Os estudos recentes sobre a filosofia do Direito, da teoria geral do direito e mesmo do direito constitucional e direito processual há acirrado debate sobre os conceitos de norma, princípio e regra.
Com a proximidade do fim da vacatio legis do CPC/2015, esse debate reacendeu peculiarmente[1], eis o motivo do modesto artigo.
Existem construções doutrinária variadas como a de Peter Haberle, Robert Alexy, Ronald Dworkin, Carl Schmitt, José Joaquim Gomes Canotilho, Virgílio Afonso da Silva, Karl Larenz, Josef Esser, Niklas Luhmann, Alf Ross, entre outros.
Observa-se que em todas as construções há a presença de elementos positivos e elementos negativos, vantagens e desvantagens sendo adaptáveis ao direito positivo interno de um Estado ou não.
Norma[2] corresponde ao sentido atribuído a qualquer disposição. Disposição é parte de um texto ainda a ser interpretado. A norma é a parte de um texto interpretado.
A normatividade é, pois, o resultado da interpretação que se apresenta como norma jurídica. Diferentemente do texto da norma que consiste na obrigação dirigida aos destinatários da norma de conformarem a esta o seu comportamento e, de outro lado, na obrigação dirigida ao juiz (ou a autoridade habilitada a interpretar) de utilizar, na sua integralidade, os textos das normas jurídicas adequados ao caso concreto particular e, ainda, trabalhar corretamente sob o ponto de vista metódico.
Norma não é Direito, apesar de que em linguagem metafórica, possa se afirmar que esta contenha Direito. Com razão, já proclamara Paulo que não é da regra que promana o direito, senão com base no direito, existente por si mesmo, que a regra[3] é elaborada. Non et, ex regula jus sumatur, sed ex jure, quod est, regula fiat.
A norma é, pura e simplesmente, a previsão. Modelo de conduta diante de fatos relevantes para o convívio social. É notável que todos os que reduzem o Direito à sentença dado o pressuposto de que esta decorre sempre de um ilícito, único motivo de ir ao tribunal, cometem equívoco semelhante ao de Hobbes e Carnelutti.
Enquadra-se na hipótese a Teoria Pura de Kelsen, que, embora tenha pretendido ser uma teoria do direito positivo em geral, contempla e distingue com especialidade o Direito contencioso, em torno do qual faz girar toda a construção doutrinária.
Norma seria a interpretação conferida a um texto ou enunciado, parte de um texto ou combinação de um texto. Não existe norma antes da interpretação e nem independente dela. Interpretar é produzir a norma. Assim, consagra-se que a norma é produto do intérprete.
Mas, cabe distinguir o texto normativo da norma com base em Gadamer, o que acarreta cisão maior com o positivismo, sem dizer que o conceito da teoria estruturante da norma institui um conceito muito mais complexo.
A norma não é apenas carente de interpretação porque não é unívoca, nem porque seja destituída de clareza, mas sobretudo porque deva ser aplicada ao caso concreto (seja real ou fictício).
O conceito mais simples de norma jurídica embora envolva certa tautologia, é aquele que resulta do posicionamento da expressão sintética jurídica ao lado da correspondente expressão analítica “de Direito”: norma jurídica é norma de Direito, isto é, norma de fazer Direito[4].
A Escola Sociológica norte-americana configura o Direito pela sentença[5], resultado de uma profecia. Percebe-se até onde vão ter certeza e a segurança em nome das quais pretendeu o positivismo impor-se.
É inaceitável a assertiva de Philip Heck representante da Escola tubigense de Direito Privado, ou a Jurisprudência de Interesses, segundo a qual o “el Derecho realmente importante para la vida es aquel que se realiza em la sentencia judicial”.
Tal assertiva envolve a deturpação do que seja validade social ou eficácia. O simples fato de o Direito ser contestado, tanto que só se resolva judicialmente, significa já o questionamento de sua validade. Que se afirme que o Direito é realização prática conforme o fez Ihering, está parcialmente correto, mas que se afirme que deva representar-se pela sentença judicial está absolutamente incorreto.
A definição do Direito em termos de decisões judiciais é tão ridícula como afirmar que a definição da medicina se dá em função do comportamento dos médicos.
O desdobramento lógico da frase de Heck nos conduz a concluir que o Direito, que se realiza de forma pacífica e silenciosa, não teria qualquer interesse para a ordem social. E reduziria o Direito apenas ao Direito contencioso.
É evidente o locus do Direito judicial, mas sem fazê-lo anular o Direito não contencioso, através da supressão de seu significado social. Apesar de Carlos Cossio revelar que a sentença seja o fenômeno jurídico por excelência.
Afinal a tarefa da criação jurídica também se materializa através da atividade negocial, no mais amplo campo da licitude. A verdade é que o homem cria Direito a todo tempo, porque há tantas relações de convivência que o obrigam. Estes sim, corresponde ao Direito realmente importante, sendo o fenômeno jurídico por excelência.
A doutrina após as obras de Dworkin e Alexy tem insistido em produzir a distinção entre princípios e regras. Enquanto as regras se esgotam em si mesmas, na medida em que descrevem o que se deve, não se deve ou se pode fazer em determinadas situações; os princípios são constitutivos da ordem jurídica, revelando os valores ou os critérios que devem orientar a compreensão e a aplicação das regras diante das situações concretas.
A afirmação do caráter constitutivo dos princípios realça a acepção da Constituição como ordem de valores adorada pelo Tribunal Constitucional Alemão desde a decisão no caso Lüth[6] em 1958.
Alexy afirma que os princípios são normas que ordenam algo seja realizado na maior medida possível, dentro das possibilidades jurídicas e fáticas existentes, ao passo que as regras são normas que podem ser cumpridas ou não, uma vez que, se uma regra é válida, há de ser feito exatamente o que esta exige, nem mais e nem menos.
Alexy aponta que as regras contêm determinações no âmbito fático e juridicamente possível, ao passo que os princípios podem ser realizados em diferentes graus, conforme as possibilidades jurídicas e fáticas.
Assim se um princípio valer para um caso, não significa afirmar que aquilo que este requer desse caso deva valer para todos os outros casos. Os princípios apresentam razões que podem ser superadas por razões opostas.
A realização dos princípios depende das possibilidades jurídicas e fáticas, que são condicionadas pelos princípios opostos, e assim exigem a consideração dos pesos dos princípios em colisão segundo as circunstâncias do caso concreto.
É extremamente relevante a importância dos princípios nos casos de controle de constitucionalidade da lei, de dúvida interpretativa e de ausência de regra. Porém, essa perspectiva constitui apenas uma parte do significado que os princípios possuem no constitucionalismo contemporâneo.
Afinal a função dos princípios não é meramente complementar e acessória, destinando-se apenas auxiliar as regras, também não se resumem em ser válvulas de escape do ordenamento jurídico, que entram em ação quando as regras não são capazes de regular adequadamente os casos concretos.
Os princípios não padecem de limitação, e são tanto quanto as regras, razões para juízos concretos do dever ser.
Na obra de Luís Virgílio Afonso da Silva são utilizados os critérios de Robert Alexy, e o doutrinador e professor alemão trabalha o tema dos princípios de forma bem diferente do conceito tradicionalmente adotado pela doutrina brasileira.
Na doutrina tradicional pátria os princípios assumem a definição de ser mandamentos nucleares ou disposições fundamentais de um sistema, ou, ainda, como núcleos condensadores.
Apesar de grande variação na nomenclatura e muitos doutrinadores se dedicaram ao estudo dos princípios jurídicos no Brasil, mas em suma, a noção costuma ser a mesma, de que seriam normas mais fundamentais do sistema, enquanto que as regras costumam ser definidas como a concretização desses princípios e teriam, por essa razão, o caráter mais instrumental e menos fundamental.
Por esse motivo é que enxergamos que muitas normas denominadas pela doutrina tradicional como sendo princípios, deveriam ser chamadas de regras, caso se adote o critério proposto por Alexy. E, assim o nulla poena sine lege presente na legalidade, na anterioridade entre outros, devam ser chamados de regras e, não de princípios.
Há ferrenha crítica ao sincretismo metodológico que é praticado no Brasil, como por exemplo, por Fábio Konder Comparado, que utiliza as teorias de Müller e de Alexy em conjunto.
A distinção entre regras e princípios, tem como uma de suas principais características exatamente a exigibilidade de sopesamento de princípios como forma de aplica-los. Porém, ambas as teorias, a despeito de serem incompatíveis, sejam defendidas no Brasil como se complementares fossem.
Os princípios recortam certas parcelas da realidade e colocam-nas sob seu âmbito de proteção. Consequentemente, a partir do momento em que se projetam sobre a realidade, eles servem de fundamento para as normas específicas que orientam concretamente a ação, seja num sentido positivo (prestação fática ou jurídica), seja num sentido negativo (omissão).
No âmbito da relação entre a Constituição Federal e a lei, isso significa que os princípios de um lado, impõem aos legisladores deveres de produção e normas jurídicas e, de outro lado, e, de outro lado, ainda imunizam determinadas posições jurídicas – as parcelas da realidade recolhidas em seu âmbito protegido – do alcance da atuação da lei.
