O consumidor e seus direitos

Prólogo

Uma jovem leitora que se identificou pelo nome de Paola dos Santos, residente na cidade de Taguatinga, na Avenida Comercial Sul, enviou-me uma mensagem na qual textualmente diz:

"Boa noite doutor Wilson. Meu nome é Paola dos Santos, tenho 23 anos e resido em Taguatinga-DF, na Av. Comercial Sul. Meu noivo e eu somos leitores assíduos de seus textos e adoramos a forma como ensina e esclarece seu público alvo. Percebemos que o senhor não escreveu nada, ainda, sobre nós consumidores e nossos direitos.

Recentemente fomos até o Taguatinga Shopping com o propósito de comprarmos uma geladeira para a nossa casa (vamos nos casar em maio de 2012 – se Deus quiser). No ato da venda o vendedor disse e carimbou na Nota Fiscal que nós tínhamos 7 (sete) dias para reclamarmos de quaisquer defeitos da geladeira.

Disse, ainda, que a geladeira havia sido testada e que não devíamos nos preocupar. Não sabemos o que fazer porque só iremos usar o produto a partir de nosso casamento que será no ano que vem. O que o senhor orientaria sobre isso? Como devemos proceder? Esse procedimento do vendedor é correto?

Desde já agradecemos sua atenção e resposta que nos der numa publicação no Recanto das Letras. Nosso abraço com a mais sentida emoção e respeito. Paola dos Santos.”.

EIS MINHA RESPOSTA AO CASAL DE NOIVOS A QUEM DESDE JÁ DESEJO MUITA PAZ E LUZ NA CONSECUÇÃO DOS PROPÓSITOS AFETIVOS

O consumidor está ficando cada vez mais consciente na busca de qualidade pelo preço pago na aquisição de um produto ou serviço. Reclamar passou a ser um procedimento normal na medida em que o conhecimento sobre as leis que regem a proteção do consumidor vão sendo difundidas e absorvidas.

De início recomendo que todos os cidadãos devem ter em suas residências uma Constituição Federal/1988 e um Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990).

O Código de Defesa do Consumidor é uma lei abrangente que trata das relações de consumo em todas as esferas: civil, elencando as responsabilidades e os mecanismos para a reparação de danos causados; administrativa, definindo os mecanismos para o poder público atuar nas relações de consumo; e penal, estabelecendo novos tipos de crimes e as punições para os mesmos.

Quando o vendedor disse que você dispõe de sete dias para reclamar de um possível defeito de um produto (geladeira) ele fez uma confusão com o artigo 49 do Código do Consumidor:

Art. 49. O consumidor pode desistir do contrato, no prazo de 7 dias a contar de sua assinatura ou do ato de recebimento do produto ou serviço, sempre que a contratação de fornecimento de produtos e serviços ocorrer fora do estabelecimento comercial, especialmente por telefone ou a domicílio.

Parágrafo único. Se o consumidor exercitar o direito de arrependimento previsto neste artigo, os valores eventualmente pagos, a qualquer título, durante o prazo de reflexão, serão devolvidos, de imediato, monetariamente atualizados.

Esse será o caso se você for visitado (a) por um vendedor em sua residência e este lhe vender algo. Pode ser uma linha de conexão banda larga, uma assinatura de TV a cabo, uma assinatura de revista, jornal, um produto cosmético, uma ou mais peças de vestuário, etc.

Não se preocupe com as informações erradas de um vendedor a bem mandado (Obediente, dócil, solícito) ao chefe. Ora, você foi até a loja situada no Taguatinga Shopping e isso descaracteriza a compra feita em domicílio. Nesse caso não se aplica o artigo 49 do Código do Consumidor.

Quando acontecer um problema com o produto adquirido você fará uso de seu direito SEM SE ABORRECER com as informações dos profissionais de vendas pouco ou nada preocupados com a pós-venda, ou seja, na etapa em que se procura fidelizar o cliente através de avaliação de seu grau de satisfação, do oferecimento de manutenção, de promoções especiais etc.

Você não precisa ser um (a) advogado (a) para conhecer os direitos a que deve desfrutar, mas pode precisar deste profissional quando a situação não for resolvida amigavelmente. Vamos ver a definição das entidades que você pode procurar para resolver a sua insatisfação com relação a um produto ou serviço:

Procon - Este órgão atua em questões individuais. Neste local o consumidor encontra respostas rápidas para suas queixas. Ao formalizar uma reclamação, os funcionários do órgão entram em contato com o fornecedor do produto ou serviço, com o objetivo de conduzir uma negociação que satisfaça ambas as partes, ou seja, fornecedor e consumidor. Quando não se obtém uma solução plausível, deve-se entrar na Justiça.

Prodecon - A Promotoria de Defesa do Consumidor faz parte do Ministério Público (órgão que tem por objetivo defender a sociedade e fiscalizar o cumprimento de seus direitos). O Ministério Público atua para defender interesses coletivos, sendo necessário que várias pessoas estejam fazendo a mesma queixa ou que o caso particular possa ser generalizado. Neste caso, os promotores iniciam ações civis públicas que serão julgadas na Justiça.

