Fundamentos Constitucionais da Desapropriação

FUNDAMENTOS CONSTITUCIONAIS DA DESAPROPRIAÇÃO URBANA E RURAL

Dr. João Evangelista

Por conta das atrocidades cometidas sob o manto da legalidade positivista, revelou-se necessária a adoção de outro modelo Estatal, orientado pelo respeito à dignidade humana, e apto a reaproximar o conceito de justiça ao de direito. Trata-se do chamado Estado Constitucional de Direito, baseado no neo-constitucionalismo, que traz como um dos seus principais vetores a noção de onipresença da Constituição em todas as áreas jurídicas.

Com base nessa nova concepção jurídico-filosófica, emerge o Estado Constitucional Democrático como proposta de superação do Estado Liberal, o qual se revelou insuficiente na efetivação de direitos sociais aptos a lastrear o desenvolvimento não apenas econômico, mas propriamente humano, na sua concepção mais ampla.

Nesse contexto, imperiosa a análise do direito de propriedade, um dos grandes símbolos do Estado Liberal, agora sob o enfoque principiológico e coerente com o atual modelo político- constitucional.

Por se inserir no rol dos direitos fundamentais de primeira dimensão, a propriedade revela-se como direito limitativo à ingerência do poder público, o qual, uma vez contextualizando com a presente realidade, não pode ser concebido tão-somente como um direito à abstenção estatal, mas também como um comando voltado à sua efetiva implementação.

Conforme mencionado, o pós-positivismo representa a superação da garantia formal dos direitos humanos, para buscar não apenas a sua concretização social a partir de uma postura ativa do Estado, mas também a sua inserção como instrumental à dignidade da pessoa humana. A propriedade, nesse diapasão, há de ser concebida, cumulativamente, como um direito a não intervenção abusiva por parte do poder público, uma garantia aos cidadãos que dela são desprovidos (os hipossuficientes) e limitada pelo cuidado com a preservação do basilar valor da dignidade da pessoa humana.

No particular, tem-se que tamanha é a relevância do direito de propriedade que o constituinte pátrio cuidou de elencá-la no próprio caput do artigo 5º da Constituição Federal, dispositivo que enuncia os direitos individuais, estes erigidos à condição de cláusula pétrea. Ademais, dentro do supracitado artigo, a propriedade é novamente assegurada no inciso XXII e, nessa mesma linha, o inciso LIV estabelece que ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal.

Não se pode deixar de perceber que o cuidado do constituinte pátrio não se restringiu aos citados dispositivos, pois, ainda que indiretamente, a propriedade é resguardada em todo o texto constitucional, a exemplo do direito à herança, ao ressarcimento pelos danos materiais, pelos limites ao poder de tributar, e, especialmente, ao ser elencado no art.170 como um dos princípios da ordem econômica.

O inciso XXIII do art.5º, por sua vez, estabelece que a propriedade deva atender a sua função social. A própria Carta Magna cuida então de indicar em seu texto o que entende por cumprimento da função social. No parágrafo segundo do art.182, estabelece que a propriedade urbana cumpra sua função social quando atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor. Em seguida, no caput do art. 186, preceitua que a propriedade rural atende à função social quando adequada e racionalmente aproveitada, inclusive em relação aos recursos naturais existentes e à preservação do meio ambiente, quando observadas as disposições que regulam as relações de trabalho e desde que a exploração favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores.

Embora majoritário, não é pacífico na doutrina o entendimento de que a função social seja um limite incito ao exercício do direito individual de propriedade. A questão é bem posta por Manoel Jorge e Silva Neto, para o qual há que se diferenciar a propriedade referida como direito individual (art.5º) daquela estabelecida como princípio geral da atividade econômica (art.170, II). Segundo o professor, a primeira acepção diz respeito ao direito à satisfação das condições mínimas de existência através da propriedade, não possuindo qualquer relação que a função social. Para ele, somente na segunda acepção se demandaria a imposição da função social como exigência ao regular exercício do domínio. Nas palavras do autor, não há razão para vincular a propriedade enquanto direito individual à função social, uma vez que seu mau uso pode ser validamente coibido pelo poder de polícia.

