Consentimento do cônjuge e peculiaridades do benefício de ordem no contrato de fiança
Benefício de Ordem: Considerando a linguagem diferenciada utilizada pelos operadores do direito, e pretendendo que o texto cumpra o seu objetivo precípuo, qual seja, o de levar informações importantes para os leitores que desejem alcançá-lo, penso que seja apropriado fazer uma breve menção ao instituto do benefício de ordem.
Partindo do princípio de que a mensagem a ser discorrida, tratará do tema fiança, diz-se, nesse caso, que benefício de ordem, significa dizer, que para que o fiador seja chamado a cumprir determinada obrigação, objeto do contrato, é necessário que em primeiro lugar tenha sido chamado o devedor principal, pois a responsabilidade do fiador é subsidiária (posterior) à do devedor principal, consideradas as devidas ressalvas contratuais e legais.
Superada a observação, é importante informar que o consentimento de um dos cônjuges, para que o outro possa se colocar no papel de fiador de determinada obrigação, não se confunde com fiança conjunta. O cônjuge pode autorizar a fiança, preenchendo desse modo a exigência legal, mas não há fiança de ambos: um cônjuge afiança e o outro simplesmente autoriza, não se convertendo em fiador. Os cônjuges podem, por outro lado, afiançar conjuntamente. Assim fazendo, ambos colocam-se como fiadores.
Quando apenas um dos cônjuges é fiador, unicamente seus bens dentro do regime respectivo podem ser constrangidos. Desse modo, sendo apenas fiador o marido, com mero assentimento da mulher, os bens reservados desta, por exemplo, bem como os incomunicáveis, não podem ser atingidos pela fiança.
Com esta posição doutrinária é possível dividir a fiança prestada pelo casal, pois pode ser conjunta ou individual com autorização. Isto porque alguns bens não podem ser atingidos pela fiança quando houver mera autorização do outro, diferente do caso quando ambos prestam a fiança em que todo o patrimônio do casal se submete aos efeitos gerados pelo inadimplemento do afiançado.
OBSERVAÇÃO: Impende salientar que, antes de alguém aceitar a proposta de se tornar fiador, é altamente recomendável que analise detidamente a cláusula de garantia do contrato em que ela está inserida, pois o artigo 828 enumera as circunstâncias nas quais o benefício de ordem não pode ser utilizado como recurso de defesa pelo fiador.
Segue a transcrição literal do dispositivo em comento:
Art. 828. Não aproveita este benefício ao fiador (o benefício de ordem):
I – se ele o renunciou expressamente;
II – se se obrigou como principal pagador, ou devedor solidário;
III– se o devedor for insolvente, ou falido.
Se houver, na cláusula de garantia do contrato, uma expressa declaração de renúncia do benefício de ordem manifestada pelo fiador, este afastará de si mesmo a possibilidade de alegar o referido instrumento jurídico em seu favor, ainda que seja demandado ANTES do devedor principal.
Na hipótese, ademais, de o fiador obrigar-se como pagador principal ou devedor solidário, perderá ele o direito de invocar o benefício de ordem. Averbe-se que se caracteriza a solidariedade passiva quando dois ou mais devedores, em virtude de previsão legal ou de convenção entre as partes (artigo 265 do Código Civil), são responsáveis pelo pagamento total do débito, podendo qualquer um deles ser demandado pela dívida inteira. No caso sub judice, contudo, após efetuar o pagamento pela dívida, poderá o fiador reclamar judicialmente, em face do devedor principal, TODAS as despesas que desembolsou para quitar o débito que originalmente não foi contraído pelo primeiro.
Conforme se verifica por tudo que até aqui foi exposto, o benefício de ordem, mesmo que resguardado pelo novel diploma civil, é ao mesmo tempo minado por peculiaridades previstas no próprio Código Civil, capazes de acarretar a impossibilidade do seu emprego pelo fiador, realidade que deve nos motivar a analisar com mais seriedade o quesito fiança.