A INCONSTITUCIONALIDADE DOS FERIADOS RELIGIOSOS.

A INCONSTITUCIONALIDADE DOS FERIADOS RELIGIOSOS –

Primeiramente, como se enlaçar um conceito sobre uma característica tão intrínseca e subjetiva como a religião? É de se ressaltar que uma delimitação básica sobre o seu conceito é possível, mas não, nunca um molde pré-determinado de sua forma. A religião para receber, pelo menos, uma idéia de seu conceito deve ser embarcada pelo raciocínio filosófico contundente que dê a Religião uma possível interpretação de seu conceito, fundamento e importância. Tudo isso, para que se prossiga com sustento o estudo político-juridico de seus efeitos e o seu estado como delineadora social.

Marilena Chaui em “Convite à Filosofia” resume a religiosidade como “A crença em divindades e numa outra vida após a morte define o núcleo da religiosidade e se exprime na experiência do sagrado”. Em poucas palavras a citada escritora disse que a religiosidade humana emana do credo (Crer) em um ente (ser) que tenha dado forma ao mundo que no momento conhecemos e que, da mesma maneira, o ser humano como ser consciente, capaz de raciocínio e de pensamento, e, pela virtuosidade da diferença para com os demais animais da Terra onde sua subjugação deles exterioriza o seguinte: “O animal acaba, mas o homem morre”. E que por isso existe outro lugar para uma segunda vida após a morte que será juntamente com a habitação do sagrado que é nas palavras da mesma o seguinte: “O Sagrado é a experiência da presença de potência ou de uma força sobrenatural que habita algum ser”.

Portanto, nada mais justo do que dizer que a religiosidade humana, Intrínseca em si desde eras remotas, deu fulcro à religião. Onde um agrupamento de pessoas que idealizam reciprocamente o mesmo conceito ajunta-se para venerar “O Sagrado” (seja fato, ato, pessoa, ser, entidade, animal, natureza etc.). Neste mesmo sentido temos que uma determinada religião ao se estruturar manifesta no seu bojo a conceitualização do “Bem e do mal”. Ou seja, a figura que deve ser seguida e a que deve ser repugnada pela própria religião. Podendo ser atos ou omissões. Na verdade, em priori, a maioria consagra que a adoração de religião diversa já ensejaria ação digna de repudio que daria fulcro para a expulsão de seu seguidor e, portanto, nada menos justo do que balizada sobre a perspectiva do “Pecado”.

Pecado, nada mais é do que o ato inescrutável para o seguimento religioso, onde conforme o termo (Latim – Culpa, falta, crime, ação má, erro), diz que o religioso por ação ou omissão , o faz em divergência com os preceitos e dogmas do seu deus ou de seu rito. Sendo congruentemente resignado ao cargo de fatalidade que é para o religioso a condenação diante da sua fé. Inviabiliza a possibilidade de desfrutar, como no inicio abordado, a possibilidade de uma vida futura, podendo e devendo ser condenado após a morte e juntamente em vida diante do grupo de indivíduos que pactuam a aceitação nesse credo e a obediência a este rito.

Tendo elucidado da maneira mais célere possível, foquemo-nos no mais importante em referencia ao assunto – A Inconstitucionalidade das Leis 6.802 de 30 de junho de 1980, da Lei 9.093 de 12 de setembro de 1995 e a Lei 0662 de 06 de Abril de 1949. Agora saindo da filosofia e embarcando no jurídico apontemos as seguintes delimitações:

1. Desde 1889 com a proclamação da Republica, o Estado Federal deu em sua promulgação ensejo para o desmenbramento do Clero e do Estado, pois um dos fundamentos dos Republicanos é que neste aborda-se somente o estudo e a administração das questões materiais, ou seja, financias do Estado e, por sua vez, as questões religiosas seriam somente abordadas pelos entes que os tem por direito (a igreja de cada religião).

2. Desde 1890, conforme o Decreto 119-A, O Brasil desfruta da liberdade religiosa. Emanado da consciência da tendência iluminista clareada juntamente com a Revolução Francesa que deu origem ao Código Napoleônico. Esta tendência destituiu a Igreja Católica do poder Político, jurídico e legislativo, havendo para si somente a liberdade religiosa de seu manifesto legitimo e nos conformes da lei.

3. Em 1988, A Constituição Federal é promulgada – A Constituição do Povo. Dá ao Estado democrático de Direito a posição laica no que tange o assunto religião. Permite a liberdade religiosa e a manifestação da mesma dentro dos limites legais e, dá a sociedade religiosa a característica ficta jurídica da pessoa jurídica respondendo por seus atos na figura do seu patrimônio (seja móvel ou imóvel), respondendo ainda por seus atos e pelos atos de seus membros e lideres.

4. O art. 5º Da CF, VI e VIII protegem a liberdade de culto e de religião, que juntamente com o Art. 19º da CF, I protegem o cidadão da desobrigação de participar de qualquer que seja o grupo religioso, podendo por conseguinte manter-se em qualquer posição que lhe tenha por justo.

