O habeas corpus tem sua origem no Direito Romano, em que todo cidadão podia reclamar a exibição do homem livre detido ilegalmente por meio de uma ação privilegiada, conhecida por interdictum de libero homine exhibendo.
Uma parte da doutrina, porém, aponta sua origem no Capítulo XXXIX da Magna Carta, outorgada, na Inglaterra, pelo rei João Sem Terra, em 1215. O artigo 48 explicitamente mencionava: “Ninguém poderá ser detido, preso ou despojado de seus bens, costumes e liberdade, senão em virtude de julgamento por seus pares, de acordo com as leis do país”.
Sob domínio de Carlos I, que pretendia governar sem leis e sem nobreza, a campanha dos ingleses pela liberdade recomeçou. Detestado por seu excessivo autoritarismo e arbitrariedade, chegou a impor determinado imposto geral e sistemático, denominado ship money, o que acarretou uma série de protestos da nobreza, que foram repelidos com violência e prisões ilegais.
Tal situação perdurou até o movimento de oposição que determinou posteriormente a chamada Petition of Rights (Petição de Direitos) que foi uma declaração formal redigida por Thomas Wentworth onde foram novamente afirmadas as liberdades públicas fundamentais e o respeito às leis de habeas corpus. Textualmente afirmava: We must vindicate our ancient liberties, we must reforce the laws made by our ancestors"[1].
O rei, na ocasião, viu-se obrigado a dar seu consentimento expresso à Petição de Direitos em 1628, o que representou uma significativa conquista em defesa dos direitos individuais. Porém, mesmo depois, as ordens de habeas corpus eram denegadas constantemente, ou, o que era ainda pior, simplesmente desobedecidas.
De sorte que as reivindicações libertárias continuaram e, em 1679, sob o reinado de Carlos II surgiu o Habeas Corpus Act[2] consagrando definitivamente o writ, reconhecido como remédio eficaz para promover a soltura ou liberação da pessoa ilegalmente presa ou detida.
Entretanto, o writ limitava-se a atender pessoas acusadas de crime, não se reconhecendo aplicação nos demais casos de prisão ilegal.
Convém alertar que as leis inglesas, desde a Magna Carta até o Habeas Corpus Act serviram de base à Constituição dos EUA, em 1778, a qual referiu-se diretamente ao habeas corpus, afirmando que esta garantia só poderia ser suspensa para garantir a segurança pública, no caso de rebelião interna ou invasão.
Em 1789, o habeas corpus fora incluído na Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão. E, em 1816, surgiu outro Habeas Corpus Act ampliando o anterior e, alcançando qualquer ofensa à liberdade dos indivíduos, ainda que não acusados de qualquer crime.
O habeas corpus encontra-se presente em quase todas as legislações do mundo. E, entrou pioneiramente na legislação brasileira, de forma expressa com a promulgação do Código de Processo Penal, de 1832, cujo o artigo 340 dispunha in litteris:
“Todo cidadão que entender que ele ou outrem sofre uma prisão ou constrangimento ilegal em sua liberdade, tem direito de pedir uma ordem de habeas corpus em seu favor.”.
Aliás, para Pontes de Miranda, o writ já constava implicitamente no direito pátrio desde a Constituição Imperial de 1824, que em seu artigo 179, §8º preceituava que: "Ninguém será preso, sem culpa formada, exceto nos casos declarados em lei e, nestes, dentro do prazo de 24 horas contadas da entrada na prisão sendo em cidades, vilas e outras povoações próximas aos lugares da residência do juiz e, nos lugares remotos, dentro de um prazo razoável, que a lei marcará, atenta à extensão do território, o juiz por uma nota por ele assinada, fará constar ao réu o motivo da prisão de seu acusador e os das testemunhas, havendo-as."
Fernando Capez noticia que a primeira forma conhecida no ordenamento jurídico pátrio foi a habeas corpus liberatório que visa fazer cessar um constrangimento à liberdade ambulatória.
E, mesmo com as grandes alterações introduzidas no CPC de 1832 estendeu-se o remédio heroico também àqueles casos em que o cidadão simplesmente se encontrava ameaçado na sua liberdade de ir e vir considerando-se a figura do habeas corpus preventivo.
Finalmente com a primeira constituição republicana no Brasil, em 1891, o habeas corpus é citado explicitamente pela primeira vez dentro do bojo constitucional, no artigo 71, §22º. Quando se cogitou em dar-se o habeas corpus ao indivíduo que estivesse para sofrer ou na iminência de perigo de sofrer violência ou coação, por ilegalidade ou abuso de poder.
Aliás, foi diversa a interpretação do dispositivo legal feita por Pedro Lessa e Rui Barbosa o que gerou uma famosa polêmica. Pois Lessa sustentava que o writ se limitava à defesa da liberdade de locomoção, não podendo ser empregado para a defesa de outros direitos líquidos e certos.
Já Rui Barbosa, por sua vez, entendia que no silêncio do texto constitucional, não se admitia a interpretação restritiva do remédio heroico, podendo o mesmo ser usado para defesa de qualquer direito.
Verificou-se que a tese de Rui Barbosa[3] se sagrou vitoriosa e prevalente no STF, que passou a interpretar amplamente o habeas corpus.
A reforma constitucional brasileira de 1926 esvaziou a discussão, restabelecendo a finalidade clássica do writ qual seja a tutela exclusiva da liberdade ambulatória. O artigo 72, §22º ficou com a seguinte redação: Dar-se-á habeas corpus sempre que alguém sofrer violência por meio de prisão ou constrangimento ilegal na sua liberdade de locomoção".
Com a Constituição brasileira de 1934 foi novamente suprimida a expressão "locomoção" pois o artigo 113, XXIII mencionava: "...violência ou coação em sua liberdade, por ilegalidade ou abuso de poder".
Entretanto, antes que se entabulasse nova discussão, o mesmo artigo 113, no inciso XXXIII, criou o instituto de mandado de segurança[4], com finalidade residual. A Constituição de 1946, em seu artigo 141, inciso XXIII, manteve o habeas corpus restrito à tutela da liberdade de ir e vir.
A Carta Constitucional de 1967 tratou do instituto no artigo 150, §20º e EC 1/1969 disciplinou-o no artigo 153, §20º sempre restrito à defesa da liberdade de locomoção. E, atualmente na Constituição Cidadã prevê o habeas corpus está previsto no artigo 5º, LXVIII, com interpretação restritiva.
O conceito de habeas corpus é de remédio judicial que tem por fim evitar ou fazer cessar a violência ou a coação à liberdade de locomoção decorrente de ilegalidade ou de abuso de poder.
Sua natureza jurídica é de ação penal popular com base constitucional, voltada à tutela da liberdade ambulatória, sempre que ocorrer os casos elencados no artigo 648 do CPP.
Nas hipóteses dos incisos II, III, IV e V assume função de autêntica ação penal cautelar. E, nos incisos VI e VII, funciona como ação rescisória (ou constitutiva negativa), se a sentença já tiver transitado em julgado, ou como ação declaratória, se o processo estiver em andamento. Assim, percebe-se, no inciso I, poderemos ter ação cautelar, declaratória ou constitutiva, dependendo do caso concreto.
Há duas espécies de habeas corpus, a saber: liberatório ou repressivo: destina-se a afastar o constrangimento ilegal efetivado, à liberdade de locomoção; a espécie preventiva que se destina a afastar a ameaça à liberdade de locomoção. Assim, in casu, corresponde a um salvo-conduto[5].
Quanto à legitimidade ativa para o habeas corpus, cabe: pode ser impetrado[6] por qualquer pessoa, independente de habilitação legal ou representação de advogado, sendo até dispensada a formalidade de procuração.
Desta forma, a analfabeto pode impetrar, desde que alguém assine a rogo; também o Promotor de Justiça também poderá propor, conforme o artigo 32, I da Lei Orgânica do Ministério Público (Lei 8.625/1993); poderá ser impetrado por pessoa jurídica e pessoa física.
Quanto a impetração por pessoa jurídica há dois posicionamentos, uma admitindo e outro não admitindo.
Porém, o juiz de direito não poderá impetrar em razão do princípio da inércia da jurisdição, mas poderá, na qualidade de cidadão. Também o Delegado de Polícia poderá impetrar, porém, não como autoridade, mas como cidadão.
Quanto a legitimidade passiva prevalece o entendimento de que pode ser impetrado contra ato particular posto que o texto constitucional cogita apenas em coação por abuso de poder, mas também por ilegalidade. Exemplificou Fernando Capez, o caso de filho que interna pais em clínicas psiquiátricas para livrar-se da obrigação de cuidar deles.
É cabível contra juiz de direito, o promotor de justiça e o delegado de polícia.
Já houve quem dissesse que o pior da ditadura, não é o que ocorreu durante, nem o tanto que se padeceu por causa dela, mas principalmente pelo que se herda dela. Quando a maioria da primeira turma do STF, em 7.8.2012, negou a jurisprudência do próprio tribunal ao deixar de admitir o habeas corpus impetrado como substitutivo de recurso ordinário, posto que significasse uma burla ao sistema recursal previsto constitucionalmente.
E essa decisão proferido foi sendo reproduzido pela mesma turma em outros casos concretos, e foi capaz de ganhar a adesão unânime da quinta turma do STJ, conforme se vê do inteiro teor do HC 239 550/RJ, a qual endossando o argumento exposto no leading case da primeira turma do STF, ressaltou que a então nova decisão impunha a premente necessidade de se reformular a admissibilidade da impetração originária também no STJ, adequando-se à nova orientação da Suprema Corte, em consonância perfeita com os princípios constitucionais, principalmente o devido processo legal, da celeridade, da economia processual e ainda o da razoável duração do processo, a fim de que não seja conhecido o habeas corpus, um remédio heroico, como substitutivo do recurso ordinário, sem prejuízo, de eventualmente, e se for o caso, deferir-se a ordem de ofício, nos feitos em trâmite.
A guinada jurisprudencial se iniciou especialmente quando se percebe que o habeas corpus é simplesmente uma das pedras basilares de todo o mundo livre, essa nova interpretação liderada pela maioria da primeira turma do STF, trouxe a ressurreição da tese jurídica sustentada francamente pela ditadura militar de 1964.
Entre os fundamentos para justificar os argumentos da maioria da primeira turma do STF, temos:
1. a competência do STF rege-se por sistema de direito estrito, não admitindo a possibilidade de ser ampliada até as situações extravasem aos limites exatos e fixados e, portanto, o uso do habeas corpus como substituto de recurso ordinário viola gravemente o sistema recursal prevista pelo texto constitucional vigente. Em síntese, o habeas corpus substitutivo de recurso não está previsto na Constituição brasileira vigente.
2. Ademais o referido substitutivo é resultado da construção jurisprudencial, e fora admitido quando não existia sobrecarga de processos, hoje registrada tanto no STF como no STJ, razão pela qual os referidos tribunais estão com elevado número de habeas corpus, e tal desvirtuamento tem pernicioso efeito nos tribunais superiores, diante de suas funções precípuas, quais sejam, o controle a infraconstitucionalidade e da constitucionalidade[7]. Assim, o STJ seria o órgão a dar a última palavra na interpretação de lei federal, ao passo que o STF seria o guardião da Constituição, e ipso facto, também da interpretação constitucional.
3. O entendimento prevalente no sentido de se conhecer de habeas corpus substitutivo de recurso contrasta com os meios de contenção de feitos processuais, além, da imposição recente de filtros tais como a súmula vinculante[8] e a repercussão geral, com a finalidade de viabilizar o exercício pleno, pelo Supremo Tribunal Federal, da nobre função de guardião da Carta Magna.
