Comentários aos artigos 298 a 300 do Código Penal Militar de 1969
Desacato a superior
Art. 298. Desacatar superior, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro, ou procurando deprimir-lhe a autoridade:
Pena - reclusão, até quatro anos, se o fato não constitui crime mais grave.
A disciplina na vida militar é e continua sendo essencial para a realização das atividades que são reservadas por força do vigente texto constitucional as Forças Armadas e as Forças Auxiliares. O Código Penal Militar a princípio não busca proteger a pessoa do militar, mas sim a própria Administração Militar, as Instituições Militares, e também o patrimônio físico das instalações militares. O Título VII cuida dos crimes que são praticados contra a Administração Militar, devendo ser entendido como sendo a Administração Pública Militar da União, dos Estados Federados e do Distrito Federal, que se encontra representada por seus agentes, em especial, por aqueles que exercem função de comando, ou se encontram no comando de uma fração, de um grupamento, de um destacamento, de um batalhão, região, ou qualquer outra unidade militar, órgãos operacionais, órgãos de apoio, ou mesmo os órgãos de saúde. O artigo sob análise cuida do crime que foi denominado pelo legislador com o nome iuris de desacato a superior. É importante se observar, que este crime é um crime propriamente militar, e que somente existe no Código Penal Militar não existindo semelhante no Código Penal Brasileiro. Em razão disto, o sujeito ativo deste crime é apenas e tão somente o militar que se encontre subordinado a um outro militar, que deverá ser superior em relação ao infrator com base nos critérios que regem a hierarquia militar. O sujeito passivo deste ilícito em um primeiro momento é a Administração Militar, União, Estados e Distrito Federal, e de forma mediata o superior que foi desacata por força do ato praticado pelo infrator. O elemento objetivo, ou seja, a ação necessária para a prática deste ilícito encontra-se representado pelo verbo desacatar que significar diminuir, desconsiderar, menosprezar, o superior hierárquico ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro, que deve ser entendido como sendo a moral do militar. O elemento subjetivo é o dolo, e não se admite a prática deste ilícito penal na modalidade culposa. A pena prevista se inicia com um ano de reclusão podendo chegar até quatro anos de reclusão, desde que o fato praticado não constitua crime mais grave, como por exemplo, uma tentativa de homicídio, ou mesmo um crime de lesão corporal de natureza grave. No âmbito dos Estados e do Distrito Federal, a autoridade judiciária competente para processar e julgar este ilícito continua sendo o Conselho de Justiça, Especial ou Permanente. No âmbito da União, a autoridade competente também é o Conselho de Justiça, Especial ou Permanente, uma vez que a Emenda Constitucional 45/2004 não alcançou a Justiça Militar da União, não existindo nesta seara a realização de julgamentos apenas pelo Juiz-Auditor, tal como no âmbito dos entes federados. Devido a sua natureza e por ser um crime propriamente militar este tipo de ilícito é incompatível com a Lei Federal 9099/95 e também com a Suspensão Condicional da Pena, Sursis, devido a flagrante quebra de hierarquia e disciplina. O militar condenado por este crime faz jus desde que a pena seja inferior a quatro anos ao regime aberto de cumprimento de pena. No âmbito da Segunda Auditoria Judiciária Militar do Estado de Minas Gerais, o militar condenado ao regime aberto deve dormir todos os dias no Quartel responsável pelo cumprimento de sua execução, sob pena de revogação deste benefício, com a fixação do regime semi-aberto em atendimento as disposições estabelecidas na Lei de Execução Penal. No âmbito da União não se aplica os preceitos estabelecidos na Lei Federal 7.210/84, mas os dispositivos existentes no CPM, parte geral, que cuidam da execução penal. Além disso, no âmbito da União o Superior Tribunal Militar editou súmula impedindo a aplicação da Lei dos Juizados no âmbito da Justiça Militar da União, buscando desta forma vincular a primeira instância quanto a matéria.
Agravação de pena
Parágrafo único. A pena é agravada, se o superior é oficial general ou comandante da unidade a que pertence o agente.
