A suspensão do pagamento do FUNRURAL por meio de Ação Judicial
“As vantagens, quando colocada na ‘ponta do lápis’ são grandes, além é lógico, de se fazer valer um direito do contribuinte (produtor rural), uma classe sofrida que não pode continuar pagando pelo que legalmente não deve.”
O FUNRURAL – Fundo de Assistência ao Trabalhador Rural, é classificado no Direito Tributário como sendo uma contribuição. Sua arrecadação visa oferecer ao homem do campo a concessão de aposentadorias por idade, invalidez, pensão, auxílio-funeral, serviço de saúde e serviço social.
Seguindo a orientação legal prevista no artigo 195, §8º da Constituição Federal e modificações pela EC - Emenda Constitucional nº 20/98, ficou estabelecido que trabalhadores rurais que exercem a atividade em regime de agricultura familiar e sem empregados permanentes, teriam sua contribuição social com alíquota incidente sobre o valor de suas receitas como contribuinte individual.
Em se tratando de trabalhador rural pessoa física e que têm funcionários registrados, criou o legislador a Lei 8.212/91 determinando que ele deveria contribuir, em relação aos seus empregados, sobre o resultado da comercialização de sua produção, ao invés de contribuir como empregador, além de pagar sobre suas receitas como contribuinte individual.
Dessa forma, o produtor rural será considerado para fins previdenciários a pessoa física proprietária ou não, que explora atividade agropecuária, pesqueira, ou de extração mineral, de forma permanente ou temporária, diretamente ou por intermédio de prepostos e com auxílio de empregados, utilizados a qualquer título, ainda que de forma não contínua (artigo 12, inciso V, a e b, da Lei 8.212/91).
Após a Lei 8212/91, criou-se a Lei 8.540/92 que instituiu o FUNRURAL, objetivando o subsídio de benefícios assistenciais, com base (fato gerador) na comercialização de produtos rurais de sua produção.
Valor da alíquota e forma de pagamento
A alíquota do FUNRURAL é de 2,1% sobre a comercialização bruta da venda de sua produção, sendo que desse total, 2,0% vão para o INSS – Instituto Nacional de Seguridade Social e 0,1% para o RAT – Risco Ambiental do Trabalho (nova denominação para o SAT - Seguro Acidente do Trabalho).
Além do FUNRURAL e do RAT, o produtor rural ainda tem que recolher a contribuição ao SENAR - Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (0,2%), criada pela Lei 8.315/91, que tem sua base de cálculo também sobre a comercialização da produção, entretanto, não faz parte do FUNRURAL, uma vez que tem natureza jurídica distinta (o SENAR não é inconstitucional e deve ser recolhido pelo produtor rural). Todas essas contribuições são recolhidas em uma mesma GPS – Guia da Previdência Social.
A cobrança do FUNRURAL ocorre pelo regime de substituição tributária (sub-rogação), ou seja, quando o adquirente (comprador) da produção paga ao produtor, deve reter o percentual das contribuições e repassá-las ao fisco.
Da inconstitucionalidade do FUNRURAL
O STF – Supremo Tribunal Federal (última instância em Direito no país) já reconheceu a inconstitucionalidade da cobrança do FUNRURAL para produtores pessoas físicas empregadoras, logo, o produtor rural pessoa física que têm empregados registrados com carteira de trabalho, tem o direito de suspender o pagamento do FUNRURAL, além de reaver o que foi pago nos últimos cinco (5) anos.
Em se tratando de empregador rural pessoa jurídica, também lhe vale o direito de suspender o pagamento do FUNRURAL, uma vez que ele recolhe o COFINS - Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social, que tem como fato gerador a receita bruta da comercialização de sua produção.
Nos dois casos apontados acima, cobrança de FUNRURAL do produtor rural pessoa física ou jurídica, com empregados registrados com carteira, tanto podem ter a contribuição suspensa como também receber aquilo que pagou referente a essa contribuição nos últimos cinco anos. Isso ocorre porque a cobrança com base no mesmo fato gerador com a mesma destinação (seguridade social) fere o princípio constitucional tributário do non bis in idem e, por reflexo, atinge outros princípios fundamentais como o princípio da igualdade, da capacidade contributiva e o do não confisco.
Outro fator incontestável é a colisão com o princípio da legalidade estrita, significando que, somente com uma lei complementar é que se pode criar, majorar ou atribuir responsabilidade tributária, e nesse caso, a lei que instituiu o FUNRURAL não se trata de uma lei complementar.
Vale lembrar que embora o legislador tenha tentado ‘driblar’ esse aspecto de inconstitucionalidade editando a Lei 10.256/01, a ilegalidade persiste, pois no sistema jurídico brasileiro não existe a figura jurídica da constitucionalidade superveniente (aquela que ocorre quando uma norma inconstitucional, ao tempo de sua edição, torna-se compatível devido à mudança do parâmetro constitucional), isso porque entende-se que uma lei criada inconstitucionalmente (vício de origem) é insanável pois ‘já nasceu morta’.
Neste mesmo parâmetro de inconstitucionalidade, pode-se afirmar também que a sub-rogação do recolhimento do FUNRURAL pelo adquirente também é inconstitucional (um alerta aos compradores de cereais, frigoríficos e cooperativas).
Tanto a suspensão imediata da contribuição do FUNRURAL como a restituição do fora pago (indevidamente) nos últimos cinco anos atribuídos a essa contribuição, deve ser requerida na justiça por meio de um advogado legalmente constituído.
* Heráclito Ney Suiter é advogado inscrito na OAB-TO sob nº 7523, e titular do escritório Suiter Advocacia, com expertise em Direito Tributário (LFG e FGV) e Direito Ambiental (Facimab). Também atuou no setor de agrobusiness (CREA-DF n° 1281) tendo expertise em Administração de Empresa Rural pela USP/Esalq/Fealq.
E-mail: suiteradvocacia@gmail.com