4. Reclamam os ministros que o habeas corpus no Brasil tem obtido um uso desvirtuado principalmente por não atacar somente prisões, mas diversos tipos de nulidades com efeitos no direito de ir e vir banalizando-se o remédio heroico.
5. A inadmissibilidade[9] do habeas corpus como substitutivo de recurso ordinário, em tese, não origina prejuízo a qualquer paciente, pois que continuaria sendo possível a concessão da ordem, se couber, de ofício, nos habeas pendentes.
6. A utilização do habeas corpus substitutivo de recurso abre a oportunidade para a má-fé processual, pois é cômodo não interpor o recurso ordinário quando se pode, a qualquer momento, buscar infirmar a decisão há muito tempo proferida, mediante o denominado habeas corpus substitutivo, galgando-se, assim, a passagem do tempo, e chegando até mesmo, na prescrição.
Os doutrinadores Paulo Bonavides e Paes de Andrade alertam que o esquecimento é o verdadeiro adubo da tirania, portanto, é curial resgar a tradição jurídica que avessa aos formalismos vieram a desnaturar o habeas corpus, desviando-o de suas nobres finalidades.
Afinal, o indivíduo constrangido ilegalmente em sua liberdade, podia invocar o remédio da lei em qualquer altura na escala judiciária.
Assim, não havia uma instância específica em matéria de habeas corpus. E, a única restrição a essa autoridade consiste na regra, incorporado afinal ao direito positivo brasileiro pela Lei 2.033, de 1871 em seu artigo 18, segundo a qual ‘a superioridade do grau na ordem da jurisdição judiciaria é a única, que limita a competência da respectiva autoridade em resolver as prisões feitas a mandado das mesmas auctoridades judiciaes. (...).
Desse modo, a vítima de constrangimento ilegal por ato de juiz inferior tinha o arbítrio de transpondo as jurisdições intermediárias, procurar imediatamente o abrigo legal na mais eminente.
Segundo Rui Barbosa este regramento de competência do habeas corpus fora recepcionado integralmente pela Constituição brasileira de 1891, em seu artigo 83, sendo uma das mais importantes conquistas liberais da monarquia brasileira.
Seguindo essa lógica, veio o Decreto 221 de 1894, que especificou as hipóteses de competência do STF, para processamento e julgamento do remédio heroico, disseminando-se na monarquia, prevendo expressamente ainda, o cabimento geral do processamento e julgamento do habeas corpus pelo STF sempre que houvesse o perigo de consumar-se a violência antes que o outro juiz ou tribunal pudesse conhecer do pedido.
Tamanho instrumento libertário se constitucionalizou em 1934, tendo sido preservado pela Carta de 1937, ainda que formalmente, e depois também na Constituição de 1946 e, também na Carta Magna de 1967.
Todavia, com o AI - 6 de 1.2.1969 introduziu-se em complemento ao contido no artigo 114, II da CF/1967 de tal modo que passou a ter a seguinte redação in litteris: "Dê-se ao offendido o arbitrio de procurar, quando possa, o tribunal menos frágil; mas não se lhe tire o de valer-se dos outros quando aquelle, pela distancia, ou por qualquer obstaculo, não estiver ao seu alcance."
Dessa forma, mesmo no período mais agudo da história brasileira, na ditadura militar de 1964 rompeu-se drasticamente a interpretação libertária[10] antes existente desde nossa monarquia, e que sempre persistiu em todos os textos constitucionais posteriores, inclusive no bojo da Carta de 1967 conquanto no período do Estado Novo a eficácia da garantia constitucional do habeas corpus a tenha sido quase que anulada na prática.
E, relativo ao efeito da ruptura em análise, esclarece o advogado criminalista e professor Alberto Zacarias Toron[11] que "a vedação da utilização do habeas substitutivo do RHC a tramitação do remédio heroico passou a ser mais lenta pois interposto o recurso no Tribunal de origem, haveria de se aguardar as contrarrazões do Ministério Público e a remessa dos autos à Capital Federal, coisas ainda hoje comumente demoradas".
Conclui-se que ocorrera a ressurreição do famigerado Ato Institucional 6/1969 através do STF em pleno século XXI o que torna contemporânea e pertinente a argumentação redigida por Rui Barbosa em 1892 quando registrou publicamente as lições de liberdade do Imperial Conselho de Estado em repreensão ao amesquinhamento do habeas corpus causado pelo STF de 1891.
Realmente, adota ressureição e torna o guardião da Constituição Cidadã merecedor da maioria das críticas dirigidas e publicadas há pelo menos de cento e vinte anos. Aliás, Rui Barbosa relata quatro casos, de 1851, 1878, 1880 e 1883 nos quais os cidadãos foram presos administrativamente, e ao contrário do que fez o STF republicano de 1891, o Tribunal de Relação da Bahia em 1851, o Superior Tribunal de Justiça (1878), e os Tribunais de Relação do Rio de Janeiro (1880) e do Recife (1883) todos se deram por competentes e concederam a ordem de habeas corpus afastando as prisões administrativas.
Enquanto que o Conselho de Estado que era sempre suscitado para resolver conflito de atribuição entre Judiciário e Administração confirmou as ordens de habeas corpus, sendo que o Aviso de 22.10.1883, consolidando o controle das prisões administrativas pelo habeas corpus, merecendo dar destaque in litteris:
“(...) Sua Majestade o Imperador, conformando-se (...) com o parecer da maioria dos signatários da consulta das seções de justiça e fazenda do Conselho de Estado (...), houve por bem declarar que nenhuma providência cabe ao governo dar sobre o assunto; porquanto o recurso do habeas corpus, já por sua natureza, já pelas disposições expressas do art. 340 do Código Criminal e art. 18 da Lei 2.033, de setembro de 1871, é admissível contra toda a pressão ou constrangimento ilegal, qualquer que seja o motivo, que o determine, e qualquer que seja a autoridade de que dimanem, salvo as exceções previstas no art. 18, entre as quais não compreende a prisão administrativa[12] (...)”.
Com relação a competência para processamento e julgamento do habeas corpus. À exceção da limitação de 1871, já mencionada, no Império brasileiro era trivial o entendimento de que qualquer autoridade judicial poderia apreciar o pedido de ordem de habeas corpus, residindo exatamente aí a grande ironia o Supremo Tribunal da Constituição Cidadã, que tantos serviços de inestimável valor tem prestado desde 1988 à nossa República, pela maioria de sua primeira Turma invade as catacumbas do Regime Militar em pleno século XXI para ressuscitar a razão jurídica de um Ato Institucional que simplesmente rompeu, quando passou a vigorar, com pelo menos um século de tradição libertária em matéria de habeas corpus brasileiro.
O uso tão profuso do habeas corpus nos Tribunais Superiores parece traduzir uma desordem, mas de fato, tudo está em ordem. Goffredo Telles Junior[13] apoiado em Henri Bergson[14], brilhante filósofo francês e Prêmio Nobel de literatura, esclarece que a desordem não é o contrário da ordem, conforme se costuma pensar. Ela é, isto sim, uma ordem contrária a outra ordem.
Bergson foi quem revelou a natureza verdadeira de desordem. Foi o referido filósofo inglês quem demonstrou a falsidade com que a questão da desordem é geralmente apresentada e deduzida.
Desordem, segundo Bergson, é o nome dado à ordem não desejada, não querida e não procurada. É o nome da ordem que desagrada, desgosta, decepciona, prejudica, infelicita e desola. Mas a desordem é sempre uma ordem, eis que precisa ficar bem claro.
E, Telles relembra a imagem de ruínas causadas por incêndio ou outra catástrofe qualquer, demonstrando, porém, que escombros e destroços na verdade estão em ordem por serem os efeitos certos de causas certas.
Eis o erro primordial da maioria da primeira turma do STF, este excesso de habeas corpus impetrados junto aos Tribunais Superiores, visto pelos Ministros como desordem, em realidade, significa que nada mais existe que uma ordem. Pois é o efeito certo de causas certas.
Uma ordem que realmente infelicita demais vários Ministros, ao ponto de gerar o renascimento de tese jurídica do regime autoritário.
Tal ordem que desagrada aos Ministros por alegado em excesso e por denunciar a desorganização no andamento dos trabalhos, de outro lado, constitui o plausível respiradouro de muitos brasileiros encarcerados, na maioria esmagadora das vezes em locais deveras insalubres e submetidos a processos criminais muitas vezes com uma defesa deficiente ou praticamente ausente.
O excesso de encarcerados, que de 2002 a 2011 mais que dobrou saltando para o oceano de mais de meio milhão, é sem dúvida, um fator determinante para tantos habeas corpus impetrados e, ainda, o relatório da Defensoria Pública de São Paulo, que aponta a atividade do Superior Tribunal em matéria de habeas corpus de 2002 a 2011, também cresceu significativamente.
A prodigalidade no uso do habeas corpus talvez tenha origem no número estratosférico de presos, e ainda, na imensa dívida social ainda existente entre nós, somada as práticas policiais e de persecução penal típicas de Estados autoritários e as quais estão profundamente arraigadas, infelizmente, nos costumes de nosso país.
Desta forma como o Judiciário é o competente para tutelar a liberdade, no âmbito penal, não se teve como escapar de tantas impetrações de habeas corpus, na medida em que a validade do exercício da jurisdição está atrelada a observância do princípio do contraditório e da ampla defesa.
Neste atual contexto dramático, o habeas corpus tornou-se o principal instrumento de defesa para fazer cessar abusos e ilegalidades contra os autuados, acusados e condenados definitivos.
O desvirtuado uso do habeas corpus deve-se, pois, a tradição jurídica brasileira que ampliou o cabimento do remédio heroico para além de prisões, incluindo também o combate às ilegalidades de diversos tipos no campo penal que possuam resultados no direito de ir e vir.
Segundo a maioria da primeira turma do STF a culpa do excesso,deve-se porque o habeas corpus serve de meio para sustentar pretensas nulidades.
Cumpre primeiramente sublinhar que até mesmo o Código de Processo Penal contrariando o entendimento da primeira turma do STF admite expressamente o uso de habeas corpus quando o processo for manifestamente nulo, o que confirma, a generosa tradição em defesa da liberdade.
Apesar de que nosso CPP sendo fiel à sua estrutura autoritária na temática de nulidades faz uso do adjetivo "manifestamente", termo que só deve ser interpretado, atualmente, em harmonia com a dignidade da pessoa humana. Significando uma ruptura da forma legal, mesmo que não seja manifesta ou óbvia, deve ser sancionada de nulidade se for possível que tenha influenciado no resultado final do processo.
Interpretação contrária não só ataca a finalidade do processo penal como também nos força a admitir que o sistema constitucional brasileiro de 1988 seria tão libertário quanto o do Estado Novo em temática de manejo de habeas corpus contra nulidades processuais.
É preciso, porém, transcender, pois, a resistência centenária da generosa prática de não se limitar o uso de habeas corpus brasileiro estritamente aos casos de prisão, também é o efeito certo de muitas causas certas e incertas.
É cediço que no exercício da defesa em foro penal há principais questões debatidas em instâncias superiores através de habeas corpus abordam problemas relativos à produção probatória, ao decreto de prisões cautelares e à violação de direitos dos condenados em execução penal.
Ainda analisando os possíveis e cabíveis recursos[15] em face do CPP e da Lei de Execuções Penais. Caso o juiz decida antecipar a produção probatória, ou ainda, decida fazer uso de videoconferência, ou decida não intimar a testemunha de defesa, ou decida prender cautelarmente o réu, ou denegar comutação ao condenado pela falta grave posterior, questiona-se, qual seria o recurso cabível para a defesa que deseja impugnar tais decisões imediatamente?
Assim, na seara da execução penal, há o agravo, cuja lei nem mesmo admite pedido liminar por aplicar subsidiariamente o recurso em sentido estrito.
