Do inquérito policial

Nem sempre as leis asseguravam as vontades repressivas de seu contexto histórico

Em 1934 a Constituição Federativa brasileira aboliu a possibilidade dos Estados terem seu próprio Código de Processo Penal, o que veio definitivamente simplificar, impondo em novo diploma legal que só estaria pronto mesmo em 1941.

A medida foi acertada tendo em vista que os Estados-membros só fizeram fórmulas confusas e complexas de julgamentos, não contribuindo positivamente para justiça brasileira.

Antes mesmo do Código de Processo Penal de 1938, houve o Decreto 167, de janeiro de 1938 que reservou ao tribunal do júri para poucos crimes tais como: infanticídio, induzimento ou auxílio ao suicídio, duelo com morte, latrocínio e, finalmente homicídio. Note-se que o aborto que em hoje dia é julgado pelo Tribunal do Júri restou excetuado deste âmbito.

Então, o tribunal do Júri passou a decidir apenas os crimes dolosos contra a vida.Aliás, aponta-se a origem do júri na Inglaterra. Alguns autores invocam o Concílio de Latrão em 1215 quando se aboliram as ordálias, em que a decisão era confiada aos elementos. Saindo incólume dessas provas, demonstrava, perante o Juízo de Deus, sua inocência.

Diz-se que o júri julga de fato, o que não é verdade, pois o fato é inseparável do direito.Bem escreveu Asúa que: “O juiz leigo fica sem papel na Justiça criminal de hoje”.

A favor do júri se aponta a severidade do juiz togado. A verdade é que o jurado que não conta com as garantias dadas ao juiz togado, está suscetível a influências de toda espécie. Garofalo escreveu lauto libelo contra o júri. E há ainda outro defeito que é o da morosidade, pois o julgamento é mais lento e complicado do que o julgamento pelo juiz.

A atual Constituição Brasileira restabeleceu o princípio da soberania do país declarando expressamente em seu art. 5º. XXXVIII.

Gerado em plena era getulista o Código de 1941 teve sua ideologia bem elucidada pelo ministro Francisco Campos em sua Exposição de Motivos: “Não se pode contemporizar com pseudodireitos individuais em prejuízo do bem comum”.

Durante os sessenta anos de sua vigência, o referido diploma legal resistiu a duas ditaduras a getulista e militar ocorrida após o Golpe de estado em 1964.

Nem sempre as leis asseguravam as vontades repressivas de seu contexto histórico, e, por fim acabavam por adaptar suas disposições aos ideais liberais e humanistas.

Em 1977 apesar de em plena ditadura, mas num período alcunhado de “abertura”, a Lei 6.416/77 criou outras possibilidades de libertação dos acusados suspeitos de crimes antes da sentença. Comenta-se que fora a lotação das prisões o propulsor da reforma ocorrida em 1977, o que em nada ofusca o mérito das soluções apresentadas.

Atualmente sob a vigência da redentora Constituição Federal Brasileira de 1988, a prisão anterior à condenação só é possível se houver necessidade (em caso de constranger testemunhas, ocultar provas, ou ainda, ameaçando fugir para não cumprir pena).

A Lei 7.960/1989 criou a prisão antes da sentença chamada de temporária e, pode ser decretada sem os requisitos exigidos para a prisão preventiva. De questionável constitucionalidade, o que na opinião de Magalhães Noronha não parece atentar contra a Carta Magna, pois manteve a prisão cautelar ou qualquer outra coerção processual, como se atesta do art. 5º., LXI da CF. Exigindo que seja judicial e fundamentada.

A prisão temporária é cabível, a saber:

a) em primeiro lugar quando “imprescindível para a investigação criminal”; b) quando visa assegurar a execução de uma eventual condenação (quando não tiver residência fixa) ou o indiciado embaraçar a investigação, ocultando provas que possam esclarecer sua identidade; c) o cabimento diz respeito ao crime imputado (homicídio doloso, seqüestro ou cárcere privado, roubo, extorsão, extorsão mediante seqüestro e, etc.) todos aqueles reveladores de péssima índole do indiciado e capazes de provocar a repulsa social.

Como diria o legislador os chamados crimes hediondos e que por si só causam clamor popular. E para a decretação da prisão temporária basta a fundada suspeita de autoria.

