Processo eletrônico e tecnologia deficiente
*Artigo veiculado originariamente no ESPAÇO VITAL e reproduzido em diversos sites jurídicos
O processo eletrônico ganha espaço e, sem lugar para dúvidas, em muito pouco tempo os Juízos e tribunais irão abandonar o modelo tradicional do papel, que restará como autuação excepcional. A regra, portanto, em breve, será ver a enorme maioria das demandas veiculadas pelo vetor eletrônico. É muito mais que uma tendência, podendo-se afirmar que se trata de um caminho natural, tanto assim que no dia 30/12/2010 circulou na grande imprensa uma entrevista do presidente do TJRS abordando a perspectiva de ampliação do chamado processo virtual.
Antes, contudo, que isso chegue definitivamente ao cotidiano da Advocacia é mister que sejam suscitadas algumas questões que se afiguram extremamente relevantes e que não vêm sendo postas à lume, quiçá porque transitam no teórico vão das expectativas sobre fatos ainda não consumados. Uma dessas questões diz respeito à qualidade dos serviços de Internet.
Os advogados, sobretudo os que labutam no interior do Estado, certamente receberão o conteúdo deste artigo com muita preocupação e redobrada atenção, visto que nas pequenas e médias cidades a qualidade dos serviços prestados pelos provedores de Internet é péssima. Sem meias palavras – péssima – conquanto sequer o adjetivo “ruim” pode ser utilizado.
Durante uma semana toda de trabalho o sinal costuma cair e os escritórios de Advocacia ficam absolutamente ilhados – sem acesso algum aos saites dos tribunais – e quando isso não ocorre nos horários chamados de “pico” as conexões andam como se diz no popular “a passos de tartaruga” . Por vezes concluir uma pesquisa exige paciência redobrada e reclama diversos acessos a um mesmo saite.
Trocando idéias com inúmeros colegas de cidades vizinhas – todas pequenas ou médias – muitos dos que atuam preferencialmente nos Juizados Especiais Federais revelam que têm sido obrigados a levar os trabalhos para suas residências para poder fazer as tarefas durante a madrugada, pois é o único horário em que a conexão funciona razoavelmente.
Agora imagine-se o que vai ocorrer quando todo (ou quase todo) o sistema estiver implantado e o processo eletrônico se torne a regra. O que vai acontecer ?
Penso que estaremos os advogados e advogadas condenadas ao trabalho nas madrugadas, reféns e escravos de empresas e provedores que parecem imunes a qualquer fiscalização estatal eficiente.
No Brasil a imprensa tem escancarado repetidamente que pagamos uma das mais altas tarifas do mundo pelo serviço de Internet banda larga, o que já seria um dado alarmante mas que assume proporções ainda mais nefastas quando conjuga-se o pagamento de um valor elevado à péssima qualidade dos serviços prestados.
Na minha cidade, somente nesta semana, em dois dias úteis ficamos uma tarde inteira sem serviço de Internet. Quando fecha o tempo nem necessitamos aguardar o primeiro trovão que já cai todo o sistema. Como imaginar, portanto, o desempenho eficiente da Advocacia em processos eletrônicos perante um quadro de tamanha gravidade?
Deixo, pois, este artigo pioneiro e de vanguarda como proposta para a discussão de um problema que hoje é ainda pequeno, mas que num futuro próximo poderá assumir proporções inimagináveis. A modernização judiciária reclama também a existência de meios tecnológicos eficientes para todos seus operadores. Juízes e promotores dispõem de uma Intranet que mitiga bastante esse déficit tecnológico, mas nós advogados somos escravos de uma das piores redes de Internet das Américas.
No que me diz respeito tenho muito medo do que vem por aí ...