Conclui-se, portanto, que o agravo[16] na execução penal é de pouca utilidade, especialmente quando persistem violações contra teses já pacificadas pelos Tribunais Superiores, o que inclui também algumas súmulas, e quiçá súmulas vinculantes, situação que merece oferecer uma resposta mais rápida das instâncias superiores.
Porém, no processo penal de conhecimento para existir impugnação imediata não existe recurso cabível, pois não se encontra lugar para estas decisões no recurso em sentido escrito bem como nos demais recursos previstos e arrolados no CPP.
Na seara do processo penal prevalece a dureza do CPP de 1941 e a jurisprudência relativa às nulidades conforme ressalta a exposição de motivos ressaltou que somente em casos excepcionais é declarada insanável a nulidade.
Sempre que o juiz se deparar com uma causa de nulidade, deve prover, imediatamente à sua eliminação, renovando ou retificando o ato irregular, se possível, mas ainda que não o faça, a nulidade considera-se sanada, seja pelo silêncio das partes, pela efetiva consecução da finalidade visada pelo ato não obstante sua irregularidade; seja pela aceitação, mesmo que tácita, dos efeitos do ato irregular.
Assim, é pródiga a jurisprudência brasileira penal em ampliar o espectro de aplicação do artigo 572 do CPP. E, não são tão raros os casos em que a ruptura da forma legal passe distraída mesmo diante dos olhos atentos do Judiciário, no momento do processamento do ato.
O que se justifica, em boa parte, pelo espírito do CPP do Estado Novo[17], a colocar a responsabilidade das nulidades quase que inteiramente pesando sobre os ombros da defesa, aliado à aludida inclemência jurisprudencial excetuada em poucos casos de reconhecimento de nulidade absoluta.
Uma defesa minimamente decente, deve cumprir suas tarefas mais cruciais: garantir que sejam respeitadas integridades física e moral de autuados, ou acusados ou condenados definitivos enquanto membros da família humana; fiscalizar o respeito à ordem processual; procurar obter do processo criminal uma solução jurídica ou humanamente mais justa; fiscalizar, no caso de condenado definitivo, o respeito a seus direitos fundamentais especialmente para que o fim principal da execução penal de reintegração social deste, seja realmente factível.
Em resumo, de um lado o sistema recursal não atende às reais e concretas necessidades da defesa, obrigando-a ao uso do habeas corpus de forma ampliada e frequente.
De outro lado, o tratamento benigno do CPP as nulidades, na prática, auspiciosamente transferindo à defesa quase toda a responsabilidade de combatê-las e, ainda, a aplicação rigorosa deste espírito jurisprudencial, salvo as exceções em que se aplicam a sanção de nulidade absoluta.
Persiste, ainda. infelizmente uma legislação processual penal autoritária em diversos aspectos, com os agravantes decorrentes de sua aplicação também autoritária, torna mito difícil e, quase impossível, o exercício de defesa efetiva, minimamente decente, sem que se valha do habeas corpus.
Boa parte da doutrina se pronuncia no sentido de que não haveria fundamento no texto constitucional vigente para existir o habeas corpus substitutivo de recurso. Sendo esse o entendimento da primeira Turma do STF. Porém, tal interpretação, não resiste a uma aprofundada análise que nos faz lembrar dos lamentos mais comuns de Rui Barbosa: "É sempre sob a invocação da legalidade que a lei se viola (...)".
É importante ressaltar que a quebra da longa tradição libertária impactada pelo Ato Institucional 6/69 que expressamente proibiu a substituição do recurso ordinário por habeas corpus originário, meses depois fora mantida pela Emenda Constitucional I, de 17.10.1969, in litteris:
“Art. 119. Compete ao Supremo Tribunal Federal: (...) II – julgar em recurso ordinário: (...) c) os habeas corpus decididos em única ou última instância pelos tribunais federais ou tribunais de justiça dos Estados, se denegatória a decisão, não podendo o recurso ser substituído por pedido originário” (grifamos). Sobrevindo, porém, a redemocratização brasileira e, com ela, uma nova Constituição apelidada de “Cidadã”, revogou-se a proibição expressa da substituição do recurso ordinário por habeas corpus originário, como se pode notar no texto atualmente vigente e transcrito a seguir: “Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe: (...) II – julgar, em recurso ordinário: a) o habeas-corpus, o mandado de segurança, o habeas-data e o mandado de injunção decididos em única instância pelos Tribunais Superiores, se denegatória a decisão; (...)”.
Através da simples sucessão de textos jurídicos indica nitidamente que o STF ressuscitou um legado da ditadura militar de 1964[18], indiscutível e inequivocamente revogado, interpretando de forma ampliativa para a restrição indevida da garantia fundamental.
Assim, é desnecessário frisar que tal conduta lesa simultaneamente a três regras sagradas da hermenêutica, não fosse o Superior Tribunal responsável por proferir a última palavra em matéria constitucional brasileira a cometer esse imperdoável pecadilho.
Reconhecer válido o texto expressamente revogado de forma tácita; interpretar ampliativamente restrição (revogada) a garantia fundamental; escolher a opção interpretativa mais conveniente para esvaziar o trabalho do Tribunal e não para a proteção da pessoa humana, violando princípio hermenêutico comum em matéria de direitos humanos, falta esta, que se assombra como grave em um país onde sistematicamente viola os direitos humanos no campo penal.
Além do que, é princípio vigente e coerente de Direitos Humanos que toda pessoa tem direito a receber dos tribunais nacionais competentes remédio efetivo para os atos que violem os direitos fundamentais que lhe sejam reconhecidos pela Constituição ou pela lei.
Ressalte-se ainda que o Brasil se vinculou expressamente perante aos órgãos internacionais de defesa e proteção dos direitos humanos de garantir o remédio efetivo para os atos violadores de direitos fundamentais, tal como prescreve explicitamente a Convenção Interamericana de Direitos Humanos, especialmente em seu artigo 25, que impõe ao Estado que seja parte de desenvolver as possibilidades de recurso judicial[19].
E, não basta o que está previsto na Constituição e na lei e, com que seja formalmente admissível, sem que se requereira, que seja realmente idôneo para estabelecer quando ocorrido a violação dos direitos humanos.
Ainda que deixássemos esquecidos os Tratados Internacionais de Direitos Humanos, a nossa Constituição vigente, em seu artigo 5º,2º§ prevê que os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados.
Aliás, cumpre assinalar que a origem dessa menção legislativa remonta ao artigo 78 da Constituição brasileira de 1891, e foi inspirada na Emenda IX da Constituição dos Estados Unidos da América, a qual foi estabelecida segundo comentadores, como adequada cautela contra a má aplicação da máxima demasiado repetida, que uma afirmação em casos particulares importa uma negação em todos os mais e vice-versa.
Ressaltando-se ainda que o texto constitucional vigente alerta que os direitos e garantias pertencem aos indivíduos, aos cidadãos, ao povo, poder-se ia concluir ainda que outros direitos e garantias não lhes são reconhecidos, visto não se acharem expressos no texto constitucional.
Assim, a enumeração das garantias não jamais pode ser considerada como supressiva.
Adentrando ao túnel do tempo e chegando à República Velha, é cediço que nos momentos mais críticos e violentos, o habeas corpus foi o instrumento principal pelo qual se deu azo aos duelos importantes entre os Poderes do então novo regime; além de lutas pelo respeito aos direitos fundamentais por estes mesmos Poderes.
E, mesmo antes dos tempos republicanos no Brasil, ainda no Império, o habeas corpus representou efetivo instrumento na luta contra a escravidão, inclusive conforme ficou famosa a atuação de Luiz Gama, que segundo Fábio Comparato: praticamente sozinho, logrou livrar do cativeiro ilegal mais de quinhentos negros, fato sem precedentes na história mundial da advocacia".
Valeu-se Gama, do habeas corpus em causa abolicionista alegando a tese de vigência de Leis de 1818 e 1831 que proibiam a importação de escravos e os reconheciam como livres.
Assim, o remédio heroico se confirmou, também contra as prisões administrativas devido ao consentimento de Dom Pedro II, consentimento que foi muito relevante para a estruturação inicial das liberdades públicas no Brasil.
E, no mesmo sentido, Pontes de Miranda ressaltou que dista em muito da magna relevância do habeas corpus na vida nacional. Se deixássemos de dar ao habeas corpus a extensão que lhe afeiçoaram a Constituição de 1891, a de 1934 e a de 1946, a liberdade entre nós seria ilusão, irrisória promessa em máximas contidas na declaração de direitos inerme e fictícia.
Assim, partindo da premissa de que os recursos de estrito direito sejam mais relevantes do que habeas corpus no plano penal, significa, minimamente, uma visão auspiciosa que tentar apagar o nosso passado. Especialmente quando a interpretação ocorre num país absolutamente dependente do remédio heroico, por força da ironia do destino, onde os próprios expressivos números de impetrações assolam os Tribunais Superiores.
Concluímos que o Brasil em sua jurisprudência contemporânea afronta toda a jurisprudência internacional de Direitos Humanos, através do STF, particularmente a sua primeira turma, ao ressuscitar preceito jurídico legado da ditadura militar que se valeu com o propósito de anular os efeitos reais e práticos do habeas corpus.
Resignamo-nos do afrouxamento da efetividade da jurisprudência pátria dos Tribunais Superiores pela obstrução da via do habeas corpus substitutivo, ao contrário do que se sustenta, na verdade, estimulará a tendência de recrudescimento do autoritarismo dos Tribunais inferiores, juízos e autoridades administrativas com atribuições no sistema penal. Sendo o estímulo atendido, tornar-se-á crescente a tendência para o cometimento de abusos e, como resultado, crescerá na mesma medida a necessidade de recursos e de medidas judiciais.
Com essa jurisprudência especialmente da primeira turma do STF, obteve-se o momentâneo alívio imediato ao permitir a produção em massa de decisões extinguindo e arquivando-se as impetrações substitutivas de recurso, sob a alegação de falta de cabimento[20].
Porém, a médio e longo prazo, na prática, percebe-se que o processo penal cobrará com juros expressivos, pois tende a agravar muito a crise já existente no sistema penal e especialmente no penitenciário.
A deterioração da função jurisdicional culminou-se com o precedente que ganha materialidade e produz a erosão da jurisprudência dos Tribunais Superiores.
Sem dúvida, num Estado Democrático de Direito, o habeas corpus que tenha sua importância mitigada, a autorizar o STF a reajustar seu cabimento de acordo com esta mudança constitui um contrassenso. Mas, ressaltou Calamandrei que a uma uniformidade interpretativa contemporânea que não impede a diversidade sucessiva do direito, opinião mencionada na Exposição de Motivos do Anteprojeto do Código de Processo Civil de 1973.
O habeas corpus do século XXI tem sido um instrumento essencial e vital na administração complexa da questão penal, e particularmente, a penitenciária que abala o Brasil, e ainda envolve principalmente a população de baixa renda, uma esmagadora vítima da pesada dívida social onde estamos mergulhados apesar de recentes progressos sociais.
Assim, a cada ordem de habeas corpus concedido, tutelando minimamente esta população oprimida significa uma despressurização da grande caldeira penal e desumana que vive sempre à beira de explosão.
É o habeas corpus um instrumento hábil a permitir que o Judiciário possa intervir diretamente na administração do problema, que é resultado de uma sociedade injusta, servindo apenas para diminuir as chances de convulsões sociais e outros conflitos intestinos mais graves dos que já existentes em nosso pobre país.
Pontes Miranda ressaltou que a função social por mais de século adotado no prazo, principalmente até 1930 e entre 1934 e 1937, assumindo a extraordinária função coordenadora e legalizante. O nobre doutrinador alertou ainda que existia no Brasil uma minoria que explora, com auxílio da ignorância, da força policial, da política, uma grande maioria de indivíduos.
