A Defensoria Pública na Constituição
A Defensoria Pública na Constituição
Cumpre, inicialmente, trazer ao tema central desta obra, a visão do legislador constituinte no que diz respeito à instituição “Defensoria Pública”. Para tanto, a viagem pela Constituição Republicana, melhor, pela Constituição Federal (uma vez que a redação correta do nome da Carta Maior deveria ser Constituição da Federação Republicana do Brasil, afinal, a Federação vem primeiro e após, decide-se pela forma de governo – república ou monarquia constitucional,
v.g. como foi disciplinado no artigo 2º dos Ato(s) das Dis- posições Constitucionais Transitórias – ADCT), respeitará a ordem cronológica da Carta Magna.
Assim, vejamos. Reza o artigo 5º, incisos LXIII e LXXIV da CF, in verbis:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
LXIII - o preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado, sendo-
-lhe assegurada a assistência da família e de advogado (grifo nosso)
Observemos que a pessoa, e não só o cidadão (detentor de direitos políticos), na condição de preso, terá o direito de um advogado. Este termo advogado é gênero, pois estamos diante da figura de advogado público (antes da instituição da defensoria pública em muitos Estados brasileiros, quem fazia as “vezes” da defensoria pública eram os Procuradores do Estado) ou privado e de defensor público, cujas atribuições se assemelham, mas são profissões total- mente diferentes, com naturezas distintas.
Aproveitando o ensejo, em matéria de Habeas Corpus, no âmbito trabalhista, disciplina a Constituição em seu artigo 114, inciso IV, com redação trazida pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004 (a chamada Re- forma do Judiciário, que aliás quis trazer a nomenclatura DESEMBARGADOR DO TRABALHO E DESEMBARGA-
DOR FEDERAL para juízes de 2º grau, destes dois órgãos da judicatura nacional, porém, na publicação da Emenda, não foi respeitada a redação que foi votada e enviada para o diário, pelo menos até, dia 07 de dezembro de 2004 – coisas do Brasil. Tanto que até hoje, o Termo Desembargador é disciplinado em Regimento interno dos Tribunais Regionais Federais e do Trabalho de todo o país, já que a
Constituição apenas manteve este termo “pomposo” para juízes de segundo grau dos Estados, aliás, o termo desembargador é tão chique, que apelidamos um amigo, Augusto Belém, “Gugu”, com este título), o seguinte:
Art. 114. Compete à Justiça do Trabalho pro- cessar e julgar:
IV os mandados de segurança, habeas cor- pus e habeas data , quando o ato questionado envolver matéria sujeita à sua jurisdição; (grifo nosso).
A Ação Direta de Inconstitucionalidade 3.684-0/ DF, da relatoria do Ministro Cezar Peluso, apenas garantiu a utilização deste remédio heroico (lembre-se da reforma ortográfica - ditongo) nos casos de prisão civil, ou seja, depositário infiel, já que pensão alimentícia está totalmente fora da seara trabalhista (porém, é bom analisar decisões
v.g. como a do ministro Hugo Carlos Scheuermann, AIRR 2438.39.2010.5.02.0431, de 23.04.18), em tese. Pois bem, numa interpretação equivocada do Pacto de São José da Costa Rica, infelizmente, o Supremo Tribunal Federal – STF editou a Súmula Vinculante de nº 25, onde positiva o seguinte: “é ilícita a prisão civil do depositário infiel, qual- quer que seja a modalidade de depósito”. O STF é com- posto por pessoas, na sua maioria, sem a vocação para a magistratura, aliás, dos 11 Ministros, apenas três fizeram
concurso e ingressaram na Magistratura, os outros foram magistrados pelo quinto constitucional, ou vieram da advocacia pública ou privada, ou seja, a imparcialidade não é o forte de muito dos Ministros. Seja como for, os Ministros ganharam a força de legisladores após o advento da Emen- da Constitucional nº 45, com a possibilidade de edição de súmulas vinculantes.