Decon - A delegacia atua na repressão de crimes contra o consumidor. É bom procurá-la para denunciar o desrespeito às leis de proteção do consumidor. A polícia não será capaz de determinar a reparação do dano, mas pode prender os denunciados (culpados).

Feita a apresentação dos órgãos que atuam na defesa dos consumidores, vamos ver algumas definições estabelecidas pelo Código de Defesa do Consumidor e Código Civil.

Por definição, consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final, onde:

Produtos são quaisquer bens, móveis ou imóveis, materiais ou imateriais.

Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração.

Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividades de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.

Vamos ver um exemplo com a aplicação destes conceitos:

Imagine que você (consumidor) tenha se deslocado até uma loja de materiais de construção para comprar uma caixa d'água.

Neste caso, temos um bem móvel (a caixa) que será entregue em sua residência. Para instalar este produto, você vai precisar contratar os serviços de um profissional qualificado, ou se tiver habilidade, poderá você mesmo executar o serviço.

O Código Civil estabelece que os materiais destinados a alguma construção, enquanto não forem empregados, conservam a sua qualidade de móveis. Materiais provenientes de demolição também readquirem esta qualidade. Então, seguindo este preceito e aplicando-o no exemplo acima, a caixa d’água após a instalação, adquire a qualidade de um bem material imóvel.

Neste exemplo, que, aliás, é bem simples, vimos a aplicação do conceito de produto e serviço. Agora, o que irá realmente amparar você da compra de um produto com defeito ou de um serviço mal executado? Entra em cena o já comentado Código de Defesa do Consumidor, que estabelece as normas de proteção e defesa dos consumidores.

O Código de Defesa do Consumidor, no capítulo III, trata Dos direitos básicos do consumidor, e no capitulo IV, Da Qualidade de produtos e serviços, da prevenção e da reparação dos danos.

Um direito básico muito interessante atribuído ao consumidor é aquele definido no capítulo III, conforme descrito abaixo:

"A facilitação de defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências."

Neste caso, se o juiz determinar a aplicação do parágrafo acima citado, temos então uma inversão do ônus da prova. Sendo assim, o prestador do serviço mal executado ou o fornecedor do produto defeituoso é que terá de provar que o consumidor está errado.

Já o capítulo IV do referido Código é dividido em quatro seções. Vamos falar um pouco sobre a seção II, III e IV, aplicando em seguida alguns conceitos no nosso exemplo da caixa d'água. A seção II trata da responsabilidade pelo produto e serviço.

O artigo 12 estabelece que:

"O fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador, respondem independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre a utilização e riscos".

Já o artigo 14 estabelece que:

"O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos".

O produto ou serviço é então considerado defeituoso quando não fornece a segurança que o consumidor dele pode esperar. A seção III trata da responsabilidade por vício do produto e do serviço.

O artigo 18 estabelece que:

"Os fornecedores de produtos de consumo duráveis ou não duráveis, respondem solidariamente pelos vícios de qualidade ou quantidade que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade, ou seja, quando se anuncia uma coisa e vende-se outra".

Já o artigo 20 estabelece que:

"O fornecedor de serviços responde pelos vícios de qualidade que os tornem impróprios ao consumo ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade com as indicações constantes da oferta ou mensagem publicitária".

A seção IV trata da decadência e da prescrição.

O artigo 26 estabelece o prazo que você dispõe para reclamar após a detecção de um vício aparente ou de fácil constatação. Conforme já foi mencionado, vício de produto ou serviço, é aquilo que o torna impróprio para o consumo, diminui o seu valor, ou está em desacordo com as informações de oferta ou mensagem publicitária.

Vale salientar que no caso das perguntas de nossa consulente Paola a geladeira é um excelente exemplo de erro gritante do vendedor. Senão vejamos:

O direito de reclamar pelos vícios aparentes ou de fácil constatação perde o efeito em:

"Noventa dias, tratando-se do fornecimento de serviço e de produtos duráveis, sendo que a contagem do prazo decadencial inicia-se a partir da entrega efetiva do produto ou do término da execução dos serviços.

No entanto, o início da contagem do prazo decadencial pode ser alterado. Um exemplo é o estabelecimento de inquérito civil, até o seu encerramento.

Art. 26, § 3°, do Código do Consumidor: Tratando-se de vício oculto, o prazo decadencial inicia-se no momento em que ficar evidenciado o defeito. Este artigo (26, § 3º) é um dos mais importantes para o caso de aparelhos que funcionam muito bem por certo tempo, mas que de repente param de funcionar corretamente.

ATENÇÃO: Mesmo que o produto (bem durável) apresente um defeito fora do prazo mínimo de garantia e se for constatado e/ou caracterizado o vício oculto o consumidor fará uso do artigo 26 § 3º do Código do Consumidor.

Nesse caso é necessário uma perícia técnica, visto que nem sempre o fornecedor facilita a solução do problema. É ai que o consumidor fazendo-se representar por um advogado de sua confiança faz valer o seu direito preestabelecido em lei (Código do Consumidor).

