Novo CPC - Principais Alterações
Muito já se discutiu sobre o novo Código de Processo Civil, lei 13.105/15, que entrará em vigor no dia 18 de março de 2016, após o período de um ano de vacatio legis. Sido bem recebido, de forma geral, pelos operadores do direito, o novo CPC traz importantes alterações, no tocante a prazos, recursos, procedimentos de uniformização da jurisprudência, dentre diversos outros temas. Pode-se dizer que trata-se de uma lei mais moderna, que consagra expressamente os princípios constitucionais aplicáveis à matéria e erigiu a um novo patamar as formas consensuais de resolução de conflitos.
Longe de pretender esgotar todas as inovações do novo CPC, o que se pretende aqui é apresentar um resumo de algumas das principais alterações, e as revisões ocorridas antes mesmo da entrada em vigor do novo Código.
- Condições da ação: No CPC de 1973, eram três as condições da ação: legitimidade das partes, interesse de agir e possibilidade jurídica do pedido. Contudo como o exame do último pode se confundir com a análise do mérito, o novo CPC traz como condições apenas a legitimidade e o interesse de agir, nos termos do artigo 337, XI do Novo CPC.
- Petição Inicial: De acordo com o novo CPC, passa a haver a necessidade de se indicar na inicial, o correio eletrônico, o número de CPF ou CNPJ do autor e réu, o que já se adotava na prática, bem como o estado civil ou existência de união estável, este último requisito principalmente relevante para as ações que versem sobre direitos reais. O § 1º do artigo 322 traz como pedidos implícitos os juros legais, correção monetária e verbas de sucumbência, incluindo os honorários advocatícios, ou seja, ainda que não haja pedido expresso, pode haver a condenação, sem que sentença seja ultrapetita.
Importante alteração também diz respeito à necessidade de fixação do quantum requerido nas ações indenizatórias, inclusive por dano moral, não sendo cabível pedido genérico, nos termos do art. 292, V. A decisão que indefere a inicial se dá por sentença e antes da citação do réu. É recorrível por apelação, facultada a retratação do juiz em 5 dias (art. 331 do Novo CPC), e não mais em 48 horas como previa o CPC de 1973.
- Competência: Em relação à competência territorial, destaque para a inovação quanto ao foro para processamento de ação de separação, divórcio e anulação de casamento. O Código antigo estabelecia como regra o domicílio da mulher. Já o Novo, em homenagem à progressiva evolução social e à isonomia, atentando para o fato de que as mulheres têm estado cada dia mais em posição de igualdade com os homens, elege como foro para processamento das referidas ações (e também a dissolução de união estável), calcado na Súmula 383 do STJ, o domicílio do guardião do filho incapaz. Subsidiariamente, o domicílio último do casal, caso não haja filho incapaz, ou do réu se ambos não mais residirem no local do último domicílio do casal.
São previstos ainda o domicílio do idoso para garantia dos direitos previstos na Lei nº10.741 de 2003 e domicílio do autor ou do local do fato ou o domicilio do réu para acidentes de veículo, inclusive aeronaves.
Muito embora a súmula 33 do STJ preveja que a incompetência relativa não possa ser declarada de ofício, o novo CPC estabelece que havendo situação de abusividade, o foro de eleição pode ser de plano declarado ineficaz pelo juiz, que deverá remetê-lo ao foro competente antes mesmo da citação do réu.
Foi eliminada a exceção de incompetência, que deverá ser arguida na contestação, como preliminar, como se verificará adiante.
- MESCS - Conciliação e Mediação: Nos termos do art. 3, §3º do Novo Código, os métodos consensuais de resolução de conflitos deverão ser estimulados pelos operadores do Direito, inclusive no curso do processo. Em todas as ações que versem sobre direitos disponíveis, o réu deverá ser citado para audiência de conciliação e mediação.
Ou seja, nos moldes anteriores, a audiência de conciliação era realizada após a réplica. Atualmente, no procedimento comum, passa a haver antecipação da audiência de conciliação, que só não será realizada se ambas as partes expressamente manifestarem seu desinteresse, nos termos do artigo 334 §5º. Ambas as partes devem comparecer à audiência acompanhadas por seus advogados.
