior, passando pela fase de deliberação e formação da vontade, culminando, ao final, com a declaração de vontade, parece então que não tem como se negar o fato de que a vontade interna e a vontade declarada sejam componentes e faces da mesma moeda (ou fenômeno).
 
Portanto, conclui-se que o negócio jurídico é a manifestação de vontade emitida em obediência aos seus pressupostos de existência, validade e eficácia, com o propósito de produzir efeitos admitidos pelo ordenamento jurídico, pretendidos pelo agente. E, a esse conceito, pois, perfeitamente se subsume a noção de contrato.
 
O contrato se forma exatamente na convergência das manifestações de vontades contrapostas, concretizando o chamado consentimento.
 
A palavra contractus significa unir, contrair. Não era o único vocábulo utilizado em Direito Romano para finalidades semelhantes. Convenção, de conventio, provém de cum, venire que significa vir junto. E, pacto provém de pacis si, estar de acordo. O contrato, a convenção e pacto foram conhecidos no Direito Romano.
 
Convenção é termo mais amplo e genérico sendo aplicável a toda espécie de ato ou negócio bilateral. Já o vocábulo pacto resta reservado para cláusulas acessórias que aderem a uma convenção ou contrato, modificando seus efeitos naturais, como o pacto de melhor comprador na compra e venda e o pacto antenupcial no casamento.
 
Pacto tem sido singelamente utilizado, mas não tem a mesma acepção de contratado. Sendo utilizado para denominar um acordo de vontades sem força cogente.
 
No Direito Romano primitivo, os contratos assim como todos os atos jurídicos tinham caráter rigoroso e sacramental. As formas deveriam ser obedecidas, ainda que não expressassem em exatamente a vontade das partes. Na época da Lei das XII Tábuas, a intenção das partes estava materializada nas palavras corretamente pronunciadas.
 
A convenção e pacto eram conceitos equivalentes no Direito Romano e significavam o acordo de duas ou mais pessoas a respeito de um objeto determinado. O simples acordo, convenção ou pacto, porém, não bastava para criar uma obrigação juridicamente exigível.
 
O simples pacto não criava a obrigação. E, tal noção que é oriunda do Direito Clássico, atinge a época de Justiniano. Para que se criasse uma obrigação, havia necessidade de certas formas que se exteriorizassem à vista dos interessados. A solenidade conferia força às convenções.
 
 E, cada uma dessas convenções, sob certas formalidades, constituía um contractus. Não conhecia, assim, o Direito Romano uma categoria geral de contrato, mas somente alguns contratos em particular.
 
O elemento subjetivo da vontade só vai conseguir sobrepujar o formalismo representado pela exteriorização de fórmulas na época de Justiniano, quando de certo modo se unifica e o conceito de contrato com o de convenção. Mas, não chegou a ser uma identificação completa.
 
Afora os contratos formais, em época posterior passaram a ser conhecidas outras figuras, tais como os contratos reais (depósito, comodato, mútuo e penhor) e os consensuais (venda, arrendamento, mandato e sociedade). Posteriormente, na história romana, foram sendo reconhecidos outros pactos, que se utilizavam para certos negócios.
 
Só com Justiniano é que se confere uma ação (actio praecriptis verbis) para qualquer convenção entre as partes (contratos inominados[1]). À parte prejudicada não bastava prova a existência do contrato, devia provar que cumprira uma prestação.
 
Como vemos, a vontade era colocada em segundo plano. A proteção no direito romano dependia mais do interesse do que propriamente da vontade.
 
A intervenção do pretor mostrou-se importante no preenchimento das lacunas do ordenamento. De qualquer forma, qualquer convenção poderia tornar-se obrigatória, caso revestida de todas as formalidades legais da stipulatio. O que criou a tendência de aumentar as convenções vinculativamente obrigatórias.
 
Na fase final da codificação, já o que importava para a validade do contrato é a conventio, o acordo de vontades, ficando acima das formalidades.
 
Quando ocorreu a queda do domínio romano, o Direito Germânico é um direito menos avançado que o Direito Romano, estando dominado pelo simbolismo e pela ritualística. Para se obrigar, há necessidade de um ritual. E, tal procedimento simbólico conserva-se até a alta Idade Média.
 
As práticas medievais evoluíram para transformar a stipulatio romana em traditio cartae, o que indicava a entrega de um documento.
 