Nessa acepção, os princípios conferem valor normativo aos fatos, também indicando como a lei deve ser dimensionada para não agredi-los. Por essa razão, a compreensão e a conformação das regras estão condicionadas pelo valor atribuído à realidade pelos princípios.
Porém, se a regra deve ser compreendida e aplicada conforme o valor atribuído à realidade pelo princípio, é evidente que não se pode controlar a constitucionalidade da lei, ou mesmo interpretá-la, considerando-se apenas o seu contexto.
Nessa situação, se afirma que não basta identificar o significado da norma em abstrato, sendo necessário precisar o seu significado em face da realidade dos casos concretos.
A atenção ao desempenho da norma na prática outorga ao intérprete a possibilidade de relacionar os princípios com uma outra dimensão de significado normativo, viabilizando uma compreensão crítica da norma em sua perspectiva concreta.
Os princípios na obra de Robert Alexy são normas que ordenam que algo seja realizado na maior medida que possível, porém dentro das possibilidades jurídicas e reais existentes.
Assim são reconhecidos como mandamentos de otimização, caracterizados pelo fato de que podem ser cumpridos em diferentes graus, e de seu cumprimento não somente depende das possibilidades reais, mas também das jurídicas. O âmbito das possibilidades jurídicas é determinado pelos princípios e regras opostas.
Na obra de Dworkin, os princípios em sentido amplo englobam os principles e as policies, ou seja, os princípios em sentido estrito, que tutelam os direitos individuais e as diretrizes (políticas), que orientam a implementação de objetivos coletivos.
Para Dworkin, a política é uma espécie de padrão que fixa o objetivo a ser alcançado, geralmente um avanço do ponto de vista econômico, político ou social em prol da comunidade, nada obstante alguns desses objetivos possam a ser negativos, por protegerem alguma situação contra modificações adversas.
Por outro lado, para Dworkin o princípio é o critério que deve ser aplicado, não para proteger determinada situação política, econômica ou social, mas sim porque é exigência da justiça, equidade ou alguma outra dimensão da moralidade.
Os principles referem-se à dimensão individual, enquanto as policies, à dimensão comunitária, e é nesse sentido que deve ser entendida a afirmação de Dworkin de que a decisão judicial é essencialmente política, o que significa dizer que ela possui uma dimensão comunitária.
Os princípios conferem coerência e justificação ao sistema jurídico e permitem ao juiz, diante dos hard cases, realizar a interpretação de maneira mais conforme à Constituição.
Para tanto, o juiz Hércules[7] deve construir um esquema de princípios abstratos e concretos que possa dar coerência e consistência aos precedentes do common law (direito consuetudinário) e os termos em que esses precedentes se justificam por meio de princípios, o juiz tem que construir também um esquema que justifique tudo isso do ponto de vista constitucional e legal.
A distinção entre princípios e regras segundo Ronald Dworkin trata-se de uma distinção lógica. Mas, ambos admitem pontos comuns para decisões particulares sobre certa obrigação jurídica em circunstâncias particulares. No entanto, são diferentes no caráter da direção que cada um deles empreende.
As regras são aplicáveis tendo em vista a ideia de tudo ou nada. Dentro dos fatos que a regra estipula, ou essa regra é válida e deve ser aceita ou, ao contrário, a regra não é válida e, portanto, em nada contribui para a decisão.
Dworkin confirma a tese de que, na essência, os princípios são distintos de regras, não sendo a distinção entre eles um problema apenas de semântica.
Os princípios na visão de Lenio Luiz Streck[8] vieram para superar a abstração da regra, desterritorializando-a de seu locus privilegiado que é o positivismo.
O cerne dos princípios é a diferença ontológica, instrumento utilizado para o mundo prático invadir o positivismo.
Streck afirma que não se pode caracterizar o princípio como mandado de otimização, porque isso traz embutida a ideia positivista para que seja reavivada a abstratalidade, e, consequentemente, seja afastado o mundo prático ínsito aos princípios.
É através dos princípios que é possível sustentar a existência de respostas adequadas (sendo corretas para cada caso concreto). A resposta dada através dos princípios é um problema hermenêutico, e não analítico-procedimental (fundamentação).
A presença dos princípios na resolução dos assim denominados casos difíceis embora a evidente inadequação da distinção entre o easy (fácil) e hard (difíceis) cases tem o condão exatamente de evitar a discricionariedade judicial. A resposta não provém de um discurso adjudicador (de fora) ela provém de uma cooriginariedade.
Depois de mencionar que a tradicional metodologia jurídica fazia a distinção entre norma s e princípios, Canotilho afirma que deixará de considerar essa teoria, surgindo sua substituição por outra.
As regras e princípios são duas espécies de normas, e a distinção entre estas refere-se à distinção entre espécies de normas. Trata-se realmente de uma tarefa complexa, pois são vários os critérios sugeridos: a) grau de abstração: os princípios são normas com um grau de abstração relativamente elevado; de modo diversos, as regras possuem uma abstração relativamente reduzida.
E quanto ao grau de determinabilidade na aplicação no caso concreto, pois os princípios por serem vagos e imprecisos, carecem de mediações concretizadoras (do legislador, do juiz), enquanto que as regras são suscetíveis de aplicação direta.
Também relativamente ao caráter de fundamentalidade em face do ordenamento jurídico devido á posição hierárquica no sistema das fontes de direito (como por exemplo os princípios constitucionais) ou à sua importância estruturante dentro do sistema jurídico (como exemplo princípio do Estado de Direito) e, ainda, a proximidade da ideia de direito: os princípios são standards juridicamente vinculantes radicados nas exigências de justiça (Dworkin) ou na ideia de direito (Larenz); as regras podem ser normas vinculativas com um conteúdo meramente funcional.
E quanto a natureza normogenética: os princípios são fundamento das regras, ou seja, são normas que estão na base ou constituem a ratio de regras jurídicas, desempenhando, por isso, uma função normogenética fundamentante.
A complexidade da distinção se assevera pelo fato de não se esclarecerem duas questões fundamentais:
1. Saber qual a função dos princípios, se é retórica-argumentativa ou são normas de conduta;
2. Saber se entre os princípios e regras existe um denominador comum, pertencendo à mesma família e havendo apenas uma diferença de grau (quanto à generalidade, conteúdo informativo, hierarquia das fontes, explicitação do conteúdo, conteúdo valorativo), ou se, pelo contrário, os princípios e as regras são suscetíveis de uma diferenciação qualitativa.
Sublinhe-se que o princípio para Alexy, não comporta essa valoração porquanto é conceito axiologicamente neutro e seu uso não expressa nenhuma opção por esta ou aquela disposição fundamental, nem por este ou aquele tipo de Constituição.
Importante destacar que a pretensa supremacia do princípio sobre a regra não faz sentido em Alexy. Sempre que a regra estiver completa, deverá ser aplicado ao caso, inclusive por silogismo, razão pela qual Müller critica a teoria de Alexy.
Pois tal doutrinador está comprometido com o positivismo que supostamente pretende superar. Müller não admite que o simples fato de eleger os princípios à categoria de norma a transforme em pós-positivistas.
O pós-positivismo galga um novo conceito de norma que não pode se confundir com as regras e nem com os princípios, porque apenas surgiria diante do confronto básico com o caso concreto. Os princípios e as regras teriam normatividade, mas não seriam normas.
Para J.J.Canotilho classifica os princípios em quatro grupos:
1. Princípios jurídicos fundamentais que são historicamente objetivados e progressivamente introduzidos na consciência jurídica e que encontram uma recepção expressa e implícita no texto constitucional.
2. Princípios políticos constitucionalmente conformadores são aqueles princípios constitucionais que explicitam as valorações políticas fundamentais do legislador constituinte. Nestes princípios se condensam as opções políticas nucleares e se reflete na ideologia inspiradora do texto constitucional.
Expressando as concepções políticas triunfantes ou dominantes numa assembleia constituinte, os princípios políticos-constitucionais são o cerne político de uma constituição política, não admirando que: sejam reconhecidos, como limites do poder de revisão; se revelem os princípios mais diretamente visados no caso de alteração profunda do regime político.
Os princípios constitucionais impositivos subsumem-se todos os princípios que impõem aos órgãos do Estado, sobretudo ao legislador, a realização de fins e a execução de tarefas.
São, portanto, princípios dinâmicos, prospectivamente orientados. Estes princípios designam-se, muitas vezes, por preceitos definidores dos fins do Estado.
Princípios garantia que visam instituir direta e imediatamente uma garantia dos cidadãos. É-lhes atribuída uma densidade de autêntica norma jurídica e uma força determinante, positiva e negativa. Refiram-se, por exemplo, o princípio de nullum crimen sine lege e de nulla poena sine lege, o princípio do juiz natural e os princípios de non bis in idem e in dubio pro reo.
É evidente que a compreensão do direito por meio dos princípios o que implica numa ruptura com o positivismo típico do Estado Liberal, que se expressava em um direito constituído por regras.
Seguindo a linha do positivismo clássico, não é possível admitir que o juiz possa aplicar uma norma que não se revele mediante o seu próprio texto e que, ao contrário, exija do intérprete certa subjetividade para definição de seu significado.