Assim só há três caminhos, segundo Pontes de Miranda, a saber: a melhora da classe explorada, e então a classe dominante se fletiria por se não haver preparado para novas condições sociais; ou essa há de sugar aquela, até que aquela se enfraqueça e como que se extinga; ou à medida que se operasse a melhora geral, aprenderia o explorador como poderia ser mantida, sem contar com a população semiescrava, a situação social de superioridade econômica (...).
Concluiu, com razão, o habeas corpus significa a alavanca social, que manobrada pelo simples rábula dos sertões, ou pelo bacharel que exerce, mais do que se pensa, pelo interior do país, a anônima e alta missão civilizadora e renovante, faz cessar a violência do chefe local, ou dos agentes do governo federal, ou estadual, mediante a ordem concedida originariamente ou em grau de recurso, pelo Supremo Tribunal Federal.
Há uma enorme e pesada responsabilidade nas mãos do STF[21] pois parte de sua formação do século XXI pretende renunciá-la sem justa causa alguma, mas apenas pelo aborrecimento causado pelo excesso de impetrações do remédio heroico.
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Uma parte da doutrina, porém, aponta sua origem no Capítulo XXXIX da Magna Carta, outorgada, na Inglaterra, pelo rei João Sem Terra, em 1215. O artigo 48 explicitamente mencionava: “Ninguém poderá ser detido, preso ou despojado de seus bens, costumes e liberdade, senão em virtude de julgamento por seus pares, de acordo com as leis do país”.
Sob domínio de Carlos I, que pretendia governar sem leis e sem nobreza, a campanha dos ingleses pela liberdade recomeçou. Detestado por seu excessivo autoritarismo e arbitrariedade, chegou a impor determinado imposto geral e sistemático, denominado ship money, o que acarretou uma série de protestos da nobreza, que foram repelidos com violência e prisões ilegais.
Tal situação perdurou até o movimento de oposição que determinou posteriormente a chamada Petition of Rights (Petição de Direitos) que foi uma declaração formal redigida por Thomas Wentworth onde foram novamente afirmadas as liberdades públicas fundamentais e o respeito às leis de habeas corpus. Textualmente afirmava: We must vindicate our ancient liberties, we must reforce the laws made by our ancestors"[1].
O rei, na ocasião, viu-se obrigado a dar seu consentimento expresso à Petição de Direitos em 1628, o que representou uma significativa conquista em defesa dos direitos individuais. Porém, mesmo depois, as ordens de habeas corpus eram denegadas constantemente, ou, o que era ainda pior, simplesmente desobedecidas.
De sorte que as reivindicações libertárias continuaram e, em 1679, sob o reinado de Carlos II surgiu o Habeas Corpus Act[2] consagrando definitivamente o writ, reconhecido como remédio eficaz para promover a soltura ou liberação da pessoa ilegalmente presa ou detida.
Entretanto, o writ limitava-se a atender pessoas acusadas de crime, não se reconhecendo aplicação nos demais casos de prisão ilegal.
Convém alertar que as leis inglesas, desde a Magna Carta até o Habeas Corpus Act serviram de base à Constituição dos EUA, em 1778, a qual referiu-se diretamente ao habeas corpus, afirmando que esta garantia só poderia ser suspensa para garantir a segurança pública, no caso de rebelião interna ou invasão.
Em 1789, o habeas corpus fora incluído na Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão. E, em 1816, surgiu outro Habeas Corpus Act ampliando o anterior e, alcançando qualquer ofensa à liberdade dos indivíduos, ainda que não acusados de qualquer crime.
O habeas corpus encontra-se presente em quase todas as legislações do mundo. E, entrou pioneiramente na legislação brasileira, de forma expressa com a promulgação do Código de Processo Penal, de 1832, cujo o artigo 340 dispunha in litteris:
“Todo cidadão que entender que ele ou outrem sofre uma prisão ou constrangimento ilegal em sua liberdade, tem direito de pedir uma ordem de habeas corpus em seu favor.”.
Aliás, para Pontes de Miranda, o writ já constava implicitamente no direito pátrio desde a Constituição Imperial de 1824, que em seu artigo 179, §8º preceituava que: "Ninguém será preso, sem culpa formada, exceto nos casos declarados em lei e, nestes, dentro do prazo de 24 horas contadas da entrada na prisão sendo em cidades, vilas e outras povoações próximas aos lugares da residência do juiz e, nos lugares remotos, dentro de um prazo razoável, que a lei marcará, atenta à extensão do território, o juiz por uma nota por ele assinada, fará constar ao réu o motivo da prisão de seu acusador e os das testemunhas, havendo-as."
Fernando Capez noticia que a primeira forma conhecida no ordenamento jurídico pátrio foi a habeas corpus liberatório que visa fazer cessar um constrangimento à liberdade ambulatória.
E, mesmo com as grandes alterações introduzidas no CPC de 1832 estendeu-se o remédio heroico também àqueles casos em que o cidadão simplesmente se encontrava ameaçado na sua liberdade de ir e vir considerando-se a figura do habeas corpus preventivo.
Finalmente com a primeira constituição republicana no Brasil, em 1891, o habeas corpus é citado explicitamente pela primeira vez dentro do bojo constitucional, no artigo 71, §22º. Quando se cogitou em dar-se o habeas corpus ao indivíduo que estivesse para sofrer ou na iminência de perigo de sofrer violência ou coação, por ilegalidade ou abuso de poder.
Aliás, foi diversa a interpretação do dispositivo legal feita por Pedro Lessa e Rui Barbosa o que gerou uma famosa polêmica. Pois Lessa sustentava que o writ se limitava à defesa da liberdade de locomoção, não podendo ser empregado para a defesa de outros direitos líquidos e certos.
Já Rui Barbosa, por sua vez, entendia que no silêncio do texto constitucional, não se admitia a interpretação restritiva do remédio heroico, podendo o mesmo ser usado para defesa de qualquer direito.
Verificou-se que a tese de Rui Barbosa[3] se sagrou vitoriosa e prevalente no STF, que passou a interpretar amplamente o habeas corpus.
A reforma constitucional brasileira de 1926 esvaziou a discussão, restabelecendo a finalidade clássica do writ qual seja a tutela exclusiva da liberdade ambulatória. O artigo 72, §22º ficou com a seguinte redação: Dar-se-á habeas corpus sempre que alguém sofrer violência por meio de prisão ou constrangimento ilegal na sua liberdade de locomoção".
Com a Constituição brasileira de 1934 foi novamente suprimida a expressão "locomoção" pois o artigo 113, XXIII mencionava: "...violência ou coação em sua liberdade, por ilegalidade ou abuso de poder".
Entretanto, antes que se entabulasse nova discussão, o mesmo artigo 113, no inciso XXXIII, criou o instituto de mandado de segurança[4], com finalidade residual. A Constituição de 1946, em seu artigo 141, inciso XXIII, manteve o habeas corpus restrito à tutela da liberdade de ir e vir.
A Carta Constitucional de 1967 tratou do instituto no artigo 150, §20º e EC 1/1969 disciplinou-o no artigo 153, §20º sempre restrito à defesa da liberdade de locomoção. E, atualmente na Constituição Cidadã prevê o habeas corpus está previsto no artigo 5º, LXVIII, com interpretação restritiva.
O conceito de habeas corpus é de remédio judicial que tem por fim evitar ou fazer cessar a violência ou a coação à liberdade de locomoção decorrente de ilegalidade ou de abuso de poder.
Sua natureza jurídica é de ação penal popular com base constitucional, voltada à tutela da liberdade ambulatória, sempre que ocorrer os casos elencados no artigo 648 do CPP.
Nas hipóteses dos incisos II, III, IV e V assume função de autêntica ação penal cautelar. E, nos incisos VI e VII, funciona como ação rescisória (ou constitutiva negativa), se a sentença já tiver transitado em julgado, ou como ação declaratória, se o processo estiver em andamento. Assim, percebe-se, no inciso I, poderemos ter ação cautelar, declaratória ou constitutiva, dependendo do caso concreto.
Há duas espécies de habeas corpus, a saber: liberatório ou repressivo: destina-se a afastar o constrangimento ilegal efetivado, à liberdade de locomoção; a espécie preventiva que se destina a afastar a ameaça à liberdade de locomoção. Assim, in casu, corresponde a um salvo-conduto[5].
Quanto à legitimidade ativa para o habeas corpus, cabe: pode ser impetrado[6] por qualquer pessoa, independente de habilitação legal ou representação de advogado, sendo até dispensada a formalidade de procuração.
Desta forma, a analfabeto pode impetrar, desde que alguém assine a rogo; também o Promotor de Justiça também poderá propor, conforme o artigo 32, I da Lei Orgânica do Ministério Público (Lei 8.625/1993); poderá ser impetrado por pessoa jurídica e pessoa física.
Quanto a impetração por pessoa jurídica há dois posicionamentos, uma admitindo e outro não admitindo.
Porém, o juiz de direito não poderá impetrar em razão do princípio da inércia da jurisdição, mas poderá, na qualidade de cidadão. Também o Delegado de Polícia poderá impetrar, porém, não como autoridade, mas como cidadão.
Quanto a legitimidade passiva prevalece o entendimento de que pode ser impetrado contra ato particular posto que o texto constitucional cogita apenas em coação por abuso de poder, mas também por ilegalidade. Exemplificou Fernando Capez, o caso de filho que interna pais em clínicas psiquiátricas para livrar-se da obrigação de cuidar deles.
É cabível contra juiz de direito, o promotor de justiça e o delegado de polícia.
Já houve quem dissesse que o pior da ditadura, não é o que ocorreu durante, nem o tanto que se padeceu por causa dela, mas principalmente pelo que se herda dela. Quando a maioria da primeira turma do STF, em 7.8.2012, negou a jurisprudência do próprio tribunal ao deixar de admitir o habeas corpus impetrado como substitutivo de recurso ordinário, posto que significasse uma burla ao sistema recursal previsto constitucionalmente.
E essa decisão proferido foi sendo reproduzido pela mesma turma em outros casos concretos, e foi capaz de ganhar a adesão unânime da quinta turma do STJ, conforme se vê do inteiro teor do HC 239 550/RJ, a qual endossando o argumento exposto no leading case da primeira turma do STF, ressaltou que a então nova decisão impunha a premente necessidade de se reformular a admissibilidade da impetração originária também no STJ, adequando-se à nova orientação da Suprema Corte, em consonância perfeita com os princípios constitucionais, principalmente o devido processo legal, da celeridade, da economia processual e ainda o da razoável duração do processo, a fim de que não seja conhecido o habeas corpus, um remédio heroico, como substitutivo do recurso ordinário, sem prejuízo, de eventualmente, e se for o caso, deferir-se a ordem de ofício, nos feitos em trâmite.
A guinada jurisprudencial se iniciou especialmente quando se percebe que o habeas corpus é simplesmente uma das pedras basilares de todo o mundo livre, essa nova interpretação liderada pela maioria da primeira turma do STF, trouxe a ressurreição da tese jurídica sustentada francamente pela ditadura militar de 1964.
Entre os fundamentos para justificar os argumentos da maioria da primeira turma do STF, temos:
1. a competência do STF rege-se por sistema de direito estrito, não admitindo a possibilidade de ser ampliada até as situações extravasem aos limites exatos e fixados e, portanto, o uso do habeas corpus como substituto de recurso ordinário viola gravemente o sistema recursal prevista pelo texto constitucional vigente. Em síntese, o habeas corpus substitutivo de recurso não está previsto na Constituição brasileira vigente.
