DA POLÍTICA DE DESJUDICIALIZAÇÃO NO BRASIL: enfraquecimento do Poder Judiciário na solução de conflitos sociais

DA POLÍTICA DE DESJUDICIALIZAÇÃO NO BRASIL:

DESJUDICIALIZAR nada mais é do que incentivar a solução de conflitos por meio de métodos alternativos extrajudiciais, desincentivando o ingresso de novos pleitos junto ao Poder Judiciário.
HÁ TEMPOS TEM-SE OBSERVADO ESTA POLÍTICA NO PAÍS, antes mesmo da entrada em vigor do Código de Processo Civil de 2015, ante as inúmeras medidas tomadas pelo legislador e pelo próprio Poder Judiciário, que por meio de dirigentes processuais veem, a cada dia, filtrando as causas a serem judicializadas e as que já se encontram em trâmite/em curso, obstacularizando-as de certo modo, desestimulando a sociedade a resolver seus conflitos pela via judicial.
Os chamados EQUIVALENTES JURISDICIONAIS (meios extrajudiciais de solução de litígios), com exceção da auto tutela (que constitui-se crime no Código Penal-art 345 do CP), vem ganhando espaço e contando com o manifesto e inegável aval Estatal, seja no âmbito do Legislativo, Judiciário e Executivo.
A auto composição (por meio da transação, renúncia do direito e reconhecimento do pedido), a mediação e a arbitragem (Lei nº 9.307/1996, que condiciona o uso do Instituto ao compromisso arbitral e cláusula compromissória) ESTÃO EM VOGA no país, e tendem a ganhar espaço no ordenamento jurídico brasileiro, todavia, retira do Poder Judiciário o ônus de dirimir conflitos sociais, reduzindo novos ingressos de processos na justiça e contendo os já existentes.
Verifica-se o fenômeno em comento nas seguintes e exemplificativas situações:
1) recrudescimento dos Magistrados nas análises de pedidos de concessão dos benefícios da justiça gratuita e assistência judiciária, onde Magistrados, na condição de julgador e na notória jactância, exigem do jurisdicionado comprovações absurdas e desproporcionais de sua hipossuficiência financeira, a ponto de fulminar sua pretensão de contar com o aludido beneplácito legal.
2) nos vários dispositivos legais que obrigam o julgador a respeitar os precedentes judiciais oriundos das Cortes Superiores e do Tribunal do qual integra o Magistrado, bem como da necessária e irrestrita obediência às súmulas vinculantes editadas pelo STF. Na inércia intelectual e laboral do Magistrado, sequer atenta-se para o Distinguish (distinção procedida pelo julgador para separar as peculariedades do caso concreto dos precedentes fixados em súmulas vinculantes editadas);
3) na criteriosa análise das condições da ação e pressupostos processuais, situação que, se não observada pelas partes, culminará numa sentença extintiva do processo, não analisando seu mérito, trazendo, consequentemente, dissabor e prejuízos ao litigante, que se vê frustrado na sua pretensão. Quanto a este particular, o novo CPC, acertadamente, trouxe em seu bojo o princípio da primazia do julgamento de mérito, exigindo do julgador que vise primordialmente o julgamento da lide, resolvendo definitivamente a questão suscitada (providência legal que corrige a distorção injusta que outrora era corriqueira);
4)nas temerárias e até teratológicas decisões e sentenças prolatadas por alguns Magistrados (ou quem sabe por seus Assistentes e colaboradores de gabinete) que, no afã de se verem livres de processos em curso, atendendo exigências do Conselho Nacional de Justiça, que impõe metas a serem cumpridas, DEIXA CLARO ao jurisdicionado que a preocupação atual cinge-se unicamente a extirpação da infinita quantidade de processos em curso nas varas espalhadas pelo país e não na qualidade da prestação jurisdicional. Não é raro vermos Decisões judiciais cujo conteúdo se mostra absolutamente absurdo, nos obrigando a concluir que:1) não foi, de fato, procedida por um Magistrado ou 2), se foi, que tal julgador deveria voltar ao banco da graduação e reaprender noções básicas do direito, ou, pelo menos atualizar-se mediante qualquer curso jurídico disponibilizado facilmente pela internet (os chamados cursos a distância).
Todos as circunstâncias elencadas, cujo rol é meramente exemplificativo, contribuem para que o jurisdicionado eleja outras vias para solução de seus conflitos, vias FORA do âmbito do Poder Judiciário.
Dados estatísticos comprovam em números a insatisfação maciça da sociedade com a Justiça brasileira, a auto tutela, prática abominada pelo ordenamento jurídico, infelizmente, verticaliza-se em números apontados em pesquisas realizadas por sérias Instituições públicas e privadas (a ciência, paralela a atuação da mídia, vem colaborando com sociedade, expondo/informando as mazelas do Poder Judiciário, uma delas, a qualidade dos seus julgados).
Se de um lado a política de desjudicialização é positiva no sentido de evitar número excessivo de demandas perante o judiciário, DE OUTRO, temos a sensação que o direito fundamental de ação (CF, Art 5º, XXXV) encontra-se sob iminente ameaça, o que seria por demais temerário se considerarmos que ao Estado cabe, precipuamente, cuidar , de forma exclusiva, da função jurisdicional, dada a segurança jurídica e os necessários instrumentos conferidos ao Poder Judiciário e seus Agentes pelo Constituinte originário ( leia-se: princípios balizadores da jurisdição, garantias funcionais do Poder Judiciário, etc).
O risco de delegar a função jurisdicional a terceiros é justamente conferir legitimidade a setores da esfera privada para que resolva conflitos de acordo com seus próprios interesses, pois, além do serviço não ser gratuito, tampouco módico, nada nos garante que será isento de imparcialidade, lisura procedimental, respeito aos direitos fundamentais, etc.
Paradoxalmente, a diminuição de lides levadas ao Judiciário NÃO TEM influenciado na qualidade da prestação jurisdicional, como também não tem resultado satisfatório na execução do trabalho executado por Serventuários da Justiça (nos moldes preconizados pelos Códigos de Organização Judiciária), o princípio da eficiência, expressamente contido no art. 37 da Lei Maior, não tem sido prestigiado, bastando compulsar autos, que em regra são públicos, e verificar os atos neles contidos para se chegar a esta pueril e singela conclusão.
Abster-se o Poder Judiciário de sua função jurisdicional (função essencial do Estado), sob o pretexto de diminuição de processos, constitui-se PRÁTICA TÍPICA DO ESTADO NEOLIBERAL, do qual não há escapatória para a sociedade, ante o fato de que o mundo globalizado, sob a égide de um modelo capitalista extremamente selvagem, gira nesta órbita.

Por Leandro Borba Ferreira Nascente, Advogado militante em Goiânia.
Fone: 62 98589 1235.
Advogado Leandro Borba Ferreira
Enviado por Advogado Leandro Borba Ferreira em 26/07/2019
Reeditado em 03/02/2020
Código do texto: T6704878
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