A aplicação ou a declaração da regra, própria da jurisdição daquela época, não se concilia com a atribuição de significado que caracteriza a metodologia dos princípios.
O positivismo clássico temeu que os princípios pudessem provocar uma profunda imprevisibilidade e insegurança em razão das decisões judiciais, o que gera a incerta sobre o significado do direito, concluiu que a atividade com os princípios deveria ser limitada a um órgão político, já que não se amoldava com a função que era esperada pelo juiz, ou seja, com a simples aplicação do ditado da regra produzida e acabada pelo legislativo.
Mas após a Segunda Grande Guerra Mundial as Constituições passaram a instituir uma série de princípios materiais de justiça, com expressão de aspirações éticas e políticas em fórmulas não muito precisas, assim teceram-se normas que não eram compatíveis com a certeza e segurança tão almejada pelo Direito.
Houve também doutrinador que atribuísse aos princípios um significado meramente político, afirmando que estes só poderiam se expressar através das leis infraconstitucionais.
Mas, o Estado contemporâneo caracterizado pela força normativa da Constituição não dispensa a conformação em regras princípios constitucionais e sabe que isso apenas pode ser realizado com o auxílio da jurisdição.
Os princípios aludem aos direitos humanos e aos princípios materiais de justiça e, a partir daí, revelam valores que devem conformar a realidade e orientar a compreensão e aplicação das leis, é possível encontrar no direito através dos princípios algo similar com o que se propõe com o direito natural.
A relação feita pelo intérprete entre a sua argumentação, entre a lei e o direito natural, pode ser comparada com a que estabelece entre a lei e os princípios.
Não é errado cogitar que as normas constitucionais refletem uma ordem natural, numa acepção histórica e concreta de uma sociedade pluralista e participativa que conduziu uma concordância em um momento de cooperação.
Mas a ideia de direito por princípios não se relaciona com a ideia de direito natural nos moldes tradicionalmente conhecidos. A verdade é que sendo a Constituição uma criação política é evidente que os direitos se fundam em algo que fora elaborado pela vontade humana e não propriamente pela natureza das coisas.
A compreensão da lei a partir da Constituição, ou conforme o texto constitucional expressa outra faceta do positivismo que pode ser qualificado como crítico ou mesmo de pós-positivismo, não porque atribui às normas constitucionais o seu fundamento, mas sim, porque submete o texto da lei aos princípios materiais de justiça e aos direitos fundamentais, permitindo que seja encontrada uma norma que revela finalmente a adequada conformação da lei.
Os princípios expressam concepções e valores que estão indissociavelmente ligados ao ambiente cultural. Assim diante da contínua evolução os princípios devem ser dimensionados nesse mesma intensidade e velocidade.
Afinal, se o conteúdo dos princípios não sofresse mutação com o tempo, o texto constitucional restaria engessada e mumificada à letra das suas normas ou à interpretação que um dia fora feita.
Concluímos que os princípios são fruto do pluralismo e marcados pelo seu caráter aberto. Daí se justifica serem avessos à lógica que governa a aplicação das regras e à hierarquização. Afinal, a ideia de que um princípio prevaleça sobre o outro, numa perspectiva abstrata, afronta literalmente a condição pluralista da sociedade.
Os princípios devem conviver por natureza. E, com a pluralidade há a natural impossibilidade de submetê-los a uma lógica de hierarquização, o que faz surgir uma metodologia que permita a sua aplicação diante dos casos concretos.
Nesse sentido, cogita-se a ponderação dos princípios ou de aplicação da proporcionalidade como regra capaz de permitir a sua coexistência ou de fazer prevalecer um princípio diante do outro sem que um deles tenha que ser eliminado em abstrato, ou sem que o princípio não preferido em determinada situação tenha que ser negado como capaz de aplicação em outro caso concreto.
Afirma-se que no caso de conflito de regras o problema é de validade, enquanto que na colisão de princípios a questão é de peso. Quando há colisão de princípios, um deve ceder diante do outro, conforme as circunstâncias do caso concreto.
De modo que não há como se declarar a invalidade do princípio de menor peso, uma vez que ele prossegue íntegro e válido no ordenamento, podendo merecer prevalência que ele prossegue íntegro e válido no ordenamento, podendo merecer prevalência, em face do mesmo princípio que o precedeu, diante de outra situação concreta.
Os princípios na obra de Josef Esser[9] onde critica a doutrina moderna que tem introduzido na dogmática uma quantidade muito grande de princípios, produtos de invenção aberta, convertido num pensamento puramente axiomático, nos quais as considerações de política jurídica e a casuística se vinculam a problemas aparentemente estranhos à problemática dos princípios, porque dizem respeito às cláusulas gerais[10], normas em branco e outros institutos de criação recente.
Em vista disto, distingue três tipos de princípios: a) axiomáticos, no sentido construtivo moderno; b) problemáticos, ou ideias fundamentais no sentido retórico; e c) dogmáticos.
Para exemplificarmos, poderíamos identificar como princípio axiomático o da liberdade contratual ou, também, o da relatividade de vinculação obrigatória. Como princípio retórico poderíamos citar o da confiança e como o princípio dogmático o da natureza abstrata dos negócios de cumprimento ou o princípio da acessoriedade das garantias.
Tal classificação é criticada por Esser, porque não permite uma forma d a construção de um conceito unitário sobre princípio e propicia a banalização do trato do tema, porque parte do pressuposto de que sempre que exista uma determinada regra com caráter mais geral do que outra, mais concreta, àquela é conferida o status de princípio.
É fundamenta a distinção que Esser estabelece a diferença do tratamento de princípio nos sistemas de civil law e do common law. São distintos os conceitos de norma no direito continental e o conceito de rule no direito anglo-saxão.
Neste, o juiz não é um funcionário sob os efeitos de uma ação burocraticamente organizada, pois exercita uma forma de soberania tradicional e não forma burocrática.
Isto serve para justificar porque para o pensamento jurídico continental, a diferença entre princípio e norma tem um alcance muito maior do que, para a concepção do common law, a distância entre principle e rule, razão suficientemente clara para que não possam ser conjugados os pensamentos e ideias de Alexy (civil law) e Dworkin (common law) para a formulação ou explicação de uma mesma teoria, caracterizando-se esse procedimento como sincretismo conceptual, pecado mortal em que grande parte da doutrina brasileira incorre.
No sistema continental europeu que pode ser aplicado ao sistema brasileiro, fundado, como o europeu continental, nos preceitos do civil law, o que distingue princípio de norma não é a abstração ou o caráter geral, mas a possibilidade de se determinarem os casos de aplicação, que é o caracteriza o preceito jurídico.
O princípio não é um fim em si mesmo, um comando, uma instrução, mas sim fundamento, causa e justificação da instrução, vale dizer, o princípio já se encontra incluído na instrução, determinando a posição desta dentro do conjunto do ordenamento.
Em virtude disso e do caso concreto pode converter-se em uma instrução positiva concreta, desde que exista um sistema suscetível de dedução ou de um método que estabeleça a construção da norma singular, partindo da casuística e em razão da qual se fixa o valor normativo ou construtivo do princípio.
A qualidade de um princípio não é definível em abstrato, sem que se conheça o método para o descobrimento do direito empregado em uma dada constituição. Assim, nenhum princípio atua por si só como criador de normas, mas apenas possui força constitutiva ou valor construtivo em união com o conjunto de reconhecido ordenamento, no qual lhe incumbe uma função bem definida. Esse conjunto pode ser de um sistema axiomático que confere ao princípio um valor de derivação conceitual, lógico ou, de toda maneira, garantido racionalmente.
Nesse caso, o princípio mesmo é uma parte juridicamente dogmatizada do sistema de normas e atua normativamente.
Um princípio somente tem aptidão para a formação de normas quando é acessível à argumentação dogmatizada e especificamente jurídica sob os pontos de vista da justiça e da adequação, ou seja, se as decisões axiológicas que ainda sejam necessárias para sua configuração não pertençam a um programa político em andamento, mas consistam na adequada solução, com mecanismos jurídicos de uma tarefa fixada ou de um problema que em cada ocasião pode circunscrever-se do mesmo modo. Um princípio com esse componente político influenciando a decisão não pode ser caracterizado como jurídico.
Resta evidente que a disjunção entre princípio jurídico e princípio extrajurídico é questão que depende do sistema e, não da arbitrária decisão do legislador ordinário ou do legislador constitucional. Mas isso não é suficiente para determinar-se um princípio que não tenha sido fixado pode converter-se em parte do direito positivo como seu postulado, se assim não dispõe o legislador.
Tal questão não é um dos tantos pseudoproblemas insolúveis existentes entre as doutrinas positivistas e jusnaturalistas. Uma solução fictícia seria afirmar que todo o princípio dentro do âmbito em que foi positivado, são mais fortes os não escritos, mesmo em relação aos positivados, circunstância comprovada notadamente no campo do direito constitucional.