Este tema por si só já seria objeto de outro livro, pois as incongruências do STF, principalmente por parte de alguns dos seus membros, tornou-se alvo de descrédito perante a opinião pública, como podemos citar a súmula vinculante nº 13 que trata do nepotismo, mas não se aplica para cargos de natureza política, ou seja, nepotismo não pode para nomeações de cargos administrativos, v.g., mas cabe para cargos políticos, a exemplo do Prefeito que pode nomear sua esposa como secretária de administração e seu filho secretário de esportes, que estará tudo legal.
Bem, voltando para o tema central desta obra, quis o STF afastar esta competência dos Tribunais do Trabalho, como o fez com a ADIn nº 3.3956 em relação ao inciso I, do artigo 114, da CF, cuja oportunidade da Justiça do Trabalho atuar diretamente nas lides envolvendo servidores públicos, auxiliaria em muito na garantia de direitos trabalhistas, em sentido amplo, para muitos servidores em todo o país, principalmente em razão das fragilidades legais, por não dizer, ausências, como por exemplo a falta de uma norma que verse sobre direito de greve do servidores públicos, tema resolvido por analogia, pelo próprio STF fazendo paradigma com a Lei 7.783/89 (preferiu não editar súmula vinculante, que seria o caso).
Verdade seja dita, o STF e o Tribunal Superior do Trabalho - TST, vez por outra, encontram-se em divergência, como foi o caso dos temas referente a prescrição inter- corrente e responsabilidade subsidiária da Administração Pública em matéria de terceirização. Aliás, em se tratando de terceirização, o STF, no dia 30 de agosto de 2018, julgou a ADPF 324 e o Recurso Extraordinário 958252, e aprovou no âmbito deste último, em sede de tese de repercussão geral, a seguinte redação: “É licita a terceirização ou qualquer outra forma de divisão do trabalho entre pessoas jurídicas distintas, independentemente do objeto social das empresas envolvidas, mantida a responsabilidade subsidiária da empresa contratante”. Com esta decisão, o STF também tratou da inconstitucionalidade de incisos da Súmula 331 do TST. Com mais esta realidade, o TST terá que reformular o quanto antes as suas súmulas, inclusive no tocante à reforma trabalhista.
O TST, mesmo após a edição da súmula vinculante nº 25, ainda não reformulou ou cancelou a vigências das Orientações Jurisprudenciais da Seção de Dissídios Individuais 2 – SDI-2, de números 89, 143 e 156, a seguir transcritas:
1. OJ-SDI2-89 “HABEAS CORPUS”. DEPOSITÁRIO. TERMO DE DEPÓSITO NÃO ASSINADO PELO PACIENTE. NECESSIDADE DE ACEITAÇÃO DO ENCARGO. IMPOSSIBILIDADE DE PRISÃO CIVIL (inserida em 27.05.2002) A investidura no encargo de depositário depende da aceitação do nomeado que deve assinar termo de compromisso no auto de penhora, sem o que, é inadmissível a restrição de seu direi- to de liberdade
2. OJ-SDI2-143 “HABEAS CORPUS”. PENHORA SOBRE COISA FUTURA E INCERTA. PRISÃO. DEPOSITÁRIO INFIEL (alterada)
– Res. 151/2008, DEJT divulgado em 20, 21 e 24.11.2008 Não se caracteriza a condição de depositário infiel quando a penhora recair sobre coisa futura e incerta, circunstância que, por si só, inviabiliza a materialização do depósito no momento da constituição do pa- ciente em depositário, autorizando-se a con- cessão de “habeas corpus” diante da prisão ou ameaça de prisão que sofra.
3. OJ-SDI2-156 “HABEAS CORPUS” ORIGINÁRIO NO TST. SUBSTITUTIVO DE RECURSO ORDINÁRIO EM “HABEAS CORPUS”. CABIMENTO CONTRA DE- CISÃO DEFINITIVA PROFERIDA POR TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO.
(DEJT divulgado em 09, 10 e 11.06.2010) É cabível ajuizamento de “habeas corpus” originário no Tribunal Superior do Trabalho, em substituição de recurso ordinário em “habeas corpus”, de decisão definitiva proferida por Tribunal Regional do Trabalho, uma vez que o órgão colegiado passa a ser a autoridade coatora no momento em que examina o mérito do “habeas corpus” impetrado no âmbito da Corte local.
