P A R E C E R  J U R Í D I C O
SOBRE DISSOLUÇÃO DE SOCIEDADE

 
                     Toda sociedade comercial tem por objetivo imediato, do ponto de vista das pessoas que a compõem, e do ponto de vista da remuneração do capital, com que cada delas participa, é o que se denomina "lucro". Isto é, aos sócios-cotistas interessa, em primeiro lugar, o lucro.
                                               
                    Contudo, há interesses outros, de cunho social, de ordem pública e econômica, que devem ser considerarados, como, por exemplo, os empregos gerados, a produção ou transformação econômica de bens úteis, a geração de divisas, etc, etc.. Sobrelevam, portanto, pelo alcance do bem comum, estes interesses, àqueles dos sócios, individualmente, considerados.

                                               
                    Por tais razões, a doutrina e a jurisprudência se firmaram pela primazia da preservação da empresa. E, a partir deste entendimento, se construiu pretoriamente, a chamada "dissolução parcial da sociedade", com o que se permite a retirada do sócio dissidente, apurando-se seus haveres e preservando a sociedade com os outros sócios.


                    Exatamente. Cuida-se, na hipótese, de uma possibilidade de dissolução parcial de sociedade, por cotas limitada, composta apenas de dois sócios, em face do desaparecimento da affectio societatis entre ambos.
                                               
                     O que, na verdade, retrata a questão é a velha discussão de que, sendo a sociedade composta apenas de dois sócios, com a saída de um deles, teria ela de ser dissolvida e liquidada ou se ela pode continuar a existir com a pessoa do sócio remanescente, apurando-se apenas os haveres do sócio retirante.


                    A questão foi, primitivamente, muito debatida, chegando a predominar o entendimento de que teria, a empresa, de ser dissolvida e liquidada, na medida em que não se concebia, à luz do Direito Comercial, sociedade apenas com uma pessoa, o que seria um contradictio in terminis. 

                      Mas, na verdade, o Direito Comercial evoluiu, para receber a aragem dos novos ventos que as novas realidades sociais, comerciais e econômicas sopravam e foi, assim, evoluindo para o firme entendimento de que deve predominar, tanto quanto possível, a sociedade comercial, facultando-se, num caso de sociedade de apenas dois sócios, que, com a saída de um deles, perdure a sociedade, apurando-se apenas os haveres do sócio dissidente. 

                      Dentro, pois, desta nova aragem do Direito Comercial, é plenamente sustentável a tese de que, com a saída de um sócio, a sociedade continua com o remanescente, devendo-se apenas apurar os haveres do sócio retirante, conforme a tendência de nossos tribunais:

SOCIEDADE LIMITADA - DISSOLUÇÃO PARCIAL -ADMISSIBILIDADE. Ainda quando composta de apenas dois  sócios, admissível é a dissolução parcial da sociedade por cotas de responsabilidade limitada, aplicando-se subsidiariamente o art. 206, inc. I, d, da Lei das Sociedades Anônimas, e em atendimento ao princípio da preservação da sociedade e da utilidade social desta, apurando-se os haveres do sócio retirante, devendo, entretanto, ser recomposta a sociedade no prazo de 1 ano, sob pena de dissolução de pleno direito (TA-MG - Ac. da 5ª Câm. Cív. publ. no DJ de 16-6-92 - Ap. 103.219-3-BH - Rel. Juiz Marino Costa - José Roberto Castilho vs. Neyda Maria Campos Amaral).


 
SOCIEDADE COMERCIAL - DISSOLUÇÃO PARCIAL - PROCESSAMENTO- Tratando-se de dissolução parcial de sociedade, deve-se agir como se de dissolução total se tratasse, embora apenas em relação ao sócio que sai, porque, para esse, o vínculo social se extingue, continuando, assim, normalmente a sociedade. A dissolução, portanto, não implica a perda do objeto da sociedade e não enseja a sua dissolução total, pois compete aos sócios remanescentes tocar o negócio (TJ-SP - Ac. unân. da 16ª Câm. Cív. julg. em 3-5-94 - Ap. 226.149-2/5-São José dos Campos - Rel. Des. Pires de Araújo).
 
