LEI DO SILÊNCIO É BARULHO NA CERTA!

Além de ser conhecido com o país que tem os maiores juros do mundo, o Brasil, dizem as más línguas, é também a terra em que as leis simplesmente não saem do papel. São artigos bem elaborados; mas, na prática, não passam de belas retóricas bilaquianas, pois, na prática, simplesmente ou não são viáveis ou apenas não são respeitadas pelos cidadãos.

Um exemplo clássico dessa situação é a chamada “Lei do Silêncio”, que alguns leitores solicitaram que eu comentasse neste espaço, a título de chamar a atenção das pessoas que decidiram compartilhar o mesmo espaço, ou seja, residir em um condomínio.

Todavia, seja ele horizontal ou vertical, de “grife” ou classe média baixa, o drama é sempre o mesmo, ninguém respeita o santo sossego alheio e percebo que a comédia de erros se acentua quando um determinado vizinho se arvora no direito de simplesmente imaginar que está numa afrodisíaca ilha tropical, com direito a churrasco e pagode no último volume.

Reza a lenda que em um determinado condomínio, um certo “condômino dono do mundo”, se achava no direito de fazer o seu sagrado churrasquinho domingueiro. Mas, observem amigos, ele não se contentava em fazer uma festinha particular, tinha que sempre chamar os amigos para aumentar o volume do barulho.

Esqueci-me de um detalhe: nosso personagem desse dramalhão mexicano começava os preparativos para o almoço, sempre por volta das 7h de domingo. Horário em que a maioria dos mortais está no deleite da sonolência.

Outro complicador que não apresentei: as casas do referido residencial, que não tinha “pedigree”: as casas eram muito próximas uma das outras. Resultado, o barulho infestava todos os espaços. Tem mais um ingrediente, que talvez seja o tempero dessa muvuca: o vizinho do churrasqueiro era um profissional que trabalha no período noturno e, naturalmente, precisava, no mínimo, dar uma cochilada durante o dia, algo praticamente impossível nas manhãs de domingo.

Essa situação se repetia constantemente, até que a vítima foi à forra e, aproveitando o período de férias, aproveitou-se dos trinta dias para ouvir música clássica todos os dias, pela manhã, sempre a partir das 7h, aos finais de semana, o concerto começava mais cedo, às 5h. Lógico que o pagodeiro foi reclamar, mas deu com porta na cara. O problema chegou ao síndico, que tentou uma saída amigável: quem não respeitar a sagrada “lei do silêncio”, seria multado.

O argumento foi forte, pois pôr a mão no bolso é algo que intimida o brasileiro e, assim, pagodeiro e erudito conviveram felizes, sempre um respeitando o limite do outro. Dizem que a paz reinou no condomínio e que os churrascos continuam acontecendo, porém, os preparativos começam às 9h e o som de Marinho da Vila não interfere nas partituras de Vivaldi.

Narrei essa historinha apenas para gerar uma reflexão, uma vez que o referido assunto, embora tenha dado um tratado alegórico, é sério e exige conscientização de que não estamos sozinhos neste mundo e que as leis, embora falhas, foram feitas para todos. Portanto, precisam ser cumpridas com seriedade, pois a solução para os grandes problemas que afetam o país passa, em primeiro lugar, pelo respeito às leis e, também, às pessoas, numa relação em que os espaços comuns devem ser compartilhados com responsabilidade para que ninguém domine o terreno alheio.

Outras leis

Percebo que, na tentativa de ordenar a vida em comum, os residenciais procuram elaborar seus regimentos internos, seus códigos de conduta, para que a harmonia sobreponha-se no ambiente coletivo. Mas, nem sempre os moradores estão dispostos a colaborar.

Se há um aviso: “Não jogar lixo fora da lixeira”, a solicitação parece um convite à transgressão. Assim, se pedem para não dependurar roupas íntimas nas janelas dos prédios, é justamente o contrário que ocorre.

Logo, bastou ter uma regra para ser desrespeitada, desde as mais simples, como não permitir que os animais de estimação circulem sem coleira pela área comum, até as mais complexas, tipo: a entrega de mercadorias só poderá ocorrer até às 18h, por medida de segurança para a vida do condomínio.

Como pudemos perceber, o problema é grave. Mas voltaremos a ele brevemente. Até lá e tenham uma ótima semana.

* Douglas Lara é o idealizador da Semana do Escritor de Sorocaba; organizador da coletânea Roda Mundo.

Douglas Lara
Enviado por Douglas Lara em 29/10/2006
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