CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL, DE ACORDO COM O NOVO: DA PRISÃO EM FLAGRANTE

A regra é a liberdade, o ir e vir garantidos constitucionalmente ao ser humano que, fugindo ao caos, busca adequar-se à vida em sociedade. O Estado a cobrar um comportamento civilizado de suas gentes, posto que tutor dos bens materiais e imateriais de seu povo. A exceção é a prisão, a perda da liberdade. Nesse antagonismo paira a senda da justiça advinda da correta interpretação das leis, das normas, dos costumes e até das tradições.

À prisão em flagrante, devemos estudá-la tendo como princípio a CF/88 em seu art. 5º, LVII: “Ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”. No entanto, no Direito, há que observarmos caso a caso, não faltam exceções. No caso do inciso LVII do artigo 5º, supracitado, a exceção traz à tona casos em que são feitas prisões cautelares no transcurso do inquérito policial ou processo penal. A prisão em flagrante não mais faz parte das medidas cautelares, hoje são vistas como decisões administrativas.

Entrementes, entre a liberdade e o cárcere, há um caminho que deve ser a sucinta “Via Sacra” a qual devemos nos ater, desde o momento em que alguém é surpreendido dando vazão a atos executórios de infração penal em delito flagrante e, em regra, permanece no local do crime. (CPP - art. 302 – inciso I). O inciso II do mesmo artigo chama a atenção para o caso em que a infração penal, exposto flagrante delito recém-cometido, via de regra o contraventor ainda se encontre no local do ato “fora da lei” por ele praticado. Para outras situações, contidas ainda no artigo 302 do CPP, desta feita nos incisos III e IV, os quase flagrantes ou flagrantes impróprios, explicam, no primeiro caso: o autor da infração ser perseguido pela autoridade, pelo ofendido ou por qualquer um do povo, na certeza de ser aquele a quem persegue o autor da infração. Ambos são flagrantes impróprios, o que os diferencia é o lapso de tempo entre o cometimento da infração e a autuação. No segundo caso, o inciso IV do artigo 302, consubstancia-se o flagrante presumido, o agente é encontrado com objetos roubados, por exemplo, que faz com que seja presumida sua autoria para aquele determinado delito, objeto de investigação.

Há que se entenda que qualquer um do povo pode prender alguém em fragrante, classificado como “flagrante delito facultativo”. O do povo, não tem obrigação de arriscar-se nesta ação que pode, inclusive, deixá-lo em perigo. A obrigação, a legitimidade para fazê-lo é do delegado ou de seus agentes, autoridades competentes para agir no caso de delito sendo praticado, recém-praticado, supostamente praticado, delineando, assim, o chamado “flagrante delito compulsório”.

Há outras espécies de prisão em flagrante delito. Há que cuidarmos para não nos confundir no conceito que cada espécie de flagrante traz. Veremos a seguir.

Flagrante preparado ou provocado: se um agente do poder público, ao invés de observar os trâmites legais, resolve atrair para uma emboscada o malfeitor; e, atraído, é-lhe dada voz de prisão em flagrante delito; poderá o agente do poder público ser acusado de partícipe do crime, sem contar que urdir uma situação para incriminar quem quer que seja é um crime. Dada a voz de prisão, no mínimo, ela será relaxada pela ilegalidade do meio usado. O STF compara uma ação desta natureza a um teatro, um simulacro criado pelo próprio Estado, haja vista a Súmula 145 do STF:

Súmula 145

Não há crime, quando a preparação do flagrante pela polícia torna impossível a sua consumação.

Jurisprudência posterior ao enunciado

● Flagrante preparado e consumação do crime

"Com efeito, todos sabemos - e disso constitui expressiva evidência a Súmula nº 145 do Supremo Tribunal Federal - que não há crime quando a preparação do flagrante torna impossível a sua consumação. O delito de ensaio, também denominado delito de experiência ou crime provocado, constitui modalidade de crime putativo, cuja noção conceitual põe em destaque a absoluta impossibilidade de execução do ato delituoso." (HC 84723, Relator o Ministro Celso de Mello, Segunda Turma, julgamento em 21.2.2006, DJe de 4.12.2013).

