Responsabilidade civil nas relações de Direito de Família

Resumo:

“No dia em que o direito de família conseguir dizer o afeto dentro sua própria doutrina, definitivamente estará contemplando a pessoa humana no lugar do sujeito de direito”, essa foi a lição dada pela professora Giselda Hironaka em palestra do IBDFAM. Assim, a assertiva de Saint-Exupéry: “Tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas” pode afinal ter consequências jurídicas a serem modestamente comentadas por esse artigo.

Abstract

“On the day that family law can mean affection within his own doctrine, will definitely be looking at the human person at the place of the subject of law”, that was the lesson given by the teacher's lecture on Giselda Hironaka IBDFAM. Thus, the assertion of Saint-Exupéry: "You become responsible forever for what you have tamed" may ultimately have legal consequences to be modestly commented on this article.

Palavras-chave:

Responsabilidade civil. Relações de Direito de Família. Relações Familiares. Culpa conjugal. Culpa parental. Abandono afetivo. Afeto.

Keywords

Liability. Relationship of Family Law. Family Relations. Marital guilt. Parental guilt. Emotional distance. Affection.

A responsabilidade civil deriva de transgressão de uma norma jurídica preexistente, impondo, ao causador do dano, a consequente obrigação de indenizar a vítima.

É possível haver a responsabilização civil nas distintas relações afetivas na família (paterno-filiais e nas relações de conjugabilidade).

Reparamos três elementos fundamentais, a saber: a conduta humana (comissiva ou omissiva), própria ou de terceiros, ou, mesmo ilícita (regra geral) ou lícita (situação excepcional); dano que é violação de interesse juridicamente tutelado, seja de natureza patrimonial, seja de violação de um direito da personalidade; e, por fim, nexo de causalidade, que consiste na necessária vinculação entre a conduta humana e o dano.

Há de se lembrar ainda o elemento anímico, seja a culpa de caráter eventual ou ainda, intencional no cometimento da violação do dever jurídico preexistente, notadamente de cuidado.

No entendimento de Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona Filho a culpa é elemento acidental da responsabilidade civil, em face de existir também a responsabilidade civil objetiva (especialmente baseada no exercício de uma ativiade de risco, conforme o teor do art. 927 do CC).

Nas relações familiares, considerando que os sujeitos envolvidos não estão exercendo qualquer atividade que implique, pela sua essência, risco ao direito de outrem, a esmagadora maiorida das situações fáticas demandará a prova do elemento “culpa”, a teor da regra geral definidora do ato ilícito, constante no art. 186 do CC.

Desta forma, o cometimento do ato culposo ou doloso, no âmbito da entidade familiar, que haja causado dano material ou moral a um dos seus integrantes pode gerar a responsabilização civil e até penal.

Mesmo ante a controvérsia quanto ao direito material, há uma outra questão processual que é a discussão sobre qual órgão jurisdicional competente para a apreciação das ações de responsabilidade civil em face das relações familiares.O tema é polêmico, posto que alguns entendem ser a vara cível, e outros entendem pela atração para as varas de família.

Mas, é do entendimento da maioria da doutrina e, também de Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona Filho que a competência é mesmo das varas de família posto que a análise das peculiaridades e características da família devem ser consideradas, quando do julgamento das pretensões.

Assim, seguindo a mesma lógica da EC45/2004 que previu que a reparação dos danos morais e materiais oriunda das relações laborais deve ser apreciada pela Justiça do Trabalho, a reparação por danos materiais e morais nas relações familiares igualmente deve ser mesmo apreciada na vara de família.

Como a maioria dos casos não foi objeto de manisfestação consolidada de mérito do Supremo Tribunal Federal, muito ainda há de amadurecer, para se cogitar em uma consolidada jurisprudência sobre a matéria.

Abondono afetivo é o primeiro tema da casuística da realidade civil nas relações de família, principalmente na relação filial. É o mais polêmicos dos temas.

Um dos pioneiros a tratar do tema foi o brilhante e ilustrado Rodrigo da Cunha Pereira que, analisando o primeiro caso a chegar a uma Corte Superior brasileira, asseverou:

“Será que há alguma razão/justificativa para um pai deixar de dar assistência moral e afetiva a um filho? A ausência de prestação de uma assistência material seria até compreensível, se se tratasse de um pai totalmente desprovido de recursos. Mas deixar de dar amor e afeto a um filho… não há razão nenhuma capaz de explicar tal falta.”

Assim, questiona-se: existe um dever de dar afeto do pai para com filhos? A negação de dar afeto seria ilícito civil? Seria, portanto, indenizável?

Há juristas que defendem a tese de que é indispensável uma paternidade /maternidade responsável, e que a negativa de afeto, gera diversas sequelas psicológicas e caracterizaria um ato contrário ao ordenamento jurídico, e, por isso, sancionável no campo da responsabilidade civil.

Por outro lado, há aqueles que se contrapõem, e sustentam, basicamente que a franca adoção de indenizabilidade imporia em uma indevida monetarização do afeto com o desvirtuar de sua essência, bem como a impossibilidade de aferir quantidade e qualidade de amor dedicado do pai ao filho, ou do filho aos pais, que deve ser sempre espontâneo e natural e, não consistir mera obrigação jurídica, supervisionada e sob controle estatal.

O primeiro leading case no Brasil (caso Alexandre), onde prevaleceu a tese da possibilidade jurídica foi no TAMG com o reconhecimento da condenação em reparação civil pelo abandono afetivo e, posteriormente, quedou-se, em 29/11/2005 perante o STJ, in verbis:

“ Não cabe indenização por dano moral decorrente de abandono afetivo. A conclusão, por quatro votos a um, é da Quarta Turma do STJ, que deu provimento a recurso especial de um pai de Belo Horizonte para modificar a decisão do Tribunal de Alçada de Minas Gerais, que havia reconhecido a responsabilidade civil no caso e condenado o pai a ressarcir financeiramente o filho num valor de duzentos salários mínimos. Consta do processo que o filho mantinha contato com o pai até seis anos de idade de maneira regular. (…) ” Vide (STJ, Recurso Especial, 757.411/MG (2005/0085464-3, Relator Ministro Fernando Gonçalves).

