Políticas educacionais como objeto de pesquisa acadêmica
A partir de 1985 a redemocratização brasileira veio trazer um período marcado pela ativa participação de diversos movimentos sociais tais como: sindicatos, associações e outras organizações sociais que clamavam por mais direitos, melhor cidadania consagrando a legitimidade de participar das decisões políticas.
As lutas sociais rogavam por direitos sociais igualitários e, por melhores condições de vida e de trabalho, garantindo a oportunidade de ascensão social e a construção de uma sociedade mais solidária e justa.
É nesse contexto que se situam as discussões que envolvem a qualidade de ensino e a valorização dos profissionais de educação o que implica no reconhecimento de novos direitos capazes de assegurar melhores garantias para o exercício profissional.
Cumpre sublinhar o conjunto de reformas educacionais empreendidas pelo governo brasileiro particularmente nos anos de 1990 que resultou na ampliação das oportunidades educacionais e a melhoria na qualidade de ensino como sendo correspondentes ao desempenho dos profissionais de educação.
O reconhecimento da necessidade de capacitação e reciclagem contínua dos profissionais da educação principalmente para atender as demandas sociais contemporâneas.
Alguns dispositivos da legislação educacional dão suporte à efetivação dessas reformas, podem demonstrar a gradativa efetivação de políticas de valorização do magistério público da Educação básica.
A Constituição Federal brasileira de 1988 em seu art. 227 estabeleceu dentre os princípios com os quais deve ser ministrado o ensino brasileiro, com o destaque especial para a valorização dos profissionais do ensino, garantidos, na forma da lei, planos de carreira para o magistério público, estabelecimento do piso salarial profissional e ingresso exclusivamente por concurso público de provas e títulos.
As políticas de valorização do profissional da educação básica são constantes na LDB de 1996, onde se dedica em nove dispositivos e tratam das exigências de sua formação.
Ademais, o art. 67 propõe que o sistema de ensino deve promover a valorização desses profissionais através de estatutos e planos de carreira, firmando o concurso público como meio de ingresso, o licenciamento remunerado para a formação continuada, piso salarial nacional, progressão funcional baseada em titulação ou habilitação e avaliação de desempenho, período reservado para estudos, além das condições adequadas de trabalho.
Também a Lei 9.424/96 que regulamentou o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental (FUNDEF) prevê mecanismos de valorização dos profissionais da educação garantindo pelo menos sessenta por cento para a remuneração dos profissionais do magistério, em efetivo exercício de suas atividades no ensino fundamental público, fixa a permissão, no seu art. 7º, de utilização de parte desses recursos, nos primeiros cinco anos, na capacitação de profissionais leigos.
Igualmente no art. 9º da referida lei é previsto que os Estados, o DF, os municípios deverão dispor de novo Plano de Carreira e Remuneração do Magistério de forma a assegurar a remuneração salarial condigna dos professores do ensino fundamental público principalmente os que estejam em efetivo exercício do magistério, com o estímulo ao trabalho em sala de aula, a melhoria do magistério, o estímulo a pesquisa e capacitação contínua dos educadores.
E, nesta questão opinou o Conselho Nacional de Educação através da Resolução nº 3 de 08/10/1997 quando fixou as diretrizes para os referidos novos planos de carreira e de remuneração para o magistério público, incluindo outras determinações, a experiência mínima de dois anos para o exercício de quaisquer das funções do magistério que não seja à docência e a obrigatoriedade de promover concursos públicos quando comprovada a existência de vagas.
No Plano Nacional da Educação recém-aprovado em 28 de maio de 2014 que reafirmou peremptoriamente o direito fundamental à educação e as metas a serem alcançadas nos próximos dez anos.
O PNE em referência endossa completamente as previsões constitucionais nos arts. 205 e 214 comprometendo-se com a erradicação do analfabetismo , a universalização de atendimento escolar, a melhoria de qualidade do ensino, a formação para o trabalho, a promoção humanística, científica e tecnológica do país e, o estabelecimento da meta de aplicação de recursos públicos em educação como proporção do produto interno bruto (PIB) (Incluído pela Emenda Constitucional nº 59 de 2009 ).
