“Mutação Constitucional”

“A vaidade e a presunção de governar para além do túmulo é a mais ridícula e insolente das tiranias”. Com essa frase Thomas Paine em 1791, no seu livro The rights of man, em tradução livre “Os direitos do Homem”, transcreveu a sua indignação a respeito dos privilégios de uma geração sobre a outra. As Constituições têm vocação de permanência, porém não são eternas ou imutáveis, se fazem necessárias adaptações às realidades do mundo fático, como a nossa própria Constituição prevê tais alterações.

As modificações podem se dar pela via formal, na qual ocorreria uma reforma constitucional, ou pela via informal, que se dá pela chamada mutação constitucional, mecanismo que permite a alteração de sentido e alcance das normas sem necessariamente alterar o texto. Tais modificações já ocorreram nas Constituições de países da Europa e América do Norte, com mudanças materiais substancialmente importantes, sem qualquer alteração no seu texto.

Louvadamente já ficou para trás o conceito positivista normativista que separava o Direito da realidade dos fatos. A mutação constitucional se realiza por via da interpretação dos costumes e práticas políticas socialmente aceitas. Sua legitimidade se apresenta no ponto de equilíbrio entre a rigidez da Constituição, que proporciona segurança jurídica dentre outras garantias e a plasticidade das suas normas, que busca adaptá-las as novas demandas sociais. Evidente que essas alterações têm limites, dentre outros, empedrados nos Direitos Fundamentais e até mesmo na semântica da interpretação.

A adequação da Constituição pode dar-se por ações estatais ou por comportamentos sociais, incumbindo à Administração e ao Judiciário a sua aplicação. Essas adaptações na Carta Magna do nosso país surgem através da interpretação da norma que vai determinar o sentido e alcance da mesma constante na Constituição. Como ocorreram recentemente na matéria relativa às relações homoafetivas que não tinham previsão Constitucional, não obstante a isso, as normas referentes à liberdade de expressão e sigilo de correspondência aplicam-se inequivocamente as novas tecnologias, que não haviam sido previstos na Carta de 1988.

Como se vê a mutação constitucional é um fenômeno mais intenso do que uma simples mudança jurisprudencial, ela aflui em virtude do impacto de alterações na realidade sobre o sentido, alcance ou a validade de uma determinada norma.

Lucas Carini

Lucas Carini
Enviado por Lucas Carini em 06/12/2011
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