O DIREITO À PENSÃO POR MORTE
Prólogo
No Recanto das Letras, às vezes, ouso publicar devaneios com um misto de ficção e realidade. Uma ou outra ideia impera a depender da ocasião, do incentivo, do estado espiritual.
Ao acessar minha caixa de correspondências quase sempre leio perguntas sobre assuntos variados. Hoje, para dirimir algumas dúvidas de advogados, estagiários, estudantes e partes interessadas, resolvi responder os questionamentos sobre O DIREITO À PENSÃO POR MORTE.
EIS ALGUMAS QUESTÕES APÓCRIFAS DE ADVOGADO E LEIGOS
— QUESTÃO DE UM ADVOGADO
“A segurada faleceu no dia 18/02/2011, quando a filha (beneficiaria), estava com 15 anos de idade. Porém, a autora (filha) só veio a requerer administrativamente a pensão por morte, da mãe, no dia 07/12/2011, ou seja, quando já havia completado 16 anos de idade no dia 05/09/2011. Entendeu o MM Juiz, que a mesma tinha direito à pensão a contar do dia do óbito, se houvesse requerido o benefício no até o dia 05/10/2011.
Lastrado nas informações de minha Petição Inicial Sua Excelência julgou improcedente a concessão da pensão.
Entendo diferentemente, pois a partir dos 16 anos começa a correr a prescrição, não fazendo o (a) beneficiário (a) jus ao direito dos valores vencidos anteriores a 5 anos, da data do requerimento. Estou certo, se possível, pode me esclarecer?”.
— QUESTÕES DE LEIGOS
Primeira questão:
“Preciso de uma informação. Existe algum prazo prescricional para requerer a pensão por morte?”.
Segunda questão:
“Sou filha única e solteira, mas tenho um companheiro. Meu pai era viúvo e faleceu há treze anos. Ele era ex-combatente e pensionista do Exército. Ouvi dizer que tenho direito a pensão que ele recebia do Exército. Isso é verdade? Depois de todo esse tempo posso requerer o benefício?
Terceira questão:
“Funcionário Público Federal (mulher), pertencente aos quadros dos CORREIOS do ano de 1944 até 1972 quando aposentou-se, veio a falecer no ano de 1987. Seu esposo não pleiteou o direito a pensão que tinha direito. Não há que se falar em PRESCRIÇÃO. Ocorre que o cônjuge sobrevivente (homem) é aposentado como autônomo. Desta feita, PERGUNTA-SE:
* Tem Direito à pensão o cônjuge sobrevivente uma vez que já é aposentado e recebe esse benefício do Estado?
Caso a resposta seja positiva;
* Qual a autoridade competente para apreciar o pedido e quais os fundamentos jurídicos do pedido?”.
Quarta questão:
“Sou pensionista de meu ex-marido falecido no ano de 2010. Pretendo manter união estável ou casar novamente e quero saber se com uma dessas ações (união estável ou casamento) perderei a pensão que recebo do INSS.”.
MINHAS RESPOSTAS AOS CONSULENTES
A terceira questão precisa de uma resposta diferenciada pela atipicidade contida. Eis como respondo à pergunta: “Tem Direito à pensão o cônjuge sobrevivente uma vez que já é aposentado e recebe esse benefício do Estado?”
NÃO! O cônjuge sobrevivente NÃO TEM ESSE DIREITO! Não por ser aposentado, mas pelo fato de o óbito da esposa ter ocorrido em 1987. E na época o esposo só teria direito à pensão por morte se fosse um inválido. A lei 8.213, de 24 de julho de 1991 estendeu o direito a pensão por morte a esposo de qualquer condição. Mas sem efeitos retroativos.
A quarta questão é simples e fácil responder: Sim, pode. Não perde o benefício da pensão. A lei 8.213, de 24 de julho de 1991, não prevê o casamento como causa de extinção da pensão (art. 77) e o art. 124, VI da lei veda o recebimento de mais de uma pensão deixada por cônjuge ou companheiro, ressalvado o direito de opção pela mais vantajosa.
Logo, implicitamente admite o novo casamento ou união estável, isto é, o pensionista não perderá o direito ao benefício de pensão por morte do cônjuge, na hipótese de contrair novo casamento ou união estável. Salvo outros entendimentos, assim compreendo!