Em 1965, a Lei 4.898 foi promulgada para regulamentar os processos por abuso de autoridade, estabelecendo punição para numerosas arbitrariedades, inclusive para as prisões ilegais.

O direito apesar de dogmático vem através da hermenêutica suas normas assumir uma elástica semântica, variando em muito em razão do momento histórico. E nem sempre o que a lei exprime corresponde ao que existe no processo penal e, nos bastidores das mais badaladas cenas processuais documentadas.

O nosso atual Código de Processo Penal é herói que resiste a três constituições Federais e suas muitas emendas. A Declaração Universal dos direitos Humanos (ONU) que já é tão antiga, pois que editada em 1948 interferiu e deu novos rumos ao direito processual penal brasileiro, enfatizando a regra de que ninguém pode ser considerado culpado antes do julgamento e, re sem a respectiva condenação.

O processo penal modifica-se toda vez que se alteram as estruturas institucionais que acolhem os agentes oficiais que o movimentam. O Poder Judiciário, a polícia e o Ministério Público, nos últimos cinqüenta anos têm se modificado o que impõe condutas e limites e credenciando assim novas interpretações diversificadas da lei.

Recentemente o STF modificou seu entendimento da Súmula 394 que sustentava que deputados, senadores, juízes e outros detentores de cargos públicos fossem processados criminalmente por tribunais superiores mesmo após o término de mandato e exercício de cargo.

Tal mudança de mentalidade ainda sem amparo legislativo específico já traz a tentativa de abolir os privilégios e instaurar a tão desejada igualdade entre os cidadãos.

De qualquer modo, a legislação esparsa na área processual penal vem pouco a pouco adequando o Código de Processo aos novos tempos, e já se contabiliza em torno de trinta e uma leis que modificaram substancialmente seus dispositivos.

O discurso humanista volta-se, mormente para erradicação da miséria, da violência, e para punição do crime organizado. E, neste sentido, há de se sublinhar programas governamentais como o da Fome Zero.

A remota mobilização voltada dantes para a garantia dos direitos individuais, agora se volta particularmente para o combate à impunidade e para a segurança pública.

Registre-se ainda a forte pressão internacional principalmente depois do dia 11 de setembro de 2002 para o combate ao terrorismo, ao tráfico de entorpecentes e aos crimes transnacionais (como tráfico de mulheres e crianças).

Recentemente a legislação brasileira vem acolhendo a possibilidade de infiltração de agentes policiais no mundo do crime, de delação anônima, da recompensa, prisão temporária, interceptação telefônica e a possibilidade da criação de serviço de proteção de proteção às testemunhas.

É a especialização da repressão penal que não foi aceita ainda pela Constituição federal Brasileira de 1988.

A crescente politização da justiça e, por conseqüência do judiciário interfere nos estudos jurídicos atuais e, na objetividade jurídica bem, como na indispensável imparcialidade que deve presidir os julgamentos.

E, dentro de tal contexto até se justifica, por exemplo, a Lei da Mordaça.

O fenômeno da influência da mídia sobre os julgamentos criminais não em nada inédito, basta lembrarmos dos casos como o do Doca Street, o da Lu e a da fera da Penha. Já em 1920 Célia Bernardi escrevia sobre um lendário ladrão chamado Gino Meneghetti que virou celebridade assim como Fernandinho Beira-Mar e, que viveu muitos anos em solitária. Porém, hoje em dia, não existe mais o bom ladrão.

Os que lidam com os processos criminais precisam cuidado para não se abandonar princípios fundamentais, trais como o da ampla defesa, e da verdade real.

Constitucionalmente há a previsão de que o homem é inocente até decisão condenatória em contrário.

Por outro lado, há de se combater a mentalidade que aprova violências contra os “bandidos”, não nenhuma proteção e segurança real senão através do cumprimento da lei dentro do que chamamos de Estado Democrático de Direito.

É vexatório mais ainda existe tortura no Brasil, pelo menos é o que reconhece o “relatório sobre a Tortura no Brasil” produzido pelo relator especial sobre a tortura da Comissão de Direitos Humanos da ONU (11/04/2001).