A forma escrita passou, então a ter predominância. A influência da Igreja e o renascimento dos estudos romanos na Idade Média vêm enfatizar o sentido obrigatório do contrato.
 
Os costumes mercantis dinamizaram as relações e tendem a simplificar as formas contratuais. Com a escola do direito natural, assimilam-se os pactos e convenções aos contratos.
 
A prevalência da autonomia da vontade no direito obrigacional e, como ponto principal do negócio jurídico, nos vem dos conceitos traçados para o contrato no Código francês e no Código alemão.
 
A ideia de um contrato absolutamente paritário é aquela ínsita no direito privado. Duas pessoas, ao tratarem de um objeto a ser contratado, discutem todas as cláusulas minudentemente, propõem e contrapropõem a respeito de preço, prazo, condições, formas de pagamento e todos os demais detalhamentos, até se chegar ao momento culminante que é a conclusão do contrato.
 
Nesse tipo de contrato, sobreleva-se a autonomia da vontade, sendo pautado e direcionado para quem vende ou compra, aluga ou torna alugado, empresta ou toma emprestado está em igualdade de condições para impor sua vontade nesta ou naquela cláusula, transigindo num ou noutro ponto de relação contratual para atingir o fim desejado. Convém frisar que o contrato não desapareceu.
 
Afinal, o Código Civil brasileiro de 1916 dirigia-se a este e de certa forma também o faz o vigente diploma, pois persistem em vigor as regras do Código de Defesa do Consumidor, basicamente destinadas à contratação em massa. E, tal forma clássica de contratar permanece como baluarte de direito privado naquilo que é essencial ao direito civil, ou seja, o direito do cidadão, aquele que contrata com seus iguais.
 
E, ainda pressupõe essa contratação que os bens objeto da relação jurídica sejam únicos e individualizados e inseridos dentro do patrimônio da pessoa física, preponderantemente.
 
O consentimento pressupõe a igualdade de poder entre os contratantes. Esse ideal, no fundo, jamais fora atingido.
 
É evidente que o contrato essencialmente privado e paritário ocupa hoje parcela minoritária dento do mundo negocial contemporâneo, embora não tenha desaparecido completamente. A vigente e atual dinâmica social relegou ao secundário plano o contrato paritário.
 
Normalmente se contrata com pessoa jurídica que é detentores do capital, enfim, e o próprio Estado são os que fornecem os bens e serviços para o consumidor final.
 
Os contratos são negócios de massa. O mesmo contrato, com idênticas cláusulas, é imposto a um número indeterminado de pessoas que necessitem de certos bens ou serviços. Não há outra solução para a economia de massa e para a sociedade de consumo.
 
O contrato deia de ser a peça-chave, ou seja, a ponte para se alcançar a propriedade. E, no neocapitalismo, afastado do original capitalismo surgido na Revolução Francesa, no novo direito social, há valores mobiliários, bens imateriais que constituem parcela de riqueza importante, desvinculando-se do binômio clássico riqueza-propriedade imóvel.
 
Revela-se a sociedade contemporânea por ser imediatista e consumista e os bens e serviços são aqueles adquiridos para serem prontamente utilizados e consumidos. E, rareiam os bens duráveis e, prevalecem os de natureza descartável. A economia de massa é consagrada pela mídia através dos meios de comunicação. E o que tem efetivo valor hoje não o terá amanhã e vice-versa.
 
Nesse contexto, cumpre ao jurista analisar a posição dos contratantes individuais, como aquele que é tratado como consumidor, o qual consegue, na sociedade capitalismo, ser ao mesmo tempo a pessoa mais importante e, paradoxalmente, mais desprotegida na relação negocial. A ingerência do direito público nesse relacionamento não retira do campo do direito privado esse exame.
 
O fato de o Código Civil brasileiro de 2002 mencionar que a liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato (art. 421) e estimular que os contratantes a se comportarem com probidade e boa-fé (art. 422) abrindo toda nova perspectiva dentro do universo contratual, embora os princípios já fossem plenamente conhecidos no passado. Trata-se de aplicação da moderna e nova dialética do Direito.
 
E, nesse sentido, ao contrário do que inicialmente possa parecer, o contrato e, não mais a propriedade, passa a ser o fundamental instrumento do mundo negocial, da geração de recursos e da propulsão da economia. É certo que se trata de um contrato sob novas roupagens, distante daquele modelo clássico, mas se refere realmente a um contrato.
 