Vamos voltar para o nosso exemplo da caixa d'água e, também da geladeira para aplicar estes conceitos. Aqui vale a pena citar mais uma vez o artigo 26 do Código do Consumidor:

Art. 26. O direito de reclamar pelos vícios aparentes ou de fácil constatação caduca em:

I - trinta dias, tratando-se de fornecimento de serviço e de produtos não duráveis;

II - noventa dias, tratando-se de fornecimento de serviço e de produtos duráveis.

Exemplos de produtos não duráveis: Um saco de batatas, um saco de feijão, um saco de arroz, um saco de trigo, um saco de soja, etc. – Todos estes produtos poderão estragar dentro de trinta dias ou menos a depender do modo como serão armazenados.

Exemplos de produtos duráveis: Materiais elétricos e/ou eletrônicos, caixas d’água, tijolos, livros, CDs, etc. – Todos estes produtos poderão apresentar defeitos em alguns minutos de uso, mas não se pode esperar ser normal esse comportamento. Em condições corretas de uso uma geladeira, uma máquina fotográfica, um DVD, um TV, um telefone celular, um relógio, prestará bons serviços por muitos e muitos anos.

Suponha que horas depois de receber a caixa d'água, você constata a presença de um defeito que a torna imprópria para o uso a que se destina. Trata-se, portanto de um vício de qualidade. Neste caso você deve entrar em contato imediatamente com fornecedor e solicitar a troca do produto.

Agora imagine situação de a caixa estar em perfeitas condições de uso e você contrata um profissional para executar o serviço de instalação. O profissional lhe entrega uma proposta para a execução dos serviços.

Nesta proposta fica claro que o fornecimento dos materiais será por conta do contratado e conforme a listagem apresentada pelo mesmo.

Você concorda e autoriza a execução do serviço. Após o término do mesmo, você constata que o trabalho foi muito bem executado, mas, no entanto, foram utilizados materiais diferentes (mais baratos) daqueles especificados na listagem apresentada juntamente com a proposta.

Neste caso se configura um vício de serviço, pois o que foi executado está em desacordo com as informações da proposta, diminuindo, portanto, o valor do serviço. Sendo assim, você poderá tomar algumas medidas, tais como:

Exigir um abatimento proporcional do preço, ou até mesmo, o refazimento dos serviços.

O exemplo citado acima é bem simples quando comparado com o complexo campo que é a construção civil. Imagine um prédio, ou mesmo uma residência e você vai entender o que eu estou dizendo.

São muitos materiais distintos, assim como de profissionais envolvidos na confecção do produto final. Um vício aparente é de fácil constatação, mas um vício oculto costuma aparecer somente depois de alguns meses, ou até mesmo anos.

CONCLUSÃO

Observe que no caso de uma geladeira, por ser um bem durável, você terá noventa dias para reclamar de algum defeito após a entrega do produto. Todavia, caso exista um defeito oculto e que só venha a surgir após um ano de uso você poderá exigir a reparação (conserto) do vendedor fazendo valer a força do artigo 26, § 3º, do Código do Consumidor.

Ocorre que quase sempre você não conseguirá resolver esse impasse sem se aborrecer e sem a interveniência da justiça e a contratação de um advogado.

CUIDADOS MÍNIMOS AO APRESENTARMOS UMA RECLAMAÇÃO

Ao adquirirmos um produto ou serviço estabelecemos uma relação com o fornecedor do mesmo, seja ele uma entidade privada ou pública. Esta relação implica o cumprimento de determinados direitos e deveres por ambas as partes.

Nas situações em que o fornecedor não cumpre suas obrigações temos o direito de reclamar e solicitar a resolução do problema. Uma reclamação deve ser apresentada formalmente, por escrito e com recibo de protocolo com a data, assinatura e Carimbo da empresa com CNPJ.

Desta forma existe um documento suporte da queixa que obriga legalmente a empresa ou entidade a quem se dirige a dar seguimento e resposta à reclamação.

Caso a sua reclamação não receba a atenção do fornecedor e a sua queixa persista, pode recorrer a várias entidades públicas ou privadas para dar seguimento à mesma e defender os seus direitos enquanto consumidor.

Estas entidades tentarão resolver o problema primeiramente de forma amigável, tentando chegar a um acordo. Em última instância haverá recurso aos tribunais para uma resolução final do conflito.

O conhecimento das leis definidas no Código de Defesa do Consumidor é muito importante para que possamos exercer os nossos direitos, sempre que for necessário.

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NOTAS REFERENCIADAS E BIBLIOGRÁFICAS

- Constituição Federal Brasileira – De 5 de outubro de 1988;

- MELLO, Heloísa Carpena Vieira de. “Responsabilidade civil no Código de Defesa do Consumidor”;

- BENJAMIN, Antônio Herman V.; MARQUES, Cláudia Lima e MIRAGEM, Bruno. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor. 2ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005;

- ALMEIDA,João Batista de. A proteção jurídica do consumidor. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 2003;

- Notas de Aulas do Autor sobre Direito do Consumidor - Pós-Graduação.