Apesar de todos os esforços a realidade do processo penal brasileiro ainda é desalentadora. Atualmente os presos se fazem ouvir através de ruidosas rebeliões, mas que são coibidas com violência sem atingir o cerne da questão como a superpopulação carcerária e ainda a crescente miséria e exclusão que há no país.

Enfatizam-se muito mais os direitos sociais e recrudescem os ideais liberais e libertários bem como a esperança de normalização democrática e jurídica do país.

A Constituição Federal Brasileira de 1988 estabeleceu um detalhado rol de direitos e garantias individuais o que certamente veio alterar a interpretação de normas processuais penais.

Assim foi fixado que ao Estado caberia invadir o mínimo possível, a esfera de liberdade e privacidade individuais. A mesma Carta Magna elegeu o Ministério Público para ser a instituição controladora da Polícia e, implementou entre suas atribuições, a de zelar pela ordem jurídica, pelo regime democrático e dos direitos sociais e individuais indisponíveis.

O Ministério Público autônomo e independente e, sem a vinculação ao poder Executivo pode e deve litigar contra o governo principalmente em face do bem-estar público.

Visto em suas duas etapas o processo penal brasileiro seja pela fase da investigação, seja pela fase de produção de prova, defesa e julgamento deve sempre garantir o acesso à justiça.

A primeira fase é a desenvolvida por um instrumento chamado de inquérito policial que é realizado pela Polícia (do grego politéia – de pólis cidade) (significou a princípio o governo da cidade).

Em Roma, o termo politia adquiriu uma acepção especial significando a ação do governo no sentido de “da manter a ordem pública e a tranqüilidade e paz interna”, posteriormente passou a designar o “próprio órgão estatal incumbido de zelar sobre a segurança dos cidadãos”.

Já a segunda fase, no processo penal que pode ser promovido pelo membro do Ministério Público, portanto por impulso oficial, ou pelo ofendido, nos poucos casos em que a lei permite.

Relevante ressaltar é que na fase investigatória, o juiz só atua quando estritamente necessário para proteger a intimidade ou a liberdade, deferindo ou não interceptações telefônicas, quebras de sigilos, prisões temporários ou preventivas.

È verdade que nem sempre a Polícia investiga com exclusividade crimes, há casos em que o MP (é constitucionalmente designado para acusar e prosseguir no processo penal, representando a sociedade) também investiga.

Também as CPIs (comissões Parlamentares de Inquérito) também investigam e, ainda outras instituições como a Receita Federal e o banco Central investigam os casos relacionados aos crimes contra a ordem tributária e o sistema financeiro.

O ideal seria que o CPP reformado disciplinasse todas as formas de investigação criminal que foram possibilitas a partir da legislação extravagante.

Infelizmente, não há consenso político suficiente para que haja aprovação de um projeto de código que sistematicamente reúna todas as novidades e que se reconheça não só uma atribuição de investigar, mas também um viés educador ao repreender socialmente o crime e as contravenções.

O inquérito policial é peça meramente informativa e, não absolutamente indispensável, possui natureza administrativa sendo escrito e sigiloso e inquisitivo, onde não há o contraditório.

Até porque no inquérito não há acusado, sendo medida preparatória para o exercício da ação penal e, até dispensável, se o titular da ação penal dispor de elementos suficientes que autorizem a ingressar em juízo.

A Lei 9.099/95 foi uma inovação salutar e estabeleceu a possibilidade de transação e suspensão do processo penal quando praticadas infrações de menor potencial ofensivo e às quais são apenas com pena privativa de liberdade de curta duração (de até dois anos).

Pretende-se inovar as formas de composição das lides criminais com a diminuição do número de processos criminais que vem cada vez mais assoberbar a já desgastada estrutura do poder Judiciário brasileiro.

A lei dos Juizados Especiais Criminais resolve certas questões onde os acusados ou suspeitos livram-se da persecução penal e não se incomodam de cumprir condições como o comparecimento mensal ao juízo para justificar atividades ou a entrega de cestas básicas a instituições carentes. Porém, por outro lado, perdem a oportunidade valiosa de provar sua inocência.

Também é difícil compreender que tais condições impostas e que precisam ser fielmente cumpridas para que se dê à suspensão processual, ou mesmo seu arquivamento, não se constituem pena.