A caracterização do abandono afetivo como conduta ilícita foi proposta em projeto de lei (PLS 700/7 do senador Marcelo Crivella (PRB-RJ) que pretende enquadrar civilmente o pai ou a mãe ausente na criação do filho, o que trouxe prejuízos psicológicos, moral e social da pessoa em desenvolvimento. A referida matéria recebeu parecer no sentido de aprovação, com emendas, do relator, senador Valdir Raupp (PMDB- RO).

O referido projeto de lei 700/7 define a assistência afetiva devida pelos pais aos filhos menores de 18 (dezoito) anos como a orientação quanto às principais escolhas e oportunidades profissionais, educacionais e culturais; a solidariedade e o apoio nos momentos de intenso sofrimento ou dificuldade; a presença física espontaneamente solicitada pela criança ou adolescente e possível de ser atendida.

Aliás, é conveniente frisar que mesmo diante da dissolução conjugal dos pais, não se desfazem os laços de parentalidade e de afeto, como bem acentou Giselda Hironaka: a criança não se divorcia dos pais.

Além dos deveres de sustento, guarda e educação dos filhos menores, a proposta altera o ECA para também atribuir aos pais os deveres de convivência e assistência material e moral. É importante ressaltar que esse aspecto passará a ser considerado nas decisões judiciais de destituição de tutela e de suspensão ou destituição do poder familiar (sendo essa ultima ratio).

Interessante julgado recente do REsp 1.159.242-SP (2009/0193701-9) 3ª. Turma do STJ. Rel. Min. Nancy Andrighi

j. 24/04/2012. Publicado 10/05/2012 que sintetiza o significado do abandono afetivo e identifica a caracterização do dano moral e a percepção do cuidado como valor jurídico. Além do básico para sua manutenção – alimento, abrigo e saúde, também há outros elementos, normalmente imateriais e igualmente necessários para adequada formação.

Tânia da Silva Pereira – autora e coordenadora, entre outras, das obras “Cuidado e vulnerabilidade” e “O cuidado como valor jurídico” acentua in litteris:

“O cuidado como expressão humanizadora, preconizado por Vera Regina Waldow, também nos remete a uma efetiva reflexão, sobretudo quando referência da família de origem (…) a autora afirma: o ser humano precisa cuidar de outro ser humano para realizar a sua humanidade, para crescer no sentido ético do termo. (…)”

E, adiante Waldow conclui que: “O cuidado dentro do contexto da convivência familiar leva à releitura de toda a proposta constitucional e legal relativa à propriedade constitucional para a convivência familiar.”

Portanto, o cuidado é fundamental para a criança e o adolescente, pois não existe mensuração possível para o amor, mas sim a verificação do cumprimento, descumprimento ou parcial cumprimento da obrigação jurídica de cuidar.

Desta forma, diante do abandono afetivo e moral não se discute o amar ou de ter afeto, e sim, a imposição biológica e jurídica de cuidar que é inerente dever jurídico da liberdade das pessoas gerarem ou adotarem filhos.

Sintetizando, amar é faculdade mas cuidar é dever. E não se pode esquecer que deve existir um mínimo núcleo de cuidados parentais com a criança ou adolescente, que vai além do mero cumprimento da lei, mas que garantam aos filhos ao menos quando à afetividade a adequada formação psicológica e inserção social.

A negligência seja do pai ou da mãe nos cuidados com filhos menores também poderá ser incluída entre as hipóteses do ECA que permitem ao juiz determinar como medida cautelar, o afastamento do denunciado da moradia comum. Atualmente, as hipóteses admitidas para adoção dessa medida são maus-tratos, opresão e abuso sexual. Há igualmente a possibilidade do exercício do direito de visitação compendiado de supervisão multidisciplinar.

A fixação de reparação pecuniária tem caráter acentuadamente punitivo e pedagógico, nas perspectivas da função social da responsabilidade civil, para que não consagre o paradoxo de impor aos pais responsáveis por esse grave comportamento pernicioso a imposição,simplesmente da perda do poder familiar, o que poderia redundar num grande favor.

Giselda Hironaka inclusive ressalta que o abandono afetivo não se trata de circunstância simplesmente individual, mas um tipo de comportamento socialmente danoso, o que desafia uma firme atuação pedagógica do Direito, na perspectiva superior da função social .

Para Cláudia Maria da Silva uma sadia convivência familiar respeita o direito de personalidade do filho e garante a sua dignidade , porque a responsabilidade dos pais não se esgota apenas na contribuição material. (In Descumprimento do dever de convivência familiar e indenização por danos à personalidade do filho”, na Revista Brasileira de Direito de Família, Porto Alegre: Síntese – IBDFAM, vol. 25, p.139, ago-set, 2004) .

De qualquer modo compreender a responsabilidade civil no direito de família brasileiro impõe a interdisciplinariedade, principalmente no que se refere ao abandono afetivo, abandono paterno-filial ou teoria do desamor.

E de forma didática e inteligente, Flávio Tartuce e José Fernando Simão expõem as quatro premissas fundamentais sobre o tema, a saber: a primeira premissa corresponde a natural incidência das regras relativas à responsabilidade civil.

Sendo sabido que as normas protetivas de ordem pública são aquelas relacionadas com os princípios sociais e, então, conclui-se que os diálogos são salutares para o próprio Direito Civil como um todo. E, mesmo para o que homenageiam o chamado Direito Civil Constitucional.

A segunda premissa relaciona-se com o conceito de culpa no Direito de Família que em meu modesto entender sofreu seu mais duro golpe com a EC 66/2010, em particular o conceito de culpa conjugal.

Ainda que se entenda a culpa em seu amplo sentido e como fundamento do ato ilícito, previsto no art. 186 do CC onde se tem os elementos como dolo, negligência, imprudência ou imperícia (culpa em stricto sensu) que viola direito e causa dano à outrem ainda que exclusivamente moral.

