ADVOGADO - PROFISSÃO INGRATA

Num prédio comercial de uma cidade qualquer, existe uma banca de um causídico a espera de seus clientes; clientes estes que estão por toda parte, em qualquer lugar, a qualquer hora; e na outra ponta, o Senhor Cliente, aquele que pode ser uma pessoa física ou jurídica e em alguns países, até irracionais podem ser clientes dos causídicos, ou, na linguagem popular, o Doutor Advogado.

No Brasil, não obstante de outros tão civilizados quanto, tipo Haiti, Marrocos ou Togo, bem que os pobres animaizinhos poderiam contratar advogados para suas causas, afinal de contas, o Ex-Ministro do Trabalho, Rogério Magri, disse um dia na imprensa que o seu cãozinho era um ser humano, como outro qualquer. Quero deixar registrado que a minha parte de racionalidade eu dispenso comparações com os distintos canídeos ou para qualquer outra espécie do reino animal irracional e nomeio de público como meu representante para esta causa o próprio Rogério Magri, que deve sim ter algum parentesco com a bicharada.

Mas voltemos o assunto em questão.

Quando a pessoa (física ou jurídica) se sente injustiçada e clama pelo acolhimento da justiça; o indivíduo tem duas saídas; a primeira é procurar os Juizados Especiais para causas menores do que 20 salários mínimos e a outra e definitiva é ir até uma destas bancas de Doutores Advogados para contrata-lo, na melhor forma do direito aplicado, para que o engravatado o represente perante a justiça, analisando suas lamúrias e as transformando em pedidos embasados (nem sempre isso acontece), que será apreciado por um Magistrado e em seguida a sentença proferida, ou, como queiram, a decisão primária do que foi pleiteado.

Mas eu não quero me apegar com os pormenores que envolvem o rito jurídico e sim discutir uma relação; a relação entre cliente advogado e mesmo não sendo eu um advogado, convivo cotidianamente com muitos conhecidos e alguns muitos amigos e vejo a disparidade entre as partes.

Nesta relação, muitas vezes amistosa, outras vezes sisuda, as pessoas num primeiro momento, que chamaremos aqui de PONTO DE PARTIDA, se amam, juram fidelidade eterna e prometem serem um do outro até que a causa se encerre. Esta etapa é muito simples pois e amena e as duas partes são austeras e pacíficas pois, se de um lado o indivíduo cliente precisa dos conhecimentos, palavreados e representação para se defender ou atacar alguém numa causa; do outro existe outro indivíduo necessitando ganhar dinheiro por meio de honorários ou comissão pela coisa ganha ou contratada.

Quem procura, normalmente o cliente, quer ingressar na justiça contra alguém e quem é procurado, quer ganhar a ação para fazer jus ao seu quinhão na coisa ganha, esta é a regra básica da contratação do profissional de direito e mesmo que o contratado não logre êxito ao final do litígio, ele necessita ser pago de alguma forma pelos seus serviços, afinal de contas, o médico não só ganha quando salva vidas ou cura uma enfermidade; o profissional de medicina ganha pelo ATENDIMENTO e partindo por esta linha, o advogado deveria ganhar quando atendesse o cliente por um motivo simples; o cliente costuma fazer leilão de valores invertidos ou seja, quem cobra menos e promete mais é quem o representará.

No ponto de partida há também uma outra coisa muito interessante que é a sapiência aguçada do cliente. Tirando os mais humildes, que costumam endeusar os profissionais “doutores”, sempre há os que dizem saber demais, às vezes querem saber mais do que os próprios advogados e alguns enfatizam que estão ali apenas porque não possuem registro na Ordem dos Advogados, como se a aplicação da ciência já estivesse resolvida, necessitando apenas da colocação de um número que identifique “algum profissional”.

Depois do ponto de partida, chega a hora da representação. Nesta etapa, o contratado, quando é sério, mantém o contratante informado das datas das audiências, dos horários dos compromissos e apresenta relatórios que são uma espécie de recibo sem valor monetário.

Alguns clientes imaginam que a promessa de pagamento feita ao profissional de direito ou algum adiantamento a título de honorários o deixa garantido de uma espécie de pacote turístico. O cliente desavisado ou oportunista imagina que o advogado lhe apanhará em casa com carro de luxo, pagará as refeições e ao final da audiência, o chamará para um bate-papo num barzinho com direito a chopp gelado.

Pouco há de se fazer nesta etapa mediana. Se o cliente for iniciar uma ação, ele tem que discutir os parâmetros iniciais da relação e assinar a procuração e o advogado após formular a petição, distribui a mesma em foro competente, aguardando o seu julgamento.

Ao final, após haver o transito em julgado, chega a hora da alegria ou decepção. Não imaginando que não é o advogado quem julga, o cliente se não obtém êxito em seu pedido, parte em ataque e muitas vezes diz que já sabia que o advogado “não valia nada” e que irá recorrer com outro profissional contratado e o pior disso tudo é que existem advogados que muitas vezes dizem: - É verdade, o Senhor está certíssimo! Veio ao lugar certo e não sairá deste escritório sem o devido êxito.

Se o cliente recebe como resposta de seus pedidos um “sim” da justiça, ele vibra, pula, grita e diz: -Ganhamos! Eu já sabia que o senhor é fera, doutor! Mas eu também dei uma forcinha com minhas opiniões, não é verdade?