Por conseguinte, neste momento histórico, não podemos afirmar que o contrato esteja em crise, e ainda que seja a crise do direito privado. A crise, em verdade, se situa dentro da própria evolução da sociedade, nas transformações sociais que exigem do jurista respostas mais céleres e eficazes.
 
O sectarismo do direito das obrigações tradicional era colocado em xeque. O novo direito privado não exige do jurista e do juiz soluções prontas e adequadas aos novos desafios da sociedade humana, daí a grande relevância do interesse social no contrato.
 
E, o direito das obrigações especialmente o direito dos contratos, que durante tantos séculos se manteve avesso às modificações de seus princípios, está, pois, a exigir maiores reflexões que refogem aos dogmas clássicos. E, nesse sentido, o CC de 2002 procurou inserir o contrato com mais um elemento de eficácia social, trazendo a básica noção de que o contrato deve ser cumprido não unicamente em prol do credor, mas principalmente como benefício não unicamente em prol do credo, mas para toda a sociedade.
 
Realmente, qualquer obrigação descumprida representa uma moléstia social e não prejudica somente ao credor ou um contratante isolado, mas toda uma comunidade.
 
 
Quando o Brasil era ainda uma sociedade predominantemente agrícola, a propriedade e o poder patriarcal desempenhavam o instrumento principal de circulação de recursos. E, essa economia apresentava aspecto estático que perdurou durante séculos e ainda mesmo perdura teimosamente em alguns cantos do nosso país. É exatamente nesses bolsões em que se instala a miséria que esse sistema insiste em alimentar. 
 
Pois a propriedade agrícola, em geral, concentra o poder e a riqueza em mãos de poucos e, quando passamos para uma sociedade dinâmica, o perfil da geração de recursos já é determinado não mais pela propriedade, mas sim, pela empresa.
 
No mundo contemporâneo, a empresa imiscui-se na vida de cada indivíduo. E, os processos econômicos explodem em pequeno espaço temporal em vários países. Afinal, com esfacelamento do mundo comunista ou socialista, a presente época transcende a tudo que se poderia imaginar com relação à nova sociedade.
 
Observa-se uns contratos com mais e outros com menor vigor, todos desejam se inserir no contexto da produção e consumo da empresa.
 
Não existindo mais as fronteiras do capital. Desta forma, veio o legislador brasileiro procurando incutir na norma a realidade vivenciada, fez presentes no Código Civil de 2002, em seu artigo 421, a limitação da liberdade de contratar e a função social do contrato o que revela a preocupação com a tutela dos interesses sociais, daqueles que vivem normalmente contratando.
 
Não se trata de mera cláusula aberta, na lição de Silvio Salvo Venosa, a função social refere-se a uma responsabilização da sociedade que não desemboca em discricionariedade do juiz, como a princípio possa parecer, mas em um constante desafio para os operadores do Direito, principalmente advogados, que terão que descobrir e apontar novos caminhos que são diversos dos princípios tradicionais aplicáveis ao direito contratual.
 
Consagra-se assim o contrato como mecanismo funcional e instrumental da sociedade em geral e, especialmente da empresa. Já se pode identificar o declínio do conceito originário de negócio jurídico pois a autonomia da vontade não mais se harmoniza plenamente com o novo direito dos contratos.
 
A economia de massa exige contratos impessoais e padronizados, doutro modo, o individualismo tornaria a sociedade inviável. E, o Estado, por sua vez, frequentemente ingressa na relação contratual privada, proibindo ou mesmo impondo cláusulas O que vem coloque em xeque o dogma do liberalismo.
 
O binômio liberdade-igualdade que bem forjou o liberalismo no direito das obrigações tende a desaparecer. Existem vontades que se impõem, quer pelo poder econômico, quer pelo poder político. Essa posição igualmente exige a dialética permanente, a argumentação, a retórica doravante sob outras e novas vestes.
 
Essa é a razão das modificações, a força obrigatória dos contratos não mais prevalece absolutamente, mas sim à luz de um dever moral de realização do bem comum e de sua finalidade social.
 
O homem atual já mais aceita o dogma no sentido de que seja justo tudo que seja livre. E, por tais premissas delineadas, deve-se entender toda a doutrina e jurisprudência do direito contratual.
 
A respeito do consentimento contratual, Orlando Gomes lecionou, in litteris: "Emprega-se em duas acepções a palavra consentimento, ora como acordo de vontades, para exprimir a formação bilateral do negócio jurídico contratual, ora como sinônimo da declaração de vontade de cada parte do contrato. Admitida nesta derradeira acepção, cogita-se em mutuo consentimento, está contida a ideia que o outro, mútuo exprime”.
 