A responsabilidade civil também está geralmente fundada na culpa, pela menção de ato ilícito previsto no art. 927, caput do CC. Apesar que a evolução aponte a responsabilidade sem culpa tão-somente calcada no risco da atividade desempenhada e no nexo de causalidade.

A culpa do ato ilícito e da responsabilidade civil é a mesma culpa motivadora da dissolução conjugal, pois ambas trazem o desrespeito a um dever preexistente (dever explícitamente imposto por lei).

De qualquer modo, a culpa lato sensu conforme ensinou Von Thur significa o comportamento reprovado pela lei caracterizando a violação de um contrato ou o cometimento de uma ato ilícito.

Já a terceira premissa, há a crença de que a responsabilidade civil emerge das relações de conjugalidade e de parentalidade, é essencialmente uma responsabilidade extracontratual .

E, reforçando essa natureza extracontratual da responsabilidade temos a definição do casamento dada por Inácio de Carvalho Neto, como um contrato de natureza especial.

A derradeira premissa é a necessária aplicação das normas básicas de responsabilidade civil para que o diálogo das fontes seja metodologicamente e juridicamente possível, não se pode esquecer da identificação dos clássicos elementos da responsabilização, a saber: a conduta humana, a culpa lato sensu ou sentido amplo, o nexo de causalidade e, por fim, o dano ou prejuízo (seja de natureza material ou imaterial) .

E, não se pode olvidar as tendências contemporâneas da responsabilidade civil que apontam claramente o ocaso da culpa, ou seja, a perda da sua importância; a flexibilização do nexo de causalidade; o surgimento de novos danos; a seleção dos interesses merecedores de tutela; a cláusula geral de dano e a ponderação de interesses; a reparação do dano e o desestímulo às demandas frívolas; enfim, a evolução do conceito de responsabilidade para a solidariedade.

Como bem já ensinou Rubens Limongi França, o dano é uma perda calcada na raiz da, proveniente do partícipio dare, indicando uma certa abdicação inflingida. Registre-se que os primeiros danos aceitos como reparáveis foram os danos materiais, decorrentes de subtrações patrimoniais.

Com a evolução do direito e da própria sociedade humana, os ordenamentos jurídicos passaaram admitir os danos imateriais, não patrimoniais, ou popularmente conhecidos, como danos morais.

Inicialmente só conhecidos e reconhecidos judicialmente quando vinculados imbilicalmente aos danos materiais. Mas, com a CF/1988 pelas expressas previsões do art. 5º, incisos V e X e, em 1992, o STJ editou o verbete correspondente a súmula 37, admitindo a cumulação dos danos materiais e morais, decorrentes do mesmo fato e em uma mesma ação.

Vivenciamos a tendência doutrinária e jurisprudencial em ampliar os danos reparáveis, por essa razão, já se admitem os danos estéticos como cumuláveis com os danos materiais e morais, conforme o verbete a Súmula 387 do STJ.

E, só para exemplificar apontamos o rumoroso caso das mulheres que ingeriram as pílulas anticoncepcionais “de farinha”, admitiu danos morais coletivos por lesão a vários direitos de personalidade (STJ, REsp 866.636/SP, Rel.Min. Nancy Andrighi, 3ª. Turma, j.29/11/2007, DJ 06.12.2007, p.312).

Efetivamente podem decorrer do casamento danos materiais, incindindo as regras dos arts. 402 e 404 do CC. Sendo reparáveis os danos emergentes, e ainda, os lucros cessantes – o que razoavelmente se deixou de lucrar (como por exemplo, a incapacitação laboral resultante de reiteradas lesões corporais e psíquicas causadas pelo marido no cônjuge mulher).

No que tange aos danos morais ou extrapatrimoniais, há vários casos da jurisprudência pátria reconhecendo a sua compensação na relação entre os cônjuges, pela inscrição do nome do outro em cadastro de inadimplentes (TJRS, Agravo de Instrumento, 70018969071, 9ª Câmara Cível, TJRS, Relatora Iris Helena Medeiros Nogueira, j. 27/03/2007).

Mas é certo que se confirma na jurisprudência a velha lição de que os danos morais não se confundem com os meros aborrecimentos que sejam suportados pela pessoa em seu cotidiano, premissa que incide também nas relações familiares.

Os danos estéticos são considerados como terceira modalidade de dano pelo STJ e que são cumuláveis com os danos morais e materiais, culminando esse entendimento com a edição em 2009 do verbete da súmula 387.

A Lei 11.340/2006 (Lei Maria da Penha) determina em seu art. 5º que haverá violência doméstica contra a mulher nos casos de lesão corporal ou sofrimento físico já sendo encontráveis sentenças concedendo reparação por conta de danos morais resultantes de agressões físicas e morais praticadas por ex-marido à ex-mulher (TJRJ, Acórdão 13.223/2000, Rio de Janeiro, 3ª Câmara Cível, Rel. Des. Luiz Fernando de Carvalho, j.29/03/2001).

Assim podemos entender ser possível também a cumulação tripla de danos em casos envolvendo a responsabilidade civil casamentária, englobando os danos materiais, os morais e os estéticos. E, se mensura a indenização pela extensão do dano, conforme a regra enunciada pelo caput do art. 944 do CC.

Todavia, havendo excessiva desproporção entre a gravidade da culpa e o dano, poderá o juiz reduzir a indenização por equidade (art. 944, parágrafo único do CC), principalmente se houver culpa concorrente da própria vítima para o próprio evento-prejuízo (art. 945 do CC).

Portanto, nesse viés, a coletivização dos prejuízos nos revela situações de danos morais coletivos ou mesmo danos difusos e sociais relativos às relações casamentárias.

Teve grande impacto a EC 66/2010 principalmente em razão de dividir os civilistas e os processualistas quanto à discussão da reparação de danos em sede de ação de divórcio, bem como a necessidade uma outra ação específica para tanto.

