Primeiras linhas sobre falências e recuperação

Já não se pode chamá-la de nova pois a dita Lei 11.101 é 09 de fevereiro de 2005 e entrou em vigor em 120 9cento e vinte dias) após sua publicação.

A referida lei é composta de duzentos e um artigos e são divididos da seguinte forma:

a) arts. 1º ao 4º - disposições preliminares;

b) arts. 5º ao 46º - disposições comuns à recuperação judicial e à falência;

c) arts. 47º ao 72º - da recuperação judicial;

d) do arts. 73 e 74 – da convolação da recuperação judicial em falência;

e) arts. 75º ao 160 – da falência;

f) arts. 161 ao 167 – da recuperação extrajudicial;

g) arts. 168 ao 188 – Disposições penais;

h) arts. 189 ao 201 – disposições finais e transitórias.

Estrutura a Lei 11.101/2005 basicamente três institutos: recuperação judicial, recuperação extrajudicial e falência. Além de tipificar os crimes falimentares e regulamentar o respectivo procedimento penal.

Os dois primeiros artigos foram destinados a definir quem está e quem está sujeito aos seus ditames. O art. 1º diz que as regras referentes à recuperação judicial, recuperação extrajudicial e falência nele descritas aplicam-se ao empresário individual e à sociedade empresárias.

Resta claro portanto que os agentes econômicos civis, ou seja, aqueles que não são empresários individuais, nem sociedades empresárias, terão de se submeter às regras do CPC e não à lei de falências no que se refere à insolvência.

É relevante salientar que a referida lei é atualizada e moderna filiando-se à Teoria da Empresa igualmente adotada pelo Código Civil Brasileiro vigente, e tal fator tem influência na análise do processo de recuperação judicial ou extrajudicial, e falimentar.

Lembremos que a antiga Lei de falências aplicava-se ao comerciante que, sem relevante razão de direito, deixava de adimplir obrigação líquida constante em título capaz de legitimar ação de execução, ou que praticava ato de falência ( arts. 1º e 2º do Dec.-lei 7.661/45).

O âmbito de incidência do referido decreto era demasiadamente restrito principalmente devido ao fato de se basear na Teoria dos Atos de Comércio que marcou a segunda fase evolutiva do direito comercial brasileiro, e deixava de fora e sem regulamentação atividades como a dos prestadores de serviço e dos agricultores que ficavam sem os benefícios da concordata e os demais previstos no decreto-lei falimentar.

Por causa dessa notória precariedade legislativa surgiram novas leis com intuito de ampliar o campo de incidência normativo comercial e passando a abrigar outras atividades mercantis e agentes econômicos, até que o Código Civil vigente (a Lei 10.406/2002) foi adotada de forma definitiva a teoria da empresa possibilitou a mais plena abrangência dos agentes econômicos no direito comercial brasileiro que passou a se chamar de direito empresarial.

Hoje o direito de empresa traz inseridos os agentes econômico-sociais (empresários e sociedades empresárias mencionadas no art. 1º como destinatários da Lei 11.101/2005) e sua respectiva disciplina jurídica.

A empresa é, portanto um pólo de convergência de vários interesses, aonde se encerram os anseios dos funcionários, do Fisco, da sociedade com o consumo e da economia como um todo.

A empresa é atividade desenvolvida profissionalmente e com habitualidade, seja por um empresário individual, seja por uma sociedade empresária, de forma economicamente organizada, voltada à produção ou circulação de mercadorias ou serviços.

O empresário segundo os termos do art. 966 do CC é quem exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou circulação de bens e serviços. Portanto, empresa é a atividade desenvolvida pelo empresário.

Não será empresário aquele que desenvolve atividade intelectual de natureza científica, literária, ou artística mesmo que para tanto atue com profissionalismo, com fins lucrativos, salvo se no exercício da profissão constituir elemento da empresa( art. 966, parágrafo único do CC).

A empresa é explorada pelo empresário que pode ser pessoa física, ou seja, empresário individual como pessoa jurídica, também chamada de sociedade empresária.

O atual direito empresarial brasileiro tem como principal foco a atividade empresarial, entendida como atividade econômica e organizada, voltada à obtenção de lucros. E, para tanto assumem o empresário e as sociedades empresárias riscos e colocam à disposição da coletividade produtos e serviços.

A empresa, por ser uma atividade organizada, deve concentrar os quatro fatores de produção apontados tradicionalmente pela doutrina: capital, insumos, mão-de-obra e tecnologia.

A atividade empresarial é essencialmente econômica, porque destinada à obtenção de lucros que podem ser canalizados para a própria empresa ou utilizados para fins filantrópicos.

Daí conclui-se que se não há atividade empresarial, não há empresas. E, se não há empresa, há mera atividade civil que pode ser prestada por pessoas físicas ou jurídicas, que não estão sujeitas ao regime falimentar, mas sim à execução concursal prevista no Código Processual Civil brasileiro.

Uma pessoa jurídica que exerce atividade civil é chamada de sociedade simples (art. 982 CC) e se sujeita às normas que lhe são próprias, dispostas nos arts. 997 ao 1.038 do CC.

As sociedades empresárias adquirem personalidade jurídica com o registro de seus atos constitutivos (estatutos ou contratos sociais) na Junta Comercial. As sociedades simples adquirem personalidade jurídica com o registro no Ofício de Registro Civil das Pessoas Jurídicas ( lei 6.015/1973, art. 114).

Os profissionais liberais como advogados, médicos, dentistas, artistas, atores ou músicos não são empresários, salvo se envolvidos em cadeia produtiva e operacional que possa ser enquadrada como atividade empresarial, o que ocorre, por exemplo, como uma clínica de estética em que os médicos são apenas prestadores de serviço dentro da empresa ou sócios.

Também exercerem atividade meramente civil os produtores rurais não registrados na Junta Comercial (órgão de registro público de empresas mercantis - RPEM). Assim se estiverem registrados ficam equiparados, para todos os efeitos, aos empresários (art. 971 CC).

Outra atividade que não é considerada empresarial é a desenvolvida por cooperativas conforme os termos do art. 982 do CC, são sempre sociedade simples, independentemente do objeto por elas desenvolvido.

Somente os empresários individuais e as sociedades empresárias ( sociedade em nome coletivo; em comandita por ações e anônimas) estão sujeitos à Lei 11.101/2005, podendo recorrer aos institutos de recuperação judicial e extrajudicial ou ter a falência decretada.

O art. 2º da vigente Lei de Falências trata que não se aplica também a empresa pública e nem a sociedade de economia mista, instituição financeira pública ou privada, cooperativa de crédito, consórcio, entidade de previdência complementar, sociedade operadora de plano de assistência de saúde, sociedade seguradora, sociedade de capitalização e outras entidades legalmente equiparadas às anteriores.

As instituições financeiras são disciplinadas pela Lei 6.024/1974, as cooperativas pela Lei 5.764/71; os consórcios na Lei 6.404/76; as entidades de previdência complementar, na Lei complementar 109/2001; as sociedades operadoras de planos de assistência à saúde estão disciplinadas Lei 9.