Direitos na rescisão de contrato imobiliário

I - INTRODUÇÃO

É recorrente da história brasileira que o mais forte tire vantagem sobre o mais fraco. Somos apenas uma colônia de exploração - moderna; lutando em defesa de direitos que muitos países (ditos inferiores?) já conquistaram.

Aqui vive-se a lei da opressão em todas as relações, seja na contratação de prestação de serviços, seja na relação de trabalho, camadas sociais, setores e áreas do mercado de trabalho, incluindo este contexto imobiliário, objeto do presente artigo.

Não só no Brasil, claro, mas a busca por "tirar vantagem" parece-nos derivado da natureza humana, haja vista as parábolas e outros escritos bíblicos que isto traduz. Aqueles que, valendo-se da inaptidão, inexperiência ou ignorância de alguém, tenta de alguma forma tirar proveito e vantagem para si ou outrem.

Sobre isto, a Lei Federal nº 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor) foi um importante advento brasileiro pela conquista de direitos nas relações comerciais, individuais ou coletivas, dispondo uma gama de direitos e garantias àquele que é o mais fraco, incapaz de produzir a prova, incapaz de acessar certas informações e provar em juízo, no caso o consumidor.

A contratação de compra e venda para com a construtora ou incorporadora, em regra a única responsável pelo planejamento e execução da obra, quase sempre é uma relação consumerista, recebendo as disciplinas estatuídas no Código acima descrito. Isto faz com que o cliente seja tido pela Justiça como consumidor, acessando disciplinas que divergem de uma relação civil comum, dentro e fora de um processo.

Logo, o escopo do presente trabalho é estabelecer um paralelo entre os principais direitos do cliente que está diante de uma rescisão de contrato imobiliário, sob um enfoque de atualidade, esclarecendo os pontos mais controversos e que são palanque para embates judiciais.

Para tanto, o advogado escritor utiliza-se de seu conhecimento e de pesquisas a trabalhos já realizados, citando-se sempre a autoria, e traçando um liame entre a relação consumerista presente no caso concreto, para com a relação civil que permeia a causa, a fim de que o leitor não seja enganado pelas atrocidades cometidas no dia à dia pelas empresas do ramo imobiliário.

II - DOS MOTIVOS PARA A RESCISÃO CONTRATUAL

Quem adquire um imóvel não pretende desistir do negócio, porém, às vezes isso pode acontecer e por motivos diversos, sendo os mais comuns:

a) o aumento expressivo das parcelas a vencer, especialmente a parcela do saldo devedor que será objeto de futuro financiamento bancário, dando a impressão de que os valores já pagos em Contrato simplesmente não amortizaram absolutamente nada do preço do imóvel e o comprador, passados às vezes dois, três anos ou mais, deve à incorporadora mais do que quando comprou;

b) perda de emprego, motivo pelo qual o comprador não mais possui uma fonte de renda necessária à continuidade dos pagamentos perante a incorporadora; e

c) perda do interesse na continuidade da aquisição, pois a incorporadora vende a mesma unidade por preço idêntico ou menor do que aquele praticado para o comprador.

Esses são apenas alguns exemplos, ressaltando que a legislação brasileira não exige um motivo para que o comprador solicite o distrato ou rescisão do contrato pela via judicial.

III - CLÁUSULA PENAL NOS CONTRATOS DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEIS

O Código Civil Brasileiro não traz um conceito claro e definido para o instituto da cláusula penal e trata já no seu art. 916, primeiro dedicado à matéria, da forma pela qual se dá sua constituição, restando à doutrina a tarefa de conceituá-la.

Sendo assim, inicie-se pela lição do autor do Projeto do Código, Clóvis Beviláqua, segundo o qual a "cláusula penal é um pacto accessório, em que se estipulam penas e multas, contra aquele que deixar de cumprir o ato ou fato, a que se obrigou, ou, apenas, o retardar", conceito este seguido pelo especialista Múcio Continentino.

Para Tito Fulgêncio, bem mais sucinto, "é aquela em que se estabelece uma prestação para o caso de inexecução da obrigação".