Yussef Cahali foi um dos pioneiros e a enfrentar o assunto, filiando-se entre aqueles que admitiam plenamente a reparação civil como prentesão inserida na ação de separação judicial, também Caio Mário da Silva Pereira analisando os efeitos do vetusto desquite afirmou: “Afora os alimentos, que suprem a perda de assistência direta, poderá ainda, ocorrer a indenização por perdas e danos (dano patrimonial e dano moral) em face do prejuízo sofrido pelo cônjuge inocente”.

Concordando parcialmente, Rolf Madaleno era favorável à referida cumulação desde que a propositura da demanda ocorrese logo após ao evento danoso, sob pena de caracterização de perdão tácito, não havendo incompatibilidade de ritos processuais.

Desta forma, no plano processual Inácio de Carvalho Neto não se mostrava favorável à cumulação de demandas, diante do art. 292 do CPC, uma vez que o pedido reparatório é de competência da vara cível, ao passo que o da separação é de competência da vara de família.

Porém, podem ser encontradas decisões nos tribunais paulistas no sentido de impossibilidade de cumulação diante das diversidades de pedidos e das consequentes repercussões (TJSP, Agravo de Instrumento 128 863-4, SP, 6ª Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Antonio Carlos Marcato, j.06/04/2000).

Mas, apontem-se também existem outras decisões que pregam entendimento oposto, pela cumulação e a compatibilidade de ritos. (Vide TJSP, Agravo de Instrumento 435.183-4/6-00, SP, 9ª. Câmara de Direito Priado, Rel. Des. José Luiz Gavião de Almeida, j. 14.02.2006).

Com o fim da separação judicial com meio de dissolução conjugal, resta a dúvida, a possibilidade de cumulação da reparação de danos na ação de divórcio. E, tal busilis se torna mais relevante, pois pelo anterior entendimento majoritário consolidado anteriormente, era por sua total impossibilidade.

E, Cahali aponta que no divórcio direto havia irrelevância da causa eventualmente culposa na separação de fato. Mas, o fato divide os eminentes doutrinadores, José Fernando Simão defende que não sendo possível a discussão de culpa na sede das ações de divórcio, caberá fazer a demanda correr nas varas cíveis.

No entanto, para o ilustre Flávio Tartuce quanto a mais recente Emenda do Divórcio aponta a importação conceitual de discussão da culpa, da separação judicial para o divórcio judicial. Principalmente nos casos mais agudos em sua gravidade, como é o caso de violência doméstica,lembrando que a culpa que dissolve o casamento é a mesma que imputa a responsabilidade civil.

Essa ação de divórcio cumulada com reparação de danos corre na vara de família, e, enventualmente poderá o julgador mitigar aculpa, prinicipalmente quando esta for recíproca, o que representaria uma compensação de culpas, comum nas ações de responsabilidade civil. Ademais, é possível a decretação do divórcio na própria ação e prosseguir na discussão das questões de responsabilidade civil, o que representa melhor solução em face da economia processual.

Apesar de pós-modernamente viger uma tendência de relacionamentos plurais, e do poliamorismo, e ainda o princípio de monogamia ser defendido pelo devido controle social, a violação do dever de fidelidade, ou seja, a infidelidade pode efetivamente gerar indenizabilidade principalmente quando houver danos e prejuízos.

Paulo Lôbo assevera que “os valores hoje dominantes não reputam importante para a manutenção da sociedade conjugal, esse dever, que faz do casamento não uma comunhão de afetos e interesses maiores de companheirismo e colaboração, mas um instrumento de repressão sexual e de represália de um contra o outro, quando o relacionamento chega ao fim”.

Desta forma, a quebra da fidelidade, por si só, não tem o poder de gerar o dever de reparar danos (principalmente nos casos onde vige a separação de fatos num lapso temporal revelador da total ruptura da vida em comum).

Maria Celina Bodin de Moraes que reafirma que o descumprimento do débito conjugal e da infidelidade, são circunstâncias normalmente intoleráveis para a manutenção da vida em comum.

O único remédio cabível seja a separação judicial em face da óbvia ruptura da vida em comum, evidentemente caberá cogitar em reparação de danos materiais e morais quando resultarem lesões, agressões e humilhações contínuas e contundentes diante de terceiros, ou dos próprios filhos, o que faz surgir a caracterização do ilícito e confirma a responsabilização pelo dano inflingido.

Há também a possibilidade de indenização quando decorrente da conjugabilidade há a transmissão de moléstia grave, capaz de gerar sério comprometimento da saúde do cônjuge ou mesmo de sua prole.

Já entre os clássicos da responsabilidade civil, o inesquecível mestre Aguiar Dias, citava o mau exemplo de cônjuge que transmitia ao consorte moléstia contagiosa, bastando a simples negligência ou imprudência. Pouco importando se a transmissão patológica se deu por culpa ou dolo, haverá sempre o dever de reparar os danos resultantes.

Nesse caso, clama o doutrinador Flávio Tartuce que não se pode cogitar em mitigação de culpa, principalmente a atribuída não apenas para dar fim a sociedade conjugal mas sobretudo para gerar o dever de reparação.

Quanto a existência de amante ou concubina vem sendo muito debatido em doutrina, além de configurar culpa conjugal, mas ainda há forte tendência de amparo aos seus direitos no futuro. Apesar de haver acórdão reconhecendo a legitimidade passiva do cônjuge traidor e de sua concubina, devendo ambos responderem à ação indenizatória.

