Dos delitos e das sanções VII.
Dos delitos e das sanções VII.
Para a melhor compreensão deste texto é conveniente ler "Dos Delitos e das sanções I" [www.recantodasletras] ou o livro "À Nossa Família (curiosidades e Lembranças)".
"Curiosamente", há Constituições, por conseguinte, com efeitos jurídicos, que têm nos seus preâmbulos a palavra Deus (Amor). E Amor, até onde se sabe, não tem comunhão com a Violência ...
Este último texto é um sucinto resumo de uma série de sete [v. www.recantodasletras, ou do livro À Nossa Família (Curiosidades e Lembranças)], que visa observar a crença e a lógica nas relações interpessoais de causa e efeito (ou premissas e conclusão), quando esse plano de visão caminha junto com a humanidade, somado a que, em especial, há um conceito que encontra-se estratificado ao longo dos séculos, há milênios, merecendo alguma avaliação: A VIOLÊNCIA (dor-sofrimento mental e ou física).
Num breve teste para poder verificar o íntimo das pessoas, quatro propostas são feitas como desejo de paz : 1.ª: por favor, não fique com raiva; 2.ª: por favor, não fique com medo; 3.ª: por favor, não fique triste; e, 4.ª: por favor, não fique alegre.
Tendo em vista que essas quatro características são comuns a todos os seres humanos, e à parte o exagero dentre todas elas, desejar a extinção da alegria é incompatível com a natureza humana...
Por absoluta insegurança, desconhecimento, ou até dúvida quanto à natureza humana, a violência parece ser sinal de força e superioridade, quando a força e a elevação estão na capacidade de controlar e dominar o instinto selvagem ... É comum confundir garra, determinação, ou ímpeto, com raiva, ira, ou o ódio que descaracteriza e desconstitui a pessoa humana.
A expressão Justiça, derivada de ”jus” (bom, certo e útil, ou dar a cada um o que é seu etc.), e, “titia” (habitualidade), não é (sempre) abstrata, e, muito menos, relativa (no sentido de que cada um teria a sua, ou o que é justo para um seria injusto para o outro). Irmã gêmea da Verdade, via de regra, é concreta e absoluta, pois, caso contrário, seria o tumúltuo generalizado viver com a incerteza do que seria justo e verdadeiro no exercício (prático) da convivência. Sob este ângulo de visão, a Justiça, diverso do que, de ordinário, é concebida, além de ser absoluta, é, efetiva e preferencialmente, exercida pelo indivíduo no trato das relações quotidianas, no dia-a-dia, assim, na mais perfeita sintonia, sincronicidade, e, reciprocidade: a excepcionalidade é a existência da injustiça. Esta, a injustiça, por sua vez, não tem o condão de arrefecer a Justiça, torná-la duvidosa ou instável, salvo pelos desavisados - exatamente por ser a exceção.
Nesta simbiose, Justiça e Verdade, “justificar” significa apresentar um fato que torne justo o injusto. Justificar, portanto, é condição que surge, tão-somente, no fato que foge à habitualidade da prática do que é justo, isto é, na presença da injustiça. E aqui cabe a pergunta: JUSTIFICA CAUSAR A VIOLÊNCIA?
Repetindo: um Juízo Universal pode ser feito em todas as línguas, idiomas, e dialetos possíveis, para ser verificado, analisado e concluído sobre o que afeta negativamente ou positivamente o Ser Humano, com as seguintes propostas : 1.ª – “eu vou causar a dor-sofrimento, e ser violento”; e, 2.ª – “eu não vou causar a dor-sofrimento, e não ser violento”. A resposta aparece tornando-se evidenciada...
A violência imprime a marca da violência... É como se o indivíduo dissesse (ou ordenasse): -“eu quero que você seja violento comigo, porque fui, vou ser, ou sou violento”! Nisto, que ocorre há milênios, pode-se depreender que quem quer e determina a violência é o indivíduo violento (anormal). A pessoa comum, deparando-se com a violência, desde logo reage pensando na justiça, que é tida como o meio eficiente e eficaz de “meter o violento atrás das grades, e vê-o ter dor-sofrimento, isto é: JUSTIÇA É PRATICAR A VIOLÊNCIA; por sua vez, concomitantemente, cria o dever da sociedade, através do Estado-juiz, em fazer-lhe “civilizadamente” um Processo, que vai ter o seu ponto culminante na CONDENAÇÃO PENAL, OU CAUSAR DANO, OU, CONDENAR O VIOLENTO.
CICLO VICIOSO: VIOLÊNCIA x VIOLÊNCIA x VIOLÊNCIA x VIOLÊNCIA...