Orosimbo Nonato define-a como a "disposição contratual ou testamentária que faz pesar no devedor certa prestação quando for ele inadimplente ou moroso quanto à obrigação principal".

Caio Mário, por sua vez, diz que "a cláusula penal ou pena convencional – 'stipulatio poenae' dos romanos – é uma cláusula acessória, em que se impõe sanção econômica, em dinheiro ou outro bem pecuniariamente estimável, contra a parte infringente de uma obrigação".

Sendo a cláusula penal estipulada para o caso de inadimplemento, seja ele absoluto ou simples mora – como melhor se diferenciará adiante –, importante saber-se qual o momento em que ele se verifica ou, em outras palavras, quando a pena torna-se exigível.

Não há regra específica quanto ao valor que se pode estipular nos contratos de compra e venda quanto à cláusula penal por inadimplemento ou rescisão. Ou seja, o instituto da clausula penal encontra pleno abrigo no sistema jurídico nacional, inclusive, em virtude de nosso aspecto cultural, se o mesmo não existisse, acreditamos que muito difícil seria o cumprimento de obrigações assumidas, principalmente no tocante a pontualidade desse cumprimento.

Com o advento da clausula penal, o credor da obrigação tem mais um forma de “estimulo” pra que essa seja cumprida, pelo menos na data avençada para tal, trazendo assim certa segurança jurídica a todo o sistema.

Acontece que o valor determinado pela cláusula não pode superar o da obrigação principal, limite legal acima disposto. Se ocorrer a disposição em cláusula de valor que excede o da obrigação principal, faz-se necessário que o juiz avalie a redução do valor, reparando o excesso, sem declarar ineficácia da cláusula. Essa redução conferida pelo juiz será efetuada quando a obrigação principal tiver sido parcialmente cumprida, assim dispõe o Art. 413 do Código Civil.

IV - DA COBRANÇA DA TAXA DE CORRETAGEM

A taxa de corretagem é cobrada pelo corretor de imóveis no momento em que este realiza a venda de um bem imóvel. Contudo, o que se vê no cotidiano é a realização de contratos de promessas de compra e venda de imóveis que ainda encontram-se na plantas e vendedores que se identificam, indevidamente, como corretores de imóveis, e assim, realizam a cobrança da Taxa de Corretagem, contudo, não apresentam, quaisquer documentos que os identifiquem como Corretores (no caso o CRECI), ferindo assim o Código de Defesa do Consumidor.

Tratando-se de relação consumerista, deve o consumidor ser previamente informado sobre a cobrança da taxa de corretagem, e sobre qual o seu correto percentual, sob pena pena de referida cobrança ser considerada abusiva, bem como de quaisquer outras, na forma do inc. III do art. 6º do CDC, se tal não foi feito, a responsabilidade pelo pagamento da corretagem é exclusivamente da vendedora.

Assim, para que o negócio atenda ao princípio da boa-fé objetiva, deverá a empresa vendedora do imóvel informar em contrato de compra e venda que o valor de corretagem será devido pelo comprador. Não havendo qualquer dispositivo contratual estipulando tal encargo para o Promitente Comprador, algumas vezes a vendedora pode ser condenada a realizar a devolução em dobro.

Em suma, a cláusula de corretagem por ou não ser considerada uma cláusula abusiva imposta pela construtora, devendo se analisar cada caso de maneira isolada.

V - DA DEVOLUÇÃO DOS VALORES PAGOS

Outra questão muito famosa e recorrente quando se trata de rescisão de contrato imobiliário é a qual valor tem direito a construtora, no que tange as parcelas pagas.

Quando o ato de rescindir um contrato é do comprador, a incorporadora tem o direito assegurado pelo Judiciário em reter 10% dos valores pagos. Essa é a regra que há anos têm prevalecido na jurisprudência do Estado de São Paulo, acompanhada por outros Estados.

