Analisando as nulidades em processo ...

Analisando as nulidades em processo pendente, percebemos que o CPC preocupou-se principalmente com as nulidades resultantes dos defeitos de forma (arts. 243 e seguintes) o que levou a doutrinadora Teresa Wambier a distinguir as nulidades de fundo( vinculados às condições da ação e aos pressupostos processuais de existência e de validade), das nulidades de forma.

Essencialmente, as nulidades absolutas são as expressamente previstas em lei, enquanto que as nulidades relativas são as não previstas em lei... Assim as nulidades de fundo referem-se aos vícios das condições da ação, dos pressupostos processuais positivos e negativos, sendo portanto, nulidades absolutas...

No fundo, remonta a distinção já feita por Eduardo Couture entre as nulidades de fundo e as nulidades de forma.

Mas lembremos que a falta de pressuposto processual não determina sempre a nulidade de todo o processo.

Assim, segundo Wambier, a citação é pressuposto (de existência) do processo, contudo, sua nulidade, não determina a nulidade da petição inicial, e mesmo de liminar concedida inaudita altera pars, apenas os atos subseqüentes que são desconstituídos.

Pois como a nulidade de um ato é infecto-contagiosa e contamina apenas os subseqüentes, segue-se que os atos processuais, com seus respectivos pressupostos, são tanto mais importantes quanto mais cedo devam ser praticados.

Assim, a nulidade da demanda, primeiro ato do processo, vicia o processo inteiro; a nulidade da citação anula todo o processo, com exceção dos poucos atos praticados anteriormente; a nulidade do julgamento da apelação deixa incólume todo o procedimento no primeiro grau de jurisdição, inclusive a sentença, o apelo e as contra-razões.

Eis o motivo pelo qual se cogita de pressupostos processuais, sobretudo, quanto aos atos de constituição do processo como relação jurídica. Os atos posteriores são visualizados mais sob o prisma das nulidades processuais. Isso, porém, não afasta a identidade essencial, que vincula o tema dos pressupostos processuais ao das nulidades.

Galeno Lacerda classifica os pressupostos processuais em subjetivos, objetivos, formais e extrínsecos à relação processual.

São pressupostos subjetivos: os referentes ao juiz (ter jurisdição, ser competente para conhecer da ação e ser imparcial, isto é, ser insuspeito e desimpedido; os concernentes às partes: ter personalidade judiciária (capacidade de ser parte), capacidade processual e representação por advogado (capacidade postulatória).

Já os pressupostos objetivos a existência de um pedido, de uma causa de pedir, de nexo lógico entre ambos e a compatibilidade dos pedidos, havendo mais de um.

Os pressupostos formais referem-se naturalmente à forma dos atos processuais, como por exemplo, a forma escrita da petição inicial e da sentença, os requisitos da citação e intimações.

Entre os pressupostos extrínsecos, salienta Galeno Lacerda, o compromisso de arbitragem, a perempção, a caução, o depósito prévio, as custas, a litispendência e a coisa julgada material.]

No entanto, José Maria Rosa Tesheiner e Lucas P. Baggio entendem que o compromisso ou convenção de arbitragem é em realidade uma exceção processual posto que dependente de alegação da parte.

Ainda restam os pressupostos extrínsecos que são a perempção, a inexistência de litispendência e de coisa julgada, bem como a falta de caução ou de outra prestação exigida por lei, matérias de que o juiz pode conhecer de ofício (art. 301).

Tais pressupostos porque extrínsecos, são mais tecnicamente “impedimentos processuais” como bem assinala Calmon Passos. Posto que não dizem respeito nem aos sujeitos da relação processual e nem ao seu objeto, e, sim aos fatos relativos ao procedimento.

E, ainda ressalta o brilhante processualista que no direito anterior, o art. 67, previa a caução para o autor não residente no país ou que dele se ausentasse durante o processo, condicionava-a ao requerimento do réu. Porém, hoje, diversamente dispõe o art. 835 tornando dever do juiz a exigência da caução, independentemente de provocação da parte.