Nós advogados e demais operadores do direito sabemos e sofremos. Lógico que há jurisprudências para todos os gostos e pouca ou nenhuma compreensão. Essa teratologia (monstruosidade e malformação) jurídica sempre existirá enquanto houver humanos à frente das decisões entre os que se digladiam em busca de uma justiça equânime.
EXPLICANDO A LEI 8.213, DE 24 DE JULHO DE 1991
O benefício de pensão por morte tem como beneficiários os dependentes do segurado falecido e tem como finalidade prover a subsistência desses após o óbito daquele. Nesse sentido, o benefício de pensão por morte será devido aos economicamente dependentes do segurado, assim considerados por presunção legal ou mediante comprovação, nos termos da lei de regência (lei 8.213/91).
A pensão por morte NÃO PRESCREVE! é devida aos dependentes do segurado falecido, estabelecidos no artigo 16 da lei 8.213/91. O pagamento desse benefício será efetuado a partir da data do óbito do segurado se requerido dentro do prazo de trinta dias após o falecimento. Após esse prazo, terá início apenas a partir da data do requerimento administrativo.
É o que prevê o artigo 74 da Lei 8.213/91, abaixo transcrito:
“Art. 74. A pensão por morte será devida ao conjunto dos dependentes do segurado que falecer, aposentado ou não, a contar da data:
I - do óbito, quando requerida até trinta dias depois deste;
II - do requerimento, quando requerida após o prazo previsto no inciso anterior;
III - da decisão judicial, no caso de morte presumida.”.
Nesse diapasão, a Instrução Normativa INSS/PRES Nº 45, DE 6 DE AGOSTO DE 2010, a seguir colacionada:
“Art. 318. A pensão por morte será devida ao conjunto dos dependentes do segurado que falecer, aposentado ou não, observando que:
II - para óbitos ocorridos a partir de 11 de novembro de 1997, data da publicação da Lei nº 9.528, de 1997, a contar da data:
a) do óbito, quando requerida:
1. pelo dependente maior de dezesseis anos de idade, até trinta dias da data do óbito; e
2. pelo dependente menor até dezesseis anos, até trinta dias após completar essa idade, devendo ser verificado se houve a ocorrência da emancipação, conforme disciplinado no art. 23.
PENSÃO DO EX-COMBATENTE
A pensão especial de ex-combatente é imprescritível, podendo ser requerida a qualquer tempo (art. 10 da Lei nº 8.059 /90 e art. 53, II, do ADCT). O início do benefício, isto é, da pensão por morte, é a data do óbito do instituidor do benefício e não a data do requerimento administrativo. Isto é mais do que cristalino na lei que ora vige.
SOBRE OS MILITARES DAS FORÇAS ARMADAS
As condições de transferência do militar para a inatividade e de percepção de pensões estão estabelecidas no Estatuto dos Militares (Lei n° 6.880, de 09 de dezembro de 1980), na Lei de Remuneração dos Militares (Medida Provisória n° 2.215-10, de 31 de agosto de 2001) e na Lei de Pensões (Lei n° 3.765 de 04 de maio de 1960).
A questão da remuneração dos militares federais na reserva e dos reformados, bem como das pensões, é percebida a partir de conceitos, de entendimentos e de uma suposta racionalidade que não se amparam na legislação vigente e nem na realidade.Assim, com muita frequência, constata-se a referência ao regime previdenciário dos militares.
O que se observa, quanto a essa discussão, na maioria das vezes, é um verdadeiro exercício de ficção e de total desconhecimento do assunto, que se tomam evidentes até mesmo no emprego de conceitos básicos.
Os militares federais contribuem com 7,5% da sua remuneração bruta para constituir pensões, que são legadas aos seus dependentes e com 3,5 % , também da remuneração bruta, para fundos de Saúde.
Tem sido difundida e bastante alardeada pela mídia "a questão das filhas dos militares" que recebem, por todas as suas vidas, "polpudas" ou "substanciais" pensões. Ora, ora, ora... Desde de 29 de dezembro de 2000, não existe mais esse direito, que era centenário.
Todos os homens e mulheres que ingressaram nas Forças Armadas, a partir daquela data, não foram mais amparados pela antiga disposição legal. Para suavizar o impacto da brusca mudança estabeleceu-se, então, uma regra de transição para aqueles que, naquela data, já fossem militares.
Por essa regra, todos os que desejassem manter esse direito deveriam descontar 1,5% dos seus vencimentos brutos. Pelas regras em vigor, o direito à pensão depende da contribuição e não está condicionado ao estado civil dos familiares beneficiados.
