Defesas processuais nas ações de Busca e apreensão
Dr. João Evangelista
Diante do crescimento dos números de ações de Busca e apreensões (alienação fiduciária) e Reintegração e Posse (contrato de leasing) propostas pelas instituições financeiras, venho discorrer a respeito das defesas processuais, diante da clara hipossuficiência técnica do consumidor na relação contratual.
Da Notificação Extrajudicial:
A notificação extrajudicial é peça importante para constituir o devedor fiduciário ou arrendatário em mora, é o que leciona a lei de alienação fiduciária, Nos contratos de alienação fiduciária o devedor detém posse direta e responsabilidade sobre o bem, contudo, o credor mantém posse indireta, vinculada a um contrato cuja obrigação do devedor é permanecer em dia com suas obrigações, para não correr riscos do credor valer-se da Ação de Busca e Apreensão ou Reintegração e Posse para reaver o bem, em caso de inadimplemento, A Lei de alienação fiduciária nº 911/69, em seu artigo 3º prescreve:
“Art. 3º O Proprietário Fiduciário ou credor poderá requerer contra o devedor ou terceiro a busca e apreensão do bem alienado fiduciariamente, a qual será concedida Liminarmente, desde que comprovada à mora ou o inadimplemento do devedor.” (BRASIL, Dec. Lei 911/69, art. 3º). (grifei)
Todavia, a comprovação da mora do devedor fiduciário deve esgotar-se no plano extrajudicial, caracterizando-se como condição imprescindível para o ajuizamento da ação de busca e apreensão do bem objeto do contrato, sob pena de violar o direito-garantia fundamental e constitucional assecuratório de que ninguém poderá ser privado de seus bens, sem o devido processo legal, âmbito em que o requisito da extrajudicialidade não é validamente suprível pela incidência do art. 219, "caput", do CPC, inclusive porque "constituição em mora" e "prova da mora" são temas distintos e inconfundíveis entre si.
Logo coleciono um recente julgado do Superior Tribunal de Justiça, em relação ao tema, sobre a validade da notificação extrajudicial, “in verbis”:
“RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. CONTRATO DE FINANCIAMENTO DE AUTOMOVEL COM GARANTIA DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. NOTIFICAÇÃO EXTRAJUDICIAL REALIZADA POR CARTÓRIO DE TÍTULOS E DOCUMENTOS SITUADO EM COMARCA DIVERSA DA DO DOMICILIO DO DEVEDOR. VALIDADE.
1 – A notificação extrajudicial realizada e entregue no endereço do devedor, por via postal e com aviso de recebimento. É valida quando realizada por Cartório de Títulos e Documentos de outra Comarca, mesmo que não seja aquele do domicilio do devedor.
Precedentes.
2. Julgamento ofertado à Segunda Seção com base no procedimento pela lei 11.672/2008 (lei dos Recursos Repetitivos) e pela Resolução STJ nº 8/208.
3. Recurso especial conhecido e parcialmente provido.
(STJ – Resp. 1.184.570/MG – Ministra Maria Isabel Gallotti. Data do Julgamento: 09/05/2012)” (grifei).
A notificação prévia, para constituir o devedor em mora, é medida necessária para evitar a perda do bem alienado fiduciariamente, sem que lhe tenha sido dada oportunidade de defesa, para purgar a mora ou demonstrar sua inexistência.
Porém, o que acontece na prática e a completa falta de critério do judiciário para concessão de medida liminar de busca e apreensão ou reintegração e posse, onde a maioria dos Juízes concedem liminares, não atentando ao dispositivo constitucional do contraditório e ampla defesa.
A grande maioria das notificações extrajudiciais são invalidas, uma vez que não preenchem os critérios legais de sua expedição e convalidação, tornando-se ineficazes, conforme vejamos:
Sobre a matéria em exame, a jurisprudência pátria:
AGRAVO. AÇÃO DE BUSCA APREENSÃO. NOTIFICAÇÃO IRREGULAR.
A ausência de pressuposto processual, relativo à comprovação da constituição em mora, nos termos do § 2º do art. 2º do Decreto-Lei nº 911/69, acarreta a extinção da Ação de Busca e Apreensão. Agravo Interno desprovido. (Agravo Nº 70050689173, Décima Terceira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Lúcia de Castro Boller, Julgado em 11/10/2012)
(TJ-RS - AGV: 70050689173 RS, Relator: Lúcia de Castro Boller, Data de Julgamento: 11/10/2012, Décima Terceira Câmara Cível, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 19/10/2012) (grifei)
Alienação fiduciária. Busca e apreensão. Indeferimento da petição inicial. Notificação realizada através de Cartório de Títulos e Documentos de Comarca diversa daquela em que tem domicílio o devedor. Validade. Notificação expedida para endereço constante do contrato. Ausência de AR (Aviso de Recebimento). Notificação irregular. Recurso desprovido.
(TJ-SP - APL: 318356020118260506 SP 0031835-60.2011.8.26.0506, Relator: Pedro Baccarat, Data de Julgamento: 29/11/2012, 36ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 30/11/2012) (grifei)
AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE. CONTRATO DE ARRENDAMENTO MERCANTIL. NOTIFICAÇÃO DO ARRENDATÁRIO. AUSÊNCIA. REEXAME DE PROVAS. IMPOSSIBILIDADE. 1.- A revisão da conclusão do Acórdão recorrido de que as notificações expedidas para constituir o arrendatário em mora não foram entregues no endereço do constante do contrato demandaria o reexame das provas dos autos, procedimento vedado em sede de Recurso Especial, nos termos da Súmula 7 desta Corte. 2.- Agravo Regimental improvido.