“JELLINEK chega a mesmo sustentar que a liberdade da religião é a verdadeira origem dos direitos fundamentais” . Nestes termos temos o seguinte: A religião como primazia da consciência humana torna-se direito fundamental quando ninguém tem mais o direito de intervir nele para que na pessoa do Estado obrigue a pessoa do Cidadão a seguir determinado credo ou não. Portanto, no que as leis acima são inconstitucionais?

Hoje em dia lidamos com uma diversidade religiosa gigantesca (para todos os gostos e tipos de pensamentos – inclusive aqueles que se abstém; O Ateísmo) que nos diversifica como povo e cultura. Portanto, no momento em que o Estado insurge como Lei – Que é a posição do vinculo obrigatório de obediência – onde vincula toda a nação a resguardar determinado dia em homenagem a determinado fato, deus ou coisa de uma única religião fundamenta a inconstitucionalidade e adere novamente o Clero com o Estado. Pois que nos termos da lei 662/49 art. 2º “Só serão permitidas nos feriados nacionais atividades privadas e administrativas absolutamente indispensáveis.” Ou seja, é um individuo que por determinado fato de uma especifica religião é obrigado a reverenciar tacitamente um dia honrando-o com a abstinência do feito laboral, por exemplo?

Caros leitores insurjam agora o pensamento critico analítico, imagine-se na figura de um ateu (Características dos indivíduos que não creem em nada, nega existência de divindades) que conforme as leis trabalhista tem tudo em dia e que na quarta-feira do mês de outubro desse ano letivo (2011) será obrigado a, em função do feriado religioso, não proceder com os fins lucrativos do seu estabelecimento, salvo se for indispensável. A inescrutável dessa prerrogativa legal ofende de tal forma o direito a liberdade religiosa que, não obstante, a inviabilização de qualquer função e o impõe a honrá-lo.

Todavia, havendo indispensabilidade do exercício de suas funções, o ateu decide trabalhar nesta data, porém, terá, conforme leis trabalhista de desembolsar o adicional de 100% de horas extras para os seus funcionários, onde por via dos fatos, além de ser obrigado – Pois a força da lei esta em conceber obrigações, deveres e direitos – a abster-se do trabalho em virtude de algo que para ele é ilógico que, como mostra o texto da lei 6.802/80, Art. 1º É declarado feriado nacional o dia 12 de outubro, para culto público e oficial a Nossa Senhora Aparecida, Padroeira do Brasil.O ateu se encontra na posição de culto para algo que nele se vê violador da sua liberdade de pensamento e de credo, no caso em tela, abster-se deste. Porém, além do dano intelectual e intrínseco ele encontra dano material – Quebra de lucro – onde ele, obrigado a não trabalhar, ou em caso indispensável, a trabalhar, mas forçado a desembolsar o dobro em virtude de deus, dia ou fato religioso para ele inadmissível.

Meus caro, o próprio texto legal diz qual é o objetivo do feriado religioso – Para culto publico e oficial – portanto, neste momento o Estado laico morre. Não obstante, de acordo, por exemplo, com o Judaismo, Islamismo e Cristianismo. Abster-se do trabalho em um determinado dia é um modo direto de prestar homenagem aos seus deuses. Ou seja, Os judeus não trabalham no sábado em honra ao deus deles, pois que assim procede seus pensamentos. Agora por lei são obrigados a fazer o mesmo que fazem para honrar seu deus a um deus estranho que no ato disto gera a eles a consumação pecaminosa que é como resultado a fatalidade. Em outras palavras, dá-lhes o prejuízo de vida após a morte, de acordo com sua fé.

O Principio da liberdade e o da legalidade, onde o primeiro dá ao cidadão, como explana grande maioria da doutrina, três Direitos: 1). Autonomia: Direito de escolher; 2). Imunidade: Direito de não ser coagido pela escolha feita e a 3). Capacitação: Direito relacionado a capacidade do agente, ou seja, não adianta a autonomia e a imunidade se o agente não tem a capacidade de fazê-lo. Por exemplo, os legalmente incapazes. Já o segundo principio dá ao cidadão um algo mais importante e interessante ao que tange este estudo. Dá ao cidadão o direito de fazer ou não fazer tudo o que a lei não obrigue. Portanto, somente estas palavras dariam fundamento contundente e pertinente para a eminente inconstitucionalidade dos feriados religiosos (CF, art. 5, II). Pois que no momento em que a lei obriga um cidadão a ato ou omissão que se vincula ao subjetivismo do pensamento filosófico, moral ou religioso fere agudamente o próprio seio constitucional.

“Nesse sentido, ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de convicção filosófica ou política, salvo se invocar para eximir-se de obrigação legal a todos impostas (como o serviço militar obrigatório, nos termos do artigo 143, § 1º e 2º) e recusar-se a cumprir prestação alternativa, fixada em lei” . Diante disto, a lei obriga, quando a lei obriga a fé ou a observância de fatos que são especificamente de um determinado grupo de religiosos infringe o Estado Laico de imediato.

