Violência - um desafio a ser vencido ou uma triste realidade?

A violência que tanto preocupa a população brasileira não será diminuída apenas com o emprego das forças policiais, o endurecimento das leis, a reforma do Poder Judiciário, a extinção do Inquérito Policial, a instituição dos Juizados de Instrução, ou mesmo o surgimento de novas forças de segurança, como a guarda nacional. A modificação da realidade exige investimento nas pessoas que integram a coletividade, com a mudança de atitudes, que possam impedir a anomia das leis e o crescimento das organizações criminosas.

A imprensa todos os dias vem noticiando os atos ilícitos que são praticados pelas pessoas que abandonaram o Estado de Direito, o respeito ao próximo, e se dedicam à marginalidade. Dificilmente os jornais trazem notícias sobre os projetos sociais que estão sendo desenvolvidos pelas diversas organizações não governamentais, que buscam minorar o sofrimento dos brasileiros menos afortunados, que vivem abaixo da linha de pobreza, tentando sobreviver com um salário mínimo de R$ 200,00 reais, inferior a U$ 100,00 dólares americano.

O mundo está preocupado com o conflito que vem ocorrendo no Oriente Médio, mas como fica a guerrilha urbana que está sendo enfrentada pelos brasileiros, que se tornaram refém das organizações criminosas em suas próprias residências, e se sujeitam muitas vezes ao toque de recolher imposto pelos traficantes, como já noticiou mais de uma vez a imprensa escrita e falada. No dia 10 de abril de 2002, o Jornal Cidade Alerta da Rede Record exibiu uma matéria sobre as escolas que tiveram que fechar seus portões por determinação dos traficantes do Rio de Janeiro. Como fica o direito de ir e vir, que foi assegurado pela Constituição Federal de 1988 a todos os brasileiros e estrangeiros residentes no país?

A Comissão Mista de Segurança Pública do Congresso Nacional aprovou a unificação das polícias, o que tem sido considerado por alguns a salvação do sistema público. Será que a polícia do Estado conseguirá diminuir os índices de violência? Com a nova polícia os comerciantes estarão a salvo da possibilidade de roubos, furtos, ou mesmo de serem assaltados 26 vezes, como já foi noticiado pela imprensa ao analisar as deficiências do atual sistema de segurança.

As Cadeias Públicas e Penitenciárias estão superlotadas, mas será que todas as pessoas que possuem mandado de prisão expedido, ou sentença condenatória transitada em julgado, estão presas? Segundo o Estado de São Paulo em matéria publicada no mês de março de 2002 existem muitas pessoas que estão soltas, quando na verdade deveriam estar respondendo pelo ilícito que praticaram, o qual na maioria das vezes é um crime grave que fragilizou as vítimas. O Código Penal não permite que o condenado primário e de bons antecedentes que tenha recebido uma pena igual ou inferior a quatro anos seja levado a prisão. Mas como ficam àqueles que praticaram crimes hediondos e estão soltos ameaçando as pessoas trabalhadoras? Será que as vítimas serão plenamente protegidas pelo programa brasileiro de proteção às testemunhas?

A população vem respondendo cada vez mais com o pagamento de impostos, que estão representados pelo aumento da carga tributária, o que muitas vezes acaba sendo um desestimulo a produção e a geração de novos empregos. A classe média está cada vez mais sacrificada em nome de uma distribuição de renda, que deveria ser realizada por meio do trabalho e da concessão de oportunidades a todos os brasileiros.

Para ter acesso a uma educação de melhor qualidade e a saúde, a maioria da população busca a iniciativa privada, tendo em vista as condições em que se encontra o sistema público, que é o responsável por essas áreas sociais. Segundo a imprensa, as pessoas estão morrendo nos hospitais a espera de atendimento no Sistema Único de Saúde.

Percebe-se que a violência que tanto atormenta a população não está centralizada apenas na prática de ilícitos penais, mas difundida em várias áreas, o que também assusta a comunidade, que não encontra um caminho que possa levar as transformações necessárias para a melhoria das condições do país. Não basta apenas o ingresso no primeiro mundo ou a adesão a globalização, que beneficia poucos países que são protecionistas e que apresentam um discurso liberal até o momento em que suas economias não fiquem sujeitas à competitividade, A questão do aço enfrentada recentemente pelo Brasil e a crise Argentina evidenciaram o significado da integração das diversas economias mundiais sobre a regência da Organização Mundial do Comércio (O.M.C).