São fontes de direito também os princípios na medida em que tenham sido encarnados em uma instituição, por um ato constitutivo de Legislativo, da jurisprudência ou da vida jurídica. Portanto, todos os princípios são elementos do direito positivo e por esta razão gozam de proteção processual. São parte do corpus iuris do ordenamento jurídico. Não como verdades existentes ou em potência que devam ser descobertas ou valoradas, fora do que tenha recebido uma realização institucional.
Apesar de silente o CPC/2015 não creio na exclusão do princípio da identidade física do juiz. Aliás, são inúmeros os princípios constitucionais que informam e regem o direito processual civil brasileiro.
Interessante é apontar a definição do princípio do dispositivo em face do princípio da demanda. Há, de fato, uma distinção relevante. O princípio do dispositivo diz respeito ao poder que as partes possuem de dispor da causa, seja deixando de alegar ou provar fatos a ela pertinentes, seja desinteressando-se do andamento do processo. Enquanto que o da demanda refere-se ao alcance da própria atividade jurisdicional.
Com o CPC/2015 de matiz neoprocessual observa-se alteração da base principiológica vigente no CPC de 1973 principalmente em face de colocar os princípios e valores constitucionais presentes na legislação processual, e ainda, pela primazia do julgamento do mérito (oferecendo a maior sanabilidade que possível dos feitos), da boa-fé objetiva, da duração razoável do processo, do devido processo legal e um substancial incremento do princípio do contraditório(doravante chamado de dinâmico ou comparticipativo)e também o princípio da cooperação dos sujeitos do processo (que enfatiza e valoriza a solução autocompositiva dos conflitos, através da mediação, conciliação e mesmo arbitragem).
De qualquer maneira, o que se pretende dos princípios sejam os constitucionais e os processuais é que ajudem e orientem a correta aplicação processual da legislação galgando a solução e a pacificação social.
De qualquer forma os conceitos na teoria geral do direito não possuem fronteiras ortodoxas e estanques, posto que o objeto do Direito seja único e indivisível. Portanto é visível que toda regra deva contemplar um princípio...assim como este traz a normatividade conforme sua evolução doutrinária e histórica.
Referências:
GRECO, Leonardo. Instituições de Processo Civil. Volume I Introdução ao Direito Processual Civil. 5ª edição. Rio de Janeiro: Forense, 2015.
JUNIOR, Nelson Nery. Princípios do Processo na Constituição Federal. 10ª edição. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010.
MARINONI, Luiz Guilherme. Curso de Processo Civil. V. 1 Teoria Geral do Processo. 6ª edição São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012.
VASCONCELOS, Arnaldo. Teoria da Norma Jurídica. Rio de Janeiro: Forense, 1978.
Com a proximidade do fim da vacatio legis do CPC/2015, esse debate reacendeu peculiarmente[1], eis o motivo do modesto artigo.
Existem construções doutrinária variadas como a de Peter Haberle, Robert Alexy, Ronald Dworkin, Carl Schmitt, José Joaquim Gomes Canotilho, Virgílio Afonso da Silva, Karl Larenz, Josef Esser, Niklas Luhmann, Alf Ross, entre outros.
Observa-se que em todas as construções há a presença de elementos positivos e elementos negativos, vantagens e desvantagens sendo adaptáveis ao direito positivo interno de um Estado ou não.
Norma[2] corresponde ao sentido atribuído a qualquer disposição. Disposição é parte de um texto ainda a ser interpretado. A norma é a parte de um texto interpretado.
A normatividade é, pois, o resultado da interpretação que se apresenta como norma jurídica. Diferentemente do texto da norma que consiste na obrigação dirigida aos destinatários da norma de conformarem a esta o seu comportamento e, de outro lado, na obrigação dirigida ao juiz (ou a autoridade habilitada a interpretar) de utilizar, na sua integralidade, os textos das normas jurídicas adequados ao caso concreto particular e, ainda, trabalhar corretamente sob o ponto de vista metódico.
Norma não é Direito, apesar de que em linguagem metafórica, possa se afirmar que esta contenha Direito. Com razão, já proclamara Paulo que não é da regra que promana o direito, senão com base no direito, existente por si mesmo, que a regra[3] é elaborada. Non et, ex regula jus sumatur, sed ex jure, quod est, regula fiat.
A norma é, pura e simplesmente, a previsão. Modelo de conduta diante de fatos relevantes para o convívio social. É notável que todos os que reduzem o Direito à sentença dado o pressuposto de que esta decorre sempre de um ilícito, único motivo de ir ao tribunal, cometem equívoco semelhante ao de Hobbes e Carnelutti.
Enquadra-se na hipótese a Teoria Pura de Kelsen, que, embora tenha pretendido ser uma teoria do direito positivo em geral, contempla e distingue com especialidade o Direito contencioso, em torno do qual faz girar toda a construção doutrinária.
Norma seria a interpretação conferida a um texto ou enunciado, parte de um texto ou combinação de um texto. Não existe norma antes da interpretação e nem independente dela. Interpretar é produzir a norma. Assim, consagra-se que a norma é produto do intérprete.
Mas, cabe distinguir o texto normativo da norma com base em Gadamer, o que acarreta cisão maior com o positivismo, sem dizer que o conceito da teoria estruturante da norma institui um conceito muito mais complexo.
A norma não é apenas carente de interpretação porque não é unívoca, nem porque seja destituída de clareza, mas sobretudo porque deva ser aplicada ao caso concreto (seja real ou fictício).
O conceito mais simples de norma jurídica embora envolva certa tautologia, é aquele que resulta do posicionamento da expressão sintética jurídica ao lado da correspondente expressão analítica “de Direito”: norma jurídica é norma de Direito, isto é, norma de fazer Direito[4].
A Escola Sociológica norte-americana configura o Direito pela sentença[5], resultado de uma profecia. Percebe-se até onde vão ter certeza e a segurança em nome das quais pretendeu o positivismo impor-se.
É inaceitável a assertiva de Philip Heck representante da Escola tubigense de Direito Privado, ou a Jurisprudência de Interesses, segundo a qual o “el Derecho realmente importante para la vida es aquel que se realiza em la sentencia judicial”.
Tal assertiva envolve a deturpação do que seja validade social ou eficácia. O simples fato de o Direito ser contestado, tanto que só se resolva judicialmente, significa já o questionamento de sua validade. Que se afirme que o Direito é realização prática conforme o fez Ihering, está parcialmente correto, mas que se afirme que deva representar-se pela sentença judicial está absolutamente incorreto.
A definição do Direito em termos de decisões judiciais é tão ridícula como afirmar que a definição da medicina se dá em função do comportamento dos médicos.
O desdobramento lógico da frase de Heck nos conduz a concluir que o Direito, que se realiza de forma pacífica e silenciosa, não teria qualquer interesse para a ordem social. E reduziria o Direito apenas ao Direito contencioso.
É evidente o locus do Direito judicial, mas sem fazê-lo anular o Direito não contencioso, através da supressão de seu significado social. Apesar de Carlos Cossio revelar que a sentença seja o fenômeno jurídico por excelência.
Afinal a tarefa da criação jurídica também se materializa através da atividade negocial, no mais amplo campo da licitude. A verdade é que o homem cria Direito a todo tempo, porque há tantas relações de convivência que o obrigam. Estes sim, corresponde ao Direito realmente importante, sendo o fenômeno jurídico por excelência.
A doutrina após as obras de Dworkin e Alexy tem insistido em produzir a distinção entre princípios e regras. Enquanto as regras se esgotam em si mesmas, na medida em que descrevem o que se deve, não se deve ou se pode fazer em determinadas situações; os princípios são constitutivos da ordem jurídica, revelando os valores ou os critérios que devem orientar a compreensão e a aplicação das regras diante das situações concretas.
A afirmação do caráter constitutivo dos princípios realça a acepção da Constituição como ordem de valores adorada pelo Tribunal Constitucional Alemão desde a decisão no caso Lüth[6] em 1958.
Alexy afirma que os princípios são normas que ordenam algo seja realizado na maior medida possível, dentro das possibilidades jurídicas e fáticas existentes, ao passo que as regras são normas que podem ser cumpridas ou não, uma vez que, se uma regra é válida, há de ser feito exatamente o que esta exige, nem mais e nem menos.
Alexy aponta que as regras contêm determinações no âmbito fático e juridicamente possível, ao passo que os princípios podem ser realizados em diferentes graus, conforme as possibilidades jurídicas e fáticas.
Assim se um princípio valer para um caso, não significa afirmar que aquilo que este requer desse caso deva valer para todos os outros casos. Os princípios apresentam razões que podem ser superadas por razões opostas.
A realização dos princípios depende das possibilidades jurídicas e fáticas, que são condicionadas pelos princípios opostos, e assim exigem a consideração dos pesos dos princípios em colisão segundo as circunstâncias do caso concreto.
É extremamente relevante a importância dos princípios nos casos de controle de constitucionalidade da lei, de dúvida interpretativa e de ausência de regra. Porém, essa perspectiva constitui apenas uma parte do significado que os princípios possuem no constitucionalismo contemporâneo.
Afinal a função dos princípios não é meramente complementar e acessória, destinando-se apenas auxiliar as regras, também não se resumem em ser válvulas de escape do ordenamento jurídico, que entram em ação quando as regras não são capazes de regular adequadamente os casos concretos.
