Educação contemporânea: abordagem filosófica
Resumo:
O texto aborda filosoficamente os principais impactos sofridos pela educação contemporânea e de suas principais finalidades, principalmente diante da crise do Humanismo e da pós-modernidade. O que exige uma nova educação, um novo modelo de educador e, sem dúvida, novos métodos de ensino e aprendizagem.
Palavras-chaves: Educação contemporânea. Pós-modernidade. Tecnologias de Informação e Comunicação. Novo perfil de professor. Novo modelo de educação.
Résumé:
Le texte couvre les impacts philosophiques clés subies par l'éducation contemporaine et de ses principaux objectifs, en particulier compte tenu de la crise de l'humanisme et de la postmodernité. Cela exige une nouvelle éducation, un nouveau modèle d'éducateur et sans doute de nouvelles méthodes d'enseignement et d'apprentissage.
Mots-clés:
L'éducation contemporaine La postmodernité Technologies de l'Information et de la Communication Nouveau profil des enseignants Nouveau modèle d'éducation
A crise do projeto humanista que veio do Renascimento (que impôs o antropocentrismo em reação ao teocentrismo feudal) e permeou toda a modernidade trouxe um cenário muito particular para a educação.
Nos atuais tempos, entre o início do século XX e as primeiras décadas do século XXI, a educação finalmente abandonou o paradigma fundacionista tanto o clássico como o moderno.
Apesar de que alguns estudiosos continuaram advogando uma hierarquia de saberes, colocando a filosofia no topo ou na base da árvore do conhecimento .
Todavia, para boa parte dos filósofos contemporâneos afirmam que essas imagens perderam força. Para estes, a filosofia da educação poderia sugerir alguns procedimentos para a pedagogia e, assim, justificar as normas educativas escolhidas, porém, não mais sustentar a legitimidade pedagógica evocando os fundamentos.
O desprestígio da metafísica revelou-se em dupla via: cultural e filosófica. Considerando as manifestações culturais mais amplas, podemos dizer que o século XX terminou sob o clima que alguns chamaram de pós-moderno .
Ocorreu a crise de dois elementos básicos da metafísica moderna e, em parte, da metafísica em geral. Crise que surge no interior das teorias da verdade e do sujeito (como articulado à noção moderna de subjetividade) o que nos levou a uma nova configuração da filosofia do último quartel do século XX.
E, no campo educacional , em particular, a consequência dessas transformações se fez sentir numa forte perda de capacidade de reação da doutrina humanista.
O Humanismo do “H” maiúsculo nasceu como grande movimento cultural ao qual associamos, em geral, tudo que ocorreu do início do Renascimento vindo até aos desdobramentos do século XX, colocando o homem no topo e no centro do universo.
Com o progresso, o Humanismo uniu a cultura clássica greco-romana às várias das doutrinas artísticas e filosóficas posteriores ao Renascimento, nos séculos XVII e XVIII e até mesmo no século XIX.
Assim agregou as grandes formulações filosóficas- pedagógicas laicas e religiosas em especial os pensamentos de Platão, Descartes e Rousseau.
O Humanismo tornou-se um grande guarda-chuva filosófico e cultural. E, existiu um tempo em que todos ou se declaravam ser humanistas, ou então, nada seriam.
A regra humanista era evidente: para ser mestre ou professor, era preciso apontar um modelo de homem e, então, a partir desse modelo, desenvolver a pedagogia e a educação.
Praticamente quase toda educação ocidental fora muito influenciada por tal doutrina. Inspirada inicialmente em Platão que acreditava que o homem deve ser educado para se tornar uma espécie de rei-filósofo (aquele que pode entender a “realidade como ela é”).
Já na trilha de Descartes, o homem deveria ser criado e educado para se transformar um adulto (em franca oposição à criança), pois adulto representa aquele que pode chegar à verdade, posto que a vida adulta resulte da superação da imaginação e da sensação pelo uso da razão.
Já outros advogam o pensamento de Rousseau que prevê que o homem necessita da educação exatamente para conservar, uma vez que adulto, as boas qualidades de criança, em geral, a de não ser dominado pela máscara cultural, que se imporia à vida adulta. Desta forma, o homem estaria apto a acolher o verdadeiro e a rechaçar a mentira.
Porém, todos os filósofos, sejam os platônicos ou os iluministas entendiam que a educação faria do homem, o que este já era, ou seja, o ser humano.