A prática do desacato é um ato que demonstra uma flagrante violação aos preceitos que regem a vida militar, e o legislador ciente da importância da preservação dos pilares das Instituições Militares, a hierarquia e a disciplina, entendeu que deveria punir de forma mais severa do que aquela estabelecida no caput o militar estadual, ou mesmo o militar federal, que venha a praticar o ato de desacato em desfavor de um oficial general ou comandante de unidade. A expressão oficial general não se limita apenas ao Exército Brasileiro, General de Brigada, General de Divisão e General de Exército, mas alcança também os oficiais generais da Marinha do Brasil, Contra-Almirante, Vice-Almirante e Almirante de Esquadra, e também os oficiais generais da Força Aérea Brasileira, Brigadeiro do Ar, Major-Brigadeiro do Ar, e Tenente-Brigadeiro do Ar. O legislador também entendeu que o ato praticado contra o Comandante da Unidade a qual pertence o infrator também deve ter como conseqüência o agravamento da pena, devendo se entender como comandante de unidade, os oficiais que se encontram a frente de um Comando Regional, um Batalhão, uma Companhia Independente, ou Companhia Especial e ainda de uma Companhia. Deve-se esclarecer ainda que o crime em desfavor de um oficial general poderá ser praticado não apenas por um militar das Forças Armadas, mas também por um militar das Forças Auxiliares, o que trará como conseqüência o surgimento de um conflito de competência, positivo ou negativo. A respeito do assunto existem duas correntes, uma que entende que a competência seria da Justiça Militar da União, tendo em vista a qualidade da vítima, e uma outra corrente que considera a competência da Justiça Militar dos Estados e do Distrito Federal, tendo em vista o estabelecido no art. 125, § 4º, do vigente texto constitucional. A princípio a corrente que deve prevalecer é a segunda, mas a matéria poderá ser levada ao Superior Tribunal de Justiça, que será o responsável em definir a competência. Se eventualmente for fixada a competência da Justiça Militar da União, o infrator em sendo um oficial de polícia deverá ser processado e julgado perante o Conselho Especial de Justiça, e não perante o Conselho Permanente de Justiça, sob pena de nulidade de todo o processo, e ainda o trancamento da ação penal militar por meio de habeas corpus. O militar estadual é militar para todos os efeitos legais, inclusive quanto ao critério de fixação de competência caso seja processado e julgado perante a Justiça Militar da União.
Desacato a militar
Art. 299. Desacatar militar no exercício de função de natureza militar ou em razão dela:
Pena - detenção, de seis meses a dois anos, se o fato não constitui outro crime.
O militar estadual ou federal no exercício de suas funções constitucionais, independentemente de sua graduação ou posto, é um representante do Estado, sendo, portanto uma autoridade ou agente de autoridade investido de uma parcela de poder do Estado, e por isso merece respeito quando se encontra no exercício de função de natureza militar ou em razão dela. O crime apesar do nome iuris não é um crime propriamente militar, uma vez que pode ser praticado por qualquer pessoa, civil ou militar, e até mesmo por um militar com posto ou graduação superior ao da vítima. Percebe-se que o desacato a militar leva em consideração a função que está sendo desenvolvida pela vítima, a qual conforme foi mencionada encontra-se naquele momento representando o Estado, em especial a Administração Pública Militar. O sujeito ativo deste crime conforme foi mencionado é qualquer pessoa, sendo que no caso do civil que pratica o crime em desfavor de um militar estadual este não poderá ser processado e julgado perante a Justiça Militar do Estado ou do Distrito Federal. Neste caso o infrator será processado com base no Código Penal Brasileiro que tratou da matéria no art. 331, segundo o qual, “Desacato - Art. 331 - Desacatar funcionário público no exercício da função ou em razão dela:Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, ou multa”. O sujeito passivo do ilícito é em um primeiro momento a Administração Pública Militar da União, dos Estados e do Distrito Federal e em um segundo momento o militar que foi ofendido no exercício de suas funções. O elemento objetivo, ou seja, a maneira como o crime pode ser praticado encontra-se representado pelo verbo desacatar, que significa, diminuir, desconsiderar, menosprezar, o militar que se encontra no exercício de suas funções. O elemento subjetivo é o dolo, e não existe a prática do desacato na forma culposa, ou seja, a desconsideração do militar mediante um ato de imprudência, negligência ou mesmo imperícia. A ação penal neste caso é uma ação penal pública incondicionada, mesmo que o militar não tenha se sentido ofendido, e caberá ao Ministério Público ingressar com a ação penal, uma vez que o Estado representado pela Administração Militar também é vítima em decorrência do ato praticado contra um dos integrantes das Forças Armadas ou das Forças Auxiliares. A pena prevista para o ilícito penal é uma pena mínima de seis meses de detenção e uma pena máxima de dois anos de detenção, desde que o ato praticado não configure um outro crime, como por exemplo, uma lesão corporal de natureza grave, dentre outros. Tendo em vista a pena prevista para o ilícito penal seria possível a aplicação dos Institutos da Lei dos Juizados Especiais Criminais, mas não devido a natureza do ilícito não se recomenda a sua concessão, a não ser quando o infrator for um civil processado perante a Justiça Militar do União.