O STJ mais recentemente afastou o dever de indenizar do cúmplice da esposa traidora, concluindo que este não tem o dever de fidelidade em relação ao cônjuge de sua amante, não havendo ato ilícito no ato de traição por este terceiro. O julgado foi publicado no Informativo n. 415 do STJ, de novembro de 2009, in litteris:

“Danos morais. Cúmplice. Esposa adúltera. In casu, o recorrente ajuizou ação indenizatória em face do recorrido pleiteando danos morais sob a alegação de que este manteve com a esposa daquele relacionamento amoroso por quase dez anos, daí nascendo sua filha, que acreditava ser sua, mas, depois constatou que a paternidade era do recorrido. O pedido foi julgado procedente em primeiro grau, sendo, contudo, reformação na apelação. Assim, a questão jurídica circunscreve-se à existência ou não de ato ilícito na manutenção de relações sexuais com ex-mulher do autor, ora recorrente, em decorrência das quais foi concebida a filha erroneamente registrada. Para o Ministro Relator, não existe, na hipótese, a ilicitude jurídica pretendida, sem a qual não se há falar em responsabilidade civil subjetiva. É que o conceito, até mesmo instituitivo – de ilicitude está imbricado na violação de um dever legal ou contratual do qual resulta dano para outrem e não há, no ordenamento jurídico pátrio, norma de direito público ou privado que obrigue terceiros a velar pela fidelidade conjugal em casamento do qual não faz parte. O casamento, tanto como instituição quanto contrato sui generis, somente produz efeitos em relação aos celebrantes e seus familiares, não há como o Judiciário impor um “não fazer” ao réu, decorrendo disso a impossibilidade de indenizar o ato por inexistência de norma posta – legal e não moral – que determine. De outra parte, não há que se falar em solidariedade do recorrido por suposto ilícito praticado pela ex-esposa do recorrente, tendo em vista que o art. 942, caput e parágrafo único do CC vigente (art. 1.518 do CC/1916) somente tem aplicação qquando o ato do coautor ou partícipe for, em si, ilícito, o que não se verifica na hipótese dos autos. Com esses fundamentos, entre outros, a Turma não conheceu do recurso.” Procedente citado: REsp 742.137-RJ, FJ 29/10/2007 (STJ REsp 1.122.547-MG, Rel. Min. Luis Filipe Salomão, j. 10.11.2009).

Há ainda a curiosa jurisprudência que o tribunal fluminense determinou que a ex-esposa pagasse indenização a uma suposta amante, a quem atribuiu indevidamente como concubina de seu marido. Pode-se até invocar a aplicação do conceito de abuso de direito , nos termos do art. 187 do CC. (Vide TJRJ, Acórdão 2767/1995, Três Rios,3ª., Câmara Cível, Rel. Des. Sylvio Capanema).

A compensação em virtude da chamada infidelidade virtual, ou adultério online que pode ser feito por ICQ, chats, mirc e sala de bate-papo. Tal laço erótico-afetivo que, por si só, configuraria apenas uma conduta desonrosa a ensejar a antiga separação judicial litigiosa por sanção (art. 1.572 c/c art. 1.573, VI, CC). No entanto,não há contato físico portanto, não há uma infidelidade real, mas meros contatos cibernético ou internético, constituindo tão-só a infidelidade virtual.

No tocante às declarações feitas nos sites de relacionamentos como é o caso do orkut, podem ser encontradas decisões de deferimento da tutela reparatória, como se pode ver em TJMT, Recurso Inominado, 3.249/2008, Cuiabá, 3ª Turma Recursal, Rel. Des. Maria Aparecida Ribeiro, j. 07/08/2008, DJMT, 21.08.2008, p.76).

Até já se responsabilizou a empresa provedora que mantém o sítio (site) diante de um perfil falso que fora montado na citada comuniade interpessoal, trazendo danos a terceiros. A decisão do Tribunal de Justiça do RS também merece uma leitura (TJRS, Recurso Cível 71 991498169, Porto Alegre, 3ª Turma Recursal Cível, Rel. Des. Carlos Eduardo Richinitti, j. 26.02.2008, DOERS 04/03/2008,p. 92).

A jurisprudência brasileira também já concluiu que a mera declaração “eu odeio fulano” feita na página de relacionamento, por si só, não gera o dano moral indenizável, havendo um mero aborrecimento (Apelação cível. Responsabilidade civil. Ação de indenização. Criação de comunidade em site de relacionamentos (orkut). Dano moral. Não configuração. A enunciação de opiniões e manifestações pessoais, desprovidas de cunho difamatório ou injurioso sobre outrem, ainda que veiculadas pelos meios de comunicação, não se revela bastante à configuração do dano moral. Hipótese em que o réu infante com dez anos de idade, criou, em site de relacionamentos (orkut) comunidade denominada “Eu odeio o G. F.” na qual, contando tão somente com a participação daquele, inexiste qualquer conteúdo pejorativo à imagem ou honra do autor.Mera expressão de sentimento pessoal que não acaracteriza ato ilícito, passível de indenização. Juízo de improcedência mantido. Apelação improvida (TJRS, Acórdão 70026049445, Pelotas, 10ª. Câmara Cível, Relator Des. Paulo Roberto Lessa Franz, j., 27/11/2008, DOERS 08/01/2009, p. 47).

Muito comentada é a sentença do TJDF da lavra do juiz Jansen Fialho de Almeida, proferida em 21 de maio de 2008, condenando um marido a pagar indenização por danos morais à esposa pela prática do que se convencionou denominar sexo virtual.

Lembrando que a regra é a proteção da intimidade, mesma na relação entre cônjuges. E ainda, é certo haver a ponderação dos valores constitucionais de acordo com o caso concreto é que irá determinar qual ponto, a conclusão merece ser elogiada, valendo a ressalva de que uma pequena alteração nos fatores fáticos poderia gerar uma ponderação totalmente distinta.

De qualquer modo, não se pode presumir adultério e nem se pode confundir a infidelidade virtual com a infidelidade real.

Na Lei Maria da Penha, ou seja, 11.340/2006 há evidente exemplo de norma de tutela dos vulneráveis, realidade corriqueira na pós-modernidade, sendo tratadas as mulheres sob a violência doméstica.

E deve por interpretação extensiva ser aplicada igualmente aos que vivem em união estável, aos namorados e quiçá concubinos.

E traz a responsabilização civil do agressor, amparando o princípio da reparação integral dos danos segundo o qual todos os prejuízos suportados pela vítima da violência doméstica devem ser reparados.

A criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a mulher, que são órgãos da justiça ordinária com competência cível e criminal, está prevista no art. 14 da referida lei, visando ao julgamento e a execução das causas de reparação civil decorrentes da prática de violência doméstica e familiar contra a mulher.