CONCLUSÃO
O direito de o viúvo não inválido, isto é, em plena capacidade laboral, de receber pensão por morte em decorrência do falecimento da esposa segurada nasceu apenas com a edição da Lei 8.213/91, de 24/07/1991. Por este motivo não se pode conceder a pensão por morte a viúvo não inválido se o falecimento ocorreu antes do advento da lei.
O entendimento é da Turma Nacional de Uniformização da Jurisprudência dos Juizados Especiais Federais (TNU) e embasou a decisão de seu presidente, ministro Gilson Dipp, de determinar a devolução de incidente movido pelo INSS para que seja modificada a decisão da Turma Recursal de São Paulo que concedeu pensão por morte a viúvo não inválido cuja esposa faleceu antes da Lei 8.213/1991.
PRESCRIÇÃO VERSUS DECADÊNCIA
Para distinguirmos os institutos da prescrição e da decadência, recorremos aos conceitos definidos pela doutrina civilista.
Segundo Washington de Barros Monteiro, citando Clovis Bevilacqua, “prescrição é a perda da ação atribuída a um direito, e de toda a sua capacidade defensiva, em consequência do não uso dela, durante determinado espaço de tempo”.
Já a decadência, segundo o mesmo estudioso do tema, é observada quando “o direito é outorgado para ser exercido dentro em (sic) determinado prazo; se não exercido, extingue-se”. É dizer, “a prescrição atinge diretamente a ação e por via oblíqua faz desaparecer o direito por ela tutelado; a decadência, ao inverso, atinge diretamente o direito e por via oblíqua, ou reflexa, extingue a ação”.
PRESCRIÇÃO DE BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS
A regra geral de prescritibilidade dos direitos patrimoniais existe em face da necessidade de se preservar a estabilidade das situações jurídicas. Entretanto, as prestações previdenciárias têm finalidades que lhes emprestam características de direitos indisponíveis, atendendo a uma necessidade de índole eminentemente alimentar.
Daí que o direito ao benefício previdenciário em si não prescreve, mas tão somente as prestações não reclamadas dentro de certo tempo, que vão prescrevendo, uma a uma, em virtude da inércia do beneficiário.
No direito previdenciário, a prescrição quinquenal tem sido aplicada desde o advento do Decreto nº 20.910, de 1932. Nesse sentido:
– TFR – Súmula nº 107 – “A ação de cobrança de crédito previdenciário contra a Fazenda Pública está sujeita à prescrição quinquenal estabelecida no Decreto nº 20.910, de 1932.”.
– STJ – Súmula nº 85 – “Nas relações jurídicas de trato sucessivo, em que a Fazenda Pública figure como devedora, quando não tiver sido negado o próprio direito reclamado, a prescrição atinge apenas as prestações vencidas antes do quinquênio anterior à propositura da ação.”.
O mesmo prazo foi fixado na atual Lei de Benefícios, no art. 103, parágrafo único. De acordo com essa norma: “Prescreve em cinco anos, a contar da data em que deveriam ter sido pagas, toda e qualquer ação para haver prestações vencidas ou quaisquer restituições ou diferenças devidas pela Previdência Social, salvo o direito dos menores, incapazes e ausentes, na forma do Código Civil”.
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NOTAS BIBLIOGRÁFICAS
1) Constituição Federal de 5 de outubro de 1988 (art. 53, II, do ADCT);
2) Lei nº 8.059 /90
3) Lei 8.213/91, de 24/07/1991;
4) NERY Junior, Nelson. “Código de Processo Civil Comentado e legislação extravagante”, 9ª ed., São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006;
5) NERY Junior, Nelson. “Código Civil Comentado e legislação extravagante”, 8ª ed., São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005;
6) PARREIRA, Antonio Carlos. “Escritura de inventário e divórcio: outras questões controvertidas”;
7) Ibrahim, Fábio Zambitte, Resumo de Direito Previdenciário, 4ed, Niteroi, RJ, Impetus, 2005;
8) DIAS, Eduardo Rocha; MACÊDO, José Leandro Monteiro de. Curso de Direito Previdenciário – São Paulo : Método, 2008;
9) Portal Jurídico PROLEGIS;
10) site www.jurisway.org.br;
11) Texto: "Prescrição e decadência no direito previdenciário" do autor João Batista Lazzari;
12) Notas de Aulas do Autor sobre Direito Sucessório e Direito Previdenciário - Pós-Graduação.