Portanto, a prestação de caução é improvável ser um pressuposto processual, pois não este o conceito deste condicionado à contingência de ordem forma e, sim a critério substancial.

Portanto, acompanho o entendimento de Tesheiner e Baggio e visualizo a prestação de caução como impedimento processual que devido as circunstâncias obstam o desenvolvimento válido do processo, mas a este é estranho, não são pertinentes nem aos seus sujeitos e nem ao objeto do processo.

Calmon de Passos, aliás, na última edição de seus Comentários ao Código de Processo Civil, volume III, 1998, pp.277-278, confirmou tal entendimento.

Galeno Lacerda não destaca um pressuposto processual importante que, na minha opinião, não encontra lugar na classificação por ele mesmo apresentada. Referimo-nos à demanda, ou seja, ao ato do autor que se dirige ao juiz, pedindo a tutela jurisdicional.

São assim pressupostos processuais:

1. Subjetivos, concernentes ao juiz: a jurisdição, a competência e a imparcialidade.

2. subjetivos concernentes às partes: a personalidade judiciária, a legitimação para o processo e a capacidade postulatória.

3. objetivos: o pedido, a causa de pedir, a existência de nexo lógico entre ambos, e, no caso de cumulação de pedidos, sua compatibilidade;

4. formais: os relativos à forma dos atos processuais;

5. extrínsecos à relação processual, a inexistência de impedimentos processuais, como a litispendência e a coisa julgada material.

6. Antes de todos eles, a demanda, isto é, o ato de pedir a tutela jurisdicional.

Assim, acolhe-se plenamente a nomenclatura proposta por Teresa Wambier, para distinguir os vícios referentes à constituição da relação jurídica processual dos vícios referentes aos atos do procedimento.

Assim apontam-se como nulidades de fundo os vícios relativos aos sujeitos do processo, aos atos de constituição da relação jurídica processual e aqueles decorrentes de impedimentos processuais, como a litispendência, a perempção e a coisa julgada.

Apesar de posição em sentido contrário dos eminentes processualistas gaúchos tais como Carlos Alberto Alvaro de Oliveira, e Daniel Francisco Mitidiero que admitem o conceito de relação jurídica processual.

As nulidades de fundo ou nulidades absolutas relacionam-se aos pressupostos processuais posto que se referem à constituição da relação processual e dos requisitos de admissibilidade do julgamento de mérito.

A demanda

O art. 267 do CPC estabelece que o processo se extingue, sem resolução de mérito, quando se verificar a ausência de pressupostos de constituição e de desenvolvimento válido e regular do processo. Como somente se extingue o que é existente, conclui-se logicamente que não há pressuposto de existência do processo.

Costuma-se apontar a demanda (pedido formulado a um juiz) como pressuposto de existência do processo. Porém, historicamente nem sempre foi assim, principalmente no processo penal, pois os processos chamados inquisitórios podiam ser iniciados normalmente de ofício pelo magistrado.

Entende-se hoje que a iniciativa do juiz retira do processo seu caráter jurisdicional. E, defendem alguns que se pode ter então, a atividade de administração da justiça, mas não atividade jurisdicional.

O princípio da demanda, da ação ou da inércia da jurisdição veda o exercício da jurisdição por iniciativa do juiz. É indispensável a ação ou a atividade de um autor ou acusador.

O princípio da ação caracteriza o denominado sistema acusatório, em oposição ao inquisitório, em que o juiz age de ofício, como autoridade administrativa. Notória crítica ao sistema inquisitório resulta do fato de que o juiz além de julgador seria cumulativamente também, o acusador.

Primitivamente, a reação ao ilícito se concretizava por uma sanção imposta ao ofensor pelo próprio ofendido, ou por seus familiares, sem a interposição de quem quer que fosse.

Era a fase da vingança privada. Onde o revide não guardava proporção com a ofensa, ocasionando por vezes sucessivas e sangrentas lutas entre grupos e famílias.

Somente com o talião, delimitou-se o castigo, então a vingança não seria mais arbitrária e desproporcional.. Podemos então, dizer que a lei de talião foi a origem do tão contemporâneo e badalado princípio da proporcionalidade e da razoabilidade.