Flagrante delito forjado: Nesse caso, a autoridade cria uma circunstância para prender um suposto traficante; para garantir a prisão, são plantadas provas que o incriminam. Nesse caso, o Estado, “mal representado”, diga-se de passagem, será o criminoso, a pessoa que caiu no embuste, será a figura da vítima, ainda que esta pessoa verdadeiramente trafique.

Flagrante delito diferido - Caso esse constante na Lei 9.034 – Lei do Crime Organizado, modalidade afeta ao caso de organização criminosa. Apesar de a autoridade ter o dever de atuar compulsoriamente em flagrante delito, há a postergação do ato de prender no caso de haver a possibilidade de captar elementos mais relevantes, para pôr fim àquela organização criminosa.

Flagrante esperado – olheiros infiltrados nas 'gangs' “dão o serviço”, alertando que haverá uma infração penal com dia marcado. A polícia fica alerta. Esse flagrante gerará a voz de prisão e é tido como ação exemplar do Estado.

Fragrantes nas várias espécies de crimes

Flagrante delito no caso de crimes permanentes. São crimes que se prolongam no tempo. A vítima de um sequestro, por exemplo, poderá permanecer com a sua liberdade tolhida “ad eterno” ou morta a qualquer momento, ou devolvida mediante extorsão, ou, na melhor das hipóteses conseguirá fugir do cativeiro. Pela fragilidade da vítima, a qualquer momento, assim que descoberto o cativeiro, poderá acontecer o flagrante delito e a prisão dos sequestradores. Enquanto não cessar a permanência da vítima em cativeiro, poderá haver esse tipo de flagrante.

No caso de crime habitual, faz-se mister apurar se as condutas criminosas são reiteradamente praticadas. Só assim se consumam. No curandelismo, a título de exemplo, é difícil distinguir se está acontecendo condutas frequentes ou se trata de uma iniciação. Há que muito investigar para ocorrer um flagrante delito.

Flagrante nos crimes continuados, nas mesmas circunstâncias, contínuos assaltos a residências em uma mesma noite, ou em noite subsequente, numa mesma rua, ou proximidades. Cabe prisão em flagrante em cada ato litigioso praticado.

Os crimes, mormente, podem ser de ação pública ou privada. No caso de um crime de estupro, que é um crime de ação privada, a continuidade da persecução penal depende da representação vítima do estupro ou de seu representante legal.

Sujeitos do flagrante

A figura do preso, “conduzido”, será apresentado à respectiva delegacia de polícia pelo seu condutor. Nem sempre o condutor é a autoridade responsável pela prisão. Pode acontecer que um agente da polícia prenda o suspeito e o entregue a uma rádio patrulha da polícia militar para que o conduza. Quem o apresentar ao delegado é o “condutor” naquela operação onde consubstanciou-se o flagrante. O auto de prisão será, por fim, lavrado pelo delegado de polícia onde ela foi realizada.

Etapas ou procedimento

O procedimento é sucinto, mas, sequencial.

“Após a apresentação do conduzido pelo condutor à autoridade competente, ouvirá, esta, o condutor e colherá desde logo sua assinatura, entregando, a este, cópia do termo e recibo de entrega do preso. Em seguida, procederá à oitiva das testemunhas que o acompanharem e ao interrogatório do acusado sobre a imputação que lhe é feita, colhendo, após cada oitiva suas respectivas assinaturas, lavrando, afinal, o auto de prisão”. CPPB- art. 304

No § 1º do art. 304, vemos que se a autoridade (juiz competente) vir fundada as suspeitas o conduzirá a prisão. Não o fará, se o réu houver se evadido ou, se não for aquele juiz a autoridade competente para o caso. Na segunda alternativa, a autoridade enviará os autos àquela que tenha a competência para o caso em foco.

