Jovino e o "pretor"
Jovino e o “pretor”
jbcampos
- Pergunta-lhe o magistrado:
- Qual é a sua profissão; senhor Jovino?
Reponde o humilde autor da sentença, homem de ilibada probidade, para usar de pleonasmo forense:
- Sou latoeiro, meritíssimo!
- O senhor pode ser mais claro.
- Sou flandeiro, excelência.
- O juiz, irritadiço, chama-lhe à atenção:
- Explique de forma clara para o júri.
- Pois não, doutor.
- Trabalho com Folhas-de-flandes, no escoamento de água...
- Basta, já entendi!
- “Data venia”, doutor. Posso esclarecer melhor, quiçá, o júri ainda não tenha entendido que, trabalho com calhas, com latas, literalmente...
- Contenha-se, e somente responda as minhas perguntas, e não se alongue, por favor!
- Sim senhor!
- Senhor Jovino, o senhor foi conivente com a ré, quando esta fez a respectiva aferição do relógio?
- A resposta foi lacônica sobremaneira:
- Não sou proteu!
- Explique-se!
- Não sou: “Maria-vai-com-as-outras”!
Tratava-se de uma ação movida por Jovino, sobre contas telefônicas pelas quais se achou prejudicado em suas aferições etc.
-Senhor Jovino, o senhor notou algo de esdrúxulo na sua conta telefônica?
Continuou a respondê-lo:
- Doutor, não somente esdrúxulo, como hilário e estapafúrdio, posto que nada conste que possa desaboná-la ou fundamentá-la, porém, noto que no automóvel de vossa excelência existe um medidor de velocidade chamado: Hodômetro, e para medir a vossa febre existe outro, chamado termômetro, enfim relógios medidores tais quais: Gasômetro, hidrômetro e por aí vai. No entanto, não possuo: Pulsímetro, ou pulsômetro para as respectivas medições em evidência.
O juiz olha ao advogado de defesa e lhe dirige a palavra:
- Dr. Cândido, no caso de se fazer essa medição como é possível aferi-la?
- Pautamos pela profilaxia, meritíssimo.
Mais que ligeiro, entrou com a contra-argumentação, Jovino:
- Nada pessoal doutor Cândido, porém, a sua profilaxia é plenamente inócua, não passando de simples placebo. Aproveitando a oportunidade, excelência, peço a inversão do ônus da prova...
Aquela tirada inesperada deixou o advogado desconcertado, e sem muito argumento, ao ouvir do juiz:
- Aceito a inversão do ônus da prova.
Ainda assim disse o Dr. Cândido:
- Excelência, isto que está ocorrendo é fato inédito, nunca, advogado nenhum pediu-nos a inversão do ônus... Pelo que estou esperando, serei dispensado do meu trabalho.
Emendou:
- Como pode o autor estar contra-argumentando a todo o instante?
O juiz respondeu-lhe:
- Sinto muito, doutor, estou fazendo valer a lei e o direito do autor do processo e, quanto à contra-argumentação, quem decide sou eu, já que o seu defensor não se manifesta.
Aí, aquela jocosa criatura judicial, pelo vocábulo com o qual estava usando Jovino, retorquiu com certa veemência:
- Senhor Josino, o senhor não poderia ser mais claro no seu vernáculo?
A resposta foi um tanto inesperada.
- Bem excelência, sou um pobre autor que está praticando o direito natural, posto que peque em não conhecer inteiramente a nossa Carta Magna, já que por ela mesma não posso ignorá-la. Conquanto, sou a “Vox clamatis in deserto”, com o perdão de São João Batista pela pseudousurpação de sua honorável santidade, Ratifico que, meus parcos conhecimentos não são acadêmicos, então: “Io non so littere”, partindo do pressuposto e, com minhas escusas, como sentiria vossa excelência ocupando a minha humilde posição, aqui nesta tertúlia?
É louvável a sua erudição, seu Jovino, congratulações, porém, isto tudo não muda o rumo do processo, declarando de antemão que este juizado não tem a competência legal para julgar este processo, devendo dirigir-se à Casa dos Advogados Etc.
Logo após a audiência, alguns dos participantes vieram assediá-lo com relação ao seu vocábulo, tecendo alguns elogios, inclusive o seu próprio causídico o qual fora pego a laço no momento de sua primeira audiência judicial.
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