Os princípios não padecem de limitação, e são tanto quanto as regras, razões para juízos concretos do dever ser.
Na obra de Luís Virgílio Afonso da Silva são utilizados os critérios de Robert Alexy, e o doutrinador e professor alemão trabalha o tema dos princípios de forma bem diferente do conceito tradicionalmente adotado pela doutrina brasileira.
Na doutrina tradicional pátria os princípios assumem a definição de ser mandamentos nucleares ou disposições fundamentais de um sistema, ou, ainda, como núcleos condensadores.
Apesar de grande variação na nomenclatura e muitos doutrinadores se dedicaram ao estudo dos princípios jurídicos no Brasil, mas em suma, a noção costuma ser a mesma, de que seriam normas mais fundamentais do sistema, enquanto que as regras costumam ser definidas como a concretização desses princípios e teriam, por essa razão, o caráter mais instrumental e menos fundamental.
Por esse motivo é que enxergamos que muitas normas denominadas pela doutrina tradicional como sendo princípios, deveriam ser chamadas de regras, caso se adote o critério proposto por Alexy. E, assim o nulla poena sine lege presente na legalidade, na anterioridade entre outros, devam ser chamados de regras e, não de princípios.
Há ferrenha crítica ao sincretismo metodológico que é praticado no Brasil, como por exemplo, por Fábio Konder Comparado, que utiliza as teorias de Müller e de Alexy em conjunto.
A distinção entre regras e princípios, tem como uma de suas principais características exatamente a exigibilidade de sopesamento de princípios como forma de aplica-los. Porém, ambas as teorias, a despeito de serem incompatíveis, sejam defendidas no Brasil como se complementares fossem.
Os princípios recortam certas parcelas da realidade e colocam-nas sob seu âmbito de proteção. Consequentemente, a partir do momento em que se projetam sobre a realidade, eles servem de fundamento para as normas específicas que orientam concretamente a ação, seja num sentido positivo (prestação fática ou jurídica), seja num sentido negativo (omissão).
No âmbito da relação entre a Constituição Federal e a lei, isso significa que os princípios de um lado, impõem aos legisladores deveres de produção e normas jurídicas e, de outro lado, e, de outro lado, ainda imunizam determinadas posições jurídicas – as parcelas da realidade recolhidas em seu âmbito protegido – do alcance da atuação da lei.
Nessa acepção, os princípios conferem valor normativo aos fatos, também indicando como a lei deve ser dimensionada para não agredi-los. Por essa razão, a compreensão e a conformação das regras estão condicionadas pelo valor atribuído à realidade pelos princípios.
Porém, se a regra deve ser compreendida e aplicada conforme o valor atribuído à realidade pelo princípio, é evidente que não se pode controlar a constitucionalidade da lei, ou mesmo interpretá-la, considerando-se apenas o seu contexto.
Nessa situação, se afirma que não basta identificar o significado da norma em abstrato, sendo necessário precisar o seu significado em face da realidade dos casos concretos.
A atenção ao desempenho da norma na prática outorga ao intérprete a possibilidade de relacionar os princípios com uma outra dimensão de significado normativo, viabilizando uma compreensão crítica da norma em sua perspectiva concreta.
Os princípios na obra de Robert Alexy são normas que ordenam que algo seja realizado na maior medida que possível, porém dentro das possibilidades jurídicas e reais existentes.
Assim são reconhecidos como mandamentos de otimização, caracterizados pelo fato de que podem ser cumpridos em diferentes graus, e de seu cumprimento não somente depende das possibilidades reais, mas também das jurídicas. O âmbito das possibilidades jurídicas é determinado pelos princípios e regras opostas.
Na obra de Dworkin, os princípios em sentido amplo englobam os principles e as policies, ou seja, os princípios em sentido estrito, que tutelam os direitos individuais e as diretrizes (políticas), que orientam a implementação de objetivos coletivos.
Para Dworkin, a política é uma espécie de padrão que fixa o objetivo a ser alcançado, geralmente um avanço do ponto de vista econômico, político ou social em prol da comunidade, nada obstante alguns desses objetivos possam a ser negativos, por protegerem alguma situação contra modificações adversas.
Por outro lado, para Dworkin o princípio é o critério que deve ser aplicado, não para proteger determinada situação política, econômica ou social, mas sim porque é exigência da justiça, equidade ou alguma outra dimensão da moralidade.
Os principles referem-se à dimensão individual, enquanto as policies, à dimensão comunitária, e é nesse sentido que deve ser entendida a afirmação de Dworkin de que a decisão judicial é essencialmente política, o que significa dizer que ela possui uma dimensão comunitária.
Os princípios conferem coerência e justificação ao sistema jurídico e permitem ao juiz, diante dos hard cases, realizar a interpretação de maneira mais conforme à Constituição.
Para tanto, o juiz Hércules[7] deve construir um esquema de princípios abstratos e concretos que possa dar coerência e consistência aos precedentes do common law (direito consuetudinário) e os termos em que esses precedentes se justificam por meio de princípios, o juiz tem que construir também um esquema que justifique tudo isso do ponto de vista constitucional e legal.
A distinção entre princípios e regras segundo Ronald Dworkin trata-se de uma distinção lógica. Mas, ambos admitem pontos comuns para decisões particulares sobre certa obrigação jurídica em circunstâncias particulares. No entanto, são diferentes no caráter da direção que cada um deles empreende.
As regras são aplicáveis tendo em vista a ideia de tudo ou nada. Dentro dos fatos que a regra estipula, ou essa regra é válida e deve ser aceita ou, ao contrário, a regra não é válida e, portanto, em nada contribui para a decisão.
Dworkin confirma a tese de que, na essência, os princípios são distintos de regras, não sendo a distinção entre eles um problema apenas de semântica.
Os princípios na visão de Lenio Luiz Streck[8] vieram para superar a abstração da regra, desterritorializando-a de seu locus privilegiado que é o positivismo.
O cerne dos princípios é a diferença ontológica, instrumento utilizado para o mundo prático invadir o positivismo.
Streck afirma que não se pode caracterizar o princípio como mandado de otimização, porque isso traz embutida a ideia positivista para que seja reavivada a abstratalidade, e, consequentemente, seja afastado o mundo prático ínsito aos princípios.
É através dos princípios que é possível sustentar a existência de respostas adequadas (sendo corretas para cada caso concreto). A resposta dada através dos princípios é um problema hermenêutico, e não analítico-procedimental (fundamentação).
A presença dos princípios na resolução dos assim denominados casos difíceis embora a evidente inadequação da distinção entre o easy (fácil) e hard (difíceis) cases tem o condão exatamente de evitar a discricionariedade judicial. A resposta não provém de um discurso adjudicador (de fora) ela provém de uma cooriginariedade.
Depois de mencionar que a tradicional metodologia jurídica fazia a distinção entre norma s e princípios, Canotilho afirma que deixará de considerar essa teoria, surgindo sua substituição por outra.
As regras e princípios são duas espécies de normas, e a distinção entre estas refere-se à distinção entre espécies de normas. Trata-se realmente de uma tarefa complexa, pois são vários os critérios sugeridos: a) grau de abstração: os princípios são normas com um grau de abstração relativamente elevado; de modo diversos, as regras possuem uma abstração relativamente reduzida.
E quanto ao grau de determinabilidade na aplicação no caso concreto, pois os princípios por serem vagos e imprecisos, carecem de mediações concretizadoras (do legislador, do juiz), enquanto que as regras são suscetíveis de aplicação direta.
Também relativamente ao caráter de fundamentalidade em face do ordenamento jurídico devido á posição hierárquica no sistema das fontes de direito (como por exemplo os princípios constitucionais) ou à sua importância estruturante dentro do sistema jurídico (como exemplo princípio do Estado de Direito) e, ainda, a proximidade da ideia de direito: os princípios são standards juridicamente vinculantes radicados nas exigências de justiça (Dworkin) ou na ideia de direito (Larenz); as regras podem ser normas vinculativas com um conteúdo meramente funcional.
E quanto a natureza normogenética: os princípios são fundamento das regras, ou seja, são normas que estão na base ou constituem a ratio de regras jurídicas, desempenhando, por isso, uma função normogenética fundamentante.
A complexidade da distinção se assevera pelo fato de não se esclarecerem duas questões fundamentais:
1. Saber qual a função dos princípios, se é retórica-argumentativa ou são normas de conduta;
2. Saber se entre os princípios e regras existe um denominador comum, pertencendo à mesma família e havendo apenas uma diferença de grau (quanto à generalidade, conteúdo informativo, hierarquia das fontes, explicitação do conteúdo, conteúdo valorativo), ou se, pelo contrário, os princípios e as regras são suscetíveis de uma diferenciação qualitativa.
Sublinhe-se que o princípio para Alexy, não comporta essa valoração porquanto é conceito axiologicamente neutro e seu uso não expressa nenhuma opção por esta ou aquela disposição fundamental, nem por este ou aquele tipo de Constituição.
Importante destacar que a pretensa supremacia do princípio sobre a regra não faz sentido em Alexy. Sempre que a regra estiver completa, deverá ser aplicado ao caso, inclusive por silogismo, razão pela qual Müller critica a teoria de Alexy.
