Com bafômetro ou sem bafômetro!
Palavras-chave: Lei seca. Bafômetro. Art. 306, CTB. Exames clínicos. Princípio nemo tenetur se detegere. Princípio In dubio pro societati.
Esse artigo pretende demonstrar a legalidade da realização do teste do bafômetro como instrumento de produção de provas aplicado aos condutores em trânsito, como oportunidade eficaz de mitigação de impunidade aos condutores delituosos, bem como a indubitável possibilidade de que se venha a imputar conduta criminosa ao condutor que se nega à realização daquele.
A respeito, o artigo 302/CTB, nos informa sobre os homicídios na modalidade culposa cometido na direção de veículo automotor, todavia, o inciso V teve seu teor revogado pela Lei n.º 11.705/2008. Assim continha o retrocitado:
“Art. 302. Praticar homicídio culposo na direção de veículo automotor:
Penas - detenção, de dois a quatro anos, e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor.
Parágrafo único. No homicídio culposo cometido na direção de veículo automotor, a pena é aumentada de um terço à metade, se o agente:
V - estiver sob a influência de álcool ou substância tóxica ou entorpecente de efeitos análogos.” (grifei)
Deste modo, com a revogação do teor do inciso V, temos como abolido do ordenamento jurídico, a figura do homicídio na modalidade culposa, causado por condutor que tenha ingerido quantidade inadequada de bebida alcoólica e, portanto, vindo a provocar aquele.
Com a revogação, o vetor impunidade ficou mais distante das bancadas dos juízes do Brasil todo, isto porque, a redação anterior – acompanhando o voto do Dr. Eduardo Henrique Alferes (in Novas Normas de embriaguez no volante), levava a autoridade policial a considerar o referido homicídio como culposo.
Com fins de esclarecimentos faço nota ao art. 306, CTB que assim versa:
“Art. 306. Conduzir veículo automotor, na via pública, estando com concentração de álcool por litro de sangue igual ou superior a 6 (seis) decigramas, ou sob a influência de qualquer outra substância psicoativa que determine dependência. (Redação dada pela Lei nº 11.705, de 19.06.2008)
Penas - detenção, de seis meses a três anos, multa e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo
automotor.
(...).” (grifei)
Ora, sabemos que, um indivíduo de inteligência média, hodiernamente, instruído, entende que, tomando como base o teor alcoólico de uma cerveja (4%) e o de um vinho (que pode variar de 10% a 20%), a percentagem de seis decigramas ou 0,6 gramas de álcool por litro de sangue, equivalem –respectivamente – a uma lata de cerveja e uma taça de vinho de 150ml. Daí o motivo de a Lei n.º 11.705/2008 ter sido alcunhada de Lei Seca. Mas, na verdade, toda essa severidade foi resultado de estudos científicos que comprovam que o “nível seguro” pode-se alinhavar por pontos diferentes, já que, todos somos seres únicos, com características genéticas peculiares.
Deixando de “blábláblá” e indo ao que interessa, o teste do bafômetro é obrigatório sob a ótica do CTB, art. 277, que versa:
“Art. 277. Todo condutor de veículo automotor, envolvido em acidente de trânsito ou que for alvo de fiscalização de trânsito, sob suspeita de dirigir sob a influência de álcool será submetido a testes de alcoolemia, exames clínicos, perícia ou outro exame que, por meios técnicos ou científicos, em aparelhos homologados pelo CONTRAN permitam certificar seu estado.
(Redação dada pela Lei nº 11.275, de 2006)
(...)
§ 3.º Serão aplicadas as penalidades e medidas administrativas estabelecidas no art. 165 deste Código ao condutor que se recusar a se submeter a qualquer dos procedimentos previstos no caput deste artigo.
(Acrescentado pela Lei nº 11.705, de 19.06.2008)”
(Grifei)
.
Se o respectivo condutor negar-se deverá arcar com as penalidades administrativas concernentes, quais sejam:
“Art. 165. Dirigir sob a influência de substância psicoativa que determine dependência: (Redação dada pela Lei nº 11.705, de 19.06.2008)
Infração - gravíssima;
Penalidade - multa (cinco vezes) e suspensão do direito de dirigir, por 12 (doze) meses;
Medida administrativa - retenção do veículo até a apresentação de condutor habilitado e recolhimento do documento de habilitação.
Parágrafo único. A embriaguez também poderá ser apurada na forma do art. 277.” (Grifei)
Em miúdos, o sujeito condutor de veículo automotor que, estiver envolvido em acidente de trânsito ou situações congêneres, sendo considerado suspeito de ingestão inadequada de bebida alcoólica sendo convocado a realizar o teste do bafômetro, em se negando, deverá arcar com multa pecuniária no valor de R$ 967,70 (novecentos e cinquenta e sete reais e setenta centavos), proibição de dirigir pelo período de um ano, retenção do veículo no qual estava realizando tráfego - até que apresente-se condutor habilitado – além de recolhimento da CNH/PPD.
Mas, claro, existem indivíduos que decidem não colaborar com a polícia ou com as equipes de fiscalização de trânsito, alegando o direito de não ser obrigado a produzir provas contra si mesmo, hasteando o Princípio nemo tenetur se detegere.
Inicialmente, cumpre salientar que, o Princípio nemo tenetur se detegere é pertinente unicamente ao Processo Penal, de modo que, não sendo investido qualquer processo sobre o indivíduo que requeira as prerrogativas inerentes ao supracitado princípio, não pode gerar - ao indivíduo que o requere - benefício que apenas lhe caberia quando inserido em determinado contexto.