SOCIEDADE COMERCIAL - FIM DA "AFFECTIO SOCIETATIS" - DISSOLUÇÃO PARCIAL - A affectio societatis, elemento específico do contrato de sociedade comercial, caracteriza-se como uma vontade de união e aceitação das áleas comuns do negócio. Quando este elemento não mais existe em relação a algum dos sócios, causando a impossibilidade da consecução do fim social, plenamente possível a dissolução parcial, com fundamento no art. 336, I, do Código Comercial, permitindo a continuação da sociedade com relação aos sócios remanescentes (STJ - Ac. unân. da 3ª T. publ. no DJ de 15-4-96, pág. 11.531 - Agr. Reg. no Agr. 90.995-RS - Rel. Min. Cláudio Santos - Advs.: Cláudio Leite Pimentel e Luiz Carlos E. Piva ).

SOCIEDADE COMERCIAL - Dissolução parcial. Empresa constituída por apenas dois sócios. Rompimento da affectio societatis. Possibilidade de o réu, quotista majoritário e remanescente, admitir novo sócio ou tocar o negócio individualmente. Dissolução com apuração de haveres do autor determinada. Recurso provido para esse fim. (TJSP - AC 172.398-2 - 14 ª C. - Rel. Des. Franciulli Netto - J. 20.08.91) (RJTJESP 132/224)

SOCIEDADE COMERCIAL - Dissolução parcial. Discórdia grave entre os sócios. Rompimento da affectio societatis. Cabimento da dissolução pela impossibilidade de execução dos fins sociais. Arts. 336, I, do CCo., e 1.399, III, do CC. Apuração de haveres dos excluídos de forma mais ampla possível, em face dos fatos trazidos para os autos. Aplicabilidade, ademais,do art. 5º, XX, da CF. Ação procedente. ( TJSP - AC. 160.235-2 - 19ª C - Rel. Des. Mohamed Amaro - J. 18.03.91). (RJ 180/103)

                      Sob o tema, comenta Fran Martins (in Curso de Direito Comercial, 12ª ed., 1987, págs. 299/300):

                       "No nosso ponto de vista, havendo ou não cláusula contratual, reduzindo-se o número de sócios a apenas um, poderá o mínimo de dois ser reconstituído no prazo de um ano, a contar da data em que foi constatada a existência do único sócio, aplicando-se ao caso, por força do art. 18 do Decreto nº 3708/19, a regra de letra d do art. 206 da Lei das sociedades anônimas, que permite tal procedimento a essas sociedades quando se constata que há apenas um acionista. A Lei das sociedades anônimas, acompanhando o desenvolvimento das empresas e reconhecendo o alto valor dessas nas atividades das sociedades, sempre facultou a continuação das atividades da companhia quando o número de sócios se tornava inferior ao mínimo estabelecido na lei. E a lei atual, permitindo que a anônima se forme e funcione regularmente com apenas dois sócios (artigo 80, I), expressamente dispôs que, reduzida a sociedade a um único acionista, o mínimo de dois seja reconstituído no prazo de um ano, sob pena de ser a companhia dissolvida. O mesmo deve acontecer com as sociedades que se formam de acordo com o art. 302 do Código Comercial entre as quais a sociedade por quotas."

 
                       Por igual, ressalta Rubens Requião:
                                               
                      "A dissolução parcial passou a ser, em último caso, a regra indicada para solução dos problemas cruciais da sociedade nos seus momentos críticos. Em nossa tese de concurso para a cátedra de direito comercial, numa de suas conclusões, expunha-mos a nossa convicção de que "consideramos obsoleto o instituto da dissolução da sociedade comercial na extensão adotada pelo Código. O princípio preservativo da sociedade ou da empresa impõe a necessidade de novas fórmulas, que o direito comercial encontrou na exclusão do sócio.