Trata-se de uma matéria polêmica e que ain- da teremos muitos debates sobre o tema, principalmente quando das hipóteses de desacato de autoridade (v.g. AIRR - 142.78.2013.5.03.0012 Ministra Kátia Magalhães Arruda. DEJT 28.09.18) ou falso testemunho (v.g. AIRR - 10850.09.2016.5.03.0111 Ministro Breno Medeiros. DEJT 24.08.18) em audiência trabalhista que podem gerar uma prisão em flagrante, cujo tema, habeas corpus poderá ter ainda mais outras possibilidades, que também não será objetos de profundidade nesta obra. Basta registrar que o tema está disciplinado especificamente nos artigos 647 a 667 do Código de Processo Penal.
Continuando. Segue o inciso LXXIV:
LXXIV - o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos;
A insuficiência de recursos é um tema que foi mui- to bem abordado no Novo Código de Processo Civil, Lei 13.105/2015, em especial à gratuidade da justiça, conforme artigos 98 a 102 deste diploma processual, bem como em um título próprio que traz a Defensoria Pública, nos artigos 185 a 187.
Quis o legislador garantir a qualquer pessoa, sem condições de sustento pessoal ou de sua família, o direito de contar com uma assistência jurídica integral, ou seja, tanto na seara judiciária ou administrativa, de maneira gratuita.
Na prática, este papel vem sendo exercido pela Defensoria Pública. Por esta razão, a não existência de uma Defensoria Pública junto a Justiça do Trabalho causa, além dos prejuízos financeiros aos reconhecidamente pobres, também fere norma constitucional, sendo passível de pré-questionamento quando da elaboração dos recursos trabalhistas ou não.
Por isso, defendo, a existência da Defensoria Pública trabalhista para garantir ao trabalhador o direito de escolha ou, no ajuizamento das ações trabalhistas ou, em fazer uso do ius postulandi ou, da Defensoria Pública ou ainda, de advogado que se preste a aceitar o pagamento de honorários contratuais no momento do pagamento das verbas resilitórias, ou antecipadamente.
Seguindo no estudo da Carta Constitucional, deparamo-nos com o artigo 6º, que reza o seguinte:
Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o trans- porte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição. (grifo nosso)
Costumo dizer em minhas aulas, nestes 12 anos de docência jurídica, que se o legislador quisesse encerrar a Constituição Federal até o artigo 5º ou 6º já teria dito tudo aquilo que é necessário para a manutenção do Estado democrático de direito. O artigo 6º é a cereja do bolo, ou seja, vem para definir exatamente os fins para o qual o Estado Brasileiro existe. Saúde, educação, etc. Parece até texto de político em época de campanha eleitoral. Mas é fato que este dispositivo direciona a finalidade das ações do Estado. É claro que é mais utópico que real, mas, como no direito, vivemos o real sobre o ideal, não seria diferente na Constituição Federal.
Entre os objetivos está a assistência aos desampara- dos. Sem precisar ser redundante em defesa da Defensoria Pública trabalhista, mas é necessário recordar que a Carta Maior entende como fim por si mesmo do Estado, garantir esta assistência e por gênero, tendo como espécie a assistência jurídica aos desamparados. Mister enaltecer que os trabalhadores em sua maioria, enquadram-se na condição de necessitados, hipossuficientes, e não tendo escolha, contratam advogados particulares ou mendigam assistência jurídica junto a sindicatos despreparados ou desinteressados.
Neste sentido, bem lembra a magistrada do Trabalho da 4ª Região, Raquel Hochmann de Freitas, em seu livro A Defensoria Pública no âmbito Trabalhista como forma de efetivação dos direitos fundamentais a ampla defesa e ao acesso à justiça, (São Paulo: LTR, 2015): “No âmbito da Justiça Laboral, o operador do direito se vê diante de uma realidade em que o trabalhador ou mesmo o pequeno empregador — pessoa física ou jurídica, muito em- bora tenha diante de si o instituto jurídico do ius postulandi, que em tese lhe proporcionaria a facilidade no acesso à justiça, acaba por deparar-se com um verdadeiro entrave à efetivação deste, mormente considerando a situação de desigualdade que encontrará, diante de uma parte adversa devidamente assessorada por procurador habilitado junto à Ordem dos Advogados do Brasil — OAB”. Inclusive no prefácio desta obra da magistrada, o Desembargador do Trabalho do TRT da 4ª Região, José Felipe Ledur, ainda enaltece algo importante, que passo a transcrever: “(...) a Defensoria Pública não importa a supressão da assistência jurídica pelos sindicatos, mas sim uma alternativa a esse
serviço”.