A questão principal do PNE aprovado é que passa a educação em âmbito nacional ao tratamento da educação como Política de Estado e, não apenas de governos e relações eleitoreiras locais a designar o destino de recursos e propósitos da educação em nível local e nacional.
É realidade pungente que a educação brasileira duela diariamente com a notável precariedade de condições para a efetivação das ações de políticas educacionais. É estarrecedora a ausência gritante de condições mínimas laborais e o trabalho docente é emperrado cotidianamente por uma cultura escolar arraigada à violência física e simbólica contra professores e alunos marginalizados.
A falência do ensino nacional deve se negligência e descaso das elites brasileiras que apostam na escola como mero depósito de crianças, adolescentes e adultos com único fito de retirá-los das ruas e afastá-los da delinquência, e não para educa-los e capacitá-los para vida profissional e para a cidadania.
Por outro lado, por conta dos mecanismos de avaliação do sistema de ensino brasileiro apontar para os docentes, culpando-os pelo insucesso dos alunos e pela ineficiência administrativa da gestação escolar, o que só teima em perpetuar as desigualdades existentes, é no mínimo incoerente.
Posto que a logística dos governos e das elites sempre fora preocupada apenas em dar qualificação mínima aos pobres, com vistas à redução de criminalidade e violência, e para produzir mão-de-obra farta e de baixo custo.
Paradoxalmente o mesmo Estado utiliza da violência física e simbólica para mantê-los distantes de direitos existenciais mínimos, seja pelo uso da força policial, seja pela paulatina segregação que sucateou o ensino público e prestigiou o ensino privado, notadamente na seara do ensino superior.
A escola em horário integral não é, infelizmente, sinônimo, de escola com melhor qualidade de ensino, mas se percebe a intenção governamental em transformar as escolas públicas em depósito de desfavorecidos almejando a reduzir a quantidade de presos para dar uma pronta resposta à mídia e a sociedade.
Continuam as políticas públicas reservando aos pobres o seu devido lugar, o que os situa bem longe de mobilidade social ou de qualquer mudança política que mantém as mesmas elites no poder.
Há de se considerar que tantos diplomas legais vão ao encontro de muitos dos desejos, das bandeiras de lutas e das reivindicações que caracterizaram as manifestações, dessa categoria, desde as décadas de setenta e oitenta e, de certo modo, inspiraram as reformas educacionais que ocorreram nos anos noventa.
Cabe indagar em qual sentido os direitos e garantias fixados na legislação estão realmente sendo efetivados? O quanto destes dispositivos legais são promessas abstratas sem qualquer chance de concretização real e moral no sistema de ensino brasileiro?
Em qual medida os educadores e pesquisadores do campo da educação estão acompanhando e analisando a consecução dos objetivos dessas políticas?
Quais aspectos da profissionalização docente essas políticas têm considerado? Quais entraves existentes na sociedade brasileira para se alcançar uma verdadeira valorização do profissional da educação?
Tais questões nos atormentam, vejamos que num total de noventa e dois títulos que se relacionam ao tema de políticas públicas educacionais oito eram referentes as dissertações de mestrados defendidas por universidades brasileiras; grande parte da produção acadêmica publicada na Revista Educação e Sociedade (71%) e na revista Cadernos de Pesquisas (13%).
Percebe-se um sensível déficit quantitativo de estudos relacionados a profissionalização direitos, garantias e condições de trabalho dos profissionais da educação.
Muitos autores demonstram que as políticas de formação não fortalecem o profissionalismo e a identidade do professor como categoria ocupacional. São constantes as medidas que direcionam a formação do pedagogo ou do docente em uma diversificação de cursos, inclusive em ambientes não-universitários.
Outro enfoque direciona-se em enfatizar uma formação aligeirada e sintética a portadores de diploma de nível superior de outras áreas, incidindo, assim, no enfraquecimento da identidade do professor.
Nos estudos e pesquisas nesses cursos sintéticos e de baixo custo para atendimento às políticas oficiais que tem como resultado a formação do professor como tarefeiro, inviabilizando a constituição de sua identidade.
Desta forma, há que se definir a especificidade da ação docente, o que implica no cuidado com a sua formação e, consequentemente, na construção da identidade profissional.