Mas chegou-se ao momento em que fora proibida a defesa privada, quando o Estado integralmente assume a função punitiva ou admite que o ofensivo dela participe por meio da ação.

No primeiro caso, o indivíduo não tem nenhuma ação, mas, em contrapartida, basta que o juiz tenha notícia de algum delito para que possa perseguir o seu autor ( no sistema inquisitório).

No segundo, o direito de ação substitui a primitiva ação punitiva, direta, do ofendido, contra quem ele considera responsável pela ofensa. Persegue-o em juízo ao invés de persegui-lo pelos campos.

Na seara cível, a regra antiqüíssima, é o direito de ação conferido apenas ao próprio lesado ou interessado. Já em matéria penal, o poder de agir foi conferido a qualquer do povo, no processo acusatório romano, mas a regra, hoje, é outorgá-lo apenas a um órgão do Estado (Ministério Público), ficando, assim, o ofendido duplamente impedido de agir diretamente contra o ofensor.

Não tem a ação direta de defesa privada, ou exercício das próprias razões, nem a ação processual, exceto nos casos de ação penal privada. Embora o direito penal admita as chamadas ações penais públicas, incondicionadas ou condicionada à representação, e as ações penais privadas.

O princípio da ação, quanto ao processo penal, está consagrado no art. 129, I da Constituição Federal e, resta ao ofendido no máximo participar como assistente de acusação.

Quanto ao processo civil, o princípio da ação, com seu corolário da vedação de julgamento extra ou ultra petita, encontrando-se embutido na fórmula ampla do “devido processo”, conforme o art. 5º, LIV da CF.

O princípio da ação, também denominado “princípio da demanda” impede que o juiz profira sentença além do pedido oi fora deste. A ação, quer seja civil ou penal, deve conter um pedido certo, fundado em fatos determinados. O juiz não é um livre investigador de provas incertas ou imprecisas, para justificar pretensões incertas e imprecisas de uma das partes.

Eis aí, a diferença crucial entre ação e inquérito (ou devassa). O inquérito destina-se à descoberta de fatos novos. A ação visa a averiguar a veracidade ou não de fatos afirmados na inicial.

Mas, ao nos depararmos com o art. 989 do CPC, percebemos que o juiz poderá determinar de ofício o início do inventário, que é jurisdição contenciosa. Temos, então, uma hipótese de processo que se inicia de ofício, pelo juiz, isto é, uma hipótese de processo sem demanda.

Mitidiero ainda lembra que o juiz poderá de ofício ficar o procedimento do inventário e partilha, mandar que se exiba testamento, arrecadar herança jacente, ou de ausente, e decretar de ofício a falência (como previa o Decreto-Lei 7661/1945).

Encontram-se na legislação vigente, alguns casos, embora sejam raros, de processo sem ação/demanda.

Atualmente, a doutrina processual conjuga harmonicamente as idéias de ação, jurisdição e processo, como um todo, e cada um desses conceitos exigindo os demais.

Cabe indagar finalmente sobre a constitucionalidade de casos que excepcionam o princípio da ação. Afinal, há ou não ofensa ao devido processo legal?

Tudo indica que não. De qualquer modo, firma-se a demanda como sendo, via de regra, o fato que inicia a constituição da relação jurídica processual. Assim a demanda deve ser proposta perante autoridade jurisdicional competente.

Demanda proposta perante quem não tenha investidura jurisdicional, por exemplo, por quem é concursado mas não foi ainda nomeado, ou porque o juiz em disponibilidade ou aposentado, não tem idoneidade para ensejar o processo (jurisdicional).

Portanto, para se cogitar em processo jurisdicional é preciso um órgão jurisdicional. E que seja competente, imparcial e dotado de jurisdição.

O poder de julgar do magistrado tem suas raízes na Constituição, por isso a jurisdição é fonte de poder jurisdicional. E, só nos limites fixados na magna lei está o juiz investido no poder de julgar.