Hoje, é pacífico que o condutor possa assinar com mais duas testemunhas

Se não houver duas testemunhas presenciais, testemunhas instrumentais serão apontadas, isto é, duas pessoas que tenham vivido aquela situação fática na delegacia, irão declarar que o conduzido foi apresentado à autoridade e ratificam que viram a apresentação do preso na delegacia, isso nos diz o § 2º do artigo 304, acima citado. Já no § 3º, lemos que se o acusado se recusar a assinar, não souber fazê-lo ou algo que o valha, duas testemunhas que houverem presenciado a leitura do auto da prisão em flagrante na presença deste. A leitura do auto a que nos referimos será feita pelo escrivão. Caso o escrivão esteja impedido, outra pessoa, mediante prestação de compromisso legal, poderá fazê-lo. Isso nos garante o artigo 305 da lei em estudo.

Como vivemos num Estado Democrático de Direito, a prisão de qualquer pessoa e o local onde essa se encontre serão imediatamente comunicados ao juiz competente, ao Ministério Público e à família do preso ou à pessoa por ele indicada. Isso é garantido no artigo 306 do CPPB.

Oitiva para a lavratura do auto de prisão em flagrante

O suposto autor do fato será ouvido e dará a sua interpretação ao fato, podendo permanecer calado. Ouvido o preso, ou não, o escrivão lavra e o delegado preside. Depois destas etapas, virá a fase da entrega da nota de culpa e da prisão em flagrante. Nesse momento, o preso tomará ciência sobre quem efetuou a sua prisão e fatos a ele atribuídos. Os fatos narrados e lidos no auto de prisão se converterão num documento em duas vias. Uma será entregue ao preso como recibo. Em 24 horas, desde que ocorreu a prisão, será enviado ao juiz competente o auto de prisão. No mesmo prazo, será entregue a nota de culpa ao preso que dará recibo, informado o nome de seu advogado, este constará na nota e receberá cópia dela, se não informar, a cópia será entregue a Defensoria Pública. Informações estas que constam nos parágrafos 1º e 2º, respectivamente.

No artigo 307, caso de o fato ter sido ocorrido em presença de autoridade, ou até mesmo contra esta, estando exercendo as suas funções, tudo será colocado nos autos, inclusive a voz de prisão, aquilo que o preso declarar, também o depoimento das testemunhas. Por fim, a autoridade assina o documento juntamente com o preso e as testemunhas; feito isso, o documento é mandado imediatamente ao juiz a quem couber para que ele tome conhecimento do ato delituoso.

Se na localidade não houver delegacia de polícia, o preso deverá ser encaminhado à delegacia mais próxima para que o delegado possa lavrar o auto de prisão, isto está contido o art. 308 do CPPB.

O artigo 309 preceitua que se o réu se livrar de ser preso, deverá ser solto logo após de lavrado o auto de prisão em flagrante. Observar-se-á o (Artigo 5º, incisos LXV e LXVI da Constituição Federal de 1988.)

Art. 5º, inciso LXV: a prisão ilegal será imediatamente relaxada pela autoridade judiciária; inciso LXVI: ninguém será levado à prisão ou nela mantido, quando a lei admitir a liberdade provisória, com ou sem fiança.

O artigo 310 diz que assim que o juiz receber o auto de prisão em flagrante, deverá examinar o caso, ou relaxar a prisão ilegal (inciso I), ou, conceder liberdade provisória (inciso II), com, ou seu fiança – (inciso III), fundamentando sua decisão. O parágrafo único do 310 ainda explicita como será o gozo da liberdade provisória pelo réu, quando o seu ato antijurídico se enquadrar nos incisos I e II e III do artigo 310. Deverá o réu comparecer a todos os atos processuais, sob pena de o juiz revogar sua liberdade provisória.