COTAS EM UNIVERSIDADES PÚBLICAS OFENDE O PRINCÍPIO DA IGUALDADE?
O sistema de cotas em universidades públicas configura desrespeito ao princípio segundo o qual todos os cidadãos devem obter tratamento de igualdade perante a Lei? Ou ao contrário ao possibilitar acesso de estudantes oriundos de escolas públicas possibilitam fraternidade e redução nas desigualdades sociais, culturais e ampliam possibilidade de igualdade de aptidão e oportunidades?
A polêmica surge em decorrência do julgamento do Recurso Extraordinário 597285 pelo Supremo Tribunal Federal. O recorrente Giovane Pasqualito Fialho foi reprovado no vestibular para o curso de administração, cuja reserva de cotas, caso não existente estaria aprovado.
Do total de 160 vagas, 48 disputadas exclusivamente por cidadãos em razão de sua etnia e condição social, dez vagas para indígenas, ou seja, 102(cento e duas) foram destinadas para os demais concorrentes.
O advogado do aluno reprovado entende que ao ser aplicado o sistema de cotas violou a igualdade de competição dos candidatos submetidos ao vestibular e causou prejuízo para seu cliente, cujo sistema se não existisse estaria aprovado.
Anteriormente Giovane Pasqualito Fialho havia obtido liminar na Justiça Federal e sentença a qual lhe conferiram direito à matrícula e frequência regular ao curso de administração juntamente com os demais alunos.
Todavia o Tribunal da Justiça Federal ao julgar a lide reformou a sentença, ou seja, Giovane Pasqualito Fialho que frequentou aulas fez provas, criou expectativa de formar em administração teve todos os atos anteriormente mencionados revogados pela decisão judicial, o que sem sombra de dúvidas viola sua dignidade como pessoa humana e afronta a teoria do fato consumado a qual deve ser aplicada em todos os processos.
A teoria do fato consumado em apertada síntese determina que o julgador ao decidir o processo deve estar atento para todos os efeitos que a decisão anterior gerou no mundo fático, ou seja, tendo o aluno frequentado aulas, submetido às provas, deveria o acórdão confirmar a sentença para preservar os atos praticados pelo aluno.
Entretanto, o Tribunal de forma desumana, cruel, não observou o postulado da teoria do fato consumado, decisão lastimável, vergonhosa, a qual o aluno buscou a reforma junto ao Supremo Tribunal Federal visando obter tratamento de igualdade.
O Representante do Ministério Público Federal, responsável por fiscalização da Constituição e Aplicação da Legislação, manifestou-se no sentido de que o sistema de cotas viola a Constituição Federal.
O Supremo Tribunal Federal negou provimento ao recurso, entendeu que o recorrente aluno Giovane Pasqualito Fialho não tinha direito de permanecer como aluno no curso de administração.
Entretanto corretamente o ministro Marco Aurélio votou pelo provimento do recurso, entendimento do qual compartilhamos, conforme a seguir.
Segundo Pedro Lenza:
“igualdade material, uma vez que a lei deverá tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais, na medida de suas desigualdades. Isso porque, no Estado Social ativo, efetivador dos direitos humanos, imagina-se uma igualdade mais real perante os bens da vida, diversa daquela apenas formalizada perante a lei”. (Lenza, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado/Pedro Lenza, página 875. 15 ed. rev. Atual e amp.-São Paulo: Saraiva,2011).
Ora o fato de certas camadas da sociedade terem ou não tido educação de qualidade não pode ser utilizado para criar tratamento desigual entre candidatos à mesma vaga em vestibular de ensino superior, sob pena de haver tratamento flagrantemente desigual, o que viola a igualdade que deve ser dispensada pelo Estado Democrático para todos os seus cidadãos, art. 5, caput, da Constituição da República Federativa do Brasil.
Embora sedutor o argumento acerca de que a reserva de vagas possibilita mais facilidade de acesso a pessoas menos privilegiadas, trata-se apenas de reconhecimento de incompetência do Estado em oferecer ensino de qualidade. Deve o estado implementar medidas para tornar a educação pública de qualidade melhor, mas não criar decisões judiciais inconstitucionais para afastar a sua responsabilidade de oferecer serviço público de ensino com eficiência e excelência, o que é sua obrigação, nos termos 205 e art. 206, inciso I, da Constituição da República Federativa do Brasil/1988, in verbis:
Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.
Art. 206. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:
I - igualdade de condições para o acesso e permanência na escola;
Muito ao contrário a decisão do Supremo Tribunal Federal está simplesmente reconhecendo a péssima qualidade do ensino público brasileiro, violou o princípio da igualdade entre os candidatos, quando deveria aplicar o princípio de que todos devem concorrer às mesmas vagas do vestibular cujo critério de aprovação deve ser tão somente o mérito intelectual de cada concorrente.
Referida decisão não tem o efeito esperado de proporcionar fraternidade e redução nas desigualdades sociais, culturais, ao contrário está aumentando a desigualdade intelectual, reduz as possibilidades de igualdade de aptidão e oportunidades, pois reconhece péssima qualidade do ensino público e incentiva que assim o Estado continue a manter a educação.
Com todo respeito, o acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal viola o princípio da igualdade, o que se mostra lastimável.
O acórdão do Supremo Tribunal Federal deve ser repelido pelo Poder Judiciário Brasileiro e operadores de direito no conhecido controle difuso de constitucionalidade, visto que o acórdão embora precedente importante não deve servir de paradigma para outros processos.
Dessa forma, o acórdão do Supremo Tribunal Federal violou o princípio da igualdade, cabendo aos operadores de direito não adotar o posicionamento do Supremo Tribunal Federal.