2. Ademais o referido substitutivo é resultado da construção jurisprudencial, e fora admitido quando não existia sobrecarga de processos, hoje registrada tanto no STF como no STJ, razão pela qual os referidos tribunais estão com elevado número de habeas corpus, e tal desvirtuamento tem pernicioso efeito nos tribunais superiores, diante de suas funções precípuas, quais sejam, o controle a infraconstitucionalidade e da constitucionalidade[7]. Assim, o STJ seria o órgão a dar a última palavra na interpretação de lei federal, ao passo que o STF seria o guardião da Constituição, e ipso facto, também da interpretação constitucional.
3. O entendimento prevalente no sentido de se conhecer de habeas corpus substitutivo de recurso contrasta com os meios de contenção de feitos processuais, além, da imposição recente de filtros tais como a súmula vinculante[8] e a repercussão geral, com a finalidade de viabilizar o exercício pleno, pelo Supremo Tribunal Federal, da nobre função de guardião da Carta Magna.
4. Reclamam os ministros que o habeas corpus no Brasil tem obtido um uso desvirtuado principalmente por não atacar somente prisões, mas diversos tipos de nulidades com efeitos no direito de ir e vir banalizando-se o remédio heroico.
5. A inadmissibilidade[9] do habeas corpus como substitutivo de recurso ordinário, em tese, não origina prejuízo a qualquer paciente, pois que continuaria sendo possível a concessão da ordem, se couber, de ofício, nos habeas pendentes.
6. A utilização do habeas corpus substitutivo de recurso abre a oportunidade para a má-fé processual, pois é cômodo não interpor o recurso ordinário quando se pode, a qualquer momento, buscar infirmar a decisão há muito tempo proferida, mediante o denominado habeas corpus substitutivo, galgando-se, assim, a passagem do tempo, e chegando até mesmo, na prescrição.
Os doutrinadores Paulo Bonavides e Paes de Andrade alertam que o esquecimento é o verdadeiro adubo da tirania, portanto, é curial resgar a tradição jurídica que avessa aos formalismos vieram a desnaturar o habeas corpus, desviando-o de suas nobres finalidades.
Afinal, o indivíduo constrangido ilegalmente em sua liberdade, podia invocar o remédio da lei em qualquer altura na escala judiciária.
Assim, não havia uma instância específica em matéria de habeas corpus. E, a única restrição a essa autoridade consiste na regra, incorporado afinal ao direito positivo brasileiro pela Lei 2.033, de 1871 em seu artigo 18, segundo a qual ‘a superioridade do grau na ordem da jurisdição judiciaria é a única, que limita a competência da respectiva autoridade em resolver as prisões feitas a mandado das mesmas auctoridades judiciaes. (...).
Desse modo, a vítima de constrangimento ilegal por ato de juiz inferior tinha o arbítrio de transpondo as jurisdições intermediárias, procurar imediatamente o abrigo legal na mais eminente.
Segundo Rui Barbosa este regramento de competência do habeas corpus fora recepcionado integralmente pela Constituição brasileira de 1891, em seu artigo 83, sendo uma das mais importantes conquistas liberais da monarquia brasileira.
Seguindo essa lógica, veio o Decreto 221 de 1894, que especificou as hipóteses de competência do STF, para processamento e julgamento do remédio heroico, disseminando-se na monarquia, prevendo expressamente ainda, o cabimento geral do processamento e julgamento do habeas corpus pelo STF sempre que houvesse o perigo de consumar-se a violência antes que o outro juiz ou tribunal pudesse conhecer do pedido.
Tamanho instrumento libertário se constitucionalizou em 1934, tendo sido preservado pela Carta de 1937, ainda que formalmente, e depois também na Constituição de 1946 e, também na Carta Magna de 1967.
Todavia, com o AI - 6 de 1.2.1969 introduziu-se em complemento ao contido no artigo 114, II da CF/1967 de tal modo que passou a ter a seguinte redação in litteris: "Dê-se ao offendido o arbitrio de procurar, quando possa, o tribunal menos frágil; mas não se lhe tire o de valer-se dos outros quando aquelle, pela distancia, ou por qualquer obstaculo, não estiver ao seu alcance."
Dessa forma, mesmo no período mais agudo da história brasileira, na ditadura militar de 1964 rompeu-se drasticamente a interpretação libertária[10] antes existente desde nossa monarquia, e que sempre persistiu em todos os textos constitucionais posteriores, inclusive no bojo da Carta de 1967 conquanto no período do Estado Novo a eficácia da garantia constitucional do habeas corpus a tenha sido quase que anulada na prática.
E, relativo ao efeito da ruptura em análise, esclarece o advogado criminalista e professor Alberto Zacarias Toron[11] que "a vedação da utilização do habeas substitutivo do RHC a tramitação do remédio heroico passou a ser mais lenta pois interposto o recurso no Tribunal de origem, haveria de se aguardar as contrarrazões do Ministério Público e a remessa dos autos à Capital Federal, coisas ainda hoje comumente demoradas".
Conclui-se que ocorrera a ressurreição do famigerado Ato Institucional 6/1969 através do STF em pleno século XXI o que torna contemporânea e pertinente a argumentação redigida por Rui Barbosa em 1892 quando registrou publicamente as lições de liberdade do Imperial Conselho de Estado em repreensão ao amesquinhamento do habeas corpus causado pelo STF de 1891.
Realmente, adota ressureição e torna o guardião da Constituição Cidadã merecedor da maioria das críticas dirigidas e publicadas há pelo menos de cento e vinte anos. Aliás, Rui Barbosa relata quatro casos, de 1851, 1878, 1880 e 1883 nos quais os cidadãos foram presos administrativamente, e ao contrário do que fez o STF republicano de 1891, o Tribunal de Relação da Bahia em 1851, o Superior Tribunal de Justiça (1878), e os Tribunais de Relação do Rio de Janeiro (1880) e do Recife (1883) todos se deram por competentes e concederam a ordem de habeas corpus afastando as prisões administrativas.
Enquanto que o Conselho de Estado que era sempre suscitado para resolver conflito de atribuição entre Judiciário e Administração confirmou as ordens de habeas corpus, sendo que o Aviso de 22.10.1883, consolidando o controle das prisões administrativas pelo habeas corpus, merecendo dar destaque in litteris:
“(...) Sua Majestade o Imperador, conformando-se (...) com o parecer da maioria dos signatários da consulta das seções de justiça e fazenda do Conselho de Estado (...), houve por bem declarar que nenhuma providência cabe ao governo dar sobre o assunto; porquanto o recurso do habeas corpus, já por sua natureza, já pelas disposições expressas do art. 340 do Código Criminal e art. 18 da Lei 2.033, de setembro de 1871, é admissível contra toda a pressão ou constrangimento ilegal, qualquer que seja o motivo, que o determine, e qualquer que seja a autoridade de que dimanem, salvo as exceções previstas no art. 18, entre as quais não compreende a prisão administrativa[12] (...)”.
Com relação a competência para processamento e julgamento do habeas corpus. À exceção da limitação de 1871, já mencionada, no Império brasileiro era trivial o entendimento de que qualquer autoridade judicial poderia apreciar o pedido de ordem de habeas corpus, residindo exatamente aí a grande ironia o Supremo Tribunal da Constituição Cidadã, que tantos serviços de inestimável valor tem prestado desde 1988 à nossa República, pela maioria de sua primeira Turma invade as catacumbas do Regime Militar em pleno século XXI para ressuscitar a razão jurídica de um Ato Institucional que simplesmente rompeu, quando passou a vigorar, com pelo menos um século de tradição libertária em matéria de habeas corpus brasileiro.
O uso tão profuso do habeas corpus nos Tribunais Superiores parece traduzir uma desordem, mas de fato, tudo está em ordem. Goffredo Telles Junior[13] apoiado em Henri Bergson[14], brilhante filósofo francês e Prêmio Nobel de literatura, esclarece que a desordem não é o contrário da ordem, conforme se costuma pensar. Ela é, isto sim, uma ordem contrária a outra ordem.
Bergson foi quem revelou a natureza verdadeira de desordem. Foi o referido filósofo inglês quem demonstrou a falsidade com que a questão da desordem é geralmente apresentada e deduzida.
Desordem, segundo Bergson, é o nome dado à ordem não desejada, não querida e não procurada. É o nome da ordem que desagrada, desgosta, decepciona, prejudica, infelicita e desola. Mas a desordem é sempre uma ordem, eis que precisa ficar bem claro.
E, Telles relembra a imagem de ruínas causadas por incêndio ou outra catástrofe qualquer, demonstrando, porém, que escombros e destroços na verdade estão em ordem por serem os efeitos certos de causas certas.
Eis o erro primordial da maioria da primeira turma do STF, este excesso de habeas corpus impetrados junto aos Tribunais Superiores, visto pelos Ministros como desordem, em realidade, significa que nada mais existe que uma ordem. Pois é o efeito certo de causas certas.
Uma ordem que realmente infelicita demais vários Ministros, ao ponto de gerar o renascimento de tese jurídica do regime autoritário.
Tal ordem que desagrada aos Ministros por alegado em excesso e por denunciar a desorganização no andamento dos trabalhos, de outro lado, constitui o plausível respiradouro de muitos brasileiros encarcerados, na maioria esmagadora das vezes em locais deveras insalubres e submetidos a processos criminais muitas vezes com uma defesa deficiente ou praticamente ausente.
O excesso de encarcerados, que de 2002 a 2011 mais que dobrou saltando para o oceano de mais de meio milhão, é sem dúvida, um fator determinante para tantos habeas corpus impetrados e, ainda, o relatório da Defensoria Pública de São Paulo, que aponta a atividade do Superior Tribunal em matéria de habeas corpus de 2002 a 2011, também cresceu significativamente.
A prodigalidade no uso do habeas corpus talvez tenha origem no número estratosférico de presos, e ainda, na imensa dívida social ainda existente entre nós, somada as práticas policiais e de persecução penal típicas de Estados autoritários e as quais estão profundamente arraigadas, infelizmente, nos costumes de nosso país.
Desta forma como o Judiciário é o competente para tutelar a liberdade, no âmbito penal, não se teve como escapar de tantas impetrações de habeas corpus, na medida em que a validade do exercício da jurisdição está atrelada a observância do princípio do contraditório e da ampla defesa.
Neste atual contexto dramático, o habeas corpus tornou-se o principal instrumento de defesa para fazer cessar abusos e ilegalidades contra os autuados, acusados e condenados definitivos.
O desvirtuado uso do habeas corpus deve-se, pois, a tradição jurídica brasileira que ampliou o cabimento do remédio heroico para além de prisões, incluindo também o combate às ilegalidades de diversos tipos no campo penal que possuam resultados no direito de ir e vir.
Segundo a maioria da primeira turma do STF a culpa do excesso,deve-se porque o habeas corpus serve de meio para sustentar pretensas nulidades.
Cumpre primeiramente sublinhar que até mesmo o Código de Processo Penal contrariando o entendimento da primeira turma do STF admite expressamente o uso de habeas corpus quando o processo for manifestamente nulo, o que confirma, a generosa tradição em defesa da liberdade.
Apesar de que nosso CPP sendo fiel à sua estrutura autoritária na temática de nulidades faz uso do adjetivo "manifestamente", termo que só deve ser interpretado, atualmente, em harmonia com a dignidade da pessoa humana. Significando uma ruptura da forma legal, mesmo que não seja manifesta ou óbvia, deve ser sancionada de nulidade se for possível que tenha influenciado no resultado final do processo.
Interpretação contrária não só ataca a finalidade do processo penal como também nos força a admitir que o sistema constitucional brasileiro de 1988 seria tão libertário quanto o do Estado Novo em temática de manejo de habeas corpus contra nulidades processuais.
É preciso, porém, transcender, pois, a resistência centenária da generosa prática de não se limitar o uso de habeas corpus brasileiro estritamente aos casos de prisão, também é o efeito certo de muitas causas certas e incertas.