O poder de julgar foi repartido entre as chamadas jurisdições especiais ( penal-militar, eleitoral, do trabalho, federal) e a comum ( a remanescente).

A investidura dos órgãos jurisdicionais já lhes confere poder de julgar limitado constitucionalmente, de sorte que o exercício de suas atividades fora dos limites traçados constitucionalmente, importa mais que em defeito de competência, em defeito de jurisdição. O que faça, ou realizem fora dos limites constitucionais, é em tudo e por tudo, semelhante à atividade do não-juiz, conseqüentemente, ato inexistente juridicamente, do ponto vista processual.

Criticam as considerações de Calmon de Passos e de Humberto Theodoro Junior. O Poder Judiciário exerce a jurisdição por meio dos seus juízes e por meio de suas “justiças” tal como preceitua a CF.

O juiz ou o tribunal sempre tem jurisdição em abstrato. Por isso, independentemente de ser este ou aquele o juiz competente, o Estado deverá responder ao jurisdicionado, mesmo que a resposta importe em extinguir o processo sem resolução do mérito (art. 267, IV do CPC). O vício detectado na pendência processual, sana-se com a remessa ao juiz competente. Decreta-se a nulidade apenas dos atos decisórios, não do próprio processo (art. 113, segundo parágrafo do CPC).

Extinto o processo com resolução mérito, sana-se o vício pelo decurso do prazo de dois anos estabelecido para a propositura de ação rescisória ( art. 485, II CPC). Decorrido esse prazo, a sentença torna-se inatacável, tendo-se a “coisa soberanamente julgada”.

Há casos de acirrada divergência jurisprudencial, a justificar a rescisão da sentença, mas não a declaração de sua inexistência ou a decretação de nulidade a qualquer tempo. Assim, por exemplo, entendia o STJ que era justiça comum a competência para julgar as ações de indenização por dano moral, proposta por empregado contra seu emrpegador.

Entretanto, o STF, no Recurso Extraordinário 238.737/SP, veio a firmar entendimento justamente contrário, dizendo que, tratando-se de litígio surgido em decorrência da relação de emprego, nada importa que a causa deva ser resolvida com base no Direito Civil. Esse acórdão provocou mudança da jurisprudência do STJ.

Posteriormente, o plenário do STF, no julgamento do Recurso Extraordinário 438.639, Redator para o acórdão Ministro Cézar Peluso , por maior, na sessão de 09 de março de 2005, afirmou a competência da justiça comum para processar e julgar ações indenizatórias decorrentes de acidente de trabalho, acirrando a discussão.

Então, sobreveio a Emenda Constitucional 45 em 2004 determinando a competência da justiça do trabalho para julgar as ações por danos morais e materiais decorrentes da relação de trabalho (art. 114, VI da CF).

Apesar disso, quantas ações não terão sido julgadas pela justiça comum? Seria cabível rescisória, desde que verificados os pressupostos específicos da própria rescisória, não que qualquer juiz possa, a qualquer tempo, pura e simplesmente declarar sua inexistência ou nulidade.

Qual é o vício do ato do juiz que se pronuncia após a sentença, reexaminando o mérito, revogando a primeira decisão proferida ou sua complementação, ou ainda, prolatando outra decisão?

Carlos Alberto Alvaro de Oliveira, escrevendo antes da reforma legislativa que alterou o art. 162, primeiro parágrafo do CPC, a Lei 11.232/2005, afirma que o juiz exaure o papel, deixando de ter jurisdição, ao emitir provimento final, que não para esclarecer ou retificar o ato sentencial, ordenar os atos preparatórios do procedimento recursal, ou mandar praticar algum ato da chamada execução imprópria.

Daí, a afirmação de que o juiz que se manifesta na causa após a sentença, o faz sem ter jurisdição. Admite que o juiz não tenha esgotado seu papel, e, conseqüentemente, ainda esteja lotado de jurisdição no caso de haver alguma omissão quanto ao pedido ou parte deste. Nestes, casos, poderá a sentença ser complementada, o que não poderia nos casos anteriores.