Não é essa, contudo, a posição prevalente. Em sentido diametralmente oposto, entende José Afonso da Silva que a Constituição “só garante o direito de propriedade que atenda a sua função social”. É dizer, a propriedade que não cumpre sua função social não recebe proteção constitucional. Para o festejado doutrinador, as restrições decorrentes do desatendimento da função social indicam que a propriedade “não pode mais ser considerada como um direito individual nem como instituição de direito privado”, pois somente merece guarida quando instrumentalizada na busca de assegurar a todos existência digna, conforme ditames da justiça social.

De fato, embora tenha surgido como um direito de roupagem liberal, a propriedade, sob o ponto de vista hodierno, há de ser concebida, sobretudo como um meio ao atendimento da dignidade humana e da justiça social.

Posição intermediária é apresentada por Dirley da Cunha Jr. e Marcelo Novelino, para os quais a ausência de função social não implica numa total vulnerabilidade da propriedade, mas sim numa menor salvaguarda constitucional. Para estes, mesmo não se atendendo à função social, não se pode admitir invasões de terras por movimentos sociais organizados, ainda que a pretexto de promover a reforma agrária, tampouco supressão legislativa da instituição da propriedade privada ou a retirada arbitrário do direito de propriedade, sem observância do devido processo legal. Certamente, admitir a absoluta desproteção da propriedade que não atendesse à função social seria permitir tamanha insegurança no seio social que se estaria a comprometer o próprio desenvolvimento do país.

É de se concluir, também, que quer seja pela função social quer seja pelo poder de polícia, a propriedade não se afigura como direito absoluto, assim como não são e não poderia ser absolutos os demais direitos individuais. A relevância desta observação refere-se a necessidade de flexibilizar os tradicionais atributos relacionados à propriedade, a qual era tida como um direito absoluto, exclusivo e perpétuo. Contudo, por se tratar de um direito individual, o estudo dos mencionados limites requer especial cuidado, pois não poderiam estes afetar o núcleo intangível da propriedade, o qual consiste em cláusula pétrea.

Partindo-se da noção de que não há inconstitucionalidade de normas emanadas do constituinte originário, é cediço que as limitações constitucionais à propriedade, dentre as quais estão os fundamentos constitucionais à desapropriação, não podem ser postas em dúvida no que tange à sua validade. Especialmente no que se refere à desapropriação, tem-se que esta mitiga o caráter perpétuo da propriedade.

Não se tem por afastado, contudo, o risco de eventual interpretação conduzir a alguma inconstitucionalidade. Por conta disso, deve o intérprete se valer do “Princípio da Unidade da Constituição”, o qual consiste numa especificação da interpretação sistemática, imputando-se o dever de harmonização entre as normas constitucionais. Justamente na medida em que afasta a hierarquia entre normas constitucionais, impede-se a declaração de inconstitucionalidade de uma norma constitucional originária.

Sendo assim, na mesma medida em que se tem a propriedade como direito individual, o inciso XXXIV do art. 5º possibilita a desapropriação, com base em previsão legal, por necessidade ou utilidade pública, ou interesse social, mediante justa e prévia indenização em dinheiro, ressalvados os casos previstos na própria constituição. Trata-se, evidentemente, de norma de eficácia limitada, demandando regulamentação infra legal.

Nos termos do art. 22, inciso II da CF, compete privativamente à União legislar sobre desapropriação, podendo os Estados-membros legislar sobre questões específicas desde que autorizados por lei complementar, nos moldes do parágrafo único do mencionado artigo.

A matéria, então, é regrada pelo Decreto-Lei 3.365/41, o qual foi recepcionado pela atual constituição. Nele são traçados os aspectos procedimentais, regulamentando as etapas a serem percorridas pela administração pública. Entretanto, para o específico caso de desapropriação de imóveis rurais para fins de reforma agrária, o procedimento demandará contraditório especial, sob o rito sumário, o qual deverá ser estabelecido por lei especial.

Não se pode confundir, porém, a competência para legislar sobre desapropriação, a qual é, conforme já dito, privativa da União, com a competência para executá-la, a qual pode recair tanto sobre a administração direta e indireta, quanto sobre as concessionárias de serviço público ou entes delegados do poder público.