Assim, no exame dos elementos formadores do contrato, o consentimento apresenta-se como requisito típico, conquanto exigido, igualmente, na formação de outros negócios jurídicos bilaterais. No contrato, no entanto, particulariza-se, pela circunstância de que as vontades que o formam corresponde aos interesses contrapostos.
 
Conclui-se que o consentimento ou consenso representa o núcleo do negócio jurídico contratual, formado a partir de vontades emitidas pelas partes declarantes. Sem existir tal manifestação de vontade e, ipso facto, o consentimento, o negócio jurídico será considerado inexistente.
 
Em verdade, inexiste opinião unânime sobre o significado do termo contractus para os primitivos juristas romanos. E, a tese mais sedutora é a esposada por Bonfante pois pelo vocábulo contrahere designou-se o estabelecimento de relações duradouras e, este uso ainda se mantém vivaz nas modernas línguas latinas, e, assim é que se cogita, por exemplo em contrair casamento, contrair uma doença, uma obrigação, hábitos e relações de amizade.
 
E, tais exemplos não há mera aproximação passageira, mas uma relação que se travou e permaneceu. O contrahere não supunha voluntariedade, a vontade poderia até deixar de intervir, era indiferente que tomasse parte ou não no vínculo. Nos primórdios do direito romano, a ideia de vontade e, propriamente, de acordo, era posta de lado, tidos como atributos acidentais que não caracterizam a noção de contractus.
 
Com o evoluir da história, o direito romano clássico veio a estruturar o contrato sobre a base de um acordo de vontades a despeito de um mesmo ponto. E, como tal nas sociedades antigas, a convenção por si só não tinha o poder criador de obrigações.
 
Para o direito romano, o contrato só seria possível com a existência de elemento material, uma exteriorização de forma, fundamental, na gênese da própria obligatio.
 
Primitivamente, eram as categorias de contratos verbis, re ou litteris, conforme o elemento formal se ostentasse por palavras sacramentais, ou pela efetiva entrega do objeto, ou pela inscrição no codex.
 
Somente mais tarde, com a atribuição de ação a quatro pactos de utilização frequente (venda, locação, mandato e sociedade), surgiu a categoria dos contratos que se celebravam solo consensus, isto é, pelo acordo das vontades.
 
Uma vez celebrado, com observância estrita ao ritual, o contrato gerava obrigações, vinculava as partes e provia o credor da actio, fator da mais lídima essencialidade, sem o qual não haveria direito, já que este era nada, se não fosse munido da faculdade de reclamação em juízo.  A expressão genérica conventio abrangia os contratos e os pactos.
 
Ou seja, ao lado do contractum, estruturou o direito romano outra figura, que foi o pactum.  Este, porém, não conferia às partes uma ação, mas gerava tão somente exceptiones e, portanto, não era dotado de força cogente.
 
Com a evolução, o direito romano manteve-se fiel ao princípio da tipicidade dos contratos. De sorte que somente conhecia os contratos obrigacionais, ou seja, geradores de obrigações. Um conceito muito restrito, excluindo-se ainda, os modificativos e extintivos das preexistentes obrigações. Restando distante do conceito moderno dos contratos.
 
Já na Alta Idade Média, ocorreu o encontro do direito romano com o direito germânico o que deu na formação de novos princípios e tipos contratuais.
 
Destaque-se a afirmação pela prática medieval do princípio da eficácia que não era meramente obrigacional, mas também real de certos contratos.  Sublinhe-se ainda a influência da doutrina canonista que, por motivações ético-religiosas, sustentou a relevância dos nuda pacta.
 
E, em sentido paralelo, a prática e a jurisprudência comercialistas, apoiando-se na aequitas mercatoria, tendiam à afirmação do princípio da consensualidade.
 
Durante a Baixa Idade Média surgiram três novas instituições que permitiram transformar os contratos reais em formais, através de crasso simbolismo, a saber: o dinheiro de Deus, moeda de baixo valor que era entregue por uma parte a outra e destinada a um uso piedoso, não se tratava de princípio de pagamento; o vinho do mercado, quando as duas partes entram numa taberna e bebem juntamente vinho ou outra bebida; a palmada, as duas  partes apertam a mão, ou então, o comprador dá uma palmada na face do vendedor. A palmada significa a entrega da coisa mesmo nos nossos dias, nos mercados de gado centro-europeus, a palmada é de uso corrente.
 
