QUEM MATOU A GAROTA NARDONI?

O “caso” da vez, voltou a ser o da garotinha Nardoni, que pela investigação policial foi morta pela madrasta e pelo pai, sendo antes torturada, asfixiada e em seguida jogada pela janela de seu apartamento. Triste, não? De fato é muito triste saber que uma garotinha linda, que na época tinha a mesma idade maravilhosa que minha filha tem hoje, ter sua vida ceifada de modo cruel, bárbara, contraditória, inconsiderada e plenamente imotivada!

Várias perguntas deixaram, e pelo visto, jamais serão respondidas; perguntas que morrerão com seu algoz, ou algozes; e que nos fazem, mais uma vez, repensar naquela questão de quanto vale uma vida! O que se ouve nas esquinas e nos palcos da vida é que ela, a vida, é bela e que devemos lutar para preservá-la; que não devemos fazer mal ao nosso próximo o que em tese é sustentado que necessitamos fazer o bem, não importando a quem!

Alguém será condenado e jamais saberemos exatamente se este condenado foi ou não o verdadeiro culpado, a final de contas, o crime não contou com testemunhas e os indiciados juram inocência e clamam pela justiça; justiça esta que não lhes deram provimento nas alegações iniciais de inocência, mesmo havendo a rogatória do princípio do contraditório e da ampla defesa descrito no art. 5º inciso LV da famosa e desconhecida Constituição Federal.

Quando em Latim se diz “audiatur et altera pars”, na verdade se quer dizer para que se ouça a outra parte. É uma teoria resultante de uma veridicidade, qualificado pela possibilidade de réplicas e da utilização de todos os meios de defasa em Direito admitidos! Palavras bonitas que só ouvimos pelas bocas de juristas renomados, do tipo “estrelas globais”, ou ainda nas vozes daqueles que anseiam pela comoção do seu cliente. Quando popularmente traduzimos, chega-se a conclusão, mesmo que em teorema, que devemos sempre extinguir toda a possibilidade de alguém se defender, antes de determinarmos sua condenação e no direito penal, enxerga-se outro princípio, também em Latim, que diz “in dúbio pro reu” (na dúvida, pró réu).

Se há o “princípio” da presunção da inocência (CF art. 5º LVII), que para mim é ambígua (a palavra “princípio”), por que a mídia e a população já condenaram há dois anos o pai e a madrasta da garotinha morta? Ignorância? Talvez sim, talvez não! Que há imprecisão na interpretação legal, disso eu não tenho uma dúvida sequer; que os indiciados se mostraram frios e não esboçaram reações desejadas pela grande platéia que os condenou antecipadamente, isso eu também não duvido; que houve um jogo duro e da mesma forma antecipado por parte do nobilíssimo membro da “parquet”, isso eu também não duvido; mas então porque os dois foram presos, se mantiveram presos e serão condenados?

Se ninguém será culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória, como alude, prolixamente repetindo, a Constituição Federal, quem poderia ou pode ser maior e mais poderoso do que a Carta Magna? A polícia, a sociedade, a Rede Globo, enfim, quem?

Vamos esquecer a filosofia e a poesia do Direito arcaico romano; esqueçamos os juristas que passeiam em versos por teses megalômanas que somente lhes rende muita grana e confundem aqueles, que assim como eu, estudaram pouco, ou nada, para entupirem as varas criminais de processos absurdos e os fóruns brasileiros de papéis inúteis; vamos ser realistas e analisar friamente cada aspecto que envolve, não somente este crime em questão, mas os milhares e milhares de outros crimes hediondos que são cometidos a todo instante, em todos os lugares, inclusive nos mais observados pela sociedade, que sequer são divulgados da forma que deveriam ser!

A garota Nardoni foi morta por alguém de sangue frio, covarde, inescrupuloso e completamente insano; uma garotinha que não oferecia risco a um gatinho e que foi tratada, antes de falecer, como sendo uma adulta possuidora de forças colossais; seja o pai, a madrasta, ambos ou uma terceira pessoa, cabe sim a polícia científica desvendar os pontos obscuros e oferecer respostas ao quesito mais sério deste inquérito, que é apontar o culpado, ou os culpados, mas o que todos nós sabemos e estamos fartos de ver e ouvir dizer é que esta mesma polícia científica raramente elucida alguma coisa certa.

Os pontos levantados pela perícia, como a “impressão” deixada pela trama de uma rede de janela na camisa do pai da garota, pode ser uma prova conclusiva, mas a pergunta é se de fato a nossa polícia possui este mecanismo correto e indiscutível de que isso é uma verdade. Determinar que as gotas de sangue que estavam no chão foram produzidas pelos ferimentos da garota também pode constituir prova forte, mas afirmar que elas foram produzidas por alguém que a carregou nos braços de uma altura EXATA a estatura do pai, eu confesso que cri que estiveram produzindo uma história digna de Hollywood e provo isso!

Eu meço 1,73m e se carregasse nos braços um corpo que apresentasse sangramento, as gotas deixariam uma determinada impressão ao caírem no chão, mas e se eu carregasse este mesmo corpo pelos braços e pernas, sua altura em relação ao solo mudaria completamente e, por conseguinte, as gotas deixariam outro tipo de impressão no solo; isso é fato! Se o algoz da garotinha tivesse uma estatura semelhante ao pai, será mesmo que a polícia conseguiria determinar com exatidão que a diferença entre um ou dois centímetros alteraria a impressão do sangue no chão? Eu tenho cá as minhas cruéis dívidas!