A desapropriação é ato administrativo discricionário, embora, por óbvio, submetido aos ditames legais, ainda mais se tendo em conta a especificidade do princípio da legalidade na esfera administrativa. Consiste na supressão da propriedade por ato do poder público, este revestido de prerrogativas próprias, afigurando-se, portanto, como ato de império. A aquisição da propriedade, nesse caso, é considerada originária, inexistindo qualquer vínculo com o titular antecedente. Consequência natural do quanto exposto é extinção de direitos ou ônus que eventualmente incidam sobre o imóvel.

Da leitura do inciso XXIII do art.5º, se percebe claramente três situações justificadoras da desapropriação, quais sejam utilidade e necessidade pública e interesse social, devendo a supressão da propriedade ser precedida de prévia e justa indenização em dinheiro, sendo ressalvadas apenas as exceções constitucionalmente previstas. Tais exceções estão elencadas no artigo 182 para a desapropriação urbana, e no artigo 184 para a desapropriação rural.

No caso da desapropriação para fins de utilidade e necessidade públicas, tem a doutrina entendido que em que pesa submeterem-se ao mesmo regime jurídico, diferenciam-se sutilmente quanto ao caráter emergencial da modalidade “por necessidade pública”. Trata-se, por conseguinte, de diferenciação de pequena relevância prática. Merece destaque, no entanto, a diferenciação entre estas duas modalidades e a desapropriação por interesse social.

Nas desapropriações para fins de utilidade ou necessidade pública, o direito de propriedade é suprimido ainda que se esteja cumprindo a função social. É dizer, com base na supremacia do interesse público, retira-se compulsoriamente a propriedade para fins de consecução de objetivos voltados ao bem estar geral. Em tais casos, tendo-se em vista o princípio da isonomia, exige-se do Estado indenização prévia e justa em dinheiro, para se evitar o sacrifício maior de alguns dos administrados em prol da coletividade.

Diverso, contudo, é o procedimento da desapropriação por interesse social, a qual a doutrina costuma denominar de desapropriação-sanção. Esta decorre do descumprimento da função social, dispensando-se a indenização prévia em dinheiro. Subdivide-se em desapropriação urbana e rural.

A desapropriação urbana para fins de interesse social recebeu regramento específico no parágrafo quarto do art.182 da CF, sendo da competência municipal a sua realização.

A Constituição Federal, no caso da desapropriação urbana para fins de interesse social exigiu prévia regulamentação da matéria por lei federal. Trata-se do Estatuto da Cidade (Lei n. 10.257/01), responsável por disciplinar os aspectos urbanísticos das cidades em geral.

Sabedor do caráter drástico da perda da propriedade, a CF/88 elencou algumas medidas a serem implementadas antes da efetiva desapropriação pelo poder público municipal. Inicialmente, a área a ser expropriada deverá estar incluída no plano diretor, o qual, de acordo com o art.182, parágrafo primeiro da Constituição, é obrigatório para cidades com mais de vinte mil habitantes.

Com o fito de coibir a especulação imobiliária, cujos efeitos são fortemente sentidos nos centros urbanos, notadamente diante da desorganizada distribuição espacial das moradias, atribui-se ao Município a prerrogativa de impor ao proprietário o seu adequado aproveitamento, o que, para tanto, deve considerar a configuração espacial exposta no mencionado plano diretor e as características do entorno no que tange à forma de utilização da propriedade, sob o aspecto ambiental, social, etc.

Impõe-se, num primeiro momento, o parcelamento ou edificação compulsória do solo urbano. Revelando-se a insuficiência da medida, aplica-se a progressividade no tempo de alíquotas do imposto predial e territorial urbano. Por fim, como última ratio, implementa-se a desapropriação mediante pagamento de títulos da dívida pública resgatáveis em até dez anos.

Merece um breve adendo a possibilidade de se estabelecer alíquotas progressivas de IPTU com caráter fiscal. Antes da EC 29/00, o STF admitia tão somente a progressividade extrafiscal do IPTU, descrita no parágrafo primeiro do art.156 da CF, justamente voltada ao implemento da função social . A esse respeito, foi editada pelo STF a súmula 668 com a seguinte redação: “É inconstitucional a lei municipal que tenha estabelecido antes da Emenda Constitucional 29/2000, alíquotas progressivas para o IPTU, salvo destinada a assegurar o cumprimento da função social da propriedade urbana”.