(STJ - AgRg no AREsp: 292325 RS 2013/0027195-5, Relator: Ministro SIDNEI BENETI, Data de Julgamento: 11/04/2013, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 03/05/2013)
AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE. CONTRATO DE ARRENDAMENTO MERCANTIL.NOTIFICAÇÃO EXTRAJUDICIAL. AUSÊNCIA DE PRESSUPOSTOS DE CONSTITUIÇÃO E DE DESENVOLVIMENTO VÁLIDO E REGULAR DO PROCESSO. EXTINÇÃO DO PROCESSO MANTIDA. I. O direito de o credor arrendante reaver o bem que se encontra na posse do devedor está diretamente ligado à caracterização da mora do último. Súmula 369, do STJ. II. Constituição do devedor em mora que pode ser realizada pela simples entrega da notificação no endereço do devedor, informado no contrato, sendo desnecessário o seu recebimento pessoal, ou pelo protesto...
(TJ-RS - AC: 70047779236 RS, Relator: Jorge André Pereira Gailhard, Data de Julgamento: 08/11/2012, Décima Quarta Câmara Cível, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 13/11/2012)
Umas das irregularidades é que a notificação extrajudicial tem que ser expedida por cartório de títulos e documentos, e a grande maioria e expedida por Escritório de Advocacia, e registrada no cartório de títulos e documentos, esse tipo de notificação extrajudicial não preenche os requisitos legais, tornando-a ineficaz.
A notificação Extrajudicial para ter validade tem que ser expedida por Cartório de Títulos e Documentos e não por Escritórios de Advocacia ou pela Instituição credora.
Outra irregularidade é a ausência de cumprimento da notificação extrajudicial, além de ser expedida pelo Cartório de Títulos e documentos, a notificação extrajudicial para ter plena validade, tem que ser enviada para o endereço do devedor fiduciário e comprovada o seu cumprimento através de aviso de recebimento no endereço do devedor fiduciário ou arrendatário em caso de contrato de leasing e não em endereço diverso.
A notificação Extrajudicial prévia, para constituir o devedor em mora, é medida necessária para evitar a perda do bem pelo devedor com alienação fiduciária sem que lhe tenha sido dada oportunidade de defesa, para purgar a mora ou demonstrar sua inexistência, a sua ausência na inicial torna nulidade insanável, conforme corrobora a jurisprudência uníssona dos tribunais Pátrios e Súmula 72 do Superior Tribunal de Justiça. In verbis:
“a comprovação da mora é imprescindível à busca e apreensão do bem alienado fiduciariamente”
Em relação ao contrato de arrendamento mercantil é importante ressaltar a existência da Súmula 369 do STJ, in verbis:
Contrato de Arrendamento Mercantil (leasing) - Cláusula Resolutiva Expressa - Notificação Prévia do Arrendatário - Constituição em Mora
No contrato de arrendamento mercantil (leasing), ainda que haja cláusula resolutiva expressa, é necessária a notificação prévia do arrendatário para constituí-lo em mora.
Portanto, nas defesas processuais de ações de buscar e apreensão e reintegração e posse, é importante verificar se a notificação extrajudicial, preenche os requisitos de validade e cumprimento, sob pena de extinção do processo de busca e apreensão ou reintegração e posse.
Outros meios de defesa é a discussão a respeito das cobranças abusivas de Taxa de Cadastro, seguro prestamista casado, serviços de terceiros, juros remuneratórios cumulados com comissão de permanência e multa, além dos juros capitalizados sem cláusula contratual expressa que autorize e legitime a sua cobrança.
O Superior Tribunal de Justiça tem pacificado entendimento de que é possível discutir a legalidade de cláusulas contratuais na defesa de ação de busca e apreensão, conforme vejamos:
PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. CONTESTAÇÃO QUE IMPUGNA A LEGALIDADE DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS, SOB ALEGAÇÃO DE ILEGALIDADE. POSSIBILIDADE DE DISCUSSÃO DO TEMA NO ÂMBITO DA AÇÃO.
I. Possível a discussão, no âmbito da defesa apresentada na ação de busca e apreensão, da legalidade das cláusula contratuais que deram origem ao débito.
II. Recurso especial conhecido e provido.
(STJ - REsp 826.608 - RJ - Proc. 2006/0050737-9 - 4ª T. - Rel. Min. Aldir Passarinho Junior - DJ 29.06.2009)
Uma vez reconhecida à ilegalidade de cobranças abusivas muitas das ações de busca e apreensões e reintegração e posse são julgadas improcedentes, conforme vejamos nas decisões em destaques:
APELAÇÃO CIVEL. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA EM GARANTIA. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO.
1. "A notificação extrajudicial realizada e entregue no endereço do devedor, por via postal e com aviso de recebimento, é válida quando realizada por cartório de títulos e documentos de outra Comarca, mesmo que não seja aquele do domicílio do devedor"(RESP 1237699/SC, dje 18/05/2011).
2. Viabilidade de exame da (I) legalidade das cláusulas contratuais em defesa na ação de busca e apreensão. Precedentes do STJ.
3. Constatada a abusividade dos encargos cobrados no período da normalidade contratual. Mora descaracterizada. Improcedência da ação. Recurso improvido. (TJRS - AC 503882-20.2011.8.21.7000; Pelotas; Décima Quarta Câmara Cível; Relª Desª Judith dos Santos Mottecy; Julg. 15/03/2012; DJERS 28/03/2012)
Diante da possibilidade de discussão a respeito da legalidade ou não de cláusulas contratuais, antes da perda do bem alienado fiduciariamente ou arrendamento mercantil, é importante que os consumidores fiquem atentos aos seus direitos garantidos na relação consumerista e no Estado Democrático de Direito.