Quando o responsável pela desistência é o consumidor

Ainda que a construtora não tenha feito nada de errado, o consumidor tem o direito de desistir da compra, no caso de problemas financeiros, por exemplo. Nesse caso, porém, a construtora pode reter as quantias referentes a despesas administrativas, e devolver apenas parte do que foi pago ao consumidor.

Quando o responsável pela desistência é a construtora

Os contratos só costumam garantir o direito de rescisão contratual à construtora, em caso de falta de pagamento por parte do consumidor. Mas se problemas como o atraso na entrega do imóvel levarem o consumidor à desistência, ele tem sim o direito de rescindir o contrato, assegura Tapai. Neste caso, deverá receber todo o valor pago corrigido monetariamente e em parcela única.

Em São Paulo, o Tribunal de Justiça emitiu a súmula nº 1 em Direito Imobiliário no ano de 2010, a qual determina que o comprador, mesmo inadimplente, tem o direito de pedir a rescisão do Contrato e reaver os valores pagos, sendo entendido pelos Juízes que o valor a ser restituído pela incorporadora deve corresponder a 90% das quantias pagas, com correção monetária desde cada um dos pagamentos (ou seja, a correção monetária é retroativa), através de índice próprio do Tribunal de Justiça de São Paulo e acrescido de juros legais de 1% ao mês, a partir da citação da incorporadora para responder a ação até a data do efetivo pagamento, seja ele através de eventual acordo ou pelo cumprimento da decisão judicial.

VI - DO ATRASO NA ENTREGA DO IMÓVEL

O Presidente do Instituto Brasileiro de Estudo e Defesa das Relações de Consumo - IBEDEC, José Geraldo Tardin, esclarece que: “A alegação das construtoras que podem atrasar 180 dias ou mais, porque está descrito no contrato, na maioria das vezes não tem procedência. para que ocorra o atraso na obra, a construtora tem de ter um forte motivo para prejudicar os mutuários. A simples alegação de que órgãos públicos não emitiram o Habite-se, falta de mão de obra, falta de cimento ou excesso de chuvas se referem ao risco do negócio e não pode ser repassado ao mutuário”.

Caso o imóvel esteja atraso, o consumidor não pode simplesmente suspender os pagamentos à construtora, por conta deste atraso, sob pena de se tornar réu de uma execução judicial ou mesmo de uma ação de rescisão de contrato;

Se a construtora atrasou a entrega da obra, o caminho para quem deseja ser indenizado é o Judiciário. Caso o consumidor queira rescindir o contrato, ele deve buscar uma ordem judicial para autorizar a suspensão dos pagamentos ou seu depósito em juízo, enquanto tramita a ação judicial;

VII - DA CAPITALIZAÇÃO DE JUROS

a capitalização de juros (juros de juros) é vedada pelo nosso direito, mesmo quando expressamente convencionada, não tendo sido revogada a regra do art. 4° do Decreto n. 22.626/33 pela Lei n. 4.595/64. O anatocismo, repudiado pelo verbete n. 121 da súmula do Supremo Tribunal Federal, não guarda relação com o enunciado n. 596 da mesma súmula.

Portanto, cláusula contratual que estabeleça juros compostos mensalmente, se abarcada pelo Código de Defesa do Consumidor, é nula de pleno direito, dando ensejo a ação declaratória, de repetição de indébito ou até consignatória, entre outras, em virtude do disposto nos artigos 42 e 51, XV da Lei n° 8.078/90, além dos artigos 1° e 13 do Decreto 22.626/33 (Lei da Usura).

VIII - CONCLUSÃO

Certamente o presente texto não é capaz de pontuar todas as questões pertinentes a uma rescisão imobiliária, vez que são várias. O correto é que o consumidor sempre entre em contato com um advogado de sua confiança antes de assinar um contrato de pretensão de compra e venda ou mesmo o distrato/ rescisão, para que não seja lesado com eventual confissão de verbas que não são constituem direito das incorporadoras.

Alexandre Bonilha
Enviado por Alexandre Bonilha em 21/09/2015
Reeditado em 21/09/2015
Código do texto: T5389169
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