Enfim, da leitura da parte final desta obra, o leitor por certo concluirá que a Defensoria Pública é órgão estatal que, munindo-se de estrutura material e de recursos humanos apropriados, estará apto a fornecer prestação material estatal genuína, consistente na assistência jurídica integral e gratuita devida aos cidadãos necessitados. Isso exige a superação de preconceitos, via de regra alicerçados em razões ideológicas, que não servem ao aprimoramento de Estado de Direito estruturado no reconhecimento e correspondente acesso aos direitos fundamentais por todos.
Assim, não bem saímos do início da Constituição Federal, deparamo-nos com a imperiosa determinação de prestação jurídica aos reconhecidamente desamparados, entre eles, evidentemente, os trabalhadores em sua maio- ria.
Nos artigos 21, em seu inciso XIII, 22, XVII, e 24, XIII, a seguir transcritos, continuaremos a análise:
Art. 21. Compete à União:
XIII - organizar e manter o Poder Judiciário, o Ministério Público do Distrito Federal e dos Territórios e a Defensoria Pública dos Territórios;
Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre:
XVII - organização judiciária, do Ministério Público do Distrito Federal e dos Territórios
e da Defensoria Pública dos Territórios, bem como organização administrativa destes;
Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre: XIII - assistência jurídica e Defensoria pública;
A competência da União em organizar e legislar sobre a DPU é exclusiva, logo sobre este aspecto não há o que comentar. Assim, todos os reflexos relativos à indenização por conta da responsabilidade objetiva de atos da DPU, compete à União em arcar com tal obrigação. É evidente que as Defensorias estaduais e distritais serão de competências dos Entes específicos, exceto no quesito manutenção, onde a Defensoria do DF ficará sob a responsabilidade financeira da União, como bem contextualiza a norma constitucional. 44 Em relação aos Territórios Federais, uma vez estes existindo de fato, pois de direito textualmente já estão autorizados a existir, implicará na responsabilidade da União,
conforme art. 33, § 3º, da CF.
No aspecto remuneratório, sob a ótica exclusiva, por enquanto, da CF, encontramos o teto remuneratório do artigo 37, XI, cujo limite é o subsídio mensal, em espécie, dos Ministros do Supremo Tribunal Federal.
Deixa claro a CF que cumprirá ao Congresso Nacional, dispor sobre todas as matérias de competência da União, especialmente sobre a organização administrativa da Defensoria Pública da União, com base no artigo 48, IX.
No artigo 61, § 1º, II, “d”, da CF traz a seguinte ordem: São de iniciativa privativa do Presidente da República as leis que disponham sobre a organização da Defensoria Pública da União, bem como normas gerais para a organização da Defensoria Pública dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios. É evidente que a proposta de iniciativa do Chefe maior do Executivo nacional, descrita na Constituição, teve o condão de tratar a funcionabilidade das Defensorias com o devido respeito que elas merecem, uma vez que, em tese, o Gestor Maior possui as informações necessárias para melhor atenderem os interesses dos desassisti- dos no âmbito judicial.
O artigo da Constituição Federal mais importante para a Defensoria Pública é justamente aquele a disciplina, ou seja, o artigo 134, que por sinal passou por várias alterações no últimos anos, através das Emendas Constitucionais nºs 19/1998, 45/2004, 74/2013 e 80/2014.
Costumo explicar em sala de aula, a visão do Legislador Constituinte no tocante ao Título IV da Constituição Federal. Na verdade, faço questão de ensinar para o aca- dêmico de direito a importância que tem em compreender toda a Norma Maior e principalmente os seus erros formais e aspectos teleológicos projetados pelo Constituinte, pois ela é a nossa principal ferramenta de trabalho.
