ILEGALIDADE DO TERMO CIRCUNSTANCIADO LAVRADO POR AGENTE POLICIAL MILITAR

1. Introdução

A Lei nº 9099/95 modificou as disposições penais e processuais penais até então vigentes, e estabeleceu um novo sistema voltado para as infrações de menor potencial ofensivo. As contravenções e os crimes com pena máxima igual ou inferior a um ano receberam um outro tratamento, o que possibilitou a transação entre o Ministério Público e o cidadão infrator, que antes era vedada por ser a ação penal pública indisponível.

O Estado como responsável pela segurança pública (art.144 da CF) deve prestar um serviço de qualidade à população. A criminalidade no Brasil é uma realidade, que tem sido agravada por dificuldades econômicas e a falta de investimento nos setores essenciais (saúde e educação). A falta de investimentos na área social leva a um desequilíbrio, que está representado pela distribuição de renda.

Os brasileiros e estrangeiros residentes no país buscam na forças policiais a proteção necessária para o exercício dos direitos e garantias fundamentais que lhe são assegurados pela Constituição Federal e pelos instrumentos internacionais que foram subscritos pelo Brasil, como a Convenção Americana de Direitos Humanos.

Os órgãos policiais possuem suas competências delimitadas na C.F. As atividades de polícia ostensiva e preventiva nos Estados-membros da Federação são de competência da polícia militar, enquanto que as atividades de polícia judiciária são de atribuição da polícia civil. No caso de uma agressão, a vítima terá que se locomover até a Delegacia de Polícia para a lavratura do termo circunstanciado. Se um policial militar comparecer no local dos fatos, este não poderá tomar as providências enumeradas na Lei 9099/95.

A lavratura do termo circunstanciado não é privativa da polícia civil. A polícia militar que exerce as funções de polícia ostensiva e preventiva, art. 144, § 5.º, da CF, poderá lavrar o termo, inexistindo neste caso invasão de competência ou usurpação de função.

2. Lei 9099/95 e o policial militar

O Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina concedeu ordem de habeas corpus a um policial militar que foi acusado de usurpação de poder por ter lavrado um termo circunstanciado. Segundo o relator, Desembargador Nilton Macedo Machado, “É de fundamental importância colher-se o espírito da Lei n.º 9099/95, que tem como critério orientador na aplicação da lei a informalidade, dando guarida ao princípio da instrumentalidade e afastando o excessivo apego às formas do processo na tentativa de estabelecer mínima injunção do Direito Penal na vida da comunidade”. (Jornal da Associação dos Magistrados das Justiças Militares Estaduais n.º 29, ano V, set/out, 2000, p.11).

As atividades de segurança pública têm por objetivo assegurar a integridade física e patrimonial dos administrados. Os órgãos policiais são responsáveis pela manutenção ou preservação da ordem pública, e os seus agentes encontram-se investidos da função policial. No texto da Lei 9099/95, a expressão autoridade policial não está restrita a uma determinada força policial. Para a Comissão Nacional de Interpretação da Lei 9.099/95, conclusão nº 09, “A expressão autoridade policial, referida no art. 69, compreende quem se encontra investido em função policial, podendo a Secretaria do Juizado proceder à lavratura do termo de ocorrência e tomar as providências previstas no referido artigo”. (Jornal da Associação dos Magistrados das Justiças Militares Estaduais n.º 29, ano V, set/out, 2000, p.13). (grifo do autor)

Percebe-se que a lavratura do termo circunstanciado por policial militar não configura nenhuma usurpação de função. As polícias civil e militar estão legitimadas a elaborarem o termo circunstanciado. A população não está preocupada com a divisão das polícias, mas espera um serviço de qualidade que atenda as suas necessidades, e que leve a preservação da ordem pública.

O Superior Tribunal de Justiça ao tratar da matéria no julgamento do HC n.º 7199/PR, que teve como relator o Ministro Vicente Leal decidiu que, “PENAL. PROCESSUAL PENAL. LEI N.º 9099/95. JUIZADO ESPECIAL CRIMINAL. TERMO CIRCUNSTANCIADO E NOTIFICAÇÃO PATRA AUDIÊNCIA. ATUAÇÃO DE POLICIAL MILITAR. CONSTRANGIMENTO ILEGAL. INEXISTÊNCIA”.

Segundo o relator, “Nos casos de prática de infração penal de menor potencial ofensivo, a providência prevista no art. 69, da Lei n.º 9099/95, é da competência da autoridade policial, não consubstanciando, todavia, ilegalidade a circunstância de utilizar o Estado o contingente da Polícia Militar, Polícia Civil”.

Portanto, não há que se falar em ilegalidade de termo circunstanciado lavrado por policial militar no exercício da atividade de polícia, que deve estar voltada para o interesse público e o bem comum.

O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, conforme matéria vinculada no Consultor jurídico (www.conjur.com.br), com a aprovação do Conselho Superior da Magistratura Paulista, aprovou a lavratura de termo circunstanciado pelos policiais militares, afastando a exclusividade da polícia civil, como ocorre nos Estados de Santa Catarina e Rio Grande do Sul.

3. Considerações finais

A função policial é essencial no Estado democrático de Direito e tem como missão a preservação dos direitos que foram assegurados pela Constituição Federal as todos os brasileiros e estrangeiros residentes no país. O policial é a presença viva do Estado e deve ser o pacificador das lides sociais. A força, coação administrativa, somente deve ser empregada quando necessária para a manutenção ou restabelecimento da ordem pública.

O policial militar como vêm entendendo os Tribunais, dentre eles, o Superior Tribunal de Justiça, não pratica nenhum ilícito penal quando ao atender uma ocorrência elabora o termo circunstanciado na forma da Lei 9099/95. As polícias possuem suas competências delimitadas no art. 144 da Constituição Federal. No caso das infrações que são de competência do Juizado Especial Criminal não há que se falar em usurpação de função nos atos praticados pelos policiais militares.

A divisão que existe nos Estados-membros em polícia civil e militar não pode e não deve impedir a prestação efetiva dos serviços de segurança pública. A Lei 9099/95 não fez qualquer diferenciação quanto a expressão autoridade policial conforme decisão proferida pelo Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina ao julgar o HC n.º 0.002902-2, publicado no Diário Oficial de Santa Catarina n.º 10.567 de 20.10.2000, p.34.

No Estado de Direito, a polícia possui um papel relevante junto a sociedade. Somente uma força policial integrada e preparada é capaz de combater a criminalidade. A tranqüilidade e a paz social são essenciais para a realização dos objetivos do país, que devem estar voltados para o interesse público e o bem comum.

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