Teresa Wambier discorda de Carlos Alberto Alvaro de Oliveira, diz que a hipótese é de falta de competência, pois todo o juiz tem jurisdição in abstracto. Afirma que o vício gera nulidade absoluta e não impede o trânsito em julgado da decisão, configurando-se a hipótese de rescindibilidade da sentença, por vício de competência absoluta, em virtude do critério de função ou hierarquia (art. 111 do CPC).

Afirma Wambier que se trata de vício de competência em razão da função. Pode-se cogitar em vício de jurisdição diante do que se chama de conflito internacional de competência. Melhor cogitar-se em conflito internacional de jurisdição, pois a questão relaciona-se com o próprio Poder do Estado em dizer e fazer valer o direito.

A competência jurisdicional está vinculada ao conceito de jurisdição, sendo o limite dentro do qual o juiz pode exercer a jurisdição. Ressalte-se que o próprio Parlamento não pode exercer a jurisdição, como ocorreu durante a Revolução Francesa, no afamado período chamado “Período do Terror” em que a Convenção, sob a liderança de Robespierre, decretou que as pessoas (Dec. De 19 e 20/3/1793, art. 1º).

A condenação à morte decorria, então da mera constatação de sua identidade. Essa norma veio afinal a ser aplicada ao próprio Robespierre, bem como aos seus amigos, deputados e outros, que alimentaram as fornadas de 10, 11 e 12 do termidor em 1794.

Conforme o princípio do juiz natural, consubstanciado no devido processo legal, os poderes constituídos não podem criar juízos para o julgamento de casos determinados.

Desta forma os tribunais de exceção se contrapõem ao juiz natural, pré-constituído por lei. O princípio do juiz natural apresenta dois significados: consagra-se a norma de que só é juiz o órgão investido de jurisdição e impede-se a criação de tribunais ad hoc e de exceção, para o julgamento de causas penais ou civis.

A competência pode ser absoluta ou relativa. A competência absoluta é improrrogável. Não se modifica por conexão ou continência, e é inderrogável por convenção das partes.

A competência relativa prorroga-se, não sendo oferecida a respectiva exceção, no prazo legal. Segue-se, daí, que a competência de foro, que de regra é relativa, não constitui pressuposto processual.

A incompetência relativa constitui exceção em sentido estrito, isto é, de defesa que precisa ser alegada pela parte para que dela possa conhecer o juiz. A incompetência relativa não pode ser declarada de ofício ( Súmula 33 do STJ) exceto para declarar a nulidade de cláusula de eleição de foro, em contrato de adesão, quando o juiz declinará da competência para o juízo do domicílio do réu ( art. 112, parágrafo único do CPC). Ressalte-se que a regra é a impossibilidade de ser declarada de ofício.

Assim temos a jurisprudência, in verbis:

“Proposta a ação no foro de eleição, não pode o juiz, de ofício, decretar sua própria incompetência, eis que relativa a Súmula 33 do STJ. Afirmando sua própria incompetência, não pode o juiz decretar a nulidade da cláusula de eleição de foro.” ( TJSP, Agravo de Instrumento 36.919-4, 5ª Câmara de Direito Privado, relator Desembargador Marcus Andrade, j. 28/11/1996, JTJ, 194/201).

O art. 485 do CPC aponta, entre os casos de rescisória, o de sentença proferida por juiz absolutamente incompetente, o que deixa claro que, no caso de incompetência relativa, não cabe a ação.

Assim é porque, nesse caso, é preciso que a parte argua, no prazo legal, a incompetência relativa (art. 112 do CPC), sob pena de preclusão. Em outras palavras, a incompetência relativa, se não argüida por exceção, prorroga-se, donde não há que se cogitar em vício.

A competência absoluta está relacionada com regras de ordem pública, inderrogáveis por vontade das partes (art. 111 do CPC), que regulam a competência do juízo com base em critérios de ordem material, pessoal e funcional. Os vícios decorrentes de incompetência absoluta ocasionam nulidades de fundo, de que o juiz pode e deve conhecer de ofício. Sana-se a nulidade com a remessa dos autos ao juiz competente.