A premissa (ou o fundamento) de que a prevenção e o combate à violência está na violência se anula em si mesma – de resto, certamente este é um dos mais importantes exemplos do significado de tautologia...
DISCIPLINA tem a mesma etimologia da palavra "discípulo", que significa "aquele que segue". DISCIPLINA é sinônimo de: acatamento, obediência, condicionamento, respeito, restrição ...
Não obstante adotada milenarmente, a ideia de que disciplinar significa violentar, além de ser contemporaneamente retrógrada, se “ensina” algo é (exclusivamente) através do medo... ou do pavor.
A (nossa) educação é essencialmente baseada no TEMOR: “não faça ou faça isto ou aquilo, senão você vai ter - sofrer - advertência, multa, punição ou sanção etc. Raramente alguém diz: “não faça isto ou aquilo porque pode causar dor-sofrimento a outrem” etc.
A EDUCAÇÃO, muito cedo, disciplina (condiciona) a conduta (fazer, não fazer, ou dar) da criança a recear dar causa à violência, ou seja, a recear dar causa a dor-sofrimento. Mas, a própria criança (adolescente, ou adulto) vê, e, sente (muitas vezes, literalmente, na pele), que o objeto do ensinamento, A VIOLÊNCIA, constitui a sua EDUCAÇÃO como forma, meio, modo, e instrumento utilizado “pedagogicamente” para a DISCIPLINA sobre o que se repele, quando não se mistura as expressões VIOLÊNCIA E DISCIPLINA com igual prisma de mérito.
Ratificando: NÃO HÁ, E NÃO PODE HAVER, POLÍTICA DE PREVENÇÃO E COMBATE À VIOLÊNCIA PORQUE HÁ A DIDÁTICA DA VIOLÊNCIA – talvez seja porque essa evidência esteja tão perto dos olhos que não se consiga vê-la...
Uma particularidade: “levei uma surra” do meu Pai que me pegou fumando ... Ele foi um “monstro”, “perverso”, “sádico” ? Evidentemente, NÃO! Agiu como todo o mundo agia (e age): responsável, consciente e cioso de sua obrigação como Pai, teve a exclusiva a intenção de educar-me... A minha conduta era uma violência, ou desrespeito a ele, quando o cigarro era uma violência a mim mesmo... Por fim, ele pensou poder combater a violência com a violência, como todo o mundo fazia ... e (ainda) faz: não adiantou – infelizmente sou tabagista (doente) há 53 a.
Em outras palavras, a crítica em pauta não é destrutiva, ou desconstitutiva da cultura reinante (preponderante, insisto: há milênios) em que O MODELO DA VIOLÊNCIA FOI E PERMANECE FINCADO NA PARADOXAL LÓGICA DA VIOLÊNCIA PARA PREVENIR E COMBATER A VIOLÊNCIA. Contudo, sim, a busca e consecução de uma (imediata) mudança de rumo na trajetória do Humanismo com a concretude do inutuito real e verdadeiramente pedagógico e didático da estrutura da psicologia individual e social redirecionada para a NÃO-VIOLÊNCIA ...
Por derradeiro, no contexto desses sete (sucintos) artigos, a NÃO-VIOLÊNCIA não é uma "sugestão à inércia, à omissão ou à irresponsabilidade", uma filosofia de vida”, "crendice", e muito menos uma utopia, ou uma obsessão a ser alcançada desarrazoadamente, entretanto, sim, uma proposição crítica a respeito do próprio conceito de JUSTIÇA PENAL (também, com que intensidade de ira espraiada, a chamada “indignação”, ela é reclamada), com a finalidade de ser analisada e posta em prática para a Qualidade de Vida da Pessoa Humana, que não pode ter na dor-sofrimento (provocada) nenhuma experiência que lhe sirva de “lição”. Neste caminhar, a questão não versa sobre o puritanismo, ou um (presunçoso) ensaio dialético-filosófico, ou um mero ideal...
A trajetória da pessoa humana, mantendo a violência como se fizesse parte de sua natureza, refoge à sua essencial particularidade sensível que pode ser resumida na busca e na manutenção da Qualidade de Vida com o objetivo de evitar, não agravar, reduzir, ou extinguir a dor-sofrimento de todos.