É cediço que no exercício da defesa em foro penal há principais questões debatidas em instâncias superiores através de habeas corpus abordam problemas relativos à produção probatória, ao decreto de prisões cautelares e à violação de direitos dos condenados em execução penal.
Ainda analisando os possíveis e cabíveis recursos[15] em face do CPP e da Lei de Execuções Penais. Caso o juiz decida antecipar a produção probatória, ou ainda, decida fazer uso de videoconferência, ou decida não intimar a testemunha de defesa, ou decida prender cautelarmente o réu, ou denegar comutação ao condenado pela falta grave posterior, questiona-se, qual seria o recurso cabível para a defesa que deseja impugnar tais decisões imediatamente?
Assim, na seara da execução penal, há o agravo, cuja lei nem mesmo admite pedido liminar por aplicar subsidiariamente o recurso em sentido estrito.
Conclui-se, portanto, que o agravo[16] na execução penal é de pouca utilidade, especialmente quando persistem violações contra teses já pacificadas pelos Tribunais Superiores, o que inclui também algumas súmulas, e quiçá súmulas vinculantes, situação que merece oferecer uma resposta mais rápida das instâncias superiores.
Porém, no processo penal de conhecimento para existir impugnação imediata não existe recurso cabível, pois não se encontra lugar para estas decisões no recurso em sentido escrito bem como nos demais recursos previstos e arrolados no CPP.
Na seara do processo penal prevalece a dureza do CPP de 1941 e a jurisprudência relativa às nulidades conforme ressalta a exposição de motivos ressaltou que somente em casos excepcionais é declarada insanável a nulidade.
Sempre que o juiz se deparar com uma causa de nulidade, deve prover, imediatamente à sua eliminação, renovando ou retificando o ato irregular, se possível, mas ainda que não o faça, a nulidade considera-se sanada, seja pelo silêncio das partes, pela efetiva consecução da finalidade visada pelo ato não obstante sua irregularidade; seja pela aceitação, mesmo que tácita, dos efeitos do ato irregular.
Assim, é pródiga a jurisprudência brasileira penal em ampliar o espectro de aplicação do artigo 572 do CPP. E, não são tão raros os casos em que a ruptura da forma legal passe distraída mesmo diante dos olhos atentos do Judiciário, no momento do processamento do ato.
O que se justifica, em boa parte, pelo espírito do CPP do Estado Novo[17], a colocar a responsabilidade das nulidades quase que inteiramente pesando sobre os ombros da defesa, aliado à aludida inclemência jurisprudencial excetuada em poucos casos de reconhecimento de nulidade absoluta.
Uma defesa minimamente decente, deve cumprir suas tarefas mais cruciais: garantir que sejam respeitadas integridades física e moral de autuados, ou acusados ou condenados definitivos enquanto membros da família humana; fiscalizar o respeito à ordem processual; procurar obter do processo criminal uma solução jurídica ou humanamente mais justa; fiscalizar, no caso de condenado definitivo, o respeito a seus direitos fundamentais especialmente para que o fim principal da execução penal de reintegração social deste, seja realmente factível.
Em resumo, de um lado o sistema recursal não atende às reais e concretas necessidades da defesa, obrigando-a ao uso do habeas corpus de forma ampliada e frequente.
De outro lado, o tratamento benigno do CPP as nulidades, na prática, auspiciosamente transferindo à defesa quase toda a responsabilidade de combatê-las e, ainda, a aplicação rigorosa deste espírito jurisprudencial, salvo as exceções em que se aplicam a sanção de nulidade absoluta.
Persiste, ainda. infelizmente uma legislação processual penal autoritária em diversos aspectos, com os agravantes decorrentes de sua aplicação também autoritária, torna mito difícil e, quase impossível, o exercício de defesa efetiva, minimamente decente, sem que se valha do habeas corpus.
Boa parte da doutrina se pronuncia no sentido de que não haveria fundamento no texto constitucional vigente para existir o habeas corpus substitutivo de recurso. Sendo esse o entendimento da primeira Turma do STF. Porém, tal interpretação, não resiste a uma aprofundada análise que nos faz lembrar dos lamentos mais comuns de Rui Barbosa: "É sempre sob a invocação da legalidade que a lei se viola (...)".
É importante ressaltar que a quebra da longa tradição libertária impactada pelo Ato Institucional 6/69 que expressamente proibiu a substituição do recurso ordinário por habeas corpus originário, meses depois fora mantida pela Emenda Constitucional I, de 17.10.1969, in litteris:
“Art. 119. Compete ao Supremo Tribunal Federal: (...) II – julgar em recurso ordinário: (...) c) os habeas corpus decididos em única ou última instância pelos tribunais federais ou tribunais de justiça dos Estados, se denegatória a decisão, não podendo o recurso ser substituído por pedido originário” (grifamos). Sobrevindo, porém, a redemocratização brasileira e, com ela, uma nova Constituição apelidada de “Cidadã”, revogou-se a proibição expressa da substituição do recurso ordinário por habeas corpus originário, como se pode notar no texto atualmente vigente e transcrito a seguir: “Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe: (...) II – julgar, em recurso ordinário: a) o habeas-corpus, o mandado de segurança, o habeas-data e o mandado de injunção decididos em única instância pelos Tribunais Superiores, se denegatória a decisão; (...)”.
Através da simples sucessão de textos jurídicos indica nitidamente que o STF ressuscitou um legado da ditadura militar de 1964[18], indiscutível e inequivocamente revogado, interpretando de forma ampliativa para a restrição indevida da garantia fundamental.
Assim, é desnecessário frisar que tal conduta lesa simultaneamente a três regras sagradas da hermenêutica, não fosse o Superior Tribunal responsável por proferir a última palavra em matéria constitucional brasileira a cometer esse imperdoável pecadilho.
Reconhecer válido o texto expressamente revogado de forma tácita; interpretar ampliativamente restrição (revogada) a garantia fundamental; escolher a opção interpretativa mais conveniente para esvaziar o trabalho do Tribunal e não para a proteção da pessoa humana, violando princípio hermenêutico comum em matéria de direitos humanos, falta esta, que se assombra como grave em um país onde sistematicamente viola os direitos humanos no campo penal.
Além do que, é princípio vigente e coerente de Direitos Humanos que toda pessoa tem direito a receber dos tribunais nacionais competentes remédio efetivo para os atos que violem os direitos fundamentais que lhe sejam reconhecidos pela Constituição ou pela lei.
Ressalte-se ainda que o Brasil se vinculou expressamente perante aos órgãos internacionais de defesa e proteção dos direitos humanos de garantir o remédio efetivo para os atos violadores de direitos fundamentais, tal como prescreve explicitamente a Convenção Interamericana de Direitos Humanos, especialmente em seu artigo 25, que impõe ao Estado que seja parte de desenvolver as possibilidades de recurso judicial[19].
E, não basta o que está previsto na Constituição e na lei e, com que seja formalmente admissível, sem que se requereira, que seja realmente idôneo para estabelecer quando ocorrido a violação dos direitos humanos.
Ainda que deixássemos esquecidos os Tratados Internacionais de Direitos Humanos, a nossa Constituição vigente, em seu artigo 5º,2º§ prevê que os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados.
Aliás, cumpre assinalar que a origem dessa menção legislativa remonta ao artigo 78 da Constituição brasileira de 1891, e foi inspirada na Emenda IX da Constituição dos Estados Unidos da América, a qual foi estabelecida segundo comentadores, como adequada cautela contra a má aplicação da máxima demasiado repetida, que uma afirmação em casos particulares importa uma negação em todos os mais e vice-versa.
Ressaltando-se ainda que o texto constitucional vigente alerta que os direitos e garantias pertencem aos indivíduos, aos cidadãos, ao povo, poder-se ia concluir ainda que outros direitos e garantias não lhes são reconhecidos, visto não se acharem expressos no texto constitucional.
Assim, a enumeração das garantias não jamais pode ser considerada como supressiva.
Adentrando ao túnel do tempo e chegando à República Velha, é cediço que nos momentos mais críticos e violentos, o habeas corpus foi o instrumento principal pelo qual se deu azo aos duelos importantes entre os Poderes do então novo regime; além de lutas pelo respeito aos direitos fundamentais por estes mesmos Poderes.
E, mesmo antes dos tempos republicanos no Brasil, ainda no Império, o habeas corpus representou efetivo instrumento na luta contra a escravidão, inclusive conforme ficou famosa a atuação de Luiz Gama, que segundo Fábio Comparato: praticamente sozinho, logrou livrar do cativeiro ilegal mais de quinhentos negros, fato sem precedentes na história mundial da advocacia".
Valeu-se Gama, do habeas corpus em causa abolicionista alegando a tese de vigência de Leis de 1818 e 1831 que proibiam a importação de escravos e os reconheciam como livres.
Assim, o remédio heroico se confirmou, também contra as prisões administrativas devido ao consentimento de Dom Pedro II, consentimento que foi muito relevante para a estruturação inicial das liberdades públicas no Brasil.
E, no mesmo sentido, Pontes de Miranda ressaltou que dista em muito da magna relevância do habeas corpus na vida nacional. Se deixássemos de dar ao habeas corpus a extensão que lhe afeiçoaram a Constituição de 1891, a de 1934 e a de 1946, a liberdade entre nós seria ilusão, irrisória promessa em máximas contidas na declaração de direitos inerme e fictícia.
Assim, partindo da premissa de que os recursos de estrito direito sejam mais relevantes do que habeas corpus no plano penal, significa, minimamente, uma visão auspiciosa que tentar apagar o nosso passado. Especialmente quando a interpretação ocorre num país absolutamente dependente do remédio heroico, por força da ironia do destino, onde os próprios expressivos números de impetrações assolam os Tribunais Superiores.
Concluímos que o Brasil em sua jurisprudência contemporânea afronta toda a jurisprudência internacional de Direitos Humanos, através do STF, particularmente a sua primeira turma, ao ressuscitar preceito jurídico legado da ditadura militar que se valeu com o propósito de anular os efeitos reais e práticos do habeas corpus.
Resignamo-nos do afrouxamento da efetividade da jurisprudência pátria dos Tribunais Superiores pela obstrução da via do habeas corpus substitutivo, ao contrário do que se sustenta, na verdade, estimulará a tendência de recrudescimento do autoritarismo dos Tribunais inferiores, juízos e autoridades administrativas com atribuições no sistema penal. Sendo o estímulo atendido, tornar-se-á crescente a tendência para o cometimento de abusos e, como resultado, crescerá na mesma medida a necessidade de recursos e de medidas judiciais.
Com essa jurisprudência especialmente da primeira turma do STF, obteve-se o momentâneo alívio imediato ao permitir a produção em massa de decisões extinguindo e arquivando-se as impetrações substitutivas de recurso, sob a alegação de falta de cabimento[20].
Porém, a médio e longo prazo, na prática, percebe-se que o processo penal cobrará com juros expressivos, pois tende a agravar muito a crise já existente no sistema penal e especialmente no penitenciário.
A deterioração da função jurisdicional culminou-se com o precedente que ganha materialidade e produz a erosão da jurisprudência dos Tribunais Superiores.
Sem dúvida, num Estado Democrático de Direito, o habeas corpus que tenha sua importância mitigada, a autorizar o STF a reajustar seu cabimento de acordo com esta mudança constitui um contrassenso. Mas, ressaltou Calamandrei que a uma uniformidade interpretativa contemporânea que não impede a diversidade sucessiva do direito, opinião mencionada na Exposição de Motivos do Anteprojeto do Código de Processo Civil de 1973.