Desacato a assemelhado ou funcionário
Art. 300. Desacatar assemelhado ou funcionário civil no exercício de função ou em razão dela, em lugar sujeito à administração militar:
Pena - detenção, de seis meses a dois anos, se o fato não constitui outro crime.
A administração militar, estadual ou mesmo federal, possui em seus quadros não apenas militares, mas também funcionários civis, e em alguns casos funcionários terceirizados que prestam serviços mediante uma remuneração paga mensalmente as empresas contratadas. Acontece que o artigo sob análise entende que o funcionário civil assim como acontece com os demais funcionários que trabalham na administração pública direta ou indireta, merece respeito e consideração por parte daqueles que se dirigem as organizações militares. No caso sob análise é importante se observar que a figura do assemelhado a muito deixou de existir na administração militar, e que a norma penal militar permanece apenas no tocante ao funcionário civil, em especial aquele que trabalha na administração militar federal, pois no caso da administração militar estadual a Justiça Militar Estadual somente poderá julgar o infrator caso este seja um militar estadual. Caso contrário, o infrator por força do estabelecido no texto constitucional terá que ser processado e julgado perante a Justiça Comum. O sujeito ativo deste crime é qualquer pessoa, ou seja, tanto o civil como o militar poderão praticar o crime de desacato a funcionário civil. O sujeito passivo do ilícito penal militar é o funcionário civil que sofre a ação de ser desacatado no exercício de suas funções, ou em razão dela em lugar sujeito a administração militar, como por exemplo, no interior de uma organização militar. Não se deve esquecer que a Administração Militar também é vítima neste crime, uma vez que não se admite que um funcionário de um órgão militar seja diminuído, desconsiderado. O elemento objetivo, ou seja, a maneira como o crime pode ser praticado encontra-se representado pelo verbo desacatar, que significa, diminuir, desconsiderar, menosprezar, o funcionário civil que se encontra no exercício de suas funções ou em razão dela em local sujeito a administração militar. Percebe-se que se o funcionário civil for desacato em local que não se encontre sob a administração militar, como por exemplo, em uma rua da cidade, ou mesmo em um estabelecimento comercial não existirá crime estabelecido neste artigo. O elemento subjetivo é o dolo, ou seja, a vontade livre e consciente de praticar o crime de desacato ao funcionário civil. Não existe a prática do desacato na forma culposa, ou seja, a desconsideração do funcionário civil mediante um ato de imprudência, negligência ou mesmo imperícia. A ação penal neste caso é uma ação penal pública incondicionada, mesmo que o funcionário civil não tenha se sentido ofendido caberá ao Ministério Público ingressar com a ação. A pena prevista para o ilícito é uma pena mínima de seis meses de detenção e uma pena máxima de dois anos de detenção, se o fato praticado não constituir um outro crime, ou seja, um crime mais grave previsto no Código Penal Militar. Devido a natureza do ilícito, apesar da pena estabelecida, também não é possível a aplicação do instituto da transação ou mesmo da suspensão estabelecidos na Lei 9099/95.
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