A ideia pedagógica central que essa doutrina propagou fora a de que a educação favorecia ao reencontro do homem consigo mesmo. E tal reencontro não se faria sem que o homem viesse a ser sujeito.
Por vezes, isso poderia significar ser cidadão, outras vezes, portar-se como pessoa ou sujeito moral e, assim, por diante. O reencontro também não se realizaria sem que o homem segundo o modelo clássico ou moderno, fosse capaz de apreensão da verdade, a garantia principal da educação que encaixava no receituário do humanismo.
Cumpre então destacar que o humanismo se assentou sobre a verdade e a subjetividade. Correspondendo a metanarrativa principal do trabalho pedagógico e educacional dos séculos XIX e XX .
Somente ao final do século XX, o Humanismo fora efetivamente questionado e, ainda está sendo, o que evidencia a autêntica crise da verdade e do sujeito.
A autonomia intelectual e moral configuram-se como a finalidade da educação contemporânea e exige de pronto, a apresentação de conceitos esculpidos por Jean Piaget, para que se possam entender as implicações construtivistas na educação de hoje.
É, nesse sentido, Piaget contribui para formularmos os conceitos de autonomia intelectual e moral que passam de forma fluída, por toda sua obra.
O construtivismo vem cada vez mais se firmando como força mais pungente no campo da educação contemporânea. Principalmente na compreensão da epistemologia que pode ser entendida como o estudo da passagem de estados de menor conhecimento para estados de um conhecimento mais fundamentado.
A autonomia intelectual se caracteriza pela articulação de três principais conceitos que são: a estrutura, a gênese e equilibração.
A estrutura é um sistema de transformação que comporta leis enquanto sistema (por oposição às propriedades dos elementos) e que se conserva e se enriquece pelo próprio jogo de suas transformações, sem que estas ultrapassem suas fronteiras ou recorram aos elementos exteriores.
É verdade que Piaget concentrou-se no método lógico-matemático, e a partir da década de cinquenta, veio a reconhecer ser o melhor paradigma hipotético para compreender a inteligência humana, tida como estrutura, estruturada e estruturante.
Estudar a evolução da inteligência humana significa para Piaget acompanhar suas transformações estruturadas e estruturantes da realidade, como acontece nas estruturas matemáticas.
A Gênese diz respeito ao desenvolvimento das estruturas. E, a psicologia piagetiana é conhecida como genética, posto que tenha colocado na gênese o princípio ativo da transformação dos conhecimentos.
Relatou Piaget que não existe, em verdade, um ponto de gênese sem estrutura, pois toda gênese consiste na transformação progressiva de uma estrutura anterior sob a influência de situações novas, e toda gênese se transforma na construção de uma nova estrutura, de tal forma que toda gênese, mesmo se ela começa e se desenvolve sob o signo de desequilíbrios parciais, consiste, cedo ou tarde, numa restruturação de uma forma de equilíbrio correspondente a esta nova estrutura.
A equilibração surge quando Piaget cogita que a inteligência é forma de adaptação equilibradora em relação ao meio onde o organismo se encontra, ele na verdade está se referindo não só ao tema do conhecimento, mas à própria vida, como processo contínuo de equilibração majorante.
A equilibração conhece três formas básicas de adaptação: os ritmos (cardíaco, respiratório, metabólico e, etc.); as regulações cuja função consiste em sincronizar as diferentes ações rítmicas para conseguir sistematizar um conjunto de movimentos, mantidos justamente num esquema estável, para que possam permitir a conservação dos objetos através de suas transformações; e a reversibilidade que introduz a possibilidade de integrar duas ações - contrárias e recíprocas- dentro do mesmo esquema através de uma operação mental reversível.
Podemos descrever um aluno como cognitivamente autônomo quando: como sendo um sujeito curioso intelectualmente, que não se contenta com explicações decoradas; procura encontrar novas formas de resolver os problemas do cotidiano; que pensa, preferencialmente, sobre proposições e não apenas sobre a experiência fornecida pelos objetos concretos e levanta as hipóteses, pois a realidade pode ser pensada de forma diferente, a partir da compreensão dos possíveis.
A realidade nada mais é do que uma das formas que os possíveis poderiam assumir.
O pensamento autônomo carrega intimamente a metafísica do adolescente, pois seu raciocínio privilegia o aspecto formal do pensamento, em detrimento da casuística. É bom que se frise que Piaget não concebe o desenvolvimento cognitivo desvinculado do afetivo.