Diante desta alegação, não sendo cumprida a ordem do agente ou do policial, este, poderá dar voz de prisão por desacato¹ - que é um caso bem peculiar e bastante discutido – bem como por desobediência², já que – no que tange a este – o condutor estaria desobedecendo à ordem legal contida, como já vimos, no art. 277, CTB.
A respeito, colhe-se da jurisprudência:
"[...]
II – Para comprovação do crime do art. 306 do CTB, o exame de alcoolemia somente pode ser dispensado, nas hipótese de impossibilidade de sua realização (ex.: inexistência de equipamentos necessários na comarca ou recusa do acusado a se submeter ao exame), quando houver prova testemunhal ou exame clínico atestando indubitavelmente (prontamente perceptível) o estado de embriaguez. Nestas hipóteses, aplica-se o art. 167 do CPP." (HC nº 132.374-MS (rel. min. Felix Fischer, DJe 16/11/2009) (Grifei)
Porém, ainda que o policial realize qualquer uma das citadas prisões ou qualquer outra, sendo, claro, subsumida a situação aos termos contidos em dispositivo legal, ao entender de alguns pensadores juristas, o condutor poderá se safar de ser tido como réu por falta de prova material, pois, mesmo com testemunho do agente e/ou do policial – que tem força de prova – como comprovar que aquela influência de álcool era inadequada para o exercício da direção sem que um exame de cunho científico comprove? Neste diapasão, alguns juristas já decidiram pela concessão de habeas corpus por entender que, um indivíduo não pode ser preso por um crime cuja materialidade não fora comprovada, mas, apenas denotada.
Mas, afinal, o testemunho ocular do agente e/ou policial, se analisado subjetivamente, poderia ter voto a favor sob a alegação do Princípio do In dubio pro societati, pois, em se verificando a possibilidade de o condutor demonstrar – de fato – que sua embriaguez está inadequada para o exercício da direção, a atitude mais acertada dos referidos é realizar a prisão, a fim de que, o suspeito não concorra para concretização de qualquer perigo aos demais civis.
Bem, variando de comarca a comarca, tomando como exemplo a Secretaria de Segurança Pública de São Paulo, informa que, aquele que se recusar a realizar o teste do bafômetro será autuado e conduzido a uma delegacia a fim de que assine termo circunstanciado de ocorrência e que, antes de ser liberado será conduzido ao IML (Instituto de Medicina Legal) a fim de que sejam realizados exames clínicos, estes que por sua vez, se forem realizados dentro do período de uma hora após o flagrante, é possível detectar a influência de seis decigramas de álcool por litro de sangue, mediante a verificação do nível de euforia e coordenação motora do indivíduo submetido.
Sob a informação do Ministério da Saúde, a cada hora, o índice de álcool por litro de sangue cai cerca de 0,15 g/l. Assim, se o agente de trânsito e equipe policial não for diligente, o condutor sob a suspeita de embriaguez inadequada para o exercício da direção poderá se safar das condições a cumprir neste já citadas.
Deste modo, os exames clínicos afastam qualquer possibilidade de impunidade no trânsito ainda que o indivíduo se negue a realizar o teste do bafômetro, embora, atualmente, esta atitude seja motivo de muita discussão.
Fica a seguinte proclamação: que agentes, policiais e autoridades policiais busquem, sempre, uma maneira de enquadrar a lei ao indivíduo infrator/criminoso ou suspeito de infração ou delito, buscando sempre estudar a lei, jurisprudências pertinentes - levando em consideração a intentio legis - a fim de que a impunidade seja cada vez mais afastada de nossa sociedade.
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¹ “Art. 331 – Desacatar funcionário público no exercício da função ou em razão dela:
Pena – detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, ou multa.” Código Penal
² “Art. 330 – Desobedecer ordem legal de funcionário público:
Pena – detenção, de 15 (quinze) dias a 6 (seis) meses, e multa.” Código Penal
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
______________. IENNACO, Cláudio Réche. TESTE DE ALCOOLEMIA E A RECUSA DO MOTORISTA; ou: é obrigatório soprar o bafômetro? [s.d.]. Disponível em: http://www.direitopenalvirtual.com.br/artigos/leiamais/default.asp?id=624. Acesso em: 28/09/2011.
BRASIL. Código de Trânsito Brasileiro. Lei nº 9.503, de 23-9-97 - 3ª edição - Brasília: DENATRAN, 2008.
______________. ALFERES, Eduardo Henrique. Novas normas de embriaguez no volante. Disponível em: http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=3038. Acesso em: 28/09/2011.
______________. JusBrasil Tópicos. In dubio pro societati. Disponível em: http://www.jusbrasil.com.br/topicos/290832/in-dubio-pro-societate. Disponível em: 28/09/2011.
______________. DJI – Índice fundamental do Direito. Código de Trânsito Brasileiro, art. 302. Disponível em: http://www.dji.com.br/codigos/1997_lei_009503_ctb/302a312.htm. Acesso em: 28/09/2011.
______________. Perguntas e respostas. Lei seca. Julho de 2008. Disponível em: http://veja.abril.com.br/idade/exclusivo/perguntas_respostas/lei_seca/index.shtml. Acesso em: 28/09/2011.
______________. Rede nacional de advogados. IML define critérios para exame clínico de embriaguez ao volante. 01/12/2009. Disponível em: http://www.advsaude.com.br/noticias.php?local=1&nid=3698. Acesso em: 30/09/2011.