O princípio da imparcialidade encontra-se expresso no art. 10 da Declaração Universal dos Direitos Humanos: “Toda pessoa tem direito, em plena igualdade, a uma audiência justa e pública por parte de um tribunal independente e imparcial, para decidir de seus direitos e deveres ou do fundamento de qualquer acusação criminal contra ele.”

Consta implícito na CF de 1988 a este princípio da imparcialidade e vinculam-se as denominadas garantias da magistratura (vitaliciedade, inamovibilidade e irredutibilidade de vencimentos).

A imparcialidade do julgador relaciona-se também com o princípio do juiz natural. Isso porque o magistrado deve ser pré-constituído, isto é, constituído primeiro do que o fato a ser julgado, essa garantia constitucional é necessária para assegurar a imparcialidade do juiz no julgamento do conflito que lhe é apresentado.

A imparcialidade supõe que o juiz não seja parte, nem dependa de qualquer das partes e que tampouco haja outro motivo para que se possa duvidar de sua isenção, o que se traduz na ausência de causa de impedimento ou suspeição.

Os casos de impedimento estão no art. 134 do CPC onde é defeso ao juiz exercer as suas funções no processo contencioso ou voluntário de que for parte; quando for órgão de direção ou de administração de pessoa jurídica, parte na causa; quando for cônjuge, parente, consangüíneo ou afim, de alguma das partes, em linha reta ou, na colateral, até o terceiro grau; quando nele estiver postulando, como advogado da parte, o seu cônjuge ou qualquer parente seu, consangüíneo ou afim, em linha reta ou na colateral até o segundo grau, etc.

O art. 485 do CPC aponta como um dos fundamentos de ação rescisória o fato de haver a sentença sido proferida por juiz impedido, o que deixa claro que, no caso de suspeição, não cabe a rescisória.

Assim é porque, se a parte não recusa o juiz suspeito, no prazo legal, ocorre preclusão, o que significa o vício não autorizará a decretação da nulidade do processo, nele próprios e, como maior razão, em qualquer outro processo.

É sanável o vício consistente no impedimento do juiz com a remessa dos autos ao substituto legal (art. 313 do CPC). O fato de a parte não opor a exceção própria, no prazo lega (art. 305 do CPC), não implica preclusão.

O impedimento pode ser declarado a qualquer tempo. Nem há sanação pelo trânsito em julgado da sentença. Contudo, não sendo proposta a ação rescisória nos dois anos subseqüentes, a nulidade já não poderá ser decretada.

Estão os casos de suspeição presentes no art. 135 do CPC, e reputa fundada a parcialidade do juiz, quando amigo íntimo ou inimigo de qualquer das partes; alguma das partes for credora ou devedora do juiz, de seu cônjuge ou de parentes destes, em linha reta ou na colateral até o terceiro grau; herdeiro presuntivo, donatário ou empregador de alguma das partes; receber dádivas antes ou depois de iniciado o processo; aconselhar alguma das partes acerca do objeto da causa, ou subministrar meios para atender às despesas do litígio; interessado no julgamento da causa em favor de uma das partes.

Se houver uma demanda e um juiz, mas que não exista o autor, alguém formulou pedido (demanda) a um juiz, mas não existe a pessoa em cujo nome foi formulado o pedido.

Isso pode acontecer, por exemplo, no caso de um ambientalista se dirigir ao juiz formulando pedido em nome de uma espécie vegetal ou animal ameaçado de extinção.

Havendo demanda, processo há, ainda que inexista o autor. Sobre a demanda formulada em nome de pessoa já falecida, diz Jorge Luís Dall’ Agnol:

Pontes de Miranda afirma que se falta a qualidade de parte ( se o processo foi intentado pelo procurador quando já morto o autor) não há relação processual.