Emocionalmente falando eu não quero crer que foi o pai quem matou ou ajudou a ocultar a morte da menina, mas a justiça não vive, ou não deveria viver de emoções; estas deveriam estar longe dos tribunais, porque o sentimento também gera a dúvida de justiça, ele também anula a decisão; eu acho que as provas apresentadas no caso Nardoni, da forma que foram apresentadas pela televisão, não formam um conjunto forte ao ponto de capacitar a condenação daqueles indivíduos, mas isso quem decide é o povo e neste caso, o povo é soberano; é a lei e a lei é a ordem!

Vários outros pontos depõem contra o casal Nardoni; eles não apresentaram testemunhas confortáveis que atestassem por sua inocência e para acabar de completar o quadro dantesco na vida deste casal, o pai ao que parece, já havia em público esboçado reações agressivas contra a mãe da garota. Se forem condenados é pouco provável que passem menos do que 15 anos enjaulados e após isso, se conseguirem algo extraordinário, viverão excluídos eternamente da qualquer círculo civilizado e a prova disso é o caso do ator mineiro da Globo e sua esposa que foram condenados por matarem uma colega a tesouradas com a esposa; depois de cumprir a pena e de conseguir até concluir o curso de Direito, não consegue viver bem, muito menos com alguém!

Dos crimes de competência do tribunal do júri o juiz articula a sentença, que pode ser de pronúncia, que tem o efeito de reclusão imediata do réu ou por impronúncia, que determina a absolvição imediata do réu; no caso Nardoni é pouco provável que haja impronúncia ou absolvição; embora haja casos em que os réus são condenados e soltos após anos confinados nas escolas do crime, neste caso em particular, eu só enxergo possibilidade dos dois serem soltos, caso haja surgimento da terceira pessoa ou o assassino confesso.

José Frederico Marques, jurista, escreveu na década de 90 que “estado de inocência não se finda com a pronúncia em face do cânone constitucional relativo ao estado de inocência do réu, antes de passar em julgado a sentença de condenação, não pode haver prisão obrigatória... assim sendo, arbitrária, contra legen e em conflito com o art. 5º, LVII, da C.F., a prisão decretada... em conseqüência da sentença de pronúncia.”; Adriano Marrey, outro jurista, diz o contrário e crê que o juiz, uma vez convicto da evidência do crime, pode ele mantê-lo em cárcere; em quem seguir? – Somente você pode dizer!

Quando alguém perde completamente a cabeça e comete um crime, o autor torce pela face do crime perfeito, aquele que somente ele e Deus sabem da verdade, mas quando há mais de uma pessoa envolvida, que é o caso específico do pai e da madrasta da garota Isabella Nardoni, é pouco provável que isso, caso seja uma mentira, seja sustentada por muito tempo; mais dia, menos dia, algum indício acaba aparecendo e destacando se tudo isso é uma grande pantomima medíocre ou se há uma verdade capaz de fazermos acreditar que a garota foi morta por outra pessoa!

Enquanto eu buscava jurisprudências para este e outros casos, notei algumas pérolas oriundas do Tribunal Regional Federal e outro destaque do Superior Tribunal de Justiça: "Prevalência do Princípio da presunção de inocência, ante, a fragilidade, ou inexistência de prova concludente, não há de impressionar-se o juiz criminal com a vida pregressa do réu, para proferir a condenação, invertendo o princípio da presunção de inocência pela de culpa." (ACR nº 0007206 S.P); "De qualquer sorte, no Direito Brasileiro, o que deve prevalecer é a presunção de inocência dos cidadãos, até que se demonstre o contrário, em procedimentos regulares." (MS nº 0103612 DF); "Aduzem inexistirem indícios veemente de autoria e que o indiciamento contraria o princípio da presunção de inocência. Ainda, ser o indiciamento ato irreversível que manchará a vida dos Pacientes, além de não ser medida necessária para o andamento da investigação criminal, em nada influenciado a produção de prova." (HC nº 17731 RS).

Encerrando a discussão acerca do tema Nardoni, o preclaro juiz, que já foi em outrora o julgador de um processo contra o pai da garota por falta de pagamento de pensão, enxergou que todas ou parte das provas foram concludentes para a manutenção em cárcere dos réus, motivos pelos quais eles estão sendo julgados por júri popular; o insigne magistrado rechaçou qualquer possibilidade aceitada da altivez da inocência; e aí está os suspeitos, no banco dos implicados a espera da sentença e do cômputo dos seus períodos de prisão. Eu só espero que a justiça de fato seja feita ou veremos flagrante mais um caso de perda total de cabeça!

Somente para clarear as idéias, a ampla defesa se traduz na garantia e efetividade na participação em todos os momentos do processo, podendo, inclusive, serem produzidas provas por meios ilícitos, desde que devidamente justificadas pelo estado máximo da necessidade. É a lei!

Carlos Henrique Mascarenhas Pires

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Enviado por CHaMP Brasil em 26/03/2010
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