Percebe-se, por conseguinte, que a progressividade extrafiscal do IPTU foi estabelecida pelo constituinte originário, ficando a salvo de qualquer questionamento quanto a sua constitucionalidade.

Procedimento diverso é previsto para desapropriação- sanção realizada em áreas rurais, a qual é de competência da União, responsável pela implementação de políticas voltadas à reforma agrária. Neste caso, a indenização ocorrerá em títulos da dívida agrária, resgatáveis em até vinte anos, a partir do segundo ano de sua emissão. A execução da medida expropriatória será efetuada pelo INCRA – Instituto de Colonização e Reforma Agrária, que é uma autarquia federal vinculada ao Ministério da Agricultura.

O texto constitucional ressalvou da desapropriação rural a pequena e média propriedade rural, quando seu proprietário não possuir outra, bem como a propriedade produtiva. Sobre essa matéria, interessa mencionar recente decisão do STJ sobre a possibilidade de o INCRA promover a desapropriação de imóvel rural cuja área é inferior ao módulo fiscal. Na ocasião, intentou-se buscar o critério mais adequado para se estabelecer a classificação de pequeno, médio ou grande imóvel rural, optando o STJ por levar em conta a área aproveitável em lugar do tamanho do imóvel.

Observa-se que não sem razão a Constituição atribui à União a realização da desapropriação no âmbito rural para fins de reforma agrária, dado à dimensão continental do território brasileiro e a gravidade de conflitos que emergem nesta esfera. Demanda-se, por conseguinte, uma atuação ampla do poder público, sendo fadada ao insucesso eventual tentativa de se fragmentar a atuação estatal nesta questão.

Sobre a responsabilidade civil do Estado decorrente da desapropriação, cumpre citar a diferenciação inaugurada por Celso Antônio Bandeira de Mello entre o que chama de “sacrifício de direito” e a responsabilidade extracontratual do Estado. Nas palavras do autor, seria "necessário discernir, e sacar para fora do campo da responsabilidade, apenas os casos em que o Direito confere à Administração poder jurídico diretamente preordenado ao sacrifício do direito de outrem. Diversamente, consideramos inclusos no tema da responsabilidade os casos em que uma atividade lícita do Estado, orientada para certo fim não necessariamente entre chocante com o direito de outrem, vem, todavia, a compor situação na qual este resulta transgredido, como consequência mediata do comportamento estatal lícito”.

Adotando o entendimento acima esposado, infere-se que sendo a desapropriação ato cujo conteúdo próprio é o sacrifício de direito, e não mero efeito colateral de atividade diversa, a indenização atribuída ao proprietário tem como lastro jurídico não a responsabilidade civil extracontratual do Estado, mas o princípio da isonomia e a vedação ao enriquecimento ilícito. É dizer, se a desapropriação é destinada ao bem comum, não se justifica que o expropriado suporte um sacrifício maior que os demais, sendo este, portanto, o fundamento indenizatório.

Ademais, necessário destacar que eventuais abusos de poder não poderão ficar imunes do controle administrativo ou judicial, cabendo reintegração de posse e domínio na hipótese de não ser o bem destinado a qualquer finalidade pública ou simplesmente indenização caso o poder público confira destinação pública ao bem, ainda que diversa daquela que motivou o ato expropriatório – predestinação lícita.

O Código Civil prevê ainda, em seu artigo 519, que na hipótese de o bem não ser empregado no destino para que se desapropriasse a preferência do expropriado em reaver o bem pelo preço atual da coisa.

Não se pode, por fim, confundir a instituto da desapropriação com o confisco, este previsto na Constituição Federal no art.242 nas hipóteses de cultivo ilegal de plantas psicotrópicas e no caso de bens de valor econômico apreendido em decorrência do tráfico ilícito de entorpecentes. No primeiro caso, as glebas onde se procedeu ao cultivo ilegal são destinadas ao assentamento de colonos, a fim de que estes realizem o cultivo de medicamentos e produtos alimentícios. No caso de apreensão de bens de valor econômico, estes serão revertidos em prol do tratamento de dependentes químicos e da repressão ao tráfico.