Depois que a ação é julgada o profissional de direito só tem uma escolha; ou se torna um Deus perante o cliente, ou o diabo. São raros os casos em que o cliente compreende a competência do advogado, mesmo os que não possuem nenhuma, de que eles tentaram o que puderam e que a partir daquele momento, resta-lhes o recurso superior.

Agora chegou o instante do pagamento pelos serviços prestados, os honorários, e na maioria dos casos, o profissional contratado sempre tem dificuldade em receber criteriosamente o valor contratado. Se a justiça do pleito for a do Trabalho, normalmente os valores de acertos são depositados numa conta judicial especial e o advogado pode solicitar o saque por meio de alvará, o que facilita a vida do advogado.

Agora, falando mais sério.

A profissão de advogado é regulamentada por lei própria (8.906 de 2004) e a sua contratação é considerada por muitos juristas como uma relação de consumo, com os mesmos parâmetros do Código de Defesa do Consumidor (lei 8.078 de 1990), caso recente da Juíza do TRT, Jane Torres da Silva, da 9ª Turma do TRT paulista.

O cliente, ao procurar um advogado, deve exigir um contrato formal e cópia da procuração, bem como o recibo pelos valores pagos antecipadamente ou ao final. Numa relação comercial, o contrato deve conter o objeto do contrato e os parâmetros de pagamento e solução do objeto. Somente desta forma a relação pode ser menos conturbada ou pacífica.

O advogado é em tese responsável por todas as demandas destacadas numa petição, que pode ser formal, no papel ou oral, em audiência ou fora dela, ambas possuem o mesmo valor legal e ele, o advogado, torna-se após a assinatura na procuração, uma espécie de parte do corpo de seu cliente.

A função do cliente num processo jurídico é fundamental, mas quem o liga ao julgador ou ao procurador do Estado é seu advogado.

Eu considero o advogado brasileiro como um representante comercial, que vende sonhos e muitas vezes, mesmo os tendo realizado, não recebe nada pelo seu trabalho.

Nos últimos anos, com as inúmeras mudanças na legislação e nos tratados sociais, foram implantados no Brasil um numero muito grande de faculdades de direito, que mesmo a revelia da lei e aos cuidados do MEC, insistem em desembocar nos centros habitados, milhares de novos bacharéis e estes, insistem em provar que não estudaram ou não aprenderam nada porque mais de 80% deles não são aprovados nos exames da OAB; obrigatório para o ingresso no populoso clube dos advogados brasileiros.

Parte dos advogados que conseguem a “carteirinha da OAB”, muitas vezes saem da sede da ordem sem saberem que rumo tomar pois não possuem dinheiro para sequer alugar uma sala, o que em tese não prova a sua ineficiência para o oficio, mas os deixam desacreditados perante a sociedade que cobra sempre luxo e que paga com o lixo. É daí que a relação entre o cliente e o advogado já começa desgastada!

Não é difícil encontrar-se com advogados com bons índices de causas ganhas que ainda atendem em escritórios modestos, nas periferias e fazendo uso de ônibus coletivo como meio principal de transporte e esta circunstancia dar-se muito mais pelos pagamentos irrisórios de honorários, para que não os perca para outros profissionais; bem como, é igualmente fácil encontrar a outra parte de causídicos que atendem em verdadeiros palacetes em bairros nobríssimos de grandes centros, exclusivamente para as estrelas da sociedade, que muitas vezes os pagam apenas para tê-los como seus conselheiros pessoais.

Em Belo Horizonte, existem alguns poucos destes advogados abastados que se gabam por possuir veículos de meio milhão na garagem e de morar em mansões “hollywoodianas”. Seus escritórios possuem obras de arte adornando o ambiente e salas blindadas separam estes profissionais do resto do mundo, ou do perigo distinto do cargo. Com certeza, as pessoas que não estejam no mesmo nível que tais profissionais não podem o contratar, ou, a grande maioria dos brasileiros.

Finalmente, eu chego a conclusão que a classe de jurisconsultos brasileiros brigam por leis e melhorias estudantis quando ainda são estudantes; chegam até a ser revolucionários; depois, eles se formam bacharéis e lutam muito pelo direito de advogarem e uma vez de posse de suas credenciais que lhes permitem a prerrogativa constitucional de representar pessoas em juízo, estes advogados esquecem de tudo que um dia brigaram, permitindo cada vez mais que as pessoas de nenhuma cultura, manobrem as suas oportunidades de ganho e o que é pior, que as pessoas manobrem indiretamente a sua oportunidade única de se reunirem e organizarem todas as mazelas que circundam a sua profissão.

Muitos advogados que eu conheço perguntam (sabe-se Deus para quem), o que é feito com o dinheiro arrecadado pela OAB, mas jamais se movimentaram para em conjunto com outros colegas, participarem das eleições bi anual que elege os novos presidentes e diretores. No meu tempo de acadêmico, isso se chamava “pelego”.

Senhores clientes. Quando for procurar um advogado, cobrem dos mesmos as regras daquela contratação e ponha tudo num papel. A relação entre os senhores e os advogados é de extrema confiança, aliás, confiança mutua, mas assim como num casamento civil, requer um documento para que as regras sejam cumpridas e/ou, cobradas, extrajudicialmente, ou em juízo.

Senhores advogados. Não esperem que seus clientes lhes cobrem seus direitos. Mostrem que os conspícuos senhores não encontraram suas credenciais no lixo! Quem sabe após isso, esta relação entre o cliente e o advogado não se torne mais humana e menos desconfiada?

Carlos Henrique Mascarenhas Pires

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