Nesse sentido, a formação desses profissionais fora das universidades vai inviabilizar a construção de sua identidade como cientista da educação. Considerando ainda os novos cenários, as novas relações de trabalho exigem uma nova pedagogia, novas habilidades e competências para laborar com as diferenças, para suprir a deficiência cultural e cognitiva dos discentes das classes populares, inclusive para articular as várias áreas do saber como ciência, cultura e trabalho.
Infelizmente as reformas educacionais já operadas não consideraram e nem incluem o novo modelo de formação de professores. Enfim, apenas priorizam a universalização do ensino fundamental, no entanto, as políticas educacionais voltam-se a designar uma preparação sintética e rápida dos professores, com incentivo de formação específica e à formação pedagógica do docente fora do espaço universitário, com o grave risco inclusive, de terceirizar a realização de cursos, ou até desenvolvê-los de forma virtual.
Numa outra abordagem, há seis trabalhos acadêmicos que explicitam as dificuldades e desafios sobre a formação de professores da educação infantil e séries iniciais do ensino fundamental. Nesses estudos há a evidente necessidade de se fornecer sólida formação para os docentes que atendem a educação infantil.
Há trabalhos acadêmicos que analisam o papel do pedagogo, sua formação, atuação e condições laborais e ainda a centralidade dos cursos de Pedagogia e das licenciaturas como materialização das políticas públicas de formação do profissional da educação nas instituições federais do ensino superior.
A concepção da educação pela perspectiva sociohistórica com vistas a emancipação e cidadania, e reafirmando o aperfeiçoamento do aspecto humano e profissional.
Pontua-se que as referidas políticas deveriam ter uma base comum que deveria se manifestar em todos os processos e práticas formativas dos cursos voltados para a educação, e pautar-se pela indissolubilidade entre ensino, pesquisa e extensão e da sedimentação/dinamização dessa cultura.
Sobre a formação continuada e/ou serviço e saberes docentes é tema que ocupou cinte e nove pesquisas acadêmicas. Em geral, tais pesquisas e trabalhos acadêmicos criticam os programas oficiais, acusados de fragmentação e sem ligação com a experiência do professor, no que redunda na fraca repercussão dos cursos na prática docente.
Alguns trabalham analisam os reflexos positivos dos programas de municipalização nas novas proposições de formação continuada. De fato, as ações de descentralização da educação, de reforço de educação municipal e de valorização do magistério, especialmente do ensino fundamental, a exemplo da implementação do FUNDEF, promoveram mudanças importantes na formação e valorização dos profissionais das redes municipais de educação, a partir dos anos noventa especialmente nos municípios das regiões mais pobres do país.
A política do FUNDEF pouco alterou a realidade dos professores dos grandes centros urbanos já que o referido fundo não propiciou aumento de financiamento da educação e, sim, uma melhor distribuição de recursos entre Estados e municípios, sem contribuição efetiva da União, nem o seu comprometimento político com a valorização profissional e salarial do professor de educação básica.
Verifica-se ainda as preocupações com a formação continuada para a educação infantil. Há a reconstrução da prática reflexiva desse profissional, e também existem estudos que fazem a ligação entre a formação e atuação do docente e, ainda, outros que fazem críticas aos programas de formação continuada para professores alfabetizadores, caracterizada por eles como um exercício apenas de “repasse de conhecimentos”, sem orientação para a prática.
Infelizmente, em geral, os cursos de formação continuada para o professor da educação infantil não oferecem suportes teóricos e técnicos necessários para o desenvolvimento dessa etapa da educação.
Por outro lado, as secretarias municipais de educação que são as principais responsáveis para a gestão pedagógica nesse nível, não contam com o pessoal qualificado para desenvolver trabalho de apoio técnico e operacional aos docentes.
Somando-se ainda as grandes dificuldades financeiras sofridas pelas prefeituras para que sejam dados o suporte pedagógico e os recursos materiais conforme a especificidade e importância dessa oferta de ensino.
Outros estudos ainda têm demonstrado que a escolha dos conteúdos, as definições sobre as práticas pedagógicas na educação infantil não contam com a participação dos professores, como principais sujeitos dessas práticas.
Ademais, não se baseiam nas realidades socioculturais das crianças. E a solução seria por meio de implementação de programas de capitação dos técnicos e professores afinados com as diretrizes formuladas pelos próprios profissionais e com as condições materiais e financeiras adequadas a essa finalidade.
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