Os casos acima são hipóteses mais graves de descumprimento da função social, pois não consiste apenas na não promoção do aproveitamento desejável do terreno, mas na efetiva utilização do bem no sentido do “desserviço” social. Sobre o tema, o STF já proferiu decisão no sentido de que “a expropriação de glebas a que se refere o art.243 da CF há de abranger toda a propriedade e não apenas a área efetivamente cultivada”.

Em que pesa a existência de detalhado regramento infraconstitucional sobre a desapropriação, estes se revelam secundários a presente proposta, de modo que os fundamentos normativos que lastreiam o procedimento expropriatório na esfera constitucional encontram-se nos analisados artigos 5º, 182 e 184 a 185 da Constituição Federal, os quais cuidam basicamente da desapropriação para fins de interesse social.

Da analise dos aspectos acima mencionado, conclui-se que a desapropriação, quando realizada em consonância com os preceitos e princípios constitucionais, afigura-se como uma limitação legítima ao direito de propriedade. Isto porque sendo destinada ao interesse público primário, demonstra a preocupação, inexistente nos Estados Liberais, com uma política social envolvendo institutos antes hermeticamente “blindados” pelas disposições dos códigos civis.

Trata-se de salutar opção do constituinte a de vincular a função social à proteção da propriedade, o que, contudo, não suplanta a carência de tratamento mais detalhado da desapropriação para fins de utilidade e necessidade pública.

Aliás, haveria que se conferir expressos limites à supressão da propriedade nos dois casos acima mencionados, sob pena de se permitir uma perigosa amplitude na discricionariedade estatal, passível, inclusive, de corromper o interesse público primário em exclusivamente secundário e submisso ao arbítrio do poder público. Sob esse aspecto, a dignidade da pessoa humana deve ser observada a fim de reduzir a vulnerabilidade dos particulares na hipótese de, por exemplo, o poder público optar pela desapropriação por zona em face de sua incapacidade ou desinteresse em instituir contribuição de melhoria na região.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

A Constituição Federal de 1988 erigiu ao mesmo patamar de direito individual tanto o direito de propriedade quanto o poder-dever do Estado em desapropriá-la quando diante de situações excepcionais pautadas em interesse e utilidade públicas bem como no caso de interesse social. Isso indica o cuidado em coadunar um direito historicamente absoluto e perpétuo, como é o direito de propriedade, com a nova proposta de Estado Constitucional de Direito. Igualmente, não mais se concebe institutos como exclusivamente de direito privados e alheios à eficácia irradiante dos direitos fundamentais.

Percebe-se ainda que a preocupação em preservar o direito de propriedade deve sim subsistir como manifestação de um Estado verdadeiramente democrático, ao qual cabe garantir ao particular o mínimo de segurança jurídica, apta a proporcionar uma existência digna. Além disso, para que se possa caminhar no sentido do verdadeiro desenvolvimento nacional, o qual, por óbvio, não se restringe ao âmbito econômico, o direito de propriedade deve ser assegurado como prioridade.

Sobre esse aspecto, merece crítica, como já mencionado, a escassez de regulamentação constitucional acerca da desapropriação para fins de utilidade e necessidade pública em contraste com o exaustivo tratamento dispensado à desapropriação para fins de interesse social.

Com maior razão, deveria o constituinte se preocupara com a hipótese mais invasiva de desapropriação, ao menos do ponto de vista individual, que é aquela em que a despeito de o proprietário lhe conferir uma função social, prevalece o interesse público na supressão do bem. Ora, uma intervenção de tal monta não pode ser relegada ao arbítrio do poder público que, não raras vezes subverte o interesse público primário em secundário.

Afora isso, percebe-se que o instituto da desapropriação, conforme disposto na Carta Magna, e desde que observados os princípios basilares tanto da administração pública, em particular quanto àqueles que orientam a própria República Federativa do Brasil, é medida estratégica para a construção de uma sociedade menos discrepante e excludente.

Dr João Evangelista
Enviado por Dr João Evangelista em 16/05/2013
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