Do direito romano clássico até os códigos modernos há uma profunda evolução no conceito do contrato. E, durante os séculos XVII e XVIII, a contribuição doutrinária da escola jusracionalista do direito natural colocou a liberdade individual no centro de todo o sistema jurídico, espiritualizando o contrato, libertando-o das cargas ritual, simbólica e formalista que, durante séculos, cobriam a essência do fenômeno jurídico.
 
Ademais, enquanto os romanos englobavam na designação de contractus todos os atos voluntários geradores de uma obrigação, quer se tratasse de ato bilateral ou unilateral, a doutrina e as legislações modernas consideram essencial ao contrato o acordo bilateral, o mútuo consenso.
 
Outrossim, os romanos limitavam o contrato aos atos destinados a construir uma obligatio, ao passo que os códigos modernos estendem o conteúdo possível do acordo contratual a outros aspectos da relação obrigacional e a outras classes de relações jurídicas patrimoniais, não havendo dúvidas no momento atual de que os contratos são fontes, não apenas de obrigações, como de direitos reais, familiares e sucessórios.
 
A moderna acepção de contrato, tida como acordo de vontades por meio do qual as pessoas formam vínculo jurídico a que se prendem, se justifica à luz da ideologia individualista dominante na época da cristalização e do processo econômico de consolidação do capitalismo de produção.
 
O liberalismo econômico, a ideia basilar de que todos são iguais perante a lei e devem ser igualmente tratados e, a concepção de que o mercado de capitais e o mercado de trabalho devem funcionar livremente, em condições, todavia, que favorecem a dominação de uma classe sobre a economia considerada em seu conjunto, permitiram fazer-se contrato o instrumento jurídico por excelência da vida econômica.
 
O grande código da Idade Moderna, o Código de Napoleão de 1804 e o primeiro dos códigos burgueses, associava o contrato à liberdade e o conectava, em um biônimo indissolúvel, ao direito de propriedade (categoria-chave do sistema jusprivatístico).
 
O contrato seria o instrumento técnico-jurídico adequado de transferência da riqueza das classes vencidas para a nova classe nascente.
 
Mediante o igualitário acesso à propriedade, pela via do contrato, a propriedade se liberta dos pesos de origem feudal que o impedem o seu uso capitalista, adentrando também o bem no ciclo e na dinâmica produtiva.
 
No Código Civil alemão (BGB) de 1896 a disciplina do contrato foi organizada de forma distinta da organizada no Code Napoléon.
 
Na Alemanha, a categoria do contrato é construída no interior de uma categoria mais geral, compreensiva do contrato de outras figuras. Tal categoria é o negócio jurídico, que foi elaborada pela Escola Pandectística. Refere-se a um modelo abstrato, originariamente definido como uma declaração de vontade dirigida a produzir efeitos jurídicos, por isso, a ideia de ser a lei entre as partes.
 
Na base deste conceito, acolhido pelos pensamentos jusnaturalistas e iluministas, cristaliza-se o dogma da vontade, voltado a proteger de forma mais robusta a liberdade e a espontaneidade do querer de quem realiza o negócio.
 
A teoria do negócio jurídico representa um aperfeiçoado e formidável instrumento ideológico funcionalizado aos interesses da burguesia e ao capitalismo, ao propor a equiparação formal dos sujeitos jurídicos, ocultando a concreta posição econômico-social dos contratantes.
 
Com razão leciona Joaquim de Sousa Ribeiro que destaca apenas a relação vertical existente entre o sujeito de direito, que emite a declaração e, o ordenamento jurídico que a reconhece. Ignora-se a vontade do titular de interesses contrapostos.
 
Sendo a liberdade contratual pensada isoladamente, sem se considerar a igual liberdade do outro, o sistema despreza qualquer limite imanente à liberdade daquele que detém o poder contratual, importa é a sua capacidade para a prática do negócio jurídico, afinal as pessoas são tratadas, em termos abstratos, como declarante/declaratário, credor/devedor, sem se retirar a máscara dos concretos papéis que as diferenciam no domínio de operações econômicas e das relações sociais.
 
E, dentro de tal visão unidimensional de contrato, consagrou-se a concepção puramente procedimental de justiça, sendo esta automaticamente garantida com o exercício do ato de liberdade, de acordo com a máxima "quem diz contratual diz justo".
 