Há quem defenda a institucionalização dos feriados religiosos com a usurpação do conceito do costume e de que como democracia é obrigado as religiões de menores influencias sociais obedecerem ao culto e os dias sagrados daquela que precípua maior contingente de seguidores. Neste seguimento dá aquele que detém maior aglomeração de fieis poder, inclusive, de legislar. Isto ocorrendo (Como já bastante salientado pelas leis ditas e comprovadas neste ato como inconstitucionais) o Estado laico torna-se mera ficção jurídica. Com o conceito de que o costume de um povo – maioria – é maior do que as garantias individuais protegidas pelo texto constitucional se foca grande parte da defesa do constitucionalismo dos feriados religiosos.

Na defesa do constitucionalismo há também a infundada tese de que “Igualdade para com os iguais e desigualdade para os desiguais”. O principio da igualdade é bastante coerente, mas não para este caso. No que tange isto observemos a CF, art. 5º expõe assim: “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e a propriedade, nos termos seguintes:” . Neste ponto complementa-se ainda: CF, art. 5º, I: “Homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição;”. Para tanto, observados os referidos artigos constitucionais, podemos chegar à seguinte conclusão:

I – Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza. A lei neste texto é a exteriorização do Estado. Todos são iguais perante o Estado. E as naturezas de distinção podem ser sobre raça, etnia, credo, fé, economia, títulos sociais, sexo, opção sexual, filosofia, política e muitas outras.

II – Elenca os principais princípios constitucionais; a) à vida; b) à liberdade; c) à igualdade; d) à segurança e e) à propriedade.

III – Iguala Homens e Mulheres em Direitos e obrigações.

Conforme o principio da igualdade o legislador esta obrigado a legislar de forma que não vincule favorecimento ou desfavorecimento a alguém ou a alguma sociedade, seja ela religiosa, empresarial ou qualquer outra que se encabece no sistema jurídico nacional. A desigualdade na lei se produz quando a norma encontra distinção sem a mínima razoabilidade ou se manifesta arbitrariedade no tratamento especifico as pessoas diversas. Para que não seja ensejado a discriminação normativa é necessário justificativa objetiva e aceitável, de acordo com os juízos valorativos comumente aceitos, estando presente uma relação de proporcionalidade entre os meios empregados e a finalidade buscada, sempre, absolutamente sempre em conformidade com os direitos e garantias fundamentais constitucionalmente protegidos, coisa que não ocorre com uma lei que cria um feriado religioso para uma única e exclusiva religião. O costume, a maioria e a desproporcionalidade não são maiores que os balizadores constitucionais. Não são, definitivamente não são maiores do que a Constituição Federal brasileira e também que as garantias e direitos individuais.

Conclusão, aquele que legisla a favor de um determinado grupo age contra a Carta Magna, danificando o caráter Estatal e da lei. Denegrindo a Soberania do Estado e pondo-se em igualdade com o Clero (seja ele qual for). Portanto, a liberdade religiosa é subjetiva e a guarda de determinado dia em virtude de uma fé abordada de somente por uma determinada religião (Como é o caso do dia da N. Srª Da Aparecida, que só é aceita pelo catolicismo) fere todos os demais grupos sociais e religiosos, sendo ou não sendo demograficamente comparáveis. A lei esta para proteger os menos favorecidos e não os mais. Portanto, o único feriado que pode ser aceito legalmente são os feriados patrióticos e que homenageiam ícones da história do Brasil, pois ao Estado cabe honras as pessoas que estruturam e favoreceram a composição da Republica Federativa do Brasil. Porém, “conforme o famoso caso West Virgini State Board Of Education vs. Barnette há de ser consignada. Trata-se de ação promovida por integrantes da seita “Testemunhas de Jeová”, que se insurgiram contra a obrigação, constante na lei estadual, de saudar a bandeira sob pena de expulsão do colégio.” Neste caso o Tribunal concordou no conceito de que a lei contrariava a liberdade religiosa da seita. Ou seja, sempre, mesmo em honra a entes do próprio Estado haverá, em virtude da liberdade, o direito de um cidadão por qualquer que seja a natureza lutar para que não seja compelida a seguir determinada fé, culto ou abster-se dele em virtude de lei. A inconstitucionalidade é clara e lesiva. Não cabe ao Estado Laico intervir na religião.

Autor: Ygor Pierry

Estudante de Direito Bacharelato pela Universidade Paulista.

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Fontes Bibliográficas:

CONVITE À FILOSOFIA – Chaui, Marilena. Editora Ática, ISBN 85 08 08935 X, 13ª Ed.

Idem.

CURO DE DIREITO CONSTITUCIONAL – Tavares, André Ramos. Editora Saraiva, ISBN 978-85-02-06502-4, 6ª Ed.

DIREITO CONSTITUCIONAL ESQUEMATIZADO – Lenza, Pedro. Editora Saraiva, ISBN978-85-02-07916-8, 13ª Ed.

CURSO DE DIREITO CONSTITUCIONAL – Tavares, André Ramos. Editora Saraiva, ISBN 978-85-02-06502-4, 6ª Ed.