Tratando ainda sobre a temática, José Carlos Barbosa Moreira colaciona os seguintes exemplos:

a) advogado, munido de procuração, ajuíza a inicial sem ter notícia de que o outorgante viera a falecer; b) cita-se por edital por edital pessoa que depois se verifica estar morta desde data anterior. Nesses casos, elucida esse autor, haverá lugar, sem dúvida, para um pronunciamento do órgão judicial, quando se advirta do problema: e é quanto basta para que se tenha de reconhecer que algo, no processo, existe, e até vale: negar ao juiz a possibilidade de pôr termo validamente à atividade processual, em semelhante urgência, seria tornar insolúvel o problema!

No caso alusivo ao réu, há existente processo e, por isso mesmo, seria válida a decisão do juiz que anulasse os atos desenvolvidos a partir da citação, visando à sucessão processual ou eventual extinção do processo (na ausência de sucessores).

Na hipótese referente ao autor também não há como negar a existência ao processo. Dê-se prosseguimento ao exemplo referido: imagine-se que o réu tenha sido citado e contestado, antes do juiz tomar ciência do falecimento do autor (em data anterior ao ajuizamento da demanda). Que natureza teria a decisão que, reconhecendo o óbito, extinguisse o processo e condenasse o advogado no pagamento das custas e honorários advocatícios?

Não seria sentença terminativa do processo? Não constituiria esta virtual título executivo judicial? É claro que sim.

Sobre análoga situação pronunciou-se a colenda 1ª Câmara Cível do Egrégio Tribunal de Alçada do Rio Grande do Sul, relator Dr. Nelson Luiz Púperi, in verbis:

“Comprovado que a companhia administradora de imóveis propôs a ação de despejo em nome de pessoa falecida, correta se revela a sentença que declara extinto o processo com apoio na regra do art. 267, IV do CPC, condenando o mandatário ao pagamento nas custas e honorários advocatícios.”

Esclarecedora é a lição de Chiovenda pois se a demanda provém de pessoa ou se dirige a pessoa na qualidade de representante de um incapaz, de órgão de uma pessoa jurídica, quando, entretanto, tal qualidade não lhe corresponde ( falso tutor ou falsus procurator), a relação processual inexiste com respeito ao pretenso representado; porém, existe por certo: só há incerteza sobre se o sujeito dela é o pretenso representante ou o pretenso representado.

Enquanto o juiz não houver declarado se existente ou não a pretensa qualidade, deve considerar-se como caso de nulidade.

A demanda formulada por pessoa inexistente si gera a princípio um único efeito que é o de criar ao juiz o dever de indeferir a inicial, o que aliás, deverá ser feito de forma motivada conforme exige o art. 93, IX da CF. É o suficiente para se afirmar a existência do processo.

Dizer-se que, nesse caso, não há ação, mas apenas exercício do direito de petição, é fugir à realidade com garatujas vocabulares.

E, tal tese se esbarra com o teor do art. 37 do CPC que manda reputar inexistente a demanda, se a parte em cujo nome foi formulado o pedido, não ratificar o ato do advogado que requereu em seu nome.

Portanto, o advogado não poderia responder por perdas e danos em decorrência de atos que não existiram. A inexistência, pois, a que se refere o dispositivo legal, é em relação à parte que não ratificou os atos praticou.

Chamou a atenção Ovídio Baptista da Silva, se o ato pode ser ratificado, é porque ato processual na verdade existira. Se não for ratificado, a inexistência decorrerá, a rigor, da circunstância de não haver a parte ratificado, através de procurador, praticado qualquer ato. Ineficazes seriam os atos praticados em relação àquela parte que se supôs representada.

Ainda há de se frisar ser nada razoável alegar que no processo distribuído após a morte do autor, haverá de incidir o princípio da sanação, A realidade impõe que não se fechem as portas quanto a essa possibilidade. Evidentemente, o direito discutido em juízo deve ser transmissível aos herdeiros e a eles cabe a opção de habilitar-se ou não, nos autos do processo.

Então o processo resta perfeitamente caracterizado perante três pessoas, o autor que pede, o réu em face de quem se pede, e um juiz designar a aceitar ou rejeitar o pedido.

(continuará)...

GiseleLeite
Enviado por GiseleLeite em 07/04/2010
Código do texto: T2183807
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