Caso seja obtido acordo, o processo será encerrado. Caso contrário, ou não havendo comparecido uma das partes, tem início o prazo de 15 dias para contestação.
- Provas: O art. 139, VI confere ao juiz o poder, além de dilatar prazos processuais, de modificar a ordem de inversão de provas, conferindo maior celeridade ao processo. É possível ainda que o juiz altere o ônus da prova. Em regra, ao autor continua cabendo os fatos constitutivos e ao réu os modificativos, impeditivos ou extintivos do direito do autor. Contudo, o juiz pode modificar livremente o ônus da prova, em decisão fundamentada. Aqui trata-se de importante inovação. Enquanto que a inversão do ônus da prova prevista no Código de Defesa do Consumidor assume caráter mais genérico, no Novo CPC pode ser feita para fatos específicos. É a distribuição dinâmica do ônus da prova, prevista no art. 373 § 1º do NCPC, que será admitida desde que não gere encargo excessivo para a parte.
A prova emprestada foi positivada, devendo respeitar o contraditório, nos termos do art. 372 do NCPC. Foi implementada também a prova técnica simplificada, para questões de menor complexidade, na qual a prova pericial poderá ser substituída pela inquirição de profissional expert na área, nos termos do art. 464 do NCPC. Se for produzida prova pericial, poderá ser consensual em casos passíveis de resolução por auto composição e com partes capazes. Ou seja, as partes poderão indicar juntas um mesmo perito, que substitui, para todos os efeitos, o que seria nomeado pelo juiz, conforme disposição do art. 471.
- Prazos: Visando a simplificação dos prazos processuais, o novo CPC estabeleceu o prazo comum de 15 dias para recursos e respostas, exceto para os Embargos de Declaração, que continuam a ser de 5 dias. O Art. 139 VI estabelece que com vistas a melhor resolução do conflito, o juiz tem o poder de dilatar prazos processuais.
A contagem de prazos processuais passa a ser em dias úteis apenas, conforme art. 219 do NCPC. Assim, ficam excluídos os feriados, sábados, domingos e dias em que não houver expediente forense. Temos aqui um conflito de normas em relação à Lei do Processo Eletrônico (Lei 11.419 de 2006) que prevê no art. 4º, §3º que no caso de publicação eletrônica, o advogado deverá consultá-la em até 10 dias corridos, contados da data do envio da intimação, sob pena de se considerar automaticamente intimado após o decurso do prazo. Os prazos materiais, como prescrição e decadência ou de 120 dias para impetração de Mandado de Segurança repressivo, continuam a ser contados em dias corridos.
- Contestação: O Novo CPC tem por linha a simplificação do rito comum. Nesse sentido, foram extintos os incidentes processuais de impugnação ao valor da causa, exceção de incompetência, impugnação ao pedido de gratuidade de justiça, que devem ser alegados como preliminares da contestação. Quanto ao pedido de gratuidade de justiça, pode ser feito por petição durante o curso do processo, desde que até a fase de recursos. A reconvenção também deixa de ser por peça própria e passa a ser alegada dentro da contestação.
O prazo para apresentação da contestação passa a ser de 15 dias contados da audiência de conciliação ou mediação, quando não for possível o acordo ou a parte não comparecer.
- Ordem de julgamento e motivação das decisões: O novo CPC inovou ao dispor que, em regra, os processos devem ser julgados em ordem cronológica, obedecendo a ordem de entrada na conclusão, cuja listagem atualizada deveria ser informada periodicamente. Contudo, a Lei 13.256 de 2016 modificou a previsão antes mesmo de sua entrada em vigor. Assim, caiu tal disposição, devendo a referida ordem cronológica ser observada apenas “preferencialmente”, de forma a permitir que causas de menor complexidade ou com maior urgência possam ser julgadas com mais celeridade. Conforme art. 489, §1º o órgão julgador deve enfrentar todos os argumentos trazidos pela parte para proferir a decisão, não se considerando fundamentada a decisão que se limitar à mera indicação de dispositivos legais ou que aplicar conceitos jurídicos indeterminados sem indicar sua aplicabilidade ao caso concreto.