E se assim o for, contrastaria visceralmente com o texto constitucional que informa e proíbe pena anterior ao processo.

Ademais, outros conflitos são resolvidos com menor esforço onde ocorre inclusive a dispensa da presença de advogados bem como a presença do processo na folha corrida do acusado.

Polêmica e até mesmo criticável a Lei 9.099/95 que ensejou os Juizados Especiais Cíveis e Criminais significou apesar disto um abrandamento na punição de certas condutas, sem descriminalizá-las.

Há também outras novas medidas como a revalorização do papel da vítima e o incentivo à reparação civil de danos causados.

O sistema processual penal vigente enxerga o inquérito policial como preliminar ou preparatório da ação penal conforme se extrai do item IV da Exposição de Motivos do CPP.

É então uma instrução provisória, notadamente um procedimento administrativo destinado segundo a dicção do art. 4º, do CPP a apurar a infração penal e a autoria.

Do inquérito policial se encarrega a Polícia judiciária que é quem legitimamente exerce o poder de polícia.

Inicia-se o inquérito policial com a notitia criminis através da qual a autoridade policial toma conhecimento de um fato aparentemente criminoso. Por tal notitia criminis ser levada pelo próprio ofendido ou o seu representante quando se denominará de delatio criminis que é simples e postulatória.

Também pode o inquérito iniciar-se mediante requisição da autoridade judiciária ou do MP, evidentemente, nos crimes de ação pública. A competência delineada no a rt. 4º. Do CPP não exclui as autoridades administrativas a quem por lei seja atribuídas à mesma função. È possível, portanto a existência de inquérito extrapoliciais.

Há entendimento no sentido de que o art. 144, § 4º, da CF, não mais permite que seja o inquérito, nas infrações penais comuns, presidido por outra autoridade que não a policial, aliás, conforme consta no Manuela de Direito processual penal de Fernando da Costa Tourinho Filho.

A vingar tal tese, são inconstitucionais os arts 43 do Regimento Interno do STF e 58 do regimento Interno do STJ, e ainda os arts. 103 a 108 da Lei de Falências que cuidam do inquérito policial.

Se a investigação policial se dá a pedido do ofendido, é necessário que contenha certos requisitos descritos no § 1º, do art. 5º, sempre que o lesado ou vítima puder prestar as informações.

Tal requerimento poderá ser escrito ou oral (mas de qualquer maneira reduzido a termo pelo escrivão de polícia). Contudo, a autoridade policial pode entender em não abrir o inquérito quer pelo fato não se configurar como crime, quer pela insuficiência de elementos indicados pelo requerente, ou por motivo justo, indeferindo então o pedido.

Cabe, todavia ao requerente se inconformado com a decisão, impetrar o recurso para o Chefe de Polícia (art. 5º, §2º, do CPP), ou seja, ao Secretário de Segurança Pública.

No entanto, se o requerimento partir dos órgãos da Justiça, não é lícito à autoridade policial deixar de abrir o inquérito até porque não será ele que promoverá a ação penal ou que a julgará futuramente.

Não possui o inquérito um específico rito descrito em lei que tão-somente traçou as diligências que devem ser efetuadas.

A autoridade policial deve atuar com presteza, antes que se altere o local do crime ou desapareçam provas ou vestígios da existência do delito, enfim, deve colher ao vivo os elementos da infração capaz de elucidar cabalmente o fato e suas circunstâncias conforme prevê o art. 6º e seus incisos I, II e III do CPP.

Deve ainda ouvir o ofendido que em geral dará as informações mais nítidas e relevantes para o inquérito. Ato de extrema relevância é o interrogatório do indiciado onde preliminarmente deve o indiciado ser devidamente identificado.

A identificação policial datiloscópica e fotográfica era ato legal porém ofensivo e vexatório daí a atual Constituição Federal estabelecer que o civilmente identificado não será identificado criminalmente

O termo interrogado é impróprio, pois que interrogatório é ato privativamente judicial, em verdade, no inquérito policial, o indiciado é tão-somente “ouvido”, é o informa o art. 6º,V do CPP.