O habeas corpus do século XXI tem sido um instrumento essencial e vital na administração complexa da questão penal, e particularmente, a penitenciária que abala o Brasil, e ainda envolve principalmente a população de baixa renda, uma esmagadora vítima da pesada dívida social onde estamos mergulhados apesar de recentes progressos sociais.
Assim, a cada ordem de habeas corpus concedido, tutelando minimamente esta população oprimida significa uma despressurização da grande caldeira penal e desumana que vive sempre à beira de explosão.
É o habeas corpus um instrumento hábil a permitir que o Judiciário possa intervir diretamente na administração do problema, que é resultado de uma sociedade injusta, servindo apenas para diminuir as chances de convulsões sociais e outros conflitos intestinos mais graves dos que já existentes em nosso pobre país.
Pontes Miranda ressaltou que a função social por mais de século adotado no prazo, principalmente até 1930 e entre 1934 e 1937, assumindo a extraordinária função coordenadora e legalizante. O nobre doutrinador alertou ainda que existia no Brasil uma minoria que explora, com auxílio da ignorância, da força policial, da política, uma grande maioria de indivíduos.
Assim só há três caminhos, segundo Pontes de Miranda, a saber: a melhora da classe explorada, e então a classe dominante se fletiria por se não haver preparado para novas condições sociais; ou essa há de sugar aquela, até que aquela se enfraqueça e como que se extinga; ou à medida que se operasse a melhora geral, aprenderia o explorador como poderia ser mantida, sem contar com a população semiescrava, a situação social de superioridade econômica (...).
Concluiu, com razão, o habeas corpus significa a alavanca social, que manobrada pelo simples rábula dos sertões, ou pelo bacharel que exerce, mais do que se pensa, pelo interior do país, a anônima e alta missão civilizadora e renovante, faz cessar a violência do chefe local, ou dos agentes do governo federal, ou estadual, mediante a ordem concedida originariamente ou em grau de recurso, pelo Supremo Tribunal Federal.
Há uma enorme e pesada responsabilidade nas mãos do STF[21] pois parte de sua formação do século XXI pretende renunciá-la sem justa causa alguma, mas apenas pelo aborrecimento causado pelo excesso de impetrações do remédio heroico.
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[1] Devemos reivindicar nossas antigas liberdades, devemos reforçar as leis feitas por nossos ancestrais ".
[2] Foi um ato do Parlamento na Inglaterra durante o reinado de Carlos II, foi aprovado para definir e fortalecer a antiga prerrogativa de habeas corpus, que exigia que um tribunal examinasse a legalidade da detenção de um prisioneiro e assim impedisse o encarceramento ilegal ou arbitrário. Essa lei é erroneamente descrita como sendo a origem do habeas corpus.
Mas, o writ já existia sob variadas formas na Inglaterra há pelo menos cinco séculos e, acredita-se que tenha se originado no século XIII de Clarendon. Ele foi garantido, porém não criado pela Magna Carta em 1215, estabelecido em seu artigo 39. Ressalte-se que a Lei de 1679 seguiu uma lei anterior de 1640, que estabeleceu que o comando do Rei ou do Conselho Privado não era uma resposta a uma petição de habeas corpus.
Apesar de que existiram outros atos aprovados pelo Parlamento Britânico em 1803, 1804, 1816 e 1862, porém, é o Ato de 1679 que é considerado um marco importante na história constitucional inglesa. E, embora alterado, permanece no livro de estatutos até hoje.
Mas, o writ já existia sob variadas formas na Inglaterra há pelo menos cinco séculos e, acredita-se que tenha se originado no século XIII de Clarendon. Ele foi garantido, porém não criado pela Magna Carta em 1215, estabelecido em seu artigo 39. Ressalte-se que a Lei de 1679 seguiu uma lei anterior de 1640, que estabeleceu que o comando do Rei ou do Conselho Privado não era uma resposta a uma petição de habeas corpus.
Apesar de que existiram outros atos aprovados pelo Parlamento Britânico em 1803, 1804, 1816 e 1862, porém, é o Ato de 1679 que é considerado um marco importante na história constitucional inglesa. E, embora alterado, permanece no livro de estatutos até hoje.
[3] Rui Barbosa, reconhecidamente um defensor incansável das liberdades públicas, para afirmar a ampliação dada ao habeas corpus na Carta Republicana, dizia que o remédio não estava apenas “circunscrito aos casos de constrangimento corporal; o habeas corpus hoje se estende a todos os casos em que um direito nosso, qualquer direito, estiver ameaçado, manietado, impossibilitado no seu exercício pela intervenção de um abuso de poder ou de uma ilegalidade”.
E continuava em sua explanação, o sempre lembrado Águia de Haia: “desde que a Constituição não particularizou os direitos, que, com o habeas corpus, queria proteger contra a coação ou contra a violência, claro está que o seu propósito era escudar contra a violência e a coação todo e qualquer direito que elas podiam tolher e lesar nas suas manifestações”.
E continuava em sua explanação, o sempre lembrado Águia de Haia: “desde que a Constituição não particularizou os direitos, que, com o habeas corpus, queria proteger contra a coação ou contra a violência, claro está que o seu propósito era escudar contra a violência e a coação todo e qualquer direito que elas podiam tolher e lesar nas suas manifestações”.
[4] O mandado de segurança do direito brasileiro se aproxima mais do mandamus inglês, instituído para proteger os funcionários demitidos ou removidos ilegalmente. O mandamus visa atos administrativos. O mandado de segurança também, criado pela Constituição brasileira, se dirige contra atos de autoridades. O writ, ao contrário disso, é medida geral de proteção contra atos públicos e particulares. O mandado de segurança poderá equivaler a certo e determinado writ, mas não a qualquer deles. O writ of mandamus não se confunde com o quo warranto, nem com o writ os certioari.
[5] Pode-se igualmente ajuizar habeas corpus para trancar o inquérito policial ou a ação penal quando inexista justa causa para o seu trâmite, bem como impedir o indiciamento de investigado.
E até mesmo, na última hipótese, é possível a continuidade do inquérito para outras apurações. Também pode ser ajuizado para combater ilegalidades flagrantes.
E até mesmo, na última hipótese, é possível a continuidade do inquérito para outras apurações. Também pode ser ajuizado para combater ilegalidades flagrantes.
[6] Exige-se a assinatura do impetrante e ainda a identificação de sua residência, não se aceitando impetração anônima. Surge ainda o questionamento: E se o magistrado verificar, de ofício, que a petição relata, de forma fidedigna, coação ilegal ao direito de ir e vir, que exija pronta atuação judicial? Acredita-se que deve admitir o remédio, mesmo que de ofício. Dessa decisão irá recorrer de ofício, conforme o artigo 574, I CPP.
[7] As normas constitucionais devem ser consideradas como preceitos integrados em um sistema unitário de regras e princípios. Como consequência a ideia de unidade afasta a possibilidade de se estabelecer uma hierarquia normativa entre dispositivos da Constituição, impedindo a declaração de inconstitucionalidade de uma norma constitucional originária, conforme leciona Marcelo Novelino.
[8] Há mais de uma década, começou a vigorar através da EC 45/2004 que instituiu a Reforma do Judiciário e admitiu uma série de mudanças no funcionamento e na organização da justiça pátria. Na busca da celeridade processual no julgamento de processos a partir da criação de súmulas vinculantes, a filtragem de recursos que sobrem para a Suprema Corte a partir do critério de repercussão geral e a estruturação e o funcionamento dos Conselhos Nacionais de Justiça e do Ministério Público (CNMP) são considerados grandes e significativos progressos no sistema judiciário brasileiro.
Destaque-se que a duração razoável do processo se erige dentro do rol de direitos fundamentais e enaltece-se a criação de instrumentos que permitam enfim buscar a razoabilidade.
Com o intuito de regulamentar o Art. 103-A da C.F. incluído pela E.C. nº. 45 de 2004, foi promulgada a Lei 11.417 de 19 de dezembro de 2006, que disciplinou a edição, revisão e cancelamento de súmula vinculante por parte do Egrégio STF e deu outras providências.
Saliente-se que a lei regulamentadora se limita a estabelecer o quórum qualificado de apreciação pelo plenário, rol de legitimados ativos para propositura de enunciado com efeito vinculante da súmula do Pretório Excelso, possibilidade de manifestação de terceiros, modelação de efeitos matérias e temporais do respectivo verbete, a possibilidade de reclamação em face da inobservância da súmula vinculante bem como a aplicação subsidiária do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal.
Destaque-se que a duração razoável do processo se erige dentro do rol de direitos fundamentais e enaltece-se a criação de instrumentos que permitam enfim buscar a razoabilidade.
Com o intuito de regulamentar o Art. 103-A da C.F. incluído pela E.C. nº. 45 de 2004, foi promulgada a Lei 11.417 de 19 de dezembro de 2006, que disciplinou a edição, revisão e cancelamento de súmula vinculante por parte do Egrégio STF e deu outras providências.
Saliente-se que a lei regulamentadora se limita a estabelecer o quórum qualificado de apreciação pelo plenário, rol de legitimados ativos para propositura de enunciado com efeito vinculante da súmula do Pretório Excelso, possibilidade de manifestação de terceiros, modelação de efeitos matérias e temporais do respectivo verbete, a possibilidade de reclamação em face da inobservância da súmula vinculante bem como a aplicação subsidiária do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal.
[9] Pode ainda ser ajuizado o habeas corpus ainda que exista outro recurso legal para impugnar a decisão considerada abusiva, desde que não envolva exame profundo de provas. Todavia, não se pode exigir prequestionamento em matéria de habeas corpus, mesmo que a questão tenha sido tratada em sede de decisões anteriores, mas sim, que a questão tenha sido proposta perante o tribunal coator.
[10] Com o tratamento oferecido pela doutrina brasileira, interpretando extensivamente a sua aplicação a outros direitos, o habeas corpus passou, verdadeiramente, a ser “a única válvula de segurança das liberdades individuais”.
O que se justificava, inclusive, pelo fato de que nenhuma outra ação poderia prestar-se a substituí-lo com a mesma rapidez e eficiência. Os Tribunais, porém, face à intensa demanda dos casos submetidos à apreciação do Judiciário com ampliação do habeas corpus a outros direitos individuais, passaram a enfrentar o assunto com cautela. Sempre que possível, o entendimento pretoriano procurava escorar-se no fundamento seguro da liberdade de locomoção como sendo o único objeto da tutela do remédio.
O que se justificava, inclusive, pelo fato de que nenhuma outra ação poderia prestar-se a substituí-lo com a mesma rapidez e eficiência. Os Tribunais, porém, face à intensa demanda dos casos submetidos à apreciação do Judiciário com ampliação do habeas corpus a outros direitos individuais, passaram a enfrentar o assunto com cautela. Sempre que possível, o entendimento pretoriano procurava escorar-se no fundamento seguro da liberdade de locomoção como sendo o único objeto da tutela do remédio.
[11] É um advogado criminalista brasileiro, detentor de mestrado e doutoramento em Direito penal pela USP e professor licenciado de Direito Penal da PUC-SP. Foi conselheiro, por São Paulo, no Conselho Federal da OAB, em Brasília e foi secretário-geral-adjunto do Conselho Federal da OAB. Foi presidente da Comissão Nacional de Prerrogativas da Ordem dos Advogados do Brasil, vice-presidente Comissão Nacional de Defesa e Valorização da Advocacia e membro efetivo da Comissão de Estudo da Reforma do Processo Penal e da Lei de Execuções Penais e da Comissão de Estudo e Edição de Provimento para o Preenchimento dos Cargos de Representante da OAB junto ao Conselho Nacional de Justiça e ao CNMP, e foi relator, perante o Conselho Pleno da OAB, das proposições legislativas que integram o chamado pacote antiviolência, aprovado, em caráter terminativo, pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado Federal. Foi, também, presidente do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais, e do Conselho Estadual de Entorpecentes.