A função do professor segundo Piaget não se identifica com a de um repassador de informações. Cabe ao docente, através de perguntas, mostrar ao aluno que seus esquemas assimiladores são insuficientes para atingir um equilíbrio permanente.
Assim quando um aluno responde que um objeto flutua por conta da leveza de seu peso e, outro objeto afunda por ser pesado demais, o professor deverá desestabilizar esse momentâneo equilíbrio a que o aluno chegou, apresentando o seguinte fato: um navio flutua e um alfinete afunda.
Entretanto, o peso do navio é muitas vezes superior ao peso do alfinete. E, diante desse novo fato, o aluno terá que buscar um equilíbrio melhor e maior que o anterior (a equilibração majorante).
Ser autônomo moralmente significa poder analisar de forma crítica a obrigatoriedade das normas. Piaget se opõe, consequentemente, ao imperativo categórico de Kant, para quem a obrigatoriedade da lei se constitui em categoria da razão prática.
Piaget defende que o juízo moral não é inato e estará determinado por quatro fatores do desenvolvimento mental, a saber: a maturação, a experiência, a interação social e regulação.
Pois após certa fase de anomia (incompreensibilidade da obrigação moral) determinar cronologicamente essa fase, requer contextualização social, histórica, cultural e educacional dos sujeitos, a criança entende a obrigatoriedade de certos preceitos.
Todavia, a obrigatoriedade decorre da autoridade do legislador, que geralmente é representado pela proeminente figura do pai, irmão mais velho, e no contexto escolar pelo professor ou colega mais velho. Esta figura, depositária da autoridade, se perde na história ancestral da humanidade, até se confundir com Deus.
Agir moralmente correto, na fase que antecede à autonomia moral, significa obedecer e cumprir as ordens desse outrem superior. A lei inquestionável, perante esta só cabe uma atitude moralmente correta: a obediência.
Pelo fato de a relação entre os sujeitos estar calcada no respeito unilateral (adulto-criança) e pelo fato, também, de a lei provir de outrem, essa fase é chamada de heteronomia moral.
A heteronomia sucede a autonomia: a regra do jogo se apresenta então à criança, não mais como uma lei exterior e sagrada, enquanto imposta pelos adultos, mas como resultado de livre decisão, e sendo digna de respeito na medida em que é mutuamente consentida. Ser autônomo moralmente significa aceitar a responsabilidade subjetiva .
O filósofo Jean-François Lyotard (1924-1998) caracterizou a pós-modernidade particularmente pela descrença em toda a metafísica. Portanto, ninguém mais tem a necessidade de recorrer às bases filosóficas para utilizar os conhecimentos que emprega em sua profissão – em geral apreendidos na universidade.
O engenheiro ou empresário que constrói um canal fez mais que apenas construí-lo. Finda a obra, verifica-se o que fez ,se poderá vir ou não se deteriorar, pega seu pagamento que representa seu honorário e, o leva para casa.
No passado não muito distante agiria diferentemente, teria outro sentimento. Estaria integrado num projeto maior, com bases se não filosóficas, ao menos inseridas numa grande doutrina ou projeto social – o Humanismo.
O pensamento Saint-Simon (1760-1825) fez a primeira proposta de construção do Canal do Panamá (que fora construído por outros e concluído em 1914). Não se estava apenas interessado numa grande obra de engenharia para ter mais poder e dinheiro.
O que se desejava, realmente, era a união de dois oceanos, dando continuidade ao caminho ocidental para as Índias, em benefício do progresso da Humanidade, de promover a integração dos povos, o que culminaria em suma na melhoria do homem.
Portanto, toda a narrativa científica seja física ou até matemática, ou ainda, técnica, não seria descrita apenas como elemento exclusivo da construção do canal. Esta seria muito bem integrada à narrativa global, ou seja, a uma metanarrativa.
Em verdade, seria um projeto da humanidade em benefício do homem, uma continuidade do que os iluministas chamavam de progresso.
Porém, a crise das metanarrativas foi acentuada pelas modificações da imagem de nós mesmos levada adiante or meio da crítica da subjetividade ou de ataque à noção moderna de sujeito (que começou no século XIX e adentrou ao século XX em diante). E tal transformação ótica se acoplou a mudança da noção de verdade.
E surgiu principalmente com Charles Darwin (1809-1882), Karl Marx (1818-1883) e Sigmund Freud (1886-1939) que tiveram decisiva participação na construção de uma nova imagem (uma neoautoimagem).