Pois tal doutrinador está comprometido com o positivismo que supostamente pretende superar. Müller não admite que o simples fato de eleger os princípios à categoria de norma a transforme em pós-positivistas.
O pós-positivismo galga um novo conceito de norma que não pode se confundir com as regras e nem com os princípios, porque apenas surgiria diante do confronto básico com o caso concreto. Os princípios e as regras teriam normatividade, mas não seriam normas.
Para J.J.Canotilho classifica os princípios em quatro grupos:
1. Princípios jurídicos fundamentais que são historicamente objetivados e progressivamente introduzidos na consciência jurídica e que encontram uma recepção expressa e implícita no texto constitucional.
2. Princípios políticos constitucionalmente conformadores são aqueles princípios constitucionais que explicitam as valorações políticas fundamentais do legislador constituinte. Nestes princípios se condensam as opções políticas nucleares e se reflete na ideologia inspiradora do texto constitucional.
Expressando as concepções políticas triunfantes ou dominantes numa assembleia constituinte, os princípios políticos-constitucionais são o cerne político de uma constituição política, não admirando que: sejam reconhecidos, como limites do poder de revisão; se revelem os princípios mais diretamente visados no caso de alteração profunda do regime político.
Os princípios constitucionais impositivos subsumem-se todos os princípios que impõem aos órgãos do Estado, sobretudo ao legislador, a realização de fins e a execução de tarefas.
São, portanto, princípios dinâmicos, prospectivamente orientados. Estes princípios designam-se, muitas vezes, por preceitos definidores dos fins do Estado.
Princípios garantia que visam instituir direta e imediatamente uma garantia dos cidadãos. É-lhes atribuída uma densidade de autêntica norma jurídica e uma força determinante, positiva e negativa. Refiram-se, por exemplo, o princípio de nullum crimen sine lege e de nulla poena sine lege, o princípio do juiz natural e os princípios de non bis in idem e in dubio pro reo.
É evidente que a compreensão do direito por meio dos princípios o que implica numa ruptura com o positivismo típico do Estado Liberal, que se expressava em um direito constituído por regras.
Seguindo a linha do positivismo clássico, não é possível admitir que o juiz possa aplicar uma norma que não se revele mediante o seu próprio texto e que, ao contrário, exija do intérprete certa subjetividade para definição de seu significado.
A aplicação ou a declaração da regra, própria da jurisdição daquela época, não se concilia com a atribuição de significado que caracteriza a metodologia dos princípios.
O positivismo clássico temeu que os princípios pudessem provocar uma profunda imprevisibilidade e insegurança em razão das decisões judiciais, o que gera a incerta sobre o significado do direito, concluiu que a atividade com os princípios deveria ser limitada a um órgão político, já que não se amoldava com a função que era esperada pelo juiz, ou seja, com a simples aplicação do ditado da regra produzida e acabada pelo legislativo.
Mas após a Segunda Grande Guerra Mundial as Constituições passaram a instituir uma série de princípios materiais de justiça, com expressão de aspirações éticas e políticas em fórmulas não muito precisas, assim teceram-se normas que não eram compatíveis com a certeza e segurança tão almejada pelo Direito.
Houve também doutrinador que atribuísse aos princípios um significado meramente político, afirmando que estes só poderiam se expressar através das leis infraconstitucionais.
Mas, o Estado contemporâneo caracterizado pela força normativa da Constituição não dispensa a conformação em regras princípios constitucionais e sabe que isso apenas pode ser realizado com o auxílio da jurisdição.
Os princípios aludem aos direitos humanos e aos princípios materiais de justiça e, a partir daí, revelam valores que devem conformar a realidade e orientar a compreensão e aplicação das leis, é possível encontrar no direito através dos princípios algo similar com o que se propõe com o direito natural.
A relação feita pelo intérprete entre a sua argumentação, entre a lei e o direito natural, pode ser comparada com a que estabelece entre a lei e os princípios.
Não é errado cogitar que as normas constitucionais refletem uma ordem natural, numa acepção histórica e concreta de uma sociedade pluralista e participativa que conduziu uma concordância em um momento de cooperação.
Mas a ideia de direito por princípios não se relaciona com a ideia de direito natural nos moldes tradicionalmente conhecidos. A verdade é que sendo a Constituição uma criação política é evidente que os direitos se fundam em algo que fora elaborado pela vontade humana e não propriamente pela natureza das coisas.
A compreensão da lei a partir da Constituição, ou conforme o texto constitucional expressa outra faceta do positivismo que pode ser qualificado como crítico ou mesmo de pós-positivismo, não porque atribui às normas constitucionais o seu fundamento, mas sim, porque submete o texto da lei aos princípios materiais de justiça e aos direitos fundamentais, permitindo que seja encontrada uma norma que revela finalmente a adequada conformação da lei.
Os princípios expressam concepções e valores que estão indissociavelmente ligados ao ambiente cultural. Assim diante da contínua evolução os princípios devem ser dimensionados nesse mesma intensidade e velocidade.
Afinal, se o conteúdo dos princípios não sofresse mutação com o tempo, o texto constitucional restaria engessada e mumificada à letra das suas normas ou à interpretação que um dia fora feita.
Concluímos que os princípios são fruto do pluralismo e marcados pelo seu caráter aberto. Daí se justifica serem avessos à lógica que governa a aplicação das regras e à hierarquização. Afinal, a ideia de que um princípio prevaleça sobre o outro, numa perspectiva abstrata, afronta literalmente a condição pluralista da sociedade.
Os princípios devem conviver por natureza. E, com a pluralidade há a natural impossibilidade de submetê-los a uma lógica de hierarquização, o que faz surgir uma metodologia que permita a sua aplicação diante dos casos concretos.
Nesse sentido, cogita-se a ponderação dos princípios ou de aplicação da proporcionalidade como regra capaz de permitir a sua coexistência ou de fazer prevalecer um princípio diante do outro sem que um deles tenha que ser eliminado em abstrato, ou sem que o princípio não preferido em determinada situação tenha que ser negado como capaz de aplicação em outro caso concreto.
Afirma-se que no caso de conflito de regras o problema é de validade, enquanto que na colisão de princípios a questão é de peso. Quando há colisão de princípios, um deve ceder diante do outro, conforme as circunstâncias do caso concreto.
De modo que não há como se declarar a invalidade do princípio de menor peso, uma vez que ele prossegue íntegro e válido no ordenamento, podendo merecer prevalência que ele prossegue íntegro e válido no ordenamento, podendo merecer prevalência, em face do mesmo princípio que o precedeu, diante de outra situação concreta.
Os princípios na obra de Josef Esser[9] onde critica a doutrina moderna que tem introduzido na dogmática uma quantidade muito grande de princípios, produtos de invenção aberta, convertido num pensamento puramente axiomático, nos quais as considerações de política jurídica e a casuística se vinculam a problemas aparentemente estranhos à problemática dos princípios, porque dizem respeito às cláusulas gerais[10], normas em branco e outros institutos de criação recente.
Em vista disto, distingue três tipos de princípios: a) axiomáticos, no sentido construtivo moderno; b) problemáticos, ou ideias fundamentais no sentido retórico; e c) dogmáticos.
Para exemplificarmos, poderíamos identificar como princípio axiomático o da liberdade contratual ou, também, o da relatividade de vinculação obrigatória. Como princípio retórico poderíamos citar o da confiança e como o princípio dogmático o da natureza abstrata dos negócios de cumprimento ou o princípio da acessoriedade das garantias.
Tal classificação é criticada por Esser, porque não permite uma forma d a construção de um conceito unitário sobre princípio e propicia a banalização do trato do tema, porque parte do pressuposto de que sempre que exista uma determinada regra com caráter mais geral do que outra, mais concreta, àquela é conferida o status de princípio.
É fundamenta a distinção que Esser estabelece a diferença do tratamento de princípio nos sistemas de civil law e do common law. São distintos os conceitos de norma no direito continental e o conceito de rule no direito anglo-saxão.
Neste, o juiz não é um funcionário sob os efeitos de uma ação burocraticamente organizada, pois exercita uma forma de soberania tradicional e não forma burocrática.
Isto serve para justificar porque para o pensamento jurídico continental, a diferença entre princípio e norma tem um alcance muito maior do que, para a concepção do common law, a distância entre principle e rule, razão suficientemente clara para que não possam ser conjugados os pensamentos e ideias de Alexy (civil law) e Dworkin (common law) para a formulação ou explicação de uma mesma teoria, caracterizando-se esse procedimento como sincretismo conceptual, pecado mortal em que grande parte da doutrina brasileira incorre.
No sistema continental europeu que pode ser aplicado ao sistema brasileiro, fundado, como o europeu continental, nos preceitos do civil law, o que distingue princípio de norma não é a abstração ou o caráter geral, mas a possibilidade de se determinarem os casos de aplicação, que é o caracteriza o preceito jurídico.
O princípio não é um fim em si mesmo, um comando, uma instrução, mas sim fundamento, causa e justificação da instrução, vale dizer, o princípio já se encontra incluído na instrução, determinando a posição desta dentro do conjunto do ordenamento.
