Princípio da insignificância e seus requisitos

Parte da doutrina afirma que o princípio da insignificância tem origem no Direito Romano. Daquela época vem o brocardo em latim “minima non curat praetor”, ou seja, o pretor não trata de causas ínfimas.

Contudo, fato é que o princípio foi reintroduzido no sistema penal e amplamente difundido a partir da década de 60, pelo jurista alemão Claus Roxin.

Antes de trazer o conceito atual de insignificância, é necessário localizar, no plano do direito penal, onde ele está inserido.

O entendimento majoritário é de que crime é todo o fato típico, ilícito e culpável. É o que diz a teoria tripartida sobre o conceito analítico de crime.

O primeiro elemento, o fato típico, também é divido em quatro outros elementos: a conduta do agente, o resultado da conduta, o nexo-causal e a tipicidade penal. Nesse último elemento é onde reside a insignificância.

Quando constatada a insignificância estará afastada a tipicidade penal. Consequentemente, estará afastado o fato típico, e por fim, o crime.

A doutrina também estudou a tipicidade penal e a dividiu em dois aspectos: formal e material. O jurista argentino Zaffaroni fala ainda sobre a chamada tipicidade conglobante, mas essa teoria será objeto de outro texto. Aqui será tratado apenas dos aspectos formal e material.

A tipicidade formal é a quando o fato se adéqua perfeitamente ao texto da lei penal. Por exemplo: um passageiro do ônibus, ao receber o troco do bilhete, coloca uma nota de dois reais no bolso, de modo que uma pequena ponta fica para fora. O passageiro de trás na fila, aproveitando do grande número de pessoas no local, retira aquela nota e a toma pra si. Esse fato adéqua-se perfeitamente ao disposto no art. 155 do Código Penal. Essa é a tipicidade formal.

Ocorre que o direito penal visa proteger os bens jurídicos mais importantes e necessários à sociedade. Quando uma conduta, ainda que formalmente típica, causar um dano ínfimo diz-se que não há tipicidade material.

Portanto, a tipicidade material verifica se aquela conduta gera efetiva lesão (ou ao menos uma verossímil ameaça de lesão) ao bem jurídico constitucionalmente tutelado, ou seja, se é de fato significativa aos olhos do direito penal.

O princípio da insignificância, portanto, busca excluir, no caso concreto, a tipicidade penal, evitando que a tipificação de determinada conduta grave também alcance casos leves que não merecem a atenção da tutela penal.

A insignificância não é uma causa de diminuição de pena ou uma circunstância atenuante. A insignificância afasta o crime em razão da ausência de tipicidade material.

A jurisprudência do STF trouxe quatro requisitos para que uma conduta seja considerada insignificante para o direito penal:

São eles:

Reduzido grau de reprovabilidade do comportamento

Mínima ofensividade da conduta do agente

Ausência periculosidade social da ação

Inexpressividade da lesão jurídica provocada

Toda a conduta a conduta criminosa é reprovável, por esta razão o STF fala em “reduzido” grau de reprovabilidade do comportamento e não em “ausência” de reprovabilidade do comportamento.

Podemos citar, por exemplo, que atitudes como atrevimento, insolência, ousadia, desprezo com a vítima, a demonstração de sagacidade na prática criminosa, contumácia delitiva revelam alto grau de reprovabilidade do comportamento.

A ofensividade da conduta se refere ao “potencial” lesivo e não à lesão concreta. Já na inexpressividade da lesão analisa-se a lesão efetivamente provocada (lesão em concreto), ou seja, o valor do bem (tanto para a vítima como para a sociedade).

A periculosidade social da ação verifica se a conduta gerou um risco à sociedade.

Importante ressaltar uma controvérsia jurisprudencial com relação a aplicação do princípio com relação aos crimes contra a administração pública. A súmula nº 599 do STJ afirma que “o princípio da insignificância é inaplicável aos crimes contra a administração pública”.

Ocorre que o crime de descaminho está inserido no Título XI do Código Penal, denominado “Dos Crimes contra a Administração Pública”. Tanto o STF como o próprio STJ (mesmo depois da súmula) continuam aplicando o princípio ao crime de descaminho (quando presentes os requisitos e o valor não seja superior R$ 20 mil).

O STJ, em 14/08/2018, no RHC 85.272/RS, afastou a incidência da súmula em um caso de dano qualificado contra o patrimônio público nos seguintes termos:

“A despeito do teor do enunciado sumular n. 599, no sentido de que O princípio da insignificância é inaplicável aos crimes contra a administração pública, as peculiaridades do caso concreto – réu primário, com 83 anos na época dos fatos e avaria de um cone avaliado em menos de R$ 20,00, ou seja, menos de 3% do salário mínimo vigente à época dos fatos – justificam a mitigação da referida súmula”.

O princípio da insignificância também é chamado de princípio da bagatela, entretanto não se pode confundir com o chamado “princípio da bagatela imprópria”. Esse outro princípio também é chamado de Princípio da desnecessidade da pena ou Irrelevância Penal do Fato.

São princípios diversos e o princípio da bagatela imprópria será tratado em outro texto, mas é necessário ressaltar aqui um ponto é crucial para diferenciá-los: o princípio da insignificância (ou bagatela) NÃO tem previsão legal. O princípio da Irrelevância Penal do Fato possui arrimo legal no artigo 59 do CPB.