Platão havia denominado os homens de “bípedes sem penas”. Descartes os comparavam a máquinas que possuem “algo interno”. E, por fim, Darwin, Marx e Freud nos apresentaram um espelho muito especial e convincente.
A evolução das espécies, a exploração do proletariado e o império do inconsciente nos apresentaram uma verdade baseada nos mais fortes, mais poderosos e por elementos instintivos que foram excluídos da consciência, por serem censurados e reprimidos. Trazendo uma vivacidade emocional e atemporal.
A partir de Darwin passamos a nos aceitar como seres mais naturais, e mais ligados ao mundo físico e vinculados ao planeta de múltiplas formas, até bem mais do que até então havíamos imaginado.
Já o leitor do século XX passou a ver, com a teoria marxista, o quão era incapaz de comandar a própria vida, pois estaria mais sob as ordens de sistemas econômicos e políticos que nem sempre são visíveis e inteligíveis, muito mais que sob as ordens “de sua própria cabeça”.
O homem bem informado do século XX passou com a psicanálise de Freud a perceber as próprias determinações de formas inconscientes, de forças internas que por vezes assumiam o controle do “eu” e chegavam a ditar o que deveria ser feito (desbancando a crença de que somos um motor movido à razão e emoção).
Os educandos do século XXI tenderam a radicalizar e aprofundar essas visões de si mesmos, mas não a extirparão como quem elimina uma descrição errônea. A percepção do erro pode ter um viés pedagógico-didático muito interessante .
Essa visão de nossa autoimagem atual e, tais visões ganharam consciência popular e não tardaram a espelhar o que nós somos num modo completamente diverso do que pensávamos e de nossos antepassados do século XIX.
A grande revolução se faz a partir de Friedrich Nietzsche (1844-1900) que desenhou panorama filosófico que atravessou todo o século XX e chegou até o século XXI.
Estamos todos ainda, trabalhando sobre os desenhos temáticos descritos por Nietzsche (seja direta ou indiretamente). Ele criticou abertamente Platão e similares e, também a metafísica em geral (particularmente da subjetividade).
Trouxe nebulosidade para a distinção filosófica entre literal e metafórico, e ainda colocou na berlinda a ideia de que somos obrigados a ter uma visão global e unificada de mundo e de nós mesmos, e uma visão a respeito do que é real e do que é aparente. Enfim, isto colocou em xeque a metafísica.
Trabalhou a linguagem como método científico e se depreendeu do positivismo lógico e deu origem a nova filosofia analítica .
“Não sou eu quem penso, é o pensamento que me vem”. Não tardamos em concluir que segundo Nietzsche que o sujeito é consciente de seus pensamentos e responsável pelos seus atos, ou seja, aquele que pode decidir, pautado numa suposta liberdade, a ter ou não pensamentos, e agir ou não de modo prático .
De qualquer forma, Nietzsche demonstrou que a função do sujeito era meramente gramatical. E que são raros os casos em que realmente comandamos o pensamento.
Concomitantemente, o ataque nietzschiano à noção de metafísica e forte de verdade, rejeitou a ideia de verdade como sendo a correspondência entre o objeto e a expressão linguística também foi por ele estampado em postulados (Vejam suas assertivas: “A verdade nada mais é que um batalhão de metáforas”; “Não há fatos, somente interpretação” ).
Com Darwin, Marx e Freud o sujeito unitário transparente para si mesmo e senhor de si mesmo ou o instaurador de si mesmo enfraqueceu grandemente. Com Nietzsche praticamente “bateu em retirada”, nos subtraiu a condição de certeza e erigiu a interpretação como fosse nossa única alternativa.
A priori, Nietzsche provou desespero nos filósofos da educação, pedagogos e professores que se formaram sob a forja do Humanismo. Todo tipo de pergunta veio à tona, e que ainda escutamos presentes nos corredores das faculdades, escolas, e, não raro, ainda nos bastidores da educação.
Tais como: os conteúdos ensinados são verdadeiros? E o sujeito e modelo a ser alcançado, vale a pena considerá-los como existentes? O que fazer então das escolas e instituições de ensino, e nas salas de aula? O que fazer realmente para ser autêntico educador?
A perda de legitimidade do Humanismo faz parte de um processo cultural amplo, o que vieram alguns a denominar de “fracasso da educação” ou “crise da escola” no Ocidente.