O país passou e vem passando por modificações que foram essenciais para o seu progresso tecnológico e impediram que este ficasse no núcleo do furacão econômico, mas é preciso a busca de soluções que estejam centralizadas nos problemas sociais brasileiros. O fato de determinadas políticas terem produzindo resultados nos E.U.A, Reino Unido, Japão, Inglaterra e outros, não significa que estas também produzirão os mesmos efeitos no Brasil, que é um país continental, com oito milhões de quilômetros quadrados, e com uma extensa faixa de fronteira. O processo de colonização do país teve as suas particularidades, e passou por uma administração de exploração, diversamente do que ocorreu com as treze colônias americanas, onde as pessoas com discordâncias políticas e religiosas se fixaram a terra.

A polícia é a instituição mais importante no Estado democrático por ser a guardiã da lei e dos direitos e garantias fundamentais do cidadão. A pessoa que ingressa nas forças policiais deve fazê-lo por vocação, e ter mente que a causa do povo é a mais importante, o que distingue a relevância deste profissional. Mas somente o emprego da força, coação administrativa, em nenhum momento da história resolveu, ou irá resolver, os problemas de uma coletividade que tem por objetivo o desenvolvimento econômico do país.

Os conflitos sociais também devem ser resolvidos com a adoção de políticas voltadas para as questões de saúde, educação, habitação, geração de empregos, controle de natalidade e melhoria das condições de vida. Onde existe o equilíbrio social, a participação efetiva da sociedade e do Estado, não existe espaço para as organizações criminosas.

A violência possui uma causa cujos efeitos até poderão ser combatidos com o emprego da coação, uso da força, por uma só polícia ou mesmo por diversos órgãos policiais, e quando extremamente necessário com o emprego das forças armadas, mas é preciso o estudo dos motivos que levam um cidadão à marginalidade, ou mesmo a se tornar um integrante de uma organização criminosa.

Nenhuma pessoa nasce criminosa ou com o objetivo de praticar a violência. As oportunidades ou mesmo as dificuldades poderão contribuir para a escolha de uma opção, o que mesmo assim não significa a adoção de um determinado projeto de vida. É preciso que a educação seja um instrumento colocado a disposição de todos, para a formação de cidadãos comprometidos com a verdade, com o país, cumpridores de seus deveres, mas respeitados em seus direitos, que devem ser uma realidade e não apenas uma ficção.

As práticas criminosas juntamente com a violência não podem mais assustar a população, levando a um desequilíbrio das relações sociais. O caminho é a união de todos os setores sociais juntamente com o Estado para o combate em um primeiro momento dos efeitos da violência, mas também a busca de soluções para suas causas que passam pelos setores sociais, como a educação, a saúde, a habitação, a distribuição de rendas, a geração de empregos, o controle de natalidade, entre outros.

A mudança de uma realidade não se faz de um dia para o outro, mas é preciso trabalho, não bastando meras palavras. O mundo pode ser modificado começando pelo bairro da cidade onde se vive. A história mostra que os países podem ser reconstruídos, que os inimigos podem reatar os laços de amizade, que o amor pode vencer o ódio, mas sem vontade nada disso acontece. Os sonhos somente se tornam realidade com trabalho. A vontade e a fé de Martin Luter King, Nelson Mandela, Ghandi, e tantos outros, transformou o mundo, e venceu a violência.

Portanto, o Brasil possui plenas condições de alcançar a realização de seus objetivos nacionais e vencer a violência. A integração da sociedade com o Estado, e o investimento nos setores sociais, são os caminhos que devem ser trilhados para o efetivo cumprimento dos princípios enumerados na Constituição Federal, dentre eles, o direito à dignidade, à vida, à liberdade, à propriedade, e a segurança, o que permitirá o combate efetivo as causas e aos efeitos da criminalidade.

Disponível na internet: www.ibccrim.org.br, 27.07.2002