- Tutela provisória: O Novo CPC criou nova sistemática para a tutela provisória, que passa a ser classificada quanto ao objeto (tutela antecipada, que protege o direito material, e tutela cautelar, que protege o processo) e quanto aos pressupostos (de urgência, que é dada com base no fumus boni iuris e periculum in mora, e de evidência, com base apenas no fumus boni iuris qualificada por alguma situação prevista pelo legislador).
No caso da tutela de evidência, temos que o art. 311 do NCPC autoriza sua concessão calcada na fumaça do bom direito, especialmente no caso de a matéria estar calcada em repetitivo ou súmula vinculante e ainda nos casos de abuso de defesa ou caráter protelatório da parte contrária, entre outros.
- Procedimento comum: No novo CPC há apenas um procedimento único comum, acabando com o sumário. As causar de menor complexidade devem tramitar no rito sumaríssimo dos Juizados Especiais Cíveis ou se submeter ao rito comum, conforme o caso. (Vide também lei 9.099/95).
- Cisão do julgamento: O novo CPC consagra a possibilidade de cisão do julgamento. Muito embora o STJ tenha firmado entendimento de que o juiz não pode proferir decisão parcial de mérito para, em momento posterior, continuar com o julgamento do processo, o novo Código entendeu pela possibilidade de o juiz cindir o julgamento. Contudo, não se trata aqui de falarmos em sentença parcial, mas de decisão interlocutória, pois a decisão que julga primeiro determinado pedido específico é atacável por decisão interlocutória, nos termos do parágrafo único do art. 354 do NCPC.
- Desconsideração da personalidade jurídica: Pode ocorrer em qualquer fase do processo, a pedido da parte ou do Ministério Público. Se for requerida ao longo do processo, será instaurado incidente de desconsideração, se na inicial, o sócio já será citado. O sócio poderá responder previamente, em homenagem ao princípio do contraditório, nos termos do art. 135 do novo Código, não se cabendo falar em desconsideração de ofício. Contra a decisão, caberá Agravo de Instrumento. (Vide: artigo 50 do CC e 28, §6º do CDC).
- Recursos: Além da unificação dos prazos recursais, já apontada, o novo CPC trouxe importantes alterações no tocante aos recursos em geral. Os Embargos Infringentes formalmente foram extintos, mas foi criada técnica de julgamento muito semelhante ao antigo recurso. Dispõe o art. 942 do Novo Código que quando o julgamento da Apelação não for unânime, deverá ser continuado com outros julgadores, em número suficiente a possibilitar a inversão do resultado inicial. Também será aplicado na rescisória e no julgamento do agravo de instrumento contra decisão interlocutória que julgou, de forma cindida, pedidos cumulados.
O Agravo Retido também foi extinto. No novo modelo, se a decisão não puder ser recorrida imediatamente por Agravo de Instrumento, só poderá ser questionada por ocasião da Apelação, que, dessa forma, passa a ser recurso contra sentença e também interlocutórias não atacáveis por Agravo de Instrumento. As hipóteses de cabimento do Agravo de Instrumento se tornam mais objetivas, previstas no art. 1.015 do NCPC.
Quanto ao juízo de admissibilidade dos recursos especial e extraordinário, a previsão inicial era de que os recursos fossem remetidos diretamente para os tribunais superiores, sem exame de admissibilidade no tribunal de origem, sendo a admissibilidade examinada apenas no STF/STJ. Contudo a lei 13.256 de 2016, que alterou o novo CPC, trouxe de volta o juízo de admissibilidade para os referidos recursos na origem, dando nova redação ao artigo 1.030. Caso seja negado seguimento ao recurso no tribunal de origem, com base em padrões decisórios, nos termos dos incisos I e III, o recurso cabível será o Agravo Interno para o próprio tribunal de origem, conforme art. 1.030, §2º do NCPC.
Em relação à remessa necessária, o novo CPC amplia as hipóteses em que não haverá a obrigatoriedade do duplo grau, listadas no art. 496 §3º e §4º, dentre elas quando a decisão estiver fundamentada em súmula de tribunal superior, acórdão do STF ou STJ em julgamento de repetitivo, e entendimento firmado em sede de Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas, que será melhor detalhado a seguir.
