Comentários ao art. 205, caput, do Código Penal Militar
Homicídio simples
Art. 205. Matar alguém:
Pena - reclusão, de seis a vinte anos.
O crime de homicídio acompanha a humanidade desde quando esta passou a se organizar em grupos sociais e políticos, ou mesmo desde quando a espécie humana passou a se fazer presente no Planeta Terra, após a extinção dos dinossauros. Para muitos estudiosos, o primeiro homicídio que se tem notícia encontra-se descrito na Bíblia quando Caim matou Abel. Mas, não se pode esquecer que a Bíblia trabalha com o homem já na condição de evoluído, ou seja, na condição homo sapiens, mas para muitos, como por exemplo, Darwin, houve toda uma evolução na espécie humana, e com certeza na luta pela sobrevivência os homens devem ter praticado atos atentatórios uns contra a vida do outros. Mas, a repugnância por este ilícito também se fez presente no decorrer da história da humanidade. A sociedade não admite que uma pessoa possa tirar a vida da outra. Somente em casos excepcionais que devem estar previstos em lei é que se admite que uma pessoa possa tirar a vida da outro, é o que se denomina de excludentes de ilicitude e que se encontram presentes tanto no Código Penal Brasileiro como no Código Penal Militar. O sujeito ativo deste crime que é um crime impropriamente militar, uma vez que se encontra previsto também no art. 121, do Código Penal Brasileiro, a princípio é qualquer pessoa, mas no caso da norma castrense pode-se afirmar que esta encontra-se voltada para o militar que venha a praticar o crime de homicídio contra um outro militar, ou contra um civil. No caso sob comento, quando se afirma que o crime poderá ser praticado por um militar significa que este poderá ser um militar estadual, distrital, ou mesmo um militar federal que se encontre no exercício de suas funções, ou eventualmente mesmo não se encontrando no exercício de suas funções venha a praticar o crime contra um outro militar. O sujeito passivo deste crime imediato é o Estado e o sujeito passivo mediato é qualquer pessoa, civil ou militar, que seja vítima da ação praticada pelo agente. O crime admite tanto a forma consumada com o resultado morte, como a forma tentada aonde por circunstâncias alheias a vontade do agente a vítima não venha a óbito. Conforme se verifica ainda do texto constante no tipo penal o homicídio simples é aquele praticado sem a presença de qualificadores, pois caso estas se façam presentes o homicídio deixa de ser simples e passa ser qualificado na forma que foi estabelecido pela lei. O elemento objetivo deste crime está representado pelo verbo matar alguém, ou seja, tirar a vida de uma outra pessoa, civil ou militar. O elemento subjetivo é o dolo, ou seja, a vontade livre e consciente de matar alguém, o que se denomina na doutrina de animus necandi, ou seja, a vontade de matar. O ilícito penal admite a forma tentada. A ação penal cabível neste ilícito é pública incondicionada que ficará a cargo Ministério Público. A pena prevista para este crime é a pena de reclusão de no mínimo seis anos e de no máximo vinte anos, semelhante à pena prevista para o homicídio simples previsto no art. 121, do Código Penal Brasileiro. O militar condenado por homicídio simples não poderá iniciar o cumprimento da pena em regime fechado, mas em regime semi-aberto, ainda que seja primário e tenha bons antecedentes. No caso do militar federal, este iniciará o cumprimento da pena na penitenciária militar. Mas, existem outras observações que devem ser feitas quanto ao crime de homicídio em razão das alterações ocorridas no Código Penal Militar por força do advento da Lei Federal nº. 9.299/1996 que alcança tanto a Justiça Militar da União como a Justiça Militar dos Estados e do Distrito Federal. O militar que no exercício de suas funções matar um civil conforme o estabelecido na Lei Federal nº. 9.299/1996 não será processado e julgado na Justiça Militar, mas no Tribunal do Júri. No período compreendido de 1996-2004, a constitucionalidade da Lei Federal que alterou o art. 9º, do Código Penal Militar, foi questionada. Mas, com o advento da Emenda Constitucional nº 45/2004, a questão no âmbito dos Estados e do Distrito Federal foi pacificada, uma vez que o art. 125, § 4º, da Constituição Federal estabeleceu expressamente que nas hipóteses do crime de homicídio praticado por militar estadual e distrital contra civil a competência será do Tribunal do Júri, no caso o Tribunal do Júri da Justiça Comum . Já no âmbito da União permanece o questionamento quanto a constitucionalidade da Lei Federal nº 9.299/1996. Para aqueles que entendem que a lei é constitucional não existem dúvidas que o militar federal que matar um civil no exercício de suas funções será processado e julgado perante o Tribunal do Júri. Mas, para aqueles que entendem que a Lei Federal nº 9.299/1996, como se demonstra no caso da Justiça Militar Estadual onde foi preciso a edição de uma Emenda Constitucional alterando a competência daquela Justiça Especializada, não existem dúvidas que a referida lei é inconstitucional e que caberá a Justiça Militar da União processar e julgar por meio do Conselho Especial ou Conselho Permanente o militar federal que venha a matar um civil. Deve-se observar ainda quanto à matéria de competência que no caso de abate de aeronaves civis que venham a invadir o espaço aéreo brasileiro ou mesmo que desobedeçam a ordens recebidas do Comando Aéreo Nacional responsável pelo tráfego de aeronaves, a competência para processar e julgar o militar responsável pela destruição da aeronave com a conseqüente morte de seus tripulantes e passageiros será da Justiça Militar da União, e não da Justiça Federal. As modificações ocorreram por força do estabelecido na lei federal 12.432 de 2011 que modificou o parágrafo único do art. 9º do Código Penal Militar, que passou a ter a seguinte redação, “Os crimes de que trata este artigo quando dolosos contra a vida e cometidos contra civil serão da competência da Justiça comum, salvo quando praticados no contexto de ação militar realizada na forma do art. 303 da Lei 7.565, de 19 de dezembro de 1986 – Código Brasileiro de Aeronáutica. Outro assunto que ainda deve ser mencionado, nestes comentários ao crime de homicídio, que por força do estabelecido na Lei Federal 9299/1996, a fase de apuração é feita na Justiça Militar, Federal ou Estadual, e posteriormente, os autos são remetidos ao Tribunal do Júri. Isto significa que no momento em que o crime de homicídio é praticado caberá ao Juiz-Auditor ou ao Juiz de Direito da Justiça Militar decidir sobre a concessão ou não da liberdade provisória, e posteriormente remeter os autos a Justiça Comum. Deve-se ressaltar ainda que a Associação Nacional dos Delegados de Polícia chegou a ingressar com uma ADIN, Ação Declaratória de Inconstitucionalidade para questionar a competência dos oficiais de polícia de presidirem um Inquérito Policial Militar destinado a apuração de um crime militar praticado por um policial militar contra um civil, e o Supremo Tribunal Federal decidiu que é possível a abertura de dois inquéritos para apurar o fato, um pela Polícia Judiciária Militar e o outro pela Polícia Civil. A decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal não resolveu a questão, mas pode-se afirmar com base na lei e sem qualquer dúvida que a competência para processar e julgar o militar acusado da prática de um crime de homicídio contra a vida de um civil, tentado ou consumado, pelo menos no âmbito dos Estados e do Distrito Federal é da Justiça Comum Estadual, mas a apuração em fase de Inquérito Policial e a lavratura de Auto de Prisão em Flagrante é da Polícia Judiciária Militar, que por força do vigente Código de Processo Penal Militar, Decreto-lei 1002, de 1969, é exercida pelos oficiais integrantes da Polícia Militar ou do Corpo de Bombeiros Militar.
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