Em virtude disso e do caso concreto pode converter-se em uma instrução positiva concreta, desde que exista um sistema suscetível de dedução ou de um método que estabeleça a construção da norma singular, partindo da casuística e em razão da qual se fixa o valor normativo ou construtivo do princípio.
A qualidade de um princípio não é definível em abstrato, sem que se conheça o método para o descobrimento do direito empregado em uma dada constituição. Assim, nenhum princípio atua por si só como criador de normas, mas apenas possui força constitutiva ou valor construtivo em união com o conjunto de reconhecido ordenamento, no qual lhe incumbe uma função bem definida. Esse conjunto pode ser de um sistema axiomático que confere ao princípio um valor de derivação conceitual, lógico ou, de toda maneira, garantido racionalmente.
Nesse caso, o princípio mesmo é uma parte juridicamente dogmatizada do sistema de normas e atua normativamente.
Um princípio somente tem aptidão para a formação de normas quando é acessível à argumentação dogmatizada e especificamente jurídica sob os pontos de vista da justiça e da adequação, ou seja, se as decisões axiológicas que ainda sejam necessárias para sua configuração não pertençam a um programa político em andamento, mas consistam na adequada solução, com mecanismos jurídicos de uma tarefa fixada ou de um problema que em cada ocasião pode circunscrever-se do mesmo modo. Um princípio com esse componente político influenciando a decisão não pode ser caracterizado como jurídico.
Resta evidente que a disjunção entre princípio jurídico e princípio extrajurídico é questão que depende do sistema e, não da arbitrária decisão do legislador ordinário ou do legislador constitucional. Mas isso não é suficiente para determinar-se um princípio que não tenha sido fixado pode converter-se em parte do direito positivo como seu postulado, se assim não dispõe o legislador.
Tal questão não é um dos tantos pseudoproblemas insolúveis existentes entre as doutrinas positivistas e jusnaturalistas. Uma solução fictícia seria afirmar que todo o princípio dentro do âmbito em que foi positivado, são mais fortes os não escritos, mesmo em relação aos positivados, circunstância comprovada notadamente no campo do direito constitucional.
São fontes de direito também os princípios na medida em que tenham sido encarnados em uma instituição, por um ato constitutivo de Legislativo, da jurisprudência ou da vida jurídica. Portanto, todos os princípios são elementos do direito positivo e por esta razão gozam de proteção processual. São parte do corpus iuris do ordenamento jurídico. Não como verdades existentes ou em potência que devam ser descobertas ou valoradas, fora do que tenha recebido uma realização institucional.
Apesar de silente o CPC/2015 não creio na exclusão do princípio da identidade física do juiz. Aliás, são inúmeros os princípios constitucionais que informam e regem o direito processual civil brasileiro.
Interessante é apontar a definição do princípio do dispositivo em face do princípio da demanda. Há, de fato, uma distinção relevante. O princípio do dispositivo diz respeito ao poder que as partes possuem de dispor da causa, seja deixando de alegar ou provar fatos a ela pertinentes, seja desinteressando-se do andamento do processo. Enquanto que o da demanda refere-se ao alcance da própria atividade jurisdicional.
Com o CPC/2015 de matiz neoprocessual observa-se alteração da base principiológica vigente no CPC de 1973 principalmente em face de colocar os princípios e valores constitucionais presentes na legislação processual, e ainda, pela primazia do julgamento do mérito (oferecendo a maior sanabilidade que possível dos feitos), da boa-fé objetiva, da duração razoável do processo, do devido processo legal e um substancial incremento do princípio do contraditório(doravante chamado de dinâmico ou comparticipativo)e também o princípio da cooperação dos sujeitos do processo (que enfatiza e valoriza a solução autocompositiva dos conflitos, através da mediação, conciliação e mesmo arbitragem).
De qualquer maneira, o que se pretende dos princípios sejam os constitucionais e os processuais é que ajudem e orientem a correta aplicação processual da legislação galgando a solução e a pacificação social.
De qualquer forma os conceitos na teoria geral do direito não possuem fronteiras ortodoxas e estanques, posto que o objeto do Direito seja único e indivisível. Portanto é visível que toda regra deva contemplar um princípio...assim como este traz a normatividade conforme sua evolução doutrinária e histórica.
Referências:
GRECO, Leonardo. Instituições de Processo Civil. Volume I Introdução ao Direito Processual Civil. 5ª edição. Rio de Janeiro: Forense, 2015.
JUNIOR, Nelson Nery. Princípios do Processo na Constituição Federal. 10ª edição. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010.
MARINONI, Luiz Guilherme. Curso de Processo Civil. V. 1 Teoria Geral do Processo. 6ª edição São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012.
VASCONCELOS, Arnaldo. Teoria da Norma Jurídica. Rio de Janeiro: Forense, 1978.
[1] Na primeira fase da evolução dos princípios deu-se a metafísica e abstrata, é a fase jusnaturalista. Quando se ensina que os princípios funcionam como alicerce do Direito, como fonte de inspiração, como máximas fundamentais, possuindo, grande dimensão ético-valorativa.
Os princípios correspondem ao espírito do Direito, mas não são, não integram, o Direito tais como as normas jurídicos.
Já o segundo estágio de evolução, os princípios se encontra na fase positivista ou juspositivista. Quando passam a ser fonte normativa subsidiária, válvulas de segurança, o que garante o reinado absoluta da lei. Nessa segunda etapa, o princípio não era reconhecido como verdadeira norma jurídica, não possuindo, portanto, tanta importância.
Foi somente na derradeira fase evolutiva, a fase pós-positivista que se inverte o quadro, e passa-se a reconhecer o caráter normativo dos princípios, que fora afirmada em 1952 por Crisafulli, apontando sua dupla eficácia: imediata e mediata (programática), asseverando tratar-se de normas a certas condutas publicistas ou mesmo particulares. Portanto, a evolução deu-se a partir do ponto de vista da regra particular até chegar-se finalmente ao vetor principiológico, quando se sedimentou a normatividade plena dos princípios.
Os princípios correspondem ao espírito do Direito, mas não são, não integram, o Direito tais como as normas jurídicos.
Já o segundo estágio de evolução, os princípios se encontra na fase positivista ou juspositivista. Quando passam a ser fonte normativa subsidiária, válvulas de segurança, o que garante o reinado absoluta da lei. Nessa segunda etapa, o princípio não era reconhecido como verdadeira norma jurídica, não possuindo, portanto, tanta importância.
Foi somente na derradeira fase evolutiva, a fase pós-positivista que se inverte o quadro, e passa-se a reconhecer o caráter normativo dos princípios, que fora afirmada em 1952 por Crisafulli, apontando sua dupla eficácia: imediata e mediata (programática), asseverando tratar-se de normas a certas condutas publicistas ou mesmo particulares. Portanto, a evolução deu-se a partir do ponto de vista da regra particular até chegar-se finalmente ao vetor principiológico, quando se sedimentou a normatividade plena dos princípios.
[2] Toda norma jurídica se desdobra em preceito e sanção. E, particularmente o direito penal consagra tal padrão pois existe em cada artigo da lei, a conduta a ser seguida e a pena que assegura seu cumprimento. O direito civil, no entanto, limita-se a fixar os preceitos.
Kant considera ser a norma jurídica um juízo hipotético. Cabe, no entanto, diferenciar o imperativo categórico do hipotético. Pois o primeiro impõe o dever sem qualquer condição, enquanto que o hipotético é condicional. O categórico ordena por ser necessário, enquanto no hipotético a conduta imposta é meio para uma finalidade. Assim, o imperativo hipotético estabelece a condição para a produção de determinado efeito.
Kant considera ser a norma jurídica um juízo hipotético. Cabe, no entanto, diferenciar o imperativo categórico do hipotético. Pois o primeiro impõe o dever sem qualquer condição, enquanto que o hipotético é condicional. O categórico ordena por ser necessário, enquanto no hipotético a conduta imposta é meio para uma finalidade. Assim, o imperativo hipotético estabelece a condição para a produção de determinado efeito.
[3]Define Canotilho as regras como normas que, verificados determinados pressupostos, exigem, permitem ou proíbem algo em termos definitivos, sem qualquer exceção. São normas descritivas para cuja aplicação se exige a avaliação da correspondência entre a conceituação da descrição normativa e a construção conceitual dos fatos.
Quando ocorrer antinomia seja pela coexistência de duas regras incompatíveis presentes num mesmo ordenamento jurídico e no mesmo âmbito de validade, ocorrerá a eliminação de uma delas do sistema por meio da utilização dos critérios hierárquico, cronológico ou da especialidade.
Quando ocorrer antinomia seja pela coexistência de duas regras incompatíveis presentes num mesmo ordenamento jurídico e no mesmo âmbito de validade, ocorrerá a eliminação de uma delas do sistema por meio da utilização dos critérios hierárquico, cronológico ou da especialidade.