Todavia, não obstante a crição dos juizados especializados, há decisões no sentido de que estes somente seria competentes para apreciar as medidas estabelecidas pela Lei Maria da Penha, como por exemplo, o afastamento do lar do ofensor, e não a ação de responsabilidade civil, cuja competência seria do juízo cível comum.

A norma protetiva aos vulneráveis trouxe à mulher foro privilegiado, prevendo a competência, por opção da ofendida, para os processos cíveis. E, deve ser aplicada também às demandas reparatórias, vez que a responsabilidade civil decorre diretamente da violência doméstica.

Além da reparação dos danos, prevê a Lei Maria da Penha as medidas de urgência para afastar o agressor, e demais mecanismos que se cumulam sem afastar a hipótese de responsabilização civil (art. 22). A primeira medida é a suspensão ou restrição de porte de armas, com comunicação ao órgão competente (art.22, inciso I, da Lei 11.340/2006).

Também proíbe determinadas condutas, tais como a aproximação da ofendida, de seus familiares e das testemunhas; o contato com a ofendida, por qualquer meio de comunicação; o ato de frequentar determinados lugares, a fim de preservar a integridade física e psicológica da ofendida; a restrição ou a suspensão de visitas aos dependentes menores, ouvida a equipe de atendimento multidisciplinar ou serviço similar; prestação de alimentos provisionais ou provisórios (art. 22, III a V).

Para o cumprimento dessas medidas, que constituem obrigações de fazer e de não fazer, incide a específica tutela do art. 461 do CPC com a possibilidade de fixação, pelo juiz, de uma multa contra o agressor (astreintes ).

Como a questão envolve lesão a direitos da personalidade e de ordem pública, é perfeitamente possível que tal medida seja fixada até mesmo de ofício pelo magistrado(também há outras medidas protetivas de urgência em favor da mulher ofendida conforme consta no art. 23 da Lei Maria da Penha).

Com merecido destaque ao art. 37 do referido diploma legal, segundo o qual a defesa dos interesses e direitos transindividuais previstos na norma poderá ser exercida, concorrentemente, pelo Ministério Público e por associação de atuação na área, regularmente constituída há pelo menos um ano, nos termos da legislação civil.

O comando possibilita que, no futuro, sejam tomadas medidas coletivas em casos em que mulheres, em larga escala e em conjunto, sofrem violência por quem quer que seja (tutela de direitos individuais homogêneos). Além das medidas de prevenção, será plenamente possível a reparação civil coletiva, com a indenização, por exemplo, dos danos morais coletivos.

Cessado o casamento ou a sociedade conjugal não se podem tolerar as agressõs impetradas pelo ex-cônjuge, entrando em cena novamente a responsabilidade civil para a consequente imputação civil do dever de reparar.

Nesse sentido, podem ser encontradas decisões do tribunal paulista e do tribunal fluminense (vide TJSP, Apelação com revisão 520 648.4/3, Acórdão 2630326, Itápolis, 1ª Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Vicentini Barroso, j. 13/05/2008, DJESP 13.06.2008 e TJEJ, Acórdão 13.223/2000, RJ, 3ª Câmara Cível, Rel. Des. Luiz Fernando de carvalho, j. 29.03.2001).

Uma das mais comezinhas questões em sede responsabilização civil está na hipótese de rompimento da relação afetiva, que deve ser entendido como permitido en direito, não se caracterizando, por isso, como ato ilícito capaz de gerar responsabilidade civil.

Porém tal romprimento não pode ser agressivo ou de maneira atentatória à dignidade do outro, até por configurar abuso de direito .

Há duas situações excepcionais que podem ser sistematizadas como geradoras de responsabilização civil, a primeira, refere-se nas situações em que a boa-fé objetiva tenha gerado uma legítima expectativa na vítima, passível de reparação.

Desta forma, o súbito rompimento injustificado de um longo noivado pode ocasionar positivamente a obrigação de indenizar tanto dano moral como o material.

A outra hipótese diz respeito à forma de extinção, se ao término da relação, seja de noivado ou namoro, se dá de forma escandalosa ou agressiva aos direitos da personalidade da outra parte, enquadra-se tipicamente no abuso de direito, previsto no art. 187 do CC, gerando o dever de indenizar. O que aliás, fora reconhecido jurisprudencialmente.

Outras situações, como as referentes à Lei de Alimentos Gravídicos , quando o homem for obrigado a prover pensão alimentícia para potencial paternidade, onde só existem indícios e, portanto,sem efetiva prova cabal de sua condição de pai.

Comprovado a posteriori que não era o pai, por conta da irrepetibilidade dos alimentos, a melhor solução seria o suposto pai voltar-se contra a mãe em sede de ação de regresso, contra o verdadeiro genitor, para evitar o seu enriquecimento sem causa, já que fora obrigado a prover tais alimentos, sem devê-los realmente e juridicamente.

Mas, se demonstrada a má-fé da gestante, não há óbice de que fosse também ajuizada ação de reparação civil em face desta, com base na responsabilidade civil subjetiva. Mas aqui adentramos em movediço lamaçal da instrução probatória.

Outros casos nos chamam atenção, e são citados por Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona Filho, é a subtração do direito da mãe de assistir o batismo de seu próprio filho, por conta do pai separado (vide STJ, REsp 1.117.793/RJ, rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 04/02/2010).

Outra curiosa situação foi a hipótese de um marido que trocou a mulher por um homem que fora julgada pelo TJSP, pois foi negado o pedido de reparação por dano moral, posto que os motivos apresentados pela mulher para justificar o pedido de dano moral não passaram de meros aborrecimentos e insatisfações inerentes ao fim da vida em comum.

Assim, entendeu o tribunal paulista, acertadamente que o fato de haver o rompimento da relação heterossexual anterior, para a constituição de uma nova relação, porém homossexual, por si só, não enseja responsabilidade civil.

O caso dos maridos enganados pela gravidez da mulher, nos trazes a polêmica e delicada questão das esposas que enganam seus maridos quanto à parentalidade.