Principalmente após a Segunda Grande Guerra Mundial e, mais ainda após as manifestações estudantis e da juventude, em maio de 1968, quando muitos optaram por uma resposta mais conservadora sobre a educação no afã de buscar respostas para o fim do Humanismo.
Conteúdo e autoridade – eis a tábua de salvação dos jovens de tempos complicados onde tudo estava de “ponta-cabeça”.
Outros pensadores perceberam com lucidez que a questão não era a volta de valores humanistas, mas que tudo deveria ser feito para seguir o que os tempos contemporâneos requisitavam: o construir da pedagogia do século XXI .
A fenomenologia de Martin Heidegger (1889-1976) nasceu em oposição a duas tendências do pensamento ocidental: a metafísica tradicional e o positivismo.
Enfim, o trabalho de Heidegger foi desvelar o ser – o que é. Em Platão tínhamos a dicotomia entre o real e o aparente. Nos modernos, a dicotomia ganhou cobertura epistemológica, gerando a dicotomia de sujeito/objeto.
Esse tipo de pensamento tinha casado perfeitamente com o Humanismo e provocado o enfraquecimento da filosofia, e o fatal desvio da reflexão ocidental.
Com isso, o sujeito passou a ser o homem e o objeto passou a ser o mundo. Tudo que se faz no mundo se faria para o homem como sujeito, ou seja, o homem seria o palco do mundo e legitimador de tudo que efetivamente existe.
O mundo e o próprio homem nele, afinal são transformados em objetos, portanto em algo manipulável. O homem é manipulador do homem .
Na vida cotidiana, a tecnologia se tornaria comandante de tudo, se tornaria no afazer por excelência do homem moderno. Onde todas as coisas assumiram a característica de ser recurso – o que rende e o que não rende.
Procuramos a nos transformar em mais habilidosos para servir como recurso. Nosso propósito seria o de nos fazer passíveis de troca. É que desaparecia na medida em que nós e todas as coisas do mundo, que simplesmente passariam a pertencer ao campo da circulação dos objetos que é imposta pela tecnologia.
Com a fenomenologia de Heidegger se desejou escapar desse mundo em que nosso encontro com as coisas e conosco, nos faria manipuladores e, assim, nos dividiria em dominadores e dominados ao mesmo tempo.
A manipulação e dominação acarretariam a violência, inclusive a física. Tal violência teria uma anatomia bem delineada, onde a cabeça seria formada pela filosofia, como epistemologia, ou “metafísica da subjetividade”; “o coração seria a ciência e as mãos seriam a tecnologia”.
Heidegger propôs que percebêssemos que a filosofia como epistemologia e a cultura como Humanismo e a ciência como tecnologia poderia ser deixadas de lado para que voltássemos a ser – aquilo que é, e que se mostra e, não apenas aquilo que é representado.
A ideia de deixar a linguagem falar para depois ouvi-la, é um exercício da filosofia da educação, capaz de promover a pedagogia que nos devolveria a capacidade de interagir com a essência de nosso mundo e nos devolver a qualidade de entidades do mundo.
O estruturalismo agregou diferentes linhas filosóficas e pensadores de várias áreas como filósofos psicanalistas, linguísticos, sociólogos, antropólogos e, etc.
Seu ponto de partida foi a linguística de Ferdinand Saussure que contrariou duas grandes tendências filosóficas: os racionalistas e os empiristas.
Contra os racionalistas, Heidegger negou que o significado fosse dado por nomes fixados por essências. Já contra os empiristas fosse originado por nome dados segundo a experiência sensível. O significado seria função de sua posição em uma estrutura de linguagem subjacente e não-fixa.
Cada objeto linguístico seria definido não a partir de elementos que lhe seriam inerentes, e sim, em uma relação negativa com outros objetos linguísticos, em um sistema.
O caráter convencional da relação interna entre os componentes do signo faria dele um elemento arbitrário. Desta forma, o signo não teria essa essência e não apontaria para nenhuma finalidade, estaria longe de ser o aval da ideia platônica de conceitos universais, absolutos e dados pelas formas puras.
Essa ênfase contra o platonismo percorre o estruturalismo. E surgiram os neoestruturalistas ou pós-estruturalistas que radicalizaram o antiplatonismo do estruturalismo clássico.
Ademais, ao recusarem a cristalização de dualismo, também viraram as coisas para o positivismo.