È indispensável que seja assegurada ao acusado a faculdade de não responder ao que lhe for perguntado, que aconselha a aplicação dos arts. 185 a 196 CPP no que for cabível.

Deve ainda a autoridade policial proceder à nomeação de curador ao indiciado menor de 21 anos. A recusa a responder deve igualmente ser consignada nos autos do inquérito.

A lei também menciona a necessidade de duas testemunhas que devem assinar o termo de interrogatório, após ouvirem sua leitura, em presença do indiciado.

É igualmente dever da autoridade policial proceder ao reconhecimento de pessoas, coisas e acareações que seguem as normas constantes dos arts. 226 a 230 do CPP.

O corpo de delito e das perícias em geral é disciplinado conforme o arts. 6, VII, art. 158 a 184 do CPP. E não se confunde exame de corpo de delito com corpus delicti.

Corpus delicti equivale ao fato típico, ou seja, ao fato que se subsume no tipo, ou na figura descrita na lei penal. Já o exame de corpo de delito é a verificação dos elementos exteriores ou da materialidade da infração penal, é atribuição do perito.

A autoridade deva averiguar a vida pregressa do indigitado antes da infração, analisando os aspectos individual, familiar e social, e economia.

Aliás, o conhecimento da personalidade do indiciado de crucial importância para a futura individualização da pena. Sendo necessário, deve ainda procede a reconstituição do crime (art. 7º) e se houver prisão em flagrante observar-se-ão os arts. 301 a 310 do CPP.

O conceito de flagrante delito é bem amplo e não se limita apenas ao crime in faciendo (art. 302CPP).

O dicionário Jurídico da Academia Brasileira de Letras Jurídicas organizado pelo J. M. Othon Sidou define in verbis: flagrante delito “Circunstância em que o agente é surpreendido ao cometer a infração penal ou acaba de cometê-la; ou, ainda, quando é perseguido, logo após, pela autoridade, pelo ofendido ou por qualquer pessoa, em situação que faça presumir ser o autor do delito; ou, se encontrado, logo depois, com instrumento, arma, objeto ou papel que induza igual presunção” (art. 5º, XI, LXI CF/88, art. 301CPP).

Esclarece Damásio Evangelista de Jesus que existe flagrante em sentido próprio, impróprio e, ainda o flagrante presumido.

Em sentido próprio é o verdadeiro flagrante, quando o sujeito está cometendo infração penal ou acaba de cometê-la (incisos I e II).

Ocorre em sentido impróprio ou quase-flagrante quando o sujeito é perseguido, logo após a prática da infração penal, pelo ofendido ou por qualquer pessoa, em situação que faça presumir ser ele o autor da infração (inciso III).

Por derradeiro, existe o flagrante presumido quando o sujeito é encontrado, logo depois, com instrumentos que façam presumir ser ele o autor da infração (inciso IV), é o flagrante ficto.

Tanto a doutrina como a jurisprudência interpretam a expressão “logo depois” como indicadora de perseguição por parte da autoridade policial e não de uma simples procura do indigitado ao autor.

É bastante curial o teor da Súmula 145 do STF quando salienta: “Não há crime quando a preparação do flagrante torna impossível a sua consumação”.

Silencia o CPP a cerca da audiência de testemunhas só a mencionando no art. 5º, § 1º, letra c ao tratar do requerimento do ofendido.

É excessiva a importância conferida à prova testemunhal no processo penal, e, nesse sentido é valiosa a lição ministrada por Andrei Vishinski ao dizer que: “as testemunhas mais vivazes e probas contradizem-se freqüentemente, com a realidade, e cometem grosseiros equívocos em conseqüência de uma percepção má ou simplesmente errônea dos fatos que presenciaram”.

Mais adiante, o mesmo doutrinador salienta o quão curial é a observação e a memória da testemunha. Bem mais do que no processo civil, a prova testemunhal é uma prova por excelência, sendo necessário cuidado em seu arrolamento como também na inquirição sob pena de desmoralizar tal meio probatório.

Sob aspecto formal, funda-se o inquérito policial com a portaria da autoridade ou com o auto de flagrante e termina com o relatório do delegado. É instrumento por escrito e contém outras peças como termos, certidões, mandados e, etc.

