A letra fria e dura da lei! === PARTE II ===
Romeu contatou o advogado da empresa onde exercia um cargo de direção, sendo devidamente amparado por ele que prometeu que no menor espaço de tempo possível estaria na delegacia para tentar contornar a situação.
Pouco mais de meia hora após o contato, já estava na delegacia o Dr. Alex Coimbra, emitente autoridade em Direito Penal, que chefiava o Departamento Jurídico da empresa de atuação de Romeu.
Com a devida aquiescência do delegado, o Dr. Alex Coimbra reuniu-se em uma sala com Romeu para inteirar-se de todos os detalhes do caso.
Após a reunião com Romeu, o Dr. Alex Coimbra adentrou imediatamente a sala do delegado entregou-lhe uma folha de papel informando:
--- Caríssimo Doutor! Eis um pedido de HC para meu cliente. É
somente pró-forma pois meu cliente trata-se de réu primário, com
endereço certo, profissão definida, exercendo com esmero suas
funções...
--- Meu prezado doutor, não é meu desejo colocar em xeque seus
conhecimentos, muito pelo contrário! Porém, Vv. Ss. deve lembrar- se que o crime pelo qual está sendo acusado seu cliente é de
estupro de vulnerável, que é inafiançável sendo que a lei 12.015
de 07/08/2009 acrescentou ao Código Penal o artigo 217-A, que
trata do assunto.
--- O prezado Doutor não precisa se preocupar que estou
perfeitamente ciente do que ‘reza’ o artigo que trata sobre o
assunto no Código Penal, bem como sobre todas as vertentes que
favorecem meu inocente cliente...
--- Em sendo assim, reitero, Vv. Ss. deve aguardar o retorno do
parecer da Promotoria Pública e que o seu cliente deve
permanecer aqui detido até a manifestação...
--- Ok, doutor! Faça os trâmites legais e deixe que cuido de minha
parte... Peço-lhe especial deferência para estar novamente com
meu cliente...
--- Vv. Ss. esteja à vontade...
Ato contínuo o Dr. Alex Coimbra retirou-se e o delegado ‘despencou’ sobre sua cadeira, comentando ‘en passant’ com o escrivão:
--- Que ‘rabo de foguete’ sobrou para nós, hein! Bem no nosso
plantão surgiu este caso ‘inusitado’ de um crime de estupro contra
vulnerável e que é pior, após decorrido tanto tempo, tenho quase
certeza absoluta que o senhor Romeu ficará livre desta haja vista
o crime praticado, dependendo se a pena que for arbitrada pelo
meritíssimo juiz for menor do que a pena máxima prevista... Neste
caso terá ocorrido a prescrição...
Aproximadamente meia hora depois, adentraram a sala do delegado o ‘acusado’ Sr. Romeu e ‘seu defensor’ Dr. Alex Coimbra, que foi logo comunicando:
--- Bem doutor! Vou acompanhar meu cliente e seu filho até sua
residência e vou deixar meu cartão consigo para convocar-nos
quando receber o devido parecer da promotoria pública. Há algum
inconveniente?
--- Nada a opor, doutor! O Sr. Romeu a partir deste instante está sob
sua responsabilidade...
--- Não se preocupe, doutor! O Sr. Romeu estará à disposição da
justiça em seu sabido endereço e eu também posso ser facilmente
localizado pelo direcionamentos contidos no cartão que lhe
entreguei... Senhores ... Tenham uma excelente seqüência de
plantão...
Virou-se para o Sr. Romeu, tocou-lhe levemente no braço indicando a porta de saída e abandonaram o local.
Desnecessário é descrever a comoção que existia em sua residência quando Romeu e Teobaldo por lá chegaram. Julieta, que havia sido devidamente alertada pelo Doutor Alex Coimbra sobre o que estava ocorrendo, chorando copiosamente abraçou-se ao marido e ao filho, no que foi seguida pela filha Rosalina e permaneceram ainda no lado de fora, próximos à porta de entrada, compondo um único bloco irmanados em um forte abraço, compartilhando suas lágrimas!