- Recurso Repetitivo e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas: No modelo já consagrado de recurso repetitivo, temos que, quando existem diversos processos em trâmite sobre a mesma matéria, é possível que um recurso seja selecionado para julgamento, enquanto que os demais ficam sobrestados nos juízos de origem. Uma vez julgado o recurso repetitivo, o entendimento firmado no caso paradigma tem que ser observado nos casos semelhantes.
Avançando no tema, o Novo CPC criou o Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR, artigos 976 e seguintes do NCPC), que traz para os tribunais de segunda instância a mesma lógica já aplicada pelo STJ. Assim, o tribunal deverá selecionar um único recurso representativo da tese. Os demais casos serão suspensos até o julgamento do paradigma, que deve ocorrer no prazo de um ano e, em regra, tramita com prioridade. Uma vez julgado, o entendimento consolidado se aplica a todos.
É possível a dilação probatória no IRDR, inclusive com oitiva de pessoas ou entidades com interesse na resolução da questão, e é obrigatória a participação do Ministério Público. Havendo necessidade de revisão do entendimento firmado, será feito pelo mesmo tribunal que julgou o IRDR.
- Direito de família: Seguindo a linha geral estabelecida pelo novo CPC, também aqui deve-se privilegiar a solução de conflitos via mediação e conciliação. Nas ações de família a citação do réu deve seguir desacompanhada de cópia da inicial, possibilitando-se, contudo, sua consulta a qualquer tempo, conforme art. 695 do Novo CPC. No caso de execução de alimentos, o executado deve ser citado pessoalmente para pagamento no prazo de três dias, conforme art. 528 do NCPC. O débito que autoriza a prisão do devedor de alimentos é referente apenas às três prestações anteriores ao ajuizamento e as vencidas no curso do processo.
- Usucapião extrajudicial: Alterando a Lei de Registros Públicos (Lei nº 6.015 de 1973), o Novo CPC prevê a possibilidade de requerimento de usucapião diretamente no cartório do registro do imóvel. O pedido deverá ser feito por advogado e mediante a apresentação de documentos que comprovem o justo título, a natureza e tempo de posse do imóvel. O cartório deverá intimar a fazenda pública além de publicar edital, possibilitando a manifestação de quaisquer interessados. A rejeição do pedido extrajudicial não impede o ajuizamento da ação de usucapião, pela inafastabilidade da jurisdição.
- Normas tocantes à advocacia: O art. 220 do novo Código traz a previsão de férias para advocacia. No período de 20 de dezembro a 20 de janeiro não pode haver publicação de prazos processuais nem designação de audiência ou sessão de julgamento. É possível a intimação da sociedade de advogados, além do próprio advogado cadastrado no processo, desde que seja requerido na causa, nos termos do art. 272 §1°.
Inovação também no tocante aos honorários de sucumbência, que passam a ser de 10% a 20% sobre o valor da condenação ou sobre o proveito econômico ou valor da causa, conforme art. 85 do NCPC. É cabível também a condenação em honorários de sucumbência na fase recursal, contribuindo assim para a diminuição de recursos com caráter meramente protelatórios.
Fica dispensada a intimação pelo juízo de testemunha, cabendo ao advogado intimar a testemunha por ele arrolada da realização da audiência, nos termos do art. 455 do novo Código. A intimação deverá ser feita por carta com aviso de recebimento, a ser juntada aos autos com pelo menos 3 dias de antecedência da audiência. O próprio advogado também poderá promover a intimação do advogado da parte contrária por correio com aviso de recebimento, conforme art. 269, §1º. No último caso, trata-se de faculdade, e o prazo do advogado intimado começa a correr da juntada aos autos do AR.
Texto de autoria dos advogados:
*Luiz Fernando do Vale de Almeida Guilherme é sócio de Almeida Guilherme Advogados Associados.
*Carolina Alves Rocha é associada de Almeida Guilherme Advogados Associados no Rio de Janeiro.