JUSTIÇA

Leio que o juiz do caso Eike Batista foi afastado do cargo.

Não vou entrar no mérito da ação, nem dizer sobre o réu, que conheço de notícias.

Vou limitar-me a dizer o que acho, cidadão aqui do Baguaçu, sobre aquilo que me afeta: a fé no judiciário.

Aqui mesmo, em terra Araça, houve um caso parecido.

O juiz foi punido com aposentadoria compulsória.

Mas isso é passado.

A justiça carrega a crítica de lenta.

E é coisa antiga.

No livro “A colônia penal”, Kafka descreve:

“Diante da Lei há um guarda. Um camponês apresenta-se diante desse guarda e solicita que lhe permita entrar na Lei. Mas o guarda responde que por enquanto não pode deixá-lo entrar... O camponês não havia previsto estas dificuldades; a Lei deveria ser sempre acessível para todos, mas ao observar o guarda, com o seu abrigo de peles, seu nariz grande como de águia, sua barba grande como de tártaro, resolve que mais lhe convêm esperar.”; (“Diante da Lei” - 1914).

Esperar é o que a Lei espera que façamos.

Há muito tempo...

A Lei, a justiça e o judiciário, parecem sinônimos, mas são coisas absolutamente diferentes.

Deriva desse engano, o descompasso de entendimento entre o que o povo espera e o que o poder oferece.

Para o pacato cidadão ("vulgo", para os juristas),

a justiça nunca vem;

e quando vem chega atrasada.

Não é bem assim;

Mas é o que parece que

Procuram demonstrar.

Um desses simbolos semióticos está na entrada do palácio máximo do judiciário.

Diante do prédio do STF, em Brasília, a escultura em granito que representa a justiça, (deusa romana “iustitia”, obra do escultor Alfredo Ceschiatti), está sentada, os olhos estão vedados (para demonstrar a imparcialidade) e a espada (símbolo da força que dispõe para impor a lei) descansa no colo.

Não há balança.

É como se o autor quisesse dizer já no tempo em que a criou e a dispôs na porta do palácio, (1960), a mensagem:

“podem esperar sentados”,

“a espada descansa, nem é tão ameaçadora”,

“Equilíbrio, balança! Esqueci.

Outra crítica das nossas instituições é que seriam venais.

Sentimento que não pode prosperar.

Nas fábulas, (parábolas), de Fredo, filósofo nascido vinte anos antes da era cristã, há uma passagem (“Hércules contra a corrupção”):

“Quando Hércules , recebido no céu entre os deuses, por causa da sua virtude, ao saldar os deuses que o cumprimentavam festivamente, diante de Plutão, filho da Fortuna, desviou dele os olhos. O pai, Júpiter, perguntou pela razão. Respondeu Hércules: “Eu o odeio, porque é amigo dos maus e, ao mesmo tempo, com o lucro que lhe é oferecido, corrompe todas as pessoas”.

Como se vê, desde tempos romanos é desprezado quem "se vende".

Ninguém quer uma justiça vendida, corrupta.

O uso indevido pelo juiz deslumbrado dos bens arrestados de Eike foi uma forma de corrupção.

Fez muito bem o judiciário carioca em afastá-lo.

O ato, lépido como deveria ser, renova nossas esperanças de que o judiciário é sério e trilha o bom caminho.

Tudo faz parte da luta necessária para que, no futuro, possamos dizer como José Saramago:

"... a Justiça continuou e continua a morrer todos os dias. Agora mesmo, neste instante em que vos falo, longe ou aqui ao lado, à porta da nossa casa, alguém a está matando. De cada vez que morre, é como se afinal nunca tivesse existido para aqueles que nela tinham confiado, para aqueles que dela esperavam o que da Justiça todos temos o direito de esperar: justiça, simplesmente justiça.

Não a que se envolve em túnicas de teatro e nos confunde com flores de vã retórica judicialista, não a que permitiu que lhe vendassem os olhos e viciassem os pesos da balança, não a da espada que sempre corta mais para um lado que para o outro, mas uma justiça pedestre, uma justiça companheira quotidiana dos homens, uma justiça para quem o justo seria o mais exacto e rigoroso sinônimo do ético, uma justiça que chegasse a ser tão indispensável à felicidade do espírito como indispensável à vida é o alimento do corpo.

Uma justiça exercida pelos tribunais, sem dúvida, sempre que a isso os determinasse a lei, mas também, e sobretudo, uma justiça que fosse a emanação espontânea da própria sociedade em ação, uma justiça em que se manifestasse, como um iniludível imperativo moral, o respeito pelo direito a ser que a cada ser humano assiste."

Enxovalhar e matar a justiça, jamais!

Obrigado pela leitura.

Sajob, 2015.