A essa crença na intrínseca justiça do mecanismo contratual reflete-se no postulado de que, conforme enunciava Kant: "quando alguém decide alguma coisa a respeito de um outro é sempre possível que este faça àquele algum tipo de injustiça, mas toda injustiça é impossível quando ele decide por si próprio".
 
A vontade como centro principal do contrato, articulada à regra da igualdade dos contratantes (pela absolutização do indivíduo como "eu" metafísico sem vínculos históricos), obriga a reconhecer que tanto o legislador como juiz lhe devem fiel observância, não podendo intervir naquilo que houver sido pactuado.
 
O que é desejado pelas partes, nesta medida, é obrigatório. Assim, o contrato constitui um instrumento de autolimitação da liberdade individual e, portanto, só pode justificar-se desde que fundado no consentimento dos indivíduos, que assim se tornam relativamente menos livres em face da força obrigatória do vínculo entre eles voluntariamente formado.
 
Na segunda metade do século XIX, e, sobretudo, no século XX, aparecem reações contra a concepção individualista e liberal da teoria dos contratos: os abusos da liberdade contratual são denunciados por pensadores socialistas como Comte, Saint-Simon e Karl Marx, que se insurgem contra a ausência total de proteção dos fracos.
 
Surgem leis regulamentando as relações de grupos a grupos, como as convenções coletivas de trabalho; não apenas no direito social, mesmo o indivíduo isolado vê a sua liberdade cada vez mais limitada por contrato de adesão e cláusulas contratuais gerais.
 
Assim, em termos de civil law, as querelas doutrinárias acerca dos contratos ocorrem há mais de dois mil anos (glosadores versus pós-glosadores versus humanistas), na modernidade, na jurisprudência de conceitos versus a jurisprudência de interesses, na Alemanha do século XIX.
 
Historicamente, o tipo de norma jurídica esculpida no civil law é estrutural, as normas estabelecidas dogmaticamente de acordo com os direitos e deveres das partes (tal como o código francês e o alemão). Afinal, nesse modelo, a função da ciência do direito era interpretar o texto gramaticalmente, sistematicamente, de sorte a orientar as cortes em sua tarefa de dirimir controvérsias.
 
Os maiores civilistas tais como Domat e Pothier, em França e, Savigny e Windsheid, na Alemanha, formaram-se amparados nessa tradição e desenvolveram o que se convencionou chamar de modelo clássico de direito contratual.
 
A desconstrução de tais postulados ocorreu durante o século XIX deu lugar a uma reconceituação do contrato. Seja pela consolidação das ciências sociais como o estudo interdisciplinar da sociologia e da economia, como pela maturidade democrática alcançada pelos países ocidentais no século XX.
 
O contrato começa a se deslocar de definições genéricas em direção a regras funcionais e promocionais. Afasta-se o contrato da visão voluntarista, sendo agora encarado de forma objetiva, mais como um meio concedido pelo ordenamento jurídico para a produção de efeitos jurídicos do que propriamente um ato de vontade.
 
A primeira reação surgiu por conta de concepções normativistas ou preceptivistas do contrato, visualizado como comando concreto pelo qual o ordenamento jurídico reconhece a eficácia vinculante.
 
Para Betti, a tônica do contrato não se encontra nos direitos e nas obrigações criadas pelos contratantes, mas no regulamento de interesses instituídos pelo acordo, equiparando-se o contrato às normas jurídicas.
 
Essencialmente, o contrato seria um ato normativo, o mais genuíno expoente da autonomia privada, pois através deste instrumento as partes concebem as normas reguladoras de seus conflitos de interesses.
 
Camerino entendia que o dogma da vontade não passava de um preconceito decorrente de um individualismo excessivo. Afora isso, a característica da obrigação não poderia estar na vontade das partes, pois estas visam a fins diferentes, quando na verdade o que enaltece os contratos não é o antagonismo, mas sim., a colaboração dos consorciados. Enquanto o direito real resolve um problema de atribuição de bens no direito obrigacional se resolve um problema de cooperação.
 
A concepção objetivista ou preceptivista do contrato não ficou imune às críticas e, as regras nascidas das cláusulas contratuais, destinadas a regular pontualmente os interesses concretos dos dois contraentes, não podem ser equiparadas às normas jurídicas, que visam disciplinar, em termos abstratos, os conflitos duma generalidade mais ou menos ampla de pessoas. 
 