Os erros formais básicos que costumo tratar em sala, além do nome da própria Constituição, como já abordei anteriormente, temos a ausência do direito à vida no preâmbulo, apesar de ter vindo corretamente positivado no artigo 5º (como ocorreu com outros direitos citados no enunciado preambular); a ausência do termo União (Ente Federativo) no caput do artigo 1º; ou ainda o direcionamento para os Poderes da União, quando o correto seria positivar Poderes da República, afinal, sabemos que a Constituição Federal é ao mesmo tempo Constituição do Brasil e do Ente União e que um dos Entes não possuem o Poder Judiciário, como é o caso do Município.
Pois bem, já em relação aos aspectos teleológicos, temos vários exemplos, mas o maior deles é justamente estabelecer que além de Poderes da República, encontramos no Título IV, que trata sobre a organização dos Poderes, quatro capítulos, aos invés de três, pois foi designado um capítulo específico para as funções essências à Justiça. Quis então o Legislador Constituinte, não atribuir ao Ministério Público, a Advocacia Pública, a Advocacia Privada e a Defensoria Pública o status de Poder e sim de função que exerceu em auxilio aos Poderes, promovendo a Justiça.
Sabemos que no Brasil prevalece o sistema de jurisdição única, una, judiciária, conforme o artigo 5º, XXXV, da CF, quando informa que a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito. Razão pela qual, o conceito final de justiça será dado pelo Poder Judiciário, quando provocado, no entanto, nada impede aos demais Poderes o controle de constitucionalidade das normas, bem como à funções essenciais à justiça buscarem ao fiel cumprimento da Constituição Federal.
Assim, a Defensoria Pública nasceu formalmente com esta Carta Constitucional e nada melhor para compreendê-la do que transcrever o texto legal com a redação em vigor na data hoje (antes que o Legislador mude mais uma vez – 99 Emendas Constitucionais em 30 anos versus Constituição americana em vigor desde 1789 – 229 anos - com apenas 27 Emendas Constitucionais):
DA DEFENSORIA PÚBLICA
(REDAÇÃO DADA PELA EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 80, DE 2014)
Art. 134. A Defensoria Pública é instituição per- manente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe, como expressão e instrumento do regime democrático, fundamentalmente, a orientação jurídica, a promoção dos direitos humanos e a defesa, em todos os graus, judicial e extrajudicial, dos direitos individuais e coletivos, de forma integral e gratuita, aos necessitados, na forma do inciso LXXIV do art. 5º desta Constituição Federal. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 80, de 2014)
§ 1º Lei complementar organizará a Defenso- ria Pública da União e do Distrito Federal e dos Territórios e prescreverá normas gerais para sua organização nos Estados, em cargos de car reira, providos, na classe inicial, mediante concurso público de provas e títulos, assegurada a seus integrantes a garantia da inamovibilidade e vedado o exercício da advocacia fora das atribuições institucionais. (Renumerado do pará- grafo único pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004)
§ 2º Às Defensorias Públicas Estaduais são as- seguradas autonomia funcional e administrativa e a iniciativa de sua proposta orçamentária dentro dos limites estabelecidos na lei de diretrizes orçamentárias e subordinação ao disposto no art. 99, § 2º. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004)
§ 3º Aplica-se o disposto no § 2º às Defensorias Públicas da União e do Distrito Federal. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 74, de 2013)
§ 4º São princípios institucionais da Defensoria Pública a unidade, a indivisibilidade e a independência funcional, aplicando-se também, no que couber, o disposto no art. 93 e no inciso II do art. 96 desta Constituição Federal. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 80, de 2014)
Art. 135. Os servidores integrantes das carreiras disciplinadas nas Seções II e III deste Capítulo serão remunerados na forma do art. 39, §4º. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)
Estes dispositivos sãos interessantes pois demonstram a vontade de definir a organização administrativa e financeira das Defensorias, o ingresso na carreira e os princípios, princípios estes que justificam a unidade da instituição Defensoria Pública em todo país. Muitas Emendas Constitucionais acresceram informações a estes dispositivos centrais na organização da Defensoria e de fato, moldaram uma nova instituição, bem diferente daquela que estava positivada quando da publicação da CF.