A primeira peça do inquérito vai depender da natureza do crime, em se tratando de crime de ação pública incondicionada, a autoridade policial dele tomando ciência, instaura o inquérito de ofício ou mediante a requisição da autoridade judiciária ou do MP.

Em se tratando de crime de ação privada é instaurado o inquérito mediante requerimento do ofendido ou de quem for seu representante conforme os termos do art. 5º, do CPP. Onde deverá narrar o fato munido de todas suas circunstâncias, individuar o pretenso culpado ou dar-lhe sinais característicos e as razões de convicção ou presunção de ser ele o autor da infração, ou ainda elucidar os motivos pelos quais deixa de fazer, nomear testemunhas, com qualificação complete e indicando residência e domicílio sempre que possível.

Tratando-se de infração de menor potencial ofensivo (contravenções e crimes não sujeitos a procedimento especial) onde a pena máxima in abstracto não exceda a um ano, não haverá necessidade de inquérito.

A autoridade policial, in casu limitar-se-á a elaborar um Termo Circunstanciado de que deve constar:

I. Narração sucinta do fato e de suas circunstâncias, com indicação do autor, do ofendido e das testemunhas;

II. Nome, qualificação e endereço das testemunhas;

III. Ordem de requisição de exames periciais, quando necessários;

IV. Determinação da sua imediata remessa ao órgão do Ministério Público oficiante no juizado criminal competente, com as informações colhidas, comunicando-as ao Juiz;

V. Certificação da intimação do autuado e do ofendido para comparecimento em juízo no dia e hora designados.

Deverá ainda a autoridade policial abster-se de classificar ou dar definição jurídica do crime posto que é atribuição do Promotor Público ou do querelante. É vedado assim emitir quaisquer juízos de valor sobre o fato investigado.

Estando o indiciado preso (seja por flagrante ou preventivamente) deverá estar terminado no prazo de 10(dez) dias, pouco importando a existência de co-autores soltos ou foragidos.

Em seu décimo primeiro dia após a prisão deve ser entregue à distribuição na Justiça Criminal.

Não havendo indiciado preso, é de trinta dias o prazo para encerramento do inquérito.Malgrado a redação do art. 10 do CPP, se o Juiz decretar a prisão preventiva não haverá necessidade dos autos retornarem à autoridade policial para a conclusão do inquérito. Pois a lei é muito mais exigente para a decretação da prisão preventiva do que exatamente para o oferecimento da denúncia. Sendo assim, presentes os elementos para decretação da preventiva, com muito mais razão para a oferta da denúncia.

Na Justiça Federal, o prazo para a conclusão do inquérito, estando o indiciado preso, é de quinze dias, podendo ser prorrogado por mais quinze dias, a pedido, devidamente fundamentado da autoridade policial e deferido pelo Juiz a que competir conhecer do processo conforme dispõe o art. 66 da Lei 5.010, de 30/5/1966.

Para Magalhães Noronha o prazo para conclusão do inquérito é improrrogável estando o indiciado preso, do contrário permite a lei a prorrogação do prazo, mediante consentimento do juiz que fixará o prazo devido e determinará a devolução dos autos à Polícia, uma vez que justifique essa necessária devolução.

Para Fernando da Costa Tourinho Filho em atenção aos termos do § 3º, do art. 10, quando o fato for de difícil elucidação e o indiciado estiver solto, a autoridade poderá requerer ao Juiz a dilação do prazo. Não se cogita em ouvir o MP e muito menos o querelante. Todavia, é curial que assim se proceda.

Estando o indiciado preso, a lei não permite a dilação conta-se 10 dez dias a contar da data em que se verificou a prisão. Não concluído o inquérito, o indiciado ou alguém por ele poderá impetrar o habeas corpus com fundamento no art. 648, II do CPP.

Tratando-se de crime contra a economia popular, o prazo para a conclusão do inquérito, esteja preso ou solto o indiciado, é de dez dias consoante no § 1º, do art. 10 da Lei 1.521 de 26/12/1951.

Quanto aos delitos ligados aos entorpecentes, o prazo para conclusão do inquérito estando preso o indiciado é quinze dias, nos termos do art. 29 da Lei 10.409 de 11/1/2002. Se estiver solto, o prazo será de 30 dias.