                      Para encaminhar nossos estudos, vamos partir, pois, de outra classificação mais moderna e lógica. Propomos então a classificação, em duas espécies, da dissolução social: a) dissolução total e b) dissolução parcial. É bem verdade que essa expressão dissolução parcial é contestada por alguns autores, e entre nós pelo professor Hernani Estrela, que não se conforma com essa linguagem. Mas a imposição de seu uso tornou-a correntia, não só nas decisões judiciais como nos livros de doutrina de autores de grande tomo, motivo por que não vemos inconveniente em usá-la desembaraçadamente."
 
                      Em prosseguindo, o art. 15 do Decreto nº 3.708, de 1919, prescreve que assiste aos sócios que divergirem da alteração do contrato social a faculdade de se retirarem da sociedade, obtendo o reembolso da quantia correspondente ao seu capital, na proporção do último balanço aprovado. O referido dispositivo legal, sobre cuja interpretação concordam doutrina e jurisprudência, não foi revogado pelo artigo 38, inciso V, da Lei nº 4.726, de 1965.

                      No entanto, importantíssimo ressaltar que há de se resguardar a integralidade do patrimônio do sócio retirante, consubstanciado no seu capital e lucros inserido na sociedade. Isto significa estabelecer que somente a forma pactuada no contrato social - para os casos de retirada - não satisfaz, com eficácia, a apuração dos haveres do sócio excluído da referida sociedade.
 
                      Deve-se observar in casu, o enunciado da Súmula 265 do Eg. STF:

                     "Na apuração de haveres, não prevalece o balanço não aprovado pelo sócio falecido, excluído ou que se retirou."
 
                      É conveniente, assim, assegurar ao sócio, que se retira da sociedade -de receber o valor de sua cota com base em apuração de haveres que encontre valores reais e tudo o mais o que constituir o fundo de comércio e não apenas valores históricos ou contábeis. 

                     Como referido pelo Desembargador Fernandes Filho, em caso análogo:

                    "Em outras palavras: a apuração dos haveres se fará com base em valores reais, e não apenas em valores contábeis ou históricos, sob pena de enriquecimento ilícito dos réus, ao indireto confisco da propriedade dos autores, pois a tanto equivaleria sua exclusão da sociedade sem o efetivo e integral recebimento do valor do patrimônio que nela tem." (In Jurisprudência Mineira, vol. 82, pág. 40).
 
                     Vem, também, muito a propósito o seguinte acórdão:

SOCIEDADE - DISSOLUÇÃO PARCIAL - SÓCIO RETIRANTE - APURAÇÃO DOS HAVERES. Na apuração dos haveres para determinação daqueles do sócio que se retira devem ser considerados os seus valores reais e não aqueles do último balanço (TJ-RJ - Ac. unân. da 2ª Câm. Cív. reg. em 26-8-93 - Ap. 1.485 - Rel. Des. Murillo Fábregas).
 
                      Reitere-se que não é justo e nem consentâneo com as vontades dos sócios que a sua retirada da sociedade, prevista contratualmente, se dê por valores meramente escriturais. A convenção, em todos os contratos, de um balanço especial para o caso, ainda que se interpretando no sentido de que se trata de um balanço fora do tempo do balanço regular previsto no art. 10, § 4º , do velho Código Comercial, tem sua razão de ser. Pretende-se um balanço atual. Não se vê como esta atualidade não diga respeito a que os valores sejam efetivamente reais ao tempo, ou valores de mercado. E que não seja realizado de forma ampla, atualizada, objetivando total satisfação não só do patrimônio inserido na sociedade, bem como, dos lucros e da valorização do fundo de comércio.

                      Mas, a hipótese em causa trata, em especial, da possibilidade de que um dos sócios, não esteja cumprindo com as suas obrigações contratuais ou legais. Que o sócio esteja agindo contra a lei; que o sócio esteja agindo com excesso de mandato ou que esteja infringindo o contrato social, deixando, destarte, de cumprir com as suas obrigações.