Jacques Derrida (1930-2004) inspirado em Nietzsche e Heidegger procurou combater o platonismo alertando para uma característica da linguagem que teria envolvido e dominado a filosofia.
Ao querer apresentar a “realidade” e o “significado”, a filosofia não teria percebido o quanto se colocou em posição superior aos outros discursos e sem grande legitimidade para tanto.
O discurso filosófico não seria superior ou inferior aos demais discursos, escritos ou falados, como os da ficção e das ciências, e sofreria das vicissitudes de toda linguagem quando se dispõe a enunciar o que são significado e realidade.
Todo discurso, em tal missão, cairia em autodestruição – se desconstruiria . Derrida cogitou que todo significado ou “o que é” (ser), ao se fazer presente, cria uma ausência. A ausência seria sua presença. E o discurso se desenvolveria como algo vivo.
O mesmo ocorreria com todos os enunciados, de modo que o conjunto ganharia vida própria na medida em que não poderia não ser alterável por si mesmo.
Percebe-se que não é somente o contexto que determina o significado, mas, também que o significado determina o contexto. Se assim é, todo discurso poderia terminar abandonando os princípios lógicos com os quais se inicia; o discurso se desconstruiria enquanto estivesse sendo construído.
O discurso filosófico, que pensa imune a isso, estaria tão sujeito a essa contínua alteração como qualquer outro e, por isso mesmo, as dualidades da metafísica – realidade/aparência, fato/valor, certeza/dúvida, etc.
Por uma característica da própria linguagem, não fixariam o que pretendem fixar estariam sempre um colapso, como quaisquer outras constelações instaladas em narrativas muito menos pretensiosas do que as da filosofia.
Os tempos contemporâneos caracterizam-se pela crítica das noções clássicas de sujeito e de verdade, pela crise do Humanismo e pelo surgimento do pós-modernismo. Tal crise é bem definida pela filosofia de Nietzsche, que questiona a crença no acesso a algo que estaria bem além das interpretações.
A filosofia contemporânea é, quase toda ela, envolvida com problemas que, em Nietzsche, ganharam um determinado contorno paradigmático. Uma das principais características do pensamento contemporâneo é de seu interesse pela linguagem.
Em vários casos, tal interesse se volta também para os mecanismos de poder da sociedade.
A filosofia da educação então recebe a tarefa de criar condições e ambientes para que a pedagogia tire maior proveito dos estudos da linguagem e da comunicação, bem como dos estudos dos mecanismos de dominação política e, enfim, da liberdade e da condição humana.
Portanto, por conta das características da sociedade do próximo milênio exigem-se projetos pedagógicos comprometidos com o real favorecimento da autonomia intelectual e moral do discente. Educa-se ao refletir e enfrentar diariamente os desafios da sociedade contemporânea, com a criatividade, interatividade e principalmente com a energia para produzir o conhecimento e a capacitação humana.
Referências
BECKER, Fernando. Caminho da aprendizagem em Jean Piaget e Paulo Freire - da ação à operação. São Paulo: Editora Vozes, 1997.
GHIRADELLI JR., Paulo. Filosofia da Educação. São Paulo: Ática, 2006.
PASCUAL, Jesus Garcia. Autonomia intelectual e moral como finalidade da educação contemporânea. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1414-98931999000300002 Acesso em 09 de novembro de 2014.
PIAGET, J. O juízo moral na criança. São Paulo: Martins Fontes, 1994 .
___. Seis Estudos de Psicologia. Rio de Janeiro: Forense. 1976.
___ . Logique et conaissance scientifique. Paris: Gallimard, 1967. .
___ .Epistemologia Genética. São Paulo: Martins Fontes, 1990.
___. Le Struturalisme. Paris: P.U.F.,1970.
___. Psicologia e Pedagogia., Rio de Janeiro: José Olympio, 1970.
___. Para onde vai a educação? Rio de janeiro: Forense, 1970.
ALVES, Gilberto Luiz. O pensamento burguês no Seminário de Olinda: 1800-1836. Ibitinga, SP: Humanidades, 1993.
_______. A produção material da escola pública contemporânea. Campinas, SP: Universidade Estadual de Campinas, 1998.
COMÉNIO, João Amós. Didáctica Magna: tratado da arte universal de ensinar tudo a todos. 2.ed. Intr., trad. e notas de Joaquim Ferreira Gomes. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1976.
FREITAS, Marcos, C. (org.) História social da infância no Brasil. São Paulo, Cortez, 1997. p. 183-197.