Em seguida encontramos os artigos 166 e 168 que tratam das diretrizes orçamentárias a serem destinadas para a Defensoria Pública, principalmente com a nova realidade financeira trazida pela Emenda Constitucional nº 86/2015.
Já no artigo 227, § 3º, VI, in verbis, nos ensina que:
Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. (Re- dação dada Pela Emenda Constitucional nº 65, de 2010)
§ 3º O direito a proteção especial abrangerá os seguintes aspectos:
VI - estímulo do Poder Público, através de assistência jurídica, incentivos fiscais e subsídios, nos termos da lei, ao acolhimento, sob a forma de guarda, de criança ou adolescente órfão ou abandonado;
A Defensoria Pública se faz presente em relação à guarda de crianças e adolescentes abandonados ou órfãos. Evidentemente, à primeira vista parece um tema desfocado da seara trabalhista, no entanto, vale lembrar que o(a) trabalhador(a) que deseja adotar, terá que contar com auxílio de advogado ou defensor público e nada impede, que este profissional, caso esteja patrocinando a causa do adotante, que também, o instrua, no processo de guarda e viabilize um melhor contato com a Defensoria Pública estadual para promoção da ação. Apesar, que neste estudo, defendo a possibilidade da subsidiariedade entre defensorias e as- sim, da mesma forma como a DPE teria a competência para ajuizar ações trabalhistas, o inverso, também deveria ser reconhecido, ou seja, neste caso, a DPT poderia mover ação cível de guarda, inclusive por estar mais vinculado ao autor ou autora da demanda trabalhista.
Mister acrescer que os artigos 392-A e 392-C, da CLT, tratam sobre o tema adoção, abaixo transcritos:
Art. 392-A. À empregada que adotar ou obtiver guarda judicial para fins de adoção de criança ou adolescente será concedida licença-maternidade nos termos do art. 392 desta Lei.
(...)
§ 4o A licença-maternidade só será concedida mediante apresentação do termo judicial de guarda à adotante ou guardiã.
5o A adoção ou guarda judicial conjunta ensejará a concessão de licença-maternidade a apenas um dos adotantes ou guardiães empregado ou empregada.
Art. 392-C. Aplica-se, no que couber, o disposto no art. 392-A e 392-B ao empregado que adotar ou obtiver guarda judicial para fins de adoção.
Assim, a atuação da DPT seria de extrema importância para o trabalhador brasileiro, até em matéria, que em tese é exclusivamente de natureza cível.
Para finalizar o tema Defensoria Pública inserida na CF, encontramos nas Disposições Constitucionais Gerais, o artigo 235 que versa sobre a criação de Estados, e como este será organizado e do surgimento dos cargos, entre eles o da Defensoria Pública, nada diferente do que se deseja para uma realidade imposta pelo Estado demo-crático de direito.
Como a nossa CF é uma “colcha de retalhos”, feita por pessoas que, em regra, não sabem “costurar correta- mente”, encontramos uma parte significativa da Constituição Federal projetada no Ato das Disposições Constitucionais Transitórias – ADCT.
Nele encontramos o artigo 22, que dispõe que É assegurado aos defensores públicos investidos na função até a data de instalação da Assembleia Nacional Constituinte o direito de opção pela carreira, com a observância das garantias e vedações previstas no art. 134, parágrafo único, da Constituição. O TST consolidou entendimento sobre este tema em sede de jurisprudência (Orientação Jurisprudencial nº 14 da SDI - 1 – Transitória).