Também não é ilusória excluindo a RESPONSABILIDADE, seja extrajurídica, seja jurídica, haja vista a própria Natureza dar RESPOSTA se suas leis são descumpridas – evidentemente sem o sentimento de causar a violência. É aqui que concentra-se, em suma, toda a questão: muito distante de “beneficiar” ou oferecer “privilégios” a quem dá causa à violência, ou, finalmente, em “prol” do violento, este que, de ordinário, é tratado com violência, passa a ser visto e concebido como ANORMAL NECESSITADO DE RECEBER O TRATAMENTO ADEQUADO À ESTA SUA LASTIMÁVEL CONDIÇÃO HUMANA, QUE, EM SI MESMA, JÁ É DE DOR-SOFRIMENTO – o fato se comprova por si só, pois causar a dor-sofrimento por dolo ou culpa, ou até insciência, e em qualquer grau de intensidade, não pode ser concebido como um comportamento plausível, aceitável, admissível com a concordância de que faz-se presente a normalidade (ou a naturalidade)... somado a que a enfermidade, transtorno, ou doença mental pode ser mais violenta que a própria dor física ou corporal...
Não há como concordar com Francis Bacon, que alardeia ser a “JUSTIÇA SELVAGEM”, desde que que se é “selvagem”... não é Justiça... ou com Beccaria, que admite o suplício, a dor-sofrimento, ou seja, a VIOLÊNCIA QUE SUBSISTE NA PENA, DESDE QUE ESTA SEJA NOMINADA DE “SANÇÃO”...
Não pela mera expressão, mas sim pelo o que implica concretamente na vida quanto à consequência, a Responsabilidade passa a servir tanto para a esfera Penal, quanto para a Extrapenal – sem tocar na classificação geral do Direito.
Neste sentido, além de ser mantidos os objetos jurídicos, os bens-interesses respectivos às suas áreas permanecem os mesmos, inclusive com os graus de valor e de reprovabilidade abstratas.
Reformulando o que escrevi e publiquei no Recanto das Letras - Dano moral imoral [www.recantodasletras ; e, À Nossa Família (Curiosidades e Lembranças)], criticando a “ação indenização por danos morais compensatória”, esta já existe e deve permanecer, entretanto, não como meio de compor ou satisfazer o dano (o que desaguaria na mesma concepção de violência), e, sim, como o próprio nome indica, para compensar economicamente o prejudicado, e servir de exemplo pedagógico-didático preventivo ao Anormal de acordo com a intensidade e extensão da própria Responsabilidade - certamente mais importante ainda que a própria compensação, é o banimento da ideia de dano (“con denar”).
A estrutura do ordenamento jurídico é a mesma... a (grande e profunda) transformação está no princípio (cultural, e jurídico-cultural) de que Justiça e Violência são conceitos que andam juntos, não havendo aquela sem esta, que culmina em “condenar” (causar dano).
Compensando economicamente a vítima do Anormal, este, passível ou não de cuidados ou tratamentos clínicos ou hospitalares, desfaz-se a (histórica) visão de que causar a dor-sofrimento é o caminho para prevenir ou combater a violência.
Vale repetir: é o íntimo, o recôndito dos sentimentos que rege a conduta humana. É visceralmente diferente o ato de quem cerceia a liberdade para proteger e para violentar... No contexto, curiosamente, a História Universal é marcada pelos que tiveram o princípio filosófico-ético da NÃO-VIOLÊNCIA...
A intenção (aspecto finalístico d conduta) é tão importante que é a base do Código Penal Brasileiro - a partir de 1984, com a Teoria Finalística de Hans Welzel.
Aliás, se é verdade que a violência pode em “alguns segundos” causar o desequilíbrio e até matar, não é menos verdade que a NÃO-VIOLÊNCIA, no mesmo tempo, pode equilibrar e até salvar... Dentro desta relação fática, a NÃO-VIOLÊNCIA pode ser praticada, mesmo que durante alguns instantes, e se não puder ser praticada em “todo o mundo” e “todo o tempo”, dá origem à possibilidade de ser – humanamente – expandida, e em todos os sentidos ...
Sem desprezar a exceção, bilhões de pessoas vivem e convivem com o Juízo Universal de absterem-se da violência (causação da dor-sofrimento): se assim não fosse, a Terra seria um só foco de conflitos, lutas, e, guerras. Já alguns, os que usam da violência: não servem de paradigma à Essência do Ser Humano.
A NÃO-VIOLÊNCIA ABRE A POSSIBILIDADE DA PRÁTICA DO EXERCÍCIO DE DEFESA PROVIDENCIAL DA PRÓPRIA PESSOA HUMANA.
Niterói, RJ, 12 de agosto de 2013.
Rodolfo Thompson – OAB(RJ): 43.578 – Cel. (04121) 98100-9806.
Ps. Os fundamentos destes textos estão no que nos ensina, em primeiro lugar, Jesus Cristo, depois, Francisco de Assis, Mahatma Gandhi, e, o Dalai Lama...