De qualquer maneira, há a caracterização da paternidade sócio-afetiva e, ainda a aplicação da boa-fé objetiva, credenciando ao marido enganado pleitear indenização por danos materiais e morais, e a jurisprudência do STJ (vide STJ, REsp 25.730-SP, RT 697/202).

Há argumentos doutrinários que refutam a exclusão do dano moral no Direito de Família, para Guillermo Borda apud Madaleno a culpa na separação judicial geralmente não é só de um dos cônjuges, sendo difícil apontar qual dos consortes é o verdadeiro culpado, ou se os fatos motivadores da declaração de culpa de um não tiveram como causa os atos do outro consorte.

O dano deverá ser reparado pela regra geral acolhida pelo direito civil e presente no vetusto art. 159 do CC de 1916 e reproduzido fielmente no art. 927 do CC de 2002.

Não há de se cogitar em responsabilidade civil no Direito de Família, e de uma reparabilidade no âmbito do dano moral derivado da separação causal, porque o seu conteúdo não fica fora do alcance do Direito Privado, e tampouco impede a aplicação do princípio jurídico de ninguém poder causar um dano a outrem, cuja proteção guarda hierarquia constitucional.

Mário Moacyr Porto foi na opinião de Rolf Madaleno, talvez o pioneiro em defender o dano extrapatrimonial nas relações conjugais e admitiu claramente a cumulação da separação judicial com o pedido de reparação do dano moral em um único processo, fundada a ação no art. 159 CC/1916 c/c art. 292 do CPC porque nada impede que seja a indenização pleiteada antes ou depois da instauração do processo para obtenção da dissolução contenciosa da sociedade conjugal ou do divórcio.

Aliás, Regina Beatriz Tavares da Silva no plano processual ratifica que inexistem razões para desmembrar para juízos diferentes os pedidos de allimentos e de separação judicial litigiosa, com o pedido de reparação de danos morais, porque os princípios da responsabilidade civil são perfeitamente aplicáveis às relações conjugais e também o seriam em relação às uniões estáveis.

Didaticamente discorreu Maurício Luiz Mizrahi quando esclarece que de um lado a tese denegatória da indenização moral e, noutro extremo, a teoria qualificada como ampla ou permissiva que acolhe integralmente o dano moral no Direito de Família, sem restrições, desde que configurada a culpa pela quebra da união conjugal ou união estável.

Exatamente entre esses dois extremos transita uma sensata corrente que aponta a relativização da reparação financeira do dano extrapatrimonial sofrido pelo chamado cônjuge inocente.

Assim, para Mizrahi essa corrente só admite o dever de indenizar pelo agravo moral nas relações de Direito de Família, em um critério restritivo, por só vislumbrar a indenização nas hipóteses de excepcional gravidade na quebra dos deveres matrimoniais e da conduta conjugal e da união estável.

Tementes a uma indiscriminada abertura em prol da reparação por dano moral, a criar ensandecidos debates processuais, a evolução jurisprudencial brasileira parece caminhar para a mitigação do exame judicial da culpa no processo separatório, e ainda, por reconhecer que de regra, toda e qualquer separação conjugal naturalmente causa um abalo emocional e psicológico aos seus protagonistas.

Para a referida corrente, cessado o afeto, resta como única e viável consequência a separação judicial ou divórcio se houver casamento, sem gerar qualquer dever de indenizar, pois adentrar no mérito das misérias da vida conjugal equivaleria a desonra que é contrária a moral e aos bons constumes.

Para a tese que admite plenamente a reparação por dano moral, principalmente na separação litigiosa quando restar configurada a quebra de qualquer dever do casamento. E, não admite qualquer discriminação, gradação de culpabilidade nas relações familiares.

Ademais para os seguidores dessa teoria, é dispensável a previsão legal expressa de reparação civil posto que a regra indenizatória é genérica e, efetivamente se aplica a todo o ordenamento jurídico quando comprovado o ato antijurídico e o consequente dano, sendo absolutamente declinável qualquer exigência de menção expressa para vê-la aplicada às relações de família, até porque o Direito de Família integra o Direito Civil e o dever de indenizar tem hierarquia e previsão constitucional.

Portanto, a pretensão indenizatória estará a depender da fase probatória e casuística, e da análise de cada caso concreto.

Para a corrente que prevê de forma restritiva o dano moral no Direito de Família, e relaciona às causas excepcionais de elevada gravidade, como é o caso de adultério, que adquire na sociedade uma forte repercussão, de grande transcendência e notoriedade, expondo a vítima a toda sorte de comentários diante da perturbadora curiosidade pública.

Essa corrente faz nítida distinção na avaliação, e observa que nem sempre a violação dos deveres matrimoniais importa automaticamente em dever de indenizar do cônjuge culpado.

Ademais, as outroras culminações ao culpado não mais são praticadas em função do princípio da dignidade da pessoa humana, que faz que caso o cônjuge culpado necessitar tenha garantido pelo menos, os alimentos necessários, e também não sofrerá a perda da guarda dos filhos que deve ser fixada e pautada no melhor interesse da criança e do adolescente.

Tal orientação restritiva de indenizar em sede das relações familiares, surgiu de uma decisão proferida pelo juiz Gustavo Bossert:

“Não caberia frente a atos e modos de conduta que, são, simplesmente, expressões de desamor de perda de vínculo afetivo a certo momento (…); o desamor não se indeniza, os sentimentos e sua evolução são ingovernáveis, de maneira que representaria uma aplicação excessiva dos princípios gerais impor o pagamento de indenização frente a atos que, se bem podem implicar a cessação dos deveres conjugais, na sua essência não podem ser considerados mais do que expressões de perda do vínculo afetivo; a indenização há de ficar reservada apenas para as condutas do cônjuge, que ademais de representar violação de deveres matrimonais, implicam autênticos agravos ao outro cônjuge, sem se limitar a expressões de mera perda de vínculos de afeto .”