No tocante à matéria financeira da instituição Defensoria Pública, deparamo-nos com os artigos 76-A, 107 e 109, que não merecem considerações neste momento. Apesar que, a dotação orçamentária inibe uma melhora na DPU, o que não quer dizer que gerencialmente, a ausência da defensoria no âmbito da Justiça do Trabalho não esteja também relacionada a falta de interesse nesta atuação especial. Aliás, sobre este tema, em 08 de agosto de 2018, a Associação Nacional dos Defensores Públicos Federais (Anadef) ajuizou Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 5988), no Supremo Tribunal Federal (STF), pedindo que a Corte dê interpretação conforme a Constituição ao dispositivo do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT) que diz respeito especificamente aos gastos da Defensoria Pública da União (artigo 107, inciso V e parágrafo 1º). Esta informação está publicada no sítio eletrônico do STF, nestes termos e segue a nota, in verbis:
Segundo a entidade, o “Novo Regime Fis- cal” instituído pela Emenda Constitucional 95/2016 para congelar os gastos públicos primários pelos próximos 20 exercícios financeiros pode gerar graves prejuízos à instituição. “Considerando o congelamento dos gastos da DPU, promovido pela EC 95, a interpretação dada pelo Executivo a esses preceitos legais levaria à redução, em cerca de 33%, do serviço hoje prestado pela instituição, com o fecha- mento das respectivas unidades”, advertiu.
Na ação, a entidade rememora que o artigo 107 do ADCT fixou limite individualizado para as despesas da Defensoria Pública da União, e não para as defensorias públicas estaduais. Já os artigos 105, 106 e 107 e 108 da Lei 13.328/2016 concernem à atribuição de requisitar funcioná- rios conferida especificamente à DPU, não às demais defensorias.
A Anadef pede que o STF examine a constitucionalidade dos dispositivos da Lei nº 13.328/2016, no contexto específico da vigência da EC 95/2016, sob o argumento de que o Poder Executivo Federal vem procurando ex- trair desses preceitos a interpretação segundo a qual os servidores de outros órgãos, requisitados pela DPU há mais de três anos – a DPU não possui quadro de apoio próprio –, devem ter sua remuneração reembolsada pela própria DPU.
Na ADI, a Anadef afirma que as unidades da DPU atualmente instaladas não são suficientes para atender sequer à metade real de sua população alvo, que, em decorrência de sua hipos- suficiência, tem direito à assistência jurídica gratuita (pessoas com mais de dez anos de ida- de e com renda de até dois salários mínimos, para fins estatísticos). Hoje, a atuação da DPU alcança 1.832 municípios e atende, potencial- mente, a 41.385.421 pessoas, abrangendo apenas cerca de 33% dos municípios brasileiros e menos de 55% da população que tem direito ao atendimento.
A entidade pede liminar para que os recursos destinados à execução do cronograma que estabelece (Emenda Constitucional 80/2014) que, em oito anos, a Defensoria Pública estivesse presente em todas as unidades jurisdicionais do Brasil, não estejam inseridos no congelamento de gastos públicos primários (Novo Regime Fiscal). Para cumprir a determinação, a DPU elaborou, em 2015, o Plano de Interiorização da DPU, que previa a instalação de 205 novas unidades, o que seria suficiente para dar conta de todas as seções e subseções judiciárias federais faltantes. Com as instalações ocorridas em 2015, restam ainda 196 unidades a serem instaladas.
Essa ação já traz um dado importante: a DPU só alcança 1.832 municípios, ou seja, muito aquém da necessidade. Uma coisa é certa, caso não seja planejada ou dese- jada uma DPT, esta não estará nos projetos definidos pela Emenda Constitucional nº 80, de 2014, que trouxe a seguinte redação à ADCT:
Art. 98. O número de defensores públicos na unidade jurisdicional será proporcional à efetiva demanda pelo serviço da Defensoria Pública e à respectiva população.
§ 1º No prazo de 8 (oito) anos, a União, os Estados e o Distrito Federal deverão contar com defensores públicos em todas as unidades jurisdicionais, observado o disposto no caput deste artigo.
§ 2º Durante o decurso do prazo previsto no § 1º deste artigo, a lotação dos defensores públicos ocorrerá, prioritariamente, atendendo as regiões com maiores índices de exclusão social e adensamento populacional.
Assim, caso não haja prioridade na implementação da DPT, com certeza, estará mais uma vez, os trabalhadores brasileiros, preteridos do direito de contar com uma defensoria pública especializada em matéria trabalhista.