[4] Quando Immanuel Kant entra em cena, no final do século XVIII, destruiu todas as realidades para reconstruí-las racionalmente. Seu pensamento jurídico, como o político, situa-se no plano das possibilidades, revelando aspirações e nunca se propondo a ser meras formulações teóricas de resultados colhidos da realidade. O direito positivo que concebe tem explicação no pacto social, na possibilidade de um dever-ser (Sollen), e não uma realidade (ser ou sein). Mas, o pacto social não cria o Direito, apenas o regula. Não dá liberdades, ao revés, as restringe, para que possam coexistir harmonicamente. O Direito precede o Estado. Porém, as regras de Direito Natural existentes no estado de natureza, têm apenas valor de Direito Privado. O estado político vem garantir essas regras, tornando-as de Direito público. O Direito permanece o mesmo que antes, porém doravante assegurado pela coação.
[5] Apesar de ser verdade que é o juiz que cria a norma in concreto do direito, pois ao interpretar e aplicar a norma in abstracto no caso concreto, produz uma norma in concreto. Customizada e direcionada a resolver o mérito da causa.
[6] O caso Lüth transformou-se num dos mais sensacionais exemplos de sucesso da jurisdição constitucional alemã, o que ajuda a entender o porquê de a partir da segunda metade do século XX, a corte alemã acabaria por galgar prestígio internacional superior até mesmo da própria Suprema Corte Norte-americana. Dieter Grimm consagrado jurista e professor alemã reconhece que a importância dessa decisão traz a ponderação de bens, a proporcionalidade, a irradiação dos direitos fundamentais sobre o direito ordinário e, ainda, o dever de proteção que decorrem dos direitos fundamentais, a partir dessa decisão, tornaram-se referencial de estima para àquele Tribunal Constitucional.; O caso teve origem no recurso constitucional interposto por Erich Lüth que se opunha à condenação que lhe fora imposta por um tribunal estadual, pelo fato de haver se expressado publicamente, por diversas vezes, convocando um boicote aos filmes de Veit Harlan, por ser contrários à moral e aos costumes, razão pela qual ele fora condenado a omitir-se de novas convocações em prol do boicote sob ameaça de pagamento de multa dou até mesmo de prisão. A decisão da justiça ordinária alemã, seria, entretanto, reformada pelo Tribunal Constitucional, sob o fundamento de que direito fundamental à liberdade de opinião irradiava sua força normativa sobre o direito ordinário, no caso particularmente o Direito Civil, impondo-se aos tribunais ordinários a necessidade de emprestar prevalência ao significado dos direitos fundamentais, mesmo nas relações entre particulares.
[7] Atravessa os anos a discussão que institucionalizou os modelos de juiz, como sendo Júpiter, Hércules, Hermes, a partir de um notório texto de Fraçois Ost em que o professor belga propõe uma espécie de juiz pós-moderno e sistêmico (Hermes) que atuaria em rede e superaria, com vantagem, os modelos anteriores. Para Ost, basicamente a teoria do direito trabalha com dois modelos de juiz que também simbolizariam modelos de direito (Júpiter e Hércules).
Consequentemente, também simbolizaram os modelos de jurisdição. O primeiro representaria o modelo liberal-legal, de feição piramidal-dedutivo, ou seja, sempre dito a partir do alto, provavelmente, de algum Monte Sinai; esse direito adota a forma de lei e se expressa em forma de imperativo, vindo a ser representado pelas tábuas da lei ou códigos e as Constituições modernas, e tal parametricidade se projeta até as decisões particulares.
Já o modelo herculeano está baseado na figura do julgador que seria a única fonte do direito válido. Trata-se da pirâmide invertida, no dizer de Ost. Foi Dworkin que ao revalorizar demais a figura do juiz moderno, atribuiu-lhe as características de Hércules. Embora alegue que não quis equiparar sua tese a tese dos realistas ou pragmatistas.
Ost enfim coloca no Hércules de Dworkin os defeitos que tanto caracterizariam o juiz como monopolizador da jurisdição, no modelo de direito do Estado Social, em que o direito se reduz ao fato, enfim, à indiscutível materialidade da decisão. Esse juiz propiciaria um decisionismo, a partir da proliferação de decisões particulares.
Ost ainda apresenta um tertius genus, o juiz Hermes que adota a forma de rede, nem um polo e nem dois, nem sendo pirâmide e nem funil e, tampouco a superposição dos dois, senão uma multiplicidade de pontos de interrelação; um campo jurídico que analisa como uma combinação infinita de poderes, tanto separados como confundidos, amiúde intercambiados, uma multiplicação dos atores, uma diversificação de regras, uma inversão de réplicas, tal circulação de significados e informações não se deixa aprisionar em um código ou em uma decisão, expressando-se sob forma de um banco de dados. O juiz Hermes não é nem transcendência e nem imanência, encontra-se noutra dialética ou paradoxalmente (ora numa ou outra).
Consequentemente, também simbolizaram os modelos de jurisdição. O primeiro representaria o modelo liberal-legal, de feição piramidal-dedutivo, ou seja, sempre dito a partir do alto, provavelmente, de algum Monte Sinai; esse direito adota a forma de lei e se expressa em forma de imperativo, vindo a ser representado pelas tábuas da lei ou códigos e as Constituições modernas, e tal parametricidade se projeta até as decisões particulares.
Já o modelo herculeano está baseado na figura do julgador que seria a única fonte do direito válido. Trata-se da pirâmide invertida, no dizer de Ost. Foi Dworkin que ao revalorizar demais a figura do juiz moderno, atribuiu-lhe as características de Hércules. Embora alegue que não quis equiparar sua tese a tese dos realistas ou pragmatistas.
Ost enfim coloca no Hércules de Dworkin os defeitos que tanto caracterizariam o juiz como monopolizador da jurisdição, no modelo de direito do Estado Social, em que o direito se reduz ao fato, enfim, à indiscutível materialidade da decisão. Esse juiz propiciaria um decisionismo, a partir da proliferação de decisões particulares.
Ost ainda apresenta um tertius genus, o juiz Hermes que adota a forma de rede, nem um polo e nem dois, nem sendo pirâmide e nem funil e, tampouco a superposição dos dois, senão uma multiplicidade de pontos de interrelação; um campo jurídico que analisa como uma combinação infinita de poderes, tanto separados como confundidos, amiúde intercambiados, uma multiplicação dos atores, uma diversificação de regras, uma inversão de réplicas, tal circulação de significados e informações não se deixa aprisionar em um código ou em uma decisão, expressando-se sob forma de um banco de dados. O juiz Hermes não é nem transcendência e nem imanência, encontra-se noutra dialética ou paradoxalmente (ora numa ou outra).
[8] Lenio Streck alerta sobre um panprincipiologismo que constrói princípios despidos de normatividade, o que colabora para a fragilização do direito. Alerta ainda que tal fenômeno atinge a natureza hermenêutica nacional que sustenta os ativismos e decisionismos. Definiu o panprincipiologismo como uma fábrica de princípios. Porque se pensa equivocadamente que princípios são valores. É como se os valores flutuassem numa espécie de ontologia, de onde retirasse uma essência. É um retorno a uma espécie de realismo moral. O que é pernicioso, pois enfraquece a autonomia do direito. Aponta duas teses hermenêuticas e habermasianas que são contra o panprincipiologismo, assim como contra o panjurisprudencialismo que tem como raiz comum, a filosofia da consciência. Lenio Luiz Streck é procurador da Justiça do RS, doutor e pós-doutor em Direito.
[9] Josef Esser (1910-1999) foi jurista e professor universitário alemão. Seu trabalho mais conhecido é um manual sobre direito das obrigações, que teve várias edições e ao qual foi dada continuidade por seus admiradores. Obteve reconhecimento internacional com trabalhos sobre filosofia, metodologia e teoria do direito.
[10] Cláusulas gerais são normas dotadas de diretrizes indeterminadas e, não trazem expressamente uma solução jurídica. É norma inteiramente aberta. É um texto normativo que não fixa o a priori, o significado do pressuposto, tampouco as consequências jurídicas da norma (Consequente). Segundo Didier Jr., sua finalidade é estabelecer uma pauta de valores a ser preenchida conforme as contingências históricas.
Por outro lado, conceito jurídico indeterminado é quando as palavras ou expressões contidas na norma são vagas e imprecisas, de forma que não se encontra o significado das mesmas. Um clássico exemplo de conceito jurídico indeterminado está no art. 927, parágrafo único do Código Civil brasileiro de 2002, quando se refere a "atividade de risco".
Concluímos que na cláusula geral a dúvida está no pressuposto (conteúdo) e no consequente (solução legal) enquanto que no conceito jurídico indeterminado a dúvida somente reside no pressuposto (conteúdo), e não no consequente (solução legal), pois está predefinida em lei.
Por outro lado, conceito jurídico indeterminado é quando as palavras ou expressões contidas na norma são vagas e imprecisas, de forma que não se encontra o significado das mesmas. Um clássico exemplo de conceito jurídico indeterminado está no art. 927, parágrafo único do Código Civil brasileiro de 2002, quando se refere a "atividade de risco".
Concluímos que na cláusula geral a dúvida está no pressuposto (conteúdo) e no consequente (solução legal) enquanto que no conceito jurídico indeterminado a dúvida somente reside no pressuposto (conteúdo), e não no consequente (solução legal), pois está predefinida em lei.