Cabível então a indenização por abalo moral nos casos excepcionais, onde há uma ofensa aos direitos personalíssimos do cônjuge, com grave infração dos deveres do casamento ou conduta desonrosa, e a conduta deve ser tipificada como crime, ofensiva à integridade moral do ofendido, produzindo martirizante e profunda angústia.

Devendo-se nas demais condutas ( as não-criminosas) apenas ser justificadores da dissolução da separação judicial ou divórcio ou da união estável.

De fato, propõe a referida corrente uma diferenciação nítida entre o conceito de crise conjugal e o de real culpa conjugal, porque o fracasso da convivência afetiva obedece geralmente às causas sentimentais e íntimas, muito difíceis de elucidar e geralmente atribuídas às atitudes matrimoniais recíprocas.

Mas nem toda a doutrina é favorável a compensação dos danos morais entre cônjuges ou conviventes, mesmo quando violados deveres inerentes da convivência afetiva.

Para Sérgio Gischkow Pereira o dano moral nas relações erótico-afetivas, principalmente quando é tomada como ponto de partida a ocorrência de alguma infração de deveres próprios, seria fazer prosperar um exagero, e toda a ação de separação judicial ensejaria pedido cumulado de perdas e danos numa inaceitável e perniciosa monetarização dos relacionamentos. Essa parece, afinal, a tendência verificada na doutrina e jurisprudência brasileiras ainda escassas.

O referido doutrinador teme haver paralisação da atividade humana , quando nada mais será feito com receio das pessoas incidirem em dano moral, pois qualquer incômodo da vida pode ser fato gerador da reparação imaterial.

Aliás, segundo a professora Judith Martins-Costa há conexão semântica e lógica entre as normas do art. 5º., incisos V e X constitucional e as cláusulas gerais dos arts. 12, 21, 187, e as regras dos arts. 927 e seu parágrafo único e art. 944 do CC e, ainda, se for o caso, as regras do arts. 587, 644 e 645 do CPC que ratificam a possibilidade da responsabilização civil nas relações de Direito de Família.

Porque o art. 12 do CC permite fazer cessar qualquer ameaça ou lesão, a direito da personalidade, e reclamar perdas e danos, sem prejuízo de outras noções previstas em lei. Despontanto como dogma do Direito civil contemporâneo o respeito à personalidade da pessoa humana, é possível apontar para pagamento de perdas e danos em caráter preventivo, isto é, para impedir o dano e a continuidade malévola de seus efeitos, ou mesmo, a mera possibilidade.

Posto que a norma oferece em face da ameaça tanto a solução ex post (pagamento de perdas e danos, como recursos de ordem preventiva como a imposição da obrigação de não-fazer ao autor da ameaça, impondo-lhe se descumprida, a obrigação de pagar astreintes).

Será amplamente debatida tanto pela doutrina como pela jurisprudência a possibilidade da discussão da culpa conjugal em sede de ação de divórcio.

As três correntes já estão bem definidas expõem: a primeira corrente entende que a culpa persiste para todos os fins, inclusive para os alimentos.

Para segunda corrente, liderada pelos grandes expoentes do IBDFAM, a culpa não pode ser discutida para dissolver o casamento em hipótese alguma (nesse sentido Giselda Hironaka, Rodrigo da Cunha Pereira, Maria Berenice Dias, Paulo Lôbo, Rolf Madaleno, Pablo Stolze Gagliano, Rodolfo Pamplona Filho, José Fernando Simão, entre outros). Até porque a condenação em virtude da culpa conjugal esvaziou-se pela sistemática jurídica vigente.

Ainda há a corrente intermediária, à qual se filia Flávio Tartuce que admite ainda a discussão da culpa conjugal em excepcionais casos, tais como transmissão de doenças sexualmente transmissíveis (DSTs) e outras mais graves como AIDS (ou SIDA) entre os cônjuges, atos de violência e o engano quanto à prole (modelo dual, com e sem culpa). Humildemente também, venho concluir que assiste razão e razoabilidade o entendimento do nobre doutrinador paulista.

Ainda se discute quanto à situação das pessoas que se encontram separadas juridicamente na vigência da nova lei. Tais pessoas não podem ser consideradas automaticamente como divorciadas, havendo a positiva necessidade de ingressar com divórcio judicial ou extrajudicial.

Assim sendo ao regular as relações de afeto que permeiam as mais diversas searas das relações humanas portegidas por nosso direito prioriza-se a dignidade da pessoa humana o que justifica plenamente a relevância do respeito à boa-fé objetiva, a lealdade e transparência principalmente em face da vigente facilitação do acesso ao divórcio (quer judicial ou extrajudicial) para enfim obtermos a concretização do ideal da família eudemonista.

Referências

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GAGLIANO, Pablo Stolze. FILHO, Rodolfo Pamplona. Novo Curso de Direito Civil. Direito de Família. As Famílias em Perspectiva Constitucional. Volume VI. São Paulo: Editora Saraiva, 2011.

GODOY, Cláudio Luiz Bueno de. Função social do contrato. São Paulo: Editora Saraiva, 2004.

HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes. Sobre Peixes e Afetos. Disponível em: http://www.ibdfam.org.br/artigo&n=286 acesso em 02/06/2012.

MADALENO, Rolf. Novos Horizontes no Direito de Família. 1.ed. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2010.

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REsp 1.159.242 (2009/0193701-9) Julgamento em 24/04/2012.publicado em 10/05/2012. Disponível em:

https://ww2.stj.jus.br/revistaeletronica/ita.asp?registro=200901937019&dt_publicacao=10/05/2012 Acesso em 02/06/2012.

TARTUCE, Flávio; SIMÃO, José Fernando. Direito Civil 5, Direito de Família, 7ª. ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Editora Método. Grupo Gen, 2012.

SIMÃO, José Fernando. Novamente o afeto. Disponível em:

http://ww.professorsimao.com.br/artigos_simao_regime_bens_novamenteAfeto.html Acesso em 02.06.2012.

GiseleLeite e Denise Heuseler
Enviado por GiseleLeite em 10/08/2012
Código do texto: T3823950
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