Como havia suposto o delegado e como tinha absoluta certeza o Dr. Alex Coimbra, apesar dos contratempos ocasionados pelas convocações para depoimentos e por estar envolvido em um processo na esfera penal, deixando de ser primário, Romeu isentou-se de sanção!
Porém, nada se compara aos danos morais enfrentados por toda a família em seu cotidiano. Talvez divulgado pelo rapaz envolvido no acidente com Teobaldo, o problema envolvendo Romeu chegou de forma deturpada aos ouvidos das pessoas ávidas por noticias sensacionalistas e alastrou-se rapidamente.
Teobaldo enfrentou grandes retaliações pelos colegas de curso, que o olhavam de forma atravessada, sendo convocado pela direção para, embora de forma velada, manifestar-se acerca da ‘fama’ de pedófilo que envolveu seu genitor!
Coisa parecida ocorreu com Rosalina, que teve proibição de alguns pais de colegas da escola que elas continuassem com amizade com a filha de um criminoso!
Julieta, aqui e ali, também se deparou com alguns constrangimentos quando foi simplesmente ignorada por algumas vizinhas e ‘amigas’ de longa data! Em outros casos, solidárias amigas, prestaram sincero apoio à amiga por ‘tudo o que havia passado’ em sua infância e adolescência!
E Romeu, o protagonista principal, vez ou outra, notava cochichos e ‘apontamentos’ em sua direção, tanto na empresa onde sempre foi tratado como um ‘cidadão acima de qualquer suspeita’, como na sua vizinhança!
Foi necessário que a alta direção da empresa redigisse e fixasse um comunicado, esclarecendo pormenores do que efetivamente havia ocorrido com seu dedicado e exemplar servidor!
Recostado no silêncio de seu escritório, o iminente advogado criminalista Alex Coimbra, remoia pensamentos acerca deste seu último caso, satisfatoriamente resolvido:
--- Quiçá a opinião pública houvesse acatado o pensamento da
maioria dos excelentíssimos ministros do Supremo Tribunal Federal
quando entenderam que em um relacionamento afetivo entre duas
pessoas que demonstrem mútuo amor, mesmo que uma das partes
seja menor de quatorze anos de idade e que se unam tendo uma
vida em comum, constituindo família, concebendo ou não outros
filhos. Felizmente neste caso facilmente pude utilizar o fato de que
a prescrição já havia começado a correr da data do fato estando
o possível crime já prescrito quando o senhor Romeu foi acusado
pelo excelentíssimo Delegado de polícia. Bastou que eu recorresse
ao que ‘reza’ o artigo 109 CP.
Fico imaginando quantas famílias espalhadas por este nosso
imenso país não estão enquadradas nesta situação... E haja
promotoria pública para analisar tantos casos...
Do código Penal:
Praticar sexo com pessoas menores de 14 anos, ainda que haja o consentimento, é considerado estupro e a pena prevista é de oito a 15 anos de prisão.
Outra novidade é que agora todos os crimes sexuais que constam na nova legislação podem sofrer aumento de 50% da pena quando o ato resultar em gravidez.
A lei 12.015, de 7.08.2009 acrescentou, ao Código Penal, o art. 217-A, contendo o tipo penal de estupro de vulnerável, assim definido: “Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 (catorze) anos”. A pena cominada é reclusão, de 8 (oito) a 15 (quinze) anos. O § 1° estabelece: “Incorre na mesma pena quem pratica as ações descritas no caput com alguém que, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato, ou que, por qualquer outra causa, não pode oferecer resistência."
Por essa razão, é preciso interpretar a norma do caput do art. 217-A em harmonia com a norma contida no seu § 1° e daí extrair o conceito de vulnerável.