Em ambos os casos tais prazos poderão ser duplicados pelo juiz mediante pedido justificado. O procedimento continua sendo o previsto na lei 6.368/76.

Em que pese a opinião em contrário de Tourinho Filho por vicejar a lei nova como mais benigna permite a contestação da denúncia antes de seu recebimento, os prazos são mais dilatados e, por último, foi devidamente promulgada e está em vigor. Acrescente-se que a norma processual penal tem incidência imediata nos termos do art. 2º, do CPP.

Se o flagrante for conforme o previsto no art. 307 do CPP tão logo se conclua o autor deverá este, imediatamente, ser remetido à autoridade competente, nos próprios termos do art. 307 do CPP.

Seguindo os autos do inquérito a juízo junto a estes deve também acompanhar os instrumentos do crime e os objetos que interessarem à prova.

A função da Polícia Judiciária não é apenas realizar o inquérito, deve também auxiliar a Justiça, valendo-se dois meios que dispõe para prestar informações indispensáveis ao processo criminal, bem como efetuar as diligências requisitadas pelo Juiz ou pelo MP, cumprir mandados de prisão que praticamente fica só a seu cargo.

É incumbência da Polícia representar acerca da prisão preventiva (art.13, IIICPP), é a autoridade policial quem primeiro sente necessidade dessa prisão. É indispensável por se tratar de medida de exceção que a representação seja fundamentada conforme dispõe os arts. 311 e seguintes do CPP.

O inquérito policial brasileiro é de caráter inquisitivo, gozando a autoridade policial de discricionariedade que não se trata de arbítrio, tanto assim que esta se submete ao cumprimento de prazos e, não pode arquivar o inquérito por sua deliberação.

As atribuições da autoridade policial em geral são discricionárias, somente lhe é facultado agir livremente dentro dos respectivos limites legais.

Podendo, portanto, indeferir requerimento de diligências do ofendido, seu representante legal e do indiciado (art.14); assegurar o caráter sigiloso da investigação, quando necessário

(art.20); e decidir sobre a incomunicabilidade do indiciado.

No que se refere à incomunicabilidade do indiciado cabe a modificação introduzida pela art. 69 da Lei 5.010/1966 que impõe que esta seja imposta e decretada pelo juiz, em despacho fundamentado, e a requerimento da autoridade policial ou do MP sendo sempre assegurada a comunicabilidade do preso com o seu defensor.

Dada a natureza administrativa do inquérito policial não se compadece em ser contraditório. O direito do acusado refere à instrução contraditória ex vi o art. 5º, LV da CF.

O sigilo da investigação é da essência do inquérito, o que não chega a ponto de se remeter ao juízo sem que se tenha ouvido o indiciado.

Acerca da incomunicabilidade não poderá esta exceder a três dias e sempre vinculada ao interesse social e à conveniência da investigação.

Alguns doutrinadores entendem que se encontra sub-rogado o art.21 em face do art. 5º. LXIII da CF. Já Ari Franco entre outros opinam por sua constitucionalidade.

Os requisitos da incomunicabilidade são a legalidade da prisão e o despacho judicial que esclarece e fundamenta a sua imprescindibilidade.

O parágrafo único do art. 21 do CPP não admite prorrogação do tríduo, o mesmo se aplica ao art. 798 § 3º, uma vez que a norma especial prevalece sobre a geral conforme bem pontifica Tornaghi.

A falta de curador ao menor de 21 anos indiciado não pode fulminar o inquérito de nulidade embora existam opiniões doutrinárias dissidentes, mas tendo em vista a natureza eminentemente informativa deste, salvo naqueles atos que dificilmente se renovam em juízo, como por exemplo, os exames periciais.

Todavia, por meio de auto de prisão em flagrante delito, se não forem observadas as formalidades legais este será imprestável para ser capaz de autorizar o encarceramento do indiciado.

Não é aplicável por analogia o art. 564, III, letra c do CPP que se refere ao réu menor e não ao indiciado, como se refere também ao réu ausente. Nulidade somente haverá quando se tratar de processo contravencional.

Os arts. 17 e 18 disciplinam sobre o arquivamento do inquérito que somente pode ser determinado por autoridade judiciária. Porém, a autoridade policial devido ao arquivamento não fica proibida de prosseguir em novas diligências para melhores esclarecimentos sobre o fato e, respectiva autoria posto que função indeclinável da Polícia.