Enquanto que as normas jurídicas podem ser alteradas por nova lei, com eficácia retroativa, o mesmo não sucede com as cláusulas contratuais, cuja interpretação e integração se realiza à luz do direito vigente na data da conclusão do contrato.
 
Se as partes, por acordo, alterarem a convenção por estas anteriormente estabelecida, é do novo contrato, e não do precedente, que a alteração procede, ao invés do que sucede se uma nova lei imperativa modificar o seu conteúdo.
 
Criticável é o unilateralismo peculiar das concepções subjetivistas ou voluntaristas e preceptivas (normativas) do contrato. A transformação do negócio jurídico em norma, seria artificial, pois a norma jurídica requer uma situação em que um agente se coloque super partes – tal como na sentença, mas no contrato que é inter partes.
 
Da autonomia privada objetivamente surgirão relações jurídicas e não propriamente preceitos, sendo que a relação jurídica - regulamento emanado do contrato nunca será normativa. Assim, filia-se o autor a uma terceira via, a concepção estruturalista do negócio jurídico e, portanto, do contrato.
 
E, nessa definição não se procura saber como o negócio surge, nem como este atua, porém simplesmente o que este é. Deixando-se de lado, a vontade, a psique (genérica do contrato), ou mesmo o autorregramento e a sociedade (função do contrato). Como fato jurídico concreto, o contrato é um fato jurídico consistente em declaração de vontade, a que o ordenamento jurídico atribui os efeitos designados como desejados.
 
E, por isso mesmo, num contrato, não há como as vezes se afirma, duas ou mais declarações de vontade, há neste mais de uma vontade e mais de uma manifestação de vontade, mas estas manifestações unificam-se em uma só declaração, que juridicamente será só um fato jurídico.
 
Por outro lado, sendo a declaração de vontade um ato que, em virtude das circunstâncias em que se produz, é visto socialmente como dirigido à produção de efeitos jurídicos, o direito segue a visão social e encobre aquele ato com o seu manto, atribuindo-lhe normalmente os efeitos que foram manifestados como desejados e pretendidos.
 
Realmente a concepção estruturalista é mais ampla e abriga a discussão de questões fáticas relativas a definição de contrato. Assim, o contrato se liberta do rigor dogmático, dos textos legais e da tradição do direito, assumindo um necessário pragmatismo.
 
Com efeito, segundo Enzo Roppo, percebe-se a distinção entre a operação econômica em sua materialidade, o contrato e o direito dos contratos.
 
O contrato traduz a formalização de uma operação econômica, um fato. Já o direito dos contratos é historicamente mutável e evolutivo composto de regra e princípios que conformam o modelo jurídico de contratos. Destarte, onde não existe operação econômica e, portanto, circulação de riqueza, inexiste contrato.  Porém, poderá existir operação econômica mesmo sem contrato, isto é, a transferência de riqueza não medida pelo instrumento contratual, tal como nas relações contratuais de fato.
 
Assim, conclui-se, que o direito contratual é consectário de objetivos políticos e ideológicos e orienta as operações econômicas, segundo as valorações variáveis quanto ao local e ao tempo. Cristino Chaves de Farias e Nelson Rosenvald exemplificaram que no Brasil e no Irã existem operações econômicas de comercialização de bebidas alcoólicas.
 
Em ambos países os contratos se instrumentalizam. Porém, no Brasil, o contrato é válido e eficaz, pois o direito contratual não sanciona como ilicitude. O mesmo já não se pode afirmar sobre o direito contratual iraniano.
 
 
As relações contratuais de fato representam nova categoria dogmática e, tem como um de seus principais alicerces a noção de que, na contemporânea sociedade de massas, segundo as concepções de tráfico jurídico, existem condutas geradoras de vínculos obrigacionais, fora da emissão de declaração de vontade que se dirijam à produção de tal efeito, antes derivadas de simples ofertas e aceitações de fato.
 
Significando, a utilização de bens ou serviços massificados ocasiona algumas vezes comportamentos que, pelo seu significado social típico, produzem as consequências jurídicas de uma caracterizada atuação negociatória, mas que desta se distinguem.
 
(In: COSTA, Mário Júlio de Almeida. Direito das Obrigações, op. cit., 202)
 
Completamente avesso ao formalismo e à dogmática contratual se posiciona os EUA, e o chamado modelo clássico de direito contratual constantemente é atacado por duras críticas nas últimas três décadas.
 