No início de 2012, Alberto Toron lançou sua pré-candidatura à presidência da seccional paulista da Ordem dos Advogados do Brasil, se opondo à linha adotada pelo atual presidente Luiz Flávio Borges D’Urso. Em maio de 2017 o Ministério Público Federal acatou delação premiada de Joesley Batista, presidente do grupo JBS, em que este afirmava que o então presidente do PSDB, Aécio Neves, pediu R$ 2 milhões em propina para pagar os honorários do advogado Alberto Toron, que fazia a sua defesa nos processos da operação lava-jato
No início de 2012, Alberto Toron lançou sua pré-candidatura à presidência da seccional paulista da Ordem dos Advogados do Brasil, se opondo à linha adotada pelo atual presidente Luiz Flávio Borges D’Urso. Em maio de 2017 o Ministério Público Federal acatou delação premiada de Joesley Batista, presidente do grupo JBS, em que este afirmava que o então presidente do PSDB, Aécio Neves, pediu R$ 2 milhões em propina para pagar os honorários do advogado Alberto Toron, que fazia a sua defesa nos processos da operação lava-jato
[12] A propósito o Supremo Tribunal Federal editou a Súmula 694, onde se diz que não cabe habeas corpus contra a imposição de pena de exclusão de militar ou de perda de patente ou de função pública. A coação pode ser exercida, data vênia, por agente público ou por particular. É conhecida, aliás, posição favorável no sentido de ajuizamento de habeas corpus diante de internações em instituições particulares.
É certo que Tornaghi lecionou que a coação exercida por um particular constituirá crime de cárcere privado (artigo 148 do Código Penal), crime de constrangimento ilegal (artigo 146 do Código Penal) e, para ele, as providências contra o coator devem ser requeridas na Polícia, tratando-se de crime de ação penal pública.
É certo que Tornaghi lecionou que a coação exercida por um particular constituirá crime de cárcere privado (artigo 148 do Código Penal), crime de constrangimento ilegal (artigo 146 do Código Penal) e, para ele, as providências contra o coator devem ser requeridas na Polícia, tratando-se de crime de ação penal pública.
[13] Goffredo Carlos da Silva Telles, (1915 -2009) foi um advogado, jurista e professor universitário brasileiro. Foi professor de Direito na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), onde lecionou desde 1940, inicialmente como livre docente, depois como professor catedrático. E, tomou posse da cadeira Introdução à Ciência do Direito no ano de 1954. Em 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição Federal, criou o Círculo das Quartas-Feiras, junto aos estudantes Adriano Nunes Carrazza e Cássio Schubsky, ao qual depois se juntaram outros estudantes da Faculdade de Direito da USP.
O Círculo, como ficou conhecido, se reuniu por anos, semanalmente, para debater temas jurídicos, políticos, literários, históricos etc. O Círculo das Quartas-Feiras teve importante papel político, com medidas como primeiro mandado de segurança coletivo do País e as primeiras manifestações pelo impeachment do então presidente da República Fernando Collor de Mello. Pouco depois de sua aposentadoria, e pelo voto unânime do conselho universitário, foi honrado com o título de "Professor Emérito da Universidade de São Paulo". Morreu de causas naturais (caquexia) em sua casa no dia 27 de junho de 2009, aos 94 anos de idade.
O Círculo, como ficou conhecido, se reuniu por anos, semanalmente, para debater temas jurídicos, políticos, literários, históricos etc. O Círculo das Quartas-Feiras teve importante papel político, com medidas como primeiro mandado de segurança coletivo do País e as primeiras manifestações pelo impeachment do então presidente da República Fernando Collor de Mello. Pouco depois de sua aposentadoria, e pelo voto unânime do conselho universitário, foi honrado com o título de "Professor Emérito da Universidade de São Paulo". Morreu de causas naturais (caquexia) em sua casa no dia 27 de junho de 2009, aos 94 anos de idade.
[14] Henri Bergson (1859-1941) foi um filósofo e diplomata francês. Conhecido particularmente por Ensaios sobre os dados imediatos da consciência, Matéria e Memória. A evolução criadora e “As duas fontes da moral e da religião”, sua obra é de grande atualidade e tem sido estudada em diferentes disciplinas. Ganhou o Prêmio Nobel de Literatura de 1927. Em 1907 publicou sua obra principal: A Evolução Criadora que une crítica da tradição filosófica especulativa, com intuição da duração e com as teorias evolucionistas de Herbert Spencer. Como diplomata, participa das discussões sobre a Primeira Guerra Mundial e exerce influência sobre a decisão dos Estados Unidos em intervir no conflito. Em 1914 Bergson torna-se membro da Academia Francesa, dois anos depois, publica Duração e Simultaneidade, obra que discute a comunicação de Einstein de 1905 sobre a teoria da relatividade restrita.
[15] Da sentença concessiva ou denegatória de habeas corpus cabe recurso em sentido estrito (artigo 581, X, do Código de Processo Penal). Da sentença concessiva cabe ainda recurso de ofício, artigo 574, I, do Código de Processo Penal. Incabível seria o habeas corpus em caso de punição disciplinar. Aliás, à luz da Constituição Federal, não cabe cogitar em norma constitucional inconstitucional, uma vez que a Constituição deve ser analisada em sua inteireza, em toda a sua sistemática. Não foi de outra maneira que o Supremo Tribunal Federal, no julgamento da ADin 815 – RS, Relator Ministro Moreira Alves, 28 de março de 1996, Informativo 25 do Supremo Tribunal Federal, manifestou-se no sentido de que não tem jurisdição para fiscalizar a validade das normas aprovadas pelo poder constituinte originário.
[16] De fato, inexiste no CPP a modalidade de agravo de instrumento. A única modalidade admitida ainda em legislação extravagante é o chamado agravo em execução, na fase de execução da pena, previsto no artigo 197 da Lei 7.210/1984. As decisões interlocutórias, por sua vez, podem ser impugnadas por meio de recurso em sentido estrito, conforme o artigo 581 do CPP. Mas as hipóteses elencadas pelo referido artigo não admitem as medidas cautelares, e, outras decisões interlocutórias são impugnadas por correição parcial ou ainda pelas ações constitucionais, ou seja, por mandado de segurança criminal ou até mesmo pelo habeas corpus.
[17] Em 2008, os procedimentos criminais foram profundamente modificados em diversos pontos. Mas a principal mudança se deu no tocante à defesa do réu no processo: de 1941 a 2008, o interrogatório do réu (que é o único momento em que o acusado fala pessoalmente com o juiz, apresentando a sua versão dos fatos e exercendo seu direito de autodefesa) era o primeiro ato a ser realizado, logo após o recebimento da denúncia oferecida pelo Ministério Público. Isso significava que a pessoa processada criminalmente somente tinha oportunidade de se manifestar antes de saber o que seria dito a respeito dos fatos posteriormente por testemunhas, ou o que comprovariam eventuais documentos e provas periciais. Com a reforma de 2008, o interrogatório foi adequadamente deslocado para o final do procedimento e seguindo uma coerência lógica: primeiro a pessoa acusada tem conhecimento de tudo que se produziu a respeito dos fatos imputados para somente então se pronunciar perante o juiz.
[18] É triste a memória a edição do Ato Institucional nª5/1968, onde no artigo 10, se afirmava que "fica suspensa a garantia do habeas corpus no caos de crimes políticos, contra a segurança nacional, a ordem econômica e a economia popular". O referido ato fora revogado em 31.12.1978, quando o habeas corpus voltou a vigorar em sua plenitude.
[19] Lembremos que o habeas corpus, bem como o mandado de segurança, é remédio de rito sumariíssimo, com preferência para o julgamento, tendo em vista que objetiva amparar direito líquido e certo que é demonstrado de plano. Não pode substituir qualquer outro recurso que comporte o profundo exame da prova no seu julgamento, já que o não se admite é a apreciação de questões de alta indagação, que dependa de provas difíceis ou controvertidas.
De sorte que é incabível o conhecimento de habeas corpus de decisão em revisão criminal, ação autônoma de impugnação, ajuizada em benefício da defesa, para desconstituir coisa julgada material e formal, diante do estreito campo de análise na revisão criminal, não se subtraindo a possibilidade de habeas corpus caso haja alguma ilegalidade flagrante no julgamento daquela ação, o que significa uma questão nova.
De sorte que é incabível o conhecimento de habeas corpus de decisão em revisão criminal, ação autônoma de impugnação, ajuizada em benefício da defesa, para desconstituir coisa julgada material e formal, diante do estreito campo de análise na revisão criminal, não se subtraindo a possibilidade de habeas corpus caso haja alguma ilegalidade flagrante no julgamento daquela ação, o que significa uma questão nova.
[20] Também já se entendeu que o habeas corpus não é a via adequada para desconstituir condenação obtida através de prova ilícita, a pois há a necessidade de ampla visão do conjunto probatório, somente possível quando haja instrução e produção de várias provas, onde se recomenda o uso do recurso de apelação, quando se permite o exame mais profundo da prova. Também é incabível o habeas corpus para atender a simples intimação para prestar esclarecimentos na Polícia. Bem como para obter a restituição de coisa apreendida em decisão com força definitiva.
[21] Em verdade o STF exerce dois papéis distintos e até paradoxais. Um é o contramajoritário, quando invalida os atos de outros poderes em nome da Constituição Federal. Já o outro papel é o representativo, quando, diante de certas circunstâncias vem a atender as demais sociais que restam paralisadas no Congresso nacional.
Essas são as afirmações do Ministro Luís Roberto Barroso, que protagonizou recentemente um embate verbal com o Ministro Gilmar Mendes. Afinal, o STF pode e deve fazer o papel contramajoritário para defender as regras do jogo democrático e os direitos fundamentais. E diante da falta de atuação legislativa positiva capaz de atender as demandas sociais, cabe efetivamente ao STF, interpretando os princípios constitucionais, formular as respostas constitucionalmente adequadas. Advertiu, porém, que deve tal competência ser exercida com parcimônia.
Há quem questione angustiado se o STF é de fato uma corte constitucional? Pois, é cediço que uma corte constitucional é órgão judiciário ou diverso, cuja a principal função seja julgar a constitucionalidade de leis, emitindo pareceres sobre estas e os decretos dos poderes Executivo e Legislativo, em harmonia e consonância com a escorreita aplicação das normas constitucionais. É diferente de ser apenas uma suprema corte que tem caráter de última instância, ou de corte de apelação. Leonardo Sarmento conclui, com razão, que o STF não é autêntica corte constitucional posto que cumule funções de corte constitucional e de suprema corte.
Essas são as afirmações do Ministro Luís Roberto Barroso, que protagonizou recentemente um embate verbal com o Ministro Gilmar Mendes. Afinal, o STF pode e deve fazer o papel contramajoritário para defender as regras do jogo democrático e os direitos fundamentais. E diante da falta de atuação legislativa positiva capaz de atender as demandas sociais, cabe efetivamente ao STF, interpretando os princípios constitucionais, formular as respostas constitucionalmente adequadas. Advertiu, porém, que deve tal competência ser exercida com parcimônia.
Há quem questione angustiado se o STF é de fato uma corte constitucional? Pois, é cediço que uma corte constitucional é órgão judiciário ou diverso, cuja a principal função seja julgar a constitucionalidade de leis, emitindo pareceres sobre estas e os decretos dos poderes Executivo e Legislativo, em harmonia e consonância com a escorreita aplicação das normas constitucionais. É diferente de ser apenas uma suprema corte que tem caráter de última instância, ou de corte de apelação. Leonardo Sarmento conclui, com razão, que o STF não é autêntica corte constitucional posto que cumule funções de corte constitucional e de suprema corte.