Não deve, pois a autoridade policial emitir juízo de valor. A opinio delicti cabe ao titular da ação penal e não àquele que se limita simplesmente, a investigar o fato infringente da norma e quem tenha sido o seu autor. Por isso mesmo, não pode em qualquer hipótese determinar o arquivamento dos autos do inquérito.

O pedido de arquivamento nos crimes de ação pública fica afeto ao órgão do MP. Somente este poderá requerer ao juiz que seja arquivado o inquérito. Do contrário agirá em conformidade com ao rt. 28 do CPP.

Sendo da alçada privada o delito, não de se cogitar de arquivamento, restará arquivado quando a pessoa com o direito de queixa, deixa de intentar a ação penal. Nada obsta que a pessoa possa pedir o arquivamento que equivalerá à renúncia e, nesse caso, cumpre ao juiz decretar a extinção da punibilidade nos termos do art. 107, V do CP.

Não se pode desarquivar o inquérito sem novas provas que alterem o anterior panorama probatório conforma a dicção da Súmula 524 do STF.

Ainda que o inquérito seja suficiente para balizar a denúncia, pode, entretanto, o MP requisitar outras diligências que ocorrerão em apartado e, mais tarde, serão remetidas ao juízo criminal.

O que não é inteligível é quando após obter a prisão preventiva do indiciado, o MP peça o retorno dos autos do inquérito policial para a autoridade policial, pois uma vez decretada essa medida de exceção, é porque já existe o corpus delicti, isto é, fato típico provado, e conseqüentemente a opinio delicti necessária para robustecer a denúncia.

Tratando-se de crime que se procede mediante queixa ou ação privada, o inquérito findo será entregue ao requerente, pois possui a disponibilidade da ação. É o ofendido ou seu representante que é o dominus litis, ficarão traslados na Polícia por medida de segurança.

Não pedindo o ofendido os autos do inquérito, estes serão remetidos ao juízo competente aguardando sua iniciativa.

O valor do inquérito extrapola ao teor informativo do processo, pois que contém peças de valor probatório que quando regularmente realizadas são hábeis para concorrer para a formação da livre convicção do juiz a respeito da lide criminal.

Não obstante a natureza inquisitorial da investigação policial, esta é integrante do complexo probatório que informará todo o processo criminal.

Com o advento da Lei 9.0 99 / 95, ipso facto com a criação do juizado Especial Criminal que veio a regulamentar o art. 98, I do CF/1988 passamos a ter um juizado de instrução (na opinião de alguns doutrinadores) embora sem a pureza integral desejada.

Informa o art. 77§ 1º, da referida lei que o inquérito é peça indispensável, embora não proibida, e em alguns casos necessária, sendo que a autoridade policial seja com a notitia criminis ou a delatio criminis lavrará termo circunstanciado que poderá ter autuação sumária ou mesmo somente boletim de ocorrência, remetendo tais peças ao juízo especial.

Parafraseando Churchill (“a democracia é o pior dos regimes, à exceção de todos os outros”) conforme bem elucida Tourinho Filho o inquérito policial como instrução preparatória para a instauração do processo, é o pior de todos, à exceção dos demais...

Referências

Romeiro, Jorge Alberto Da ação penal, 2ª. ed., Rio de Janeiro, Forense, 1978.

Lima, Polastri Marcellus Curso de Processo Penal, Rio de Janeiro, Lúmen Júris, 2002.

Noronha, E. Magalhães Curso de direito processual penal, São Paulo, Saraiva, 2002.Tourinho Filho, Fernando da Costa Manual de processo penal, São Paulo, Saraiva, 2002.

Amaral, Agamenon Bento do Direito Processual Penal – Lições Teóricas e Práticas, Curitiba, Juruá, 1998.

Bajer, Paula Processo penal e cidadania Rio de Janeiro, Jorge Zahar Ed., 2002.

Jesus, Damásio Evangelista de Código de Processo Penal Anotado, São Paulo, Saraiva, 1989.

GiseleLeite
Enviado por GiseleLeite em 10/03/2007
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