E, dentre as variadas abordagens e perspectivas do direito contratual, prevalece o paradigma de Direito e Economia, consubstanciado na aplicação de conceitos nucleares da economia ao direito contratual, inaugurado por Ronald Coase, Richard Posner, Robert Cooter e outros.
 
E, ainda, sob o enfoque da Law and Economics, o contrato não é um elo solidário entre pessoas vivendo em sociedade, mas sim, uma transação de mercado na qual cada parte se comporta de acordo com os seus interesses, como se estivessem em um jogo, armando a sua estratégia.
 
Não é desconsiderada a existência de interesses, como se estivessem em um jogo, cada qual, armando sua estratégia. Também não é desconsiderada a existência de interesses coletivos dignos de tutela, mas estes se identificam, na estrutura do mercado subjacente ao contrato que está sendo celebrado.
 
Ou seja, a sociedade não é representada pela parte mais frágil do contrato, mas por um grupo ou cadeia de pessoas integrantes de um específico mercado.
 
Pelo contrato, os indivíduos realizam investimentos e fazem surgir o pleno potencial das trovas através da especialização. A essência do contrato é, pois, uma promessa de salvaguarda do ambiente institucional.
 
Para Richard Posner, “o único critério possível para a definição do que representa a análise econômica do Direito é a utilidade, não a precisão.
 
O propósito de se destacar um campo delimitado e chamá-lo de análise econômica do Direito é identificar uma área da pesquisa econômica na qual o conhecimento substancial do Direito, em seus aspectos tanto doutrinários quanto institucionais, possa ser relevante” (O movimento análise econômica do direito. (In: Correntes contemporâneas do pensamento jurídico, op. cit., p. 276).
 
A indubitável contribuição da Law and Economics à construção de renovados fundamentos teóricos do direito dos contratos, principalmente em face de nações globalizadas tais como o Brasil.
 
Primeiramente por constatar que o contrato como um fato social, proporciona uma interdisciplinaridade, consubstanciando forte diálogo com a Economia que é uma ciência descritiva metodologicamente preparada para observar e mensurar as operações patrimoniais do tráfego jurídico.
 
Segundo, por proporcionar à ciência do direito contratual, ou seja, a doutrina um paradigma diverso da tradicional e majoritária abordagem da função social do contrato.
 
Em análise econômica do direito, o benefício deferido pelos contratos em favor da sociedade não será consequência da aplicação indiscriminada do princípio da justiça substancial pelos julgadores, como por exemplo, a proteção da parte mais frágil do negócio jurídico em face de cláusulas abusivas, lesão ou usura, mas sim, da construção de um espaço público que permita o desenvolvimento de mercado plural, competitivo e imune aos oligopólios e à assimetria de informações lesivas aos consumidores.
 
Trata-se de um franco incentivo à eficiência, capaz de conferir segurança jurídica e previsibilidade às operações econômicas e sociais, acautelando as expectativas dos agentes econômicos e reflexamente beneficiando a coletividade pela redução de custos e pela ampliação de transações econômicas.
 
O grande mérito da análise econômica do direito reside em uma alternativa à explicação da causa do contrato, de seu papel perante a sociedade em um ambiente de mercado, mas não de sua essência.
 
Novamente, inspirados na opinião de Antônio Junqueira de Azevedo, podemos dizer que o desiderato de eficiência e utilidade máxima, com acréscimo de riqueza, corresponderia a um meio de correção do contrato, através de correções das falhas do mercado, no sentido de se potencializar a sua eficácia. Porém, a causa não faz parte do contrato, jaz independente de sua função social.
 
 
Para se construir uma concepção de contrato, a partir da demonstração do conflito entre as teorias e paradigmas, sejam estes formalistas, voluntaristas, normativistas, estruturalistas ou economicistas, com Enzo Roppo apud Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald, o contrato é a veste jurídico-formal das operações econômicas. Sendo estruturalmente fato jurídico, em adaptação ao conceito esculpido por Antônio Junqueira, compreende-se o contrato como todo fato jurídico consistente em declaração de vontade, a que o ordenamento jurídico confere os efeitos designados como queridos pelas partes, respeitados os pressupostos de existência, validade e eficácia que são impostos pelo sistema jurídico que sobre este incide.
 
 
 
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GiseleLeite
Enviado por GiseleLeite em 25/03/2020
Reeditado em 12/04/2020
Código do texto: T6897031
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