                      É comum fazer-se a distinção entre responsabilidade por violação de obrigação derivada de um negócio jurídico, cujo descumprimento caracterizaria o fato ilícito civil gerador do dano, e a responsabilidade delitual ou extracontratual, que abstrai a existência de um contrato previamente celebrado e decorre de um ato ilícito absoluto, violador das regras de convivência social, e causador de um dano injusto.

                     A primeira encontra seu fundamento no art. 1.056, do Código Civil: "Não cumprindo a obrigação ou deixando de cumpri-la pelo modo e no tempo devidos, responde o devedor por perdas e danos"; a segunda, no art. 159, do Código Civil: "Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência, ou imprudência, violar direito, ou causar prejuízo a outrem, fica obrigado a reparar o dano".

                     A responsabilidade civil encontra amparo quando o agente não cumpre a obrigação ou deixa de cumpri-la pelo modo e no tempo devidos, respondendo por perdas e danos. Ou quando o agente prática uma ação ou omissão voluntária; ou uma negligência ou imprudência; ou uma violação de direito; ou, finalmente, quando causa prejuízo a outrem. E, assim, fica obrigado a reparar o dano causado.

                     Isto é, quando o agente assume uma responsabilidade, tal qual lhe impõe um contrato de sociedade comercial, vindo a agir de forma culposa ou dolosa, contrariando os dispositivos contratuais e legais, poderá, evidentemente, responder pela indenização por perdas e danos.
                     No contrato bilateral, os contraentes se obrigam reciprocamente uns diante dos outros, pois a prestação de um corresponde à contraprestação do outro, havendo um nexo ou sinalagma que liga as obrigações das duas partes, mantendo-as numa relação de correspectividade e de interdependência.
 
C O N C L U S Ã O
 
                     Como já destacamos existe a possibilidade de o sócio remanescente, dar continuidade aos negócios, mesmo com a retirada do sócio minoritário. Pode ocorrer a substituição do sócio retirante por um outro num determinado prazo ou, simplesmente, aceitarem estes o reembolso dos valores devidos, apurados em balanço especial, em 12 prestações, iguais e sucessivas, de conformidade com o que consta na cláusula 6ª do contrato social.

                     A affectio societatis, elemento específico do contrato de sociedade comercial, caracteriza-se como uma vontade de união e aceitação das áleas comuns do negócio. Quando este elemento não mais existe em relação a algum dos sócios, causando a impossibilidade da consecução do fim social, sendo plenamente possível a sua exclusão ou retirada; ou plenamente possível a dissolução da sociedade.

                     A hipótese trata, também, da possibilidade de retirada de um sócio, de uma sociedade de responsabilidade limitada, regulada pelo Decreto nº 3.708/19, sob o fundamento de ter, o outro sócio, cometido atos contrários ao contrato social, à lei e agido com excesso de mandato, causando enormes prejuízos à empresa e ao sócio retirante.
Trata-se, então, de uma questão de responsabilidade civil que ocorre quando o agente não cumpre a obrigação ou deixa de cumpri-la pelo modo e no tempo devidos, respondendo por perdas e danos; que encontra o seu fundamento no art. 1.056 do Código Civil.


                     Ou quando o sócio prática uma ação ou omissão voluntária; uma negligência ou imprudência; uma violação de direito; ou, finalmente, quando causa prejuízo a outrem, fica, também, obrigado a reparar o dano causado.

                      Isto é, quando o sócio assume uma responsabilidade, tal qual lhe impõe um contrato de sociedade comercial, vindo a agir de forma culposa ou dolosa, contrariando os dispositivos contratuais e legais, poderá, evidentemente, responder pelos seus atos ou atitudes, com fundamento no art. 159, do Código Civil.
 
WSanches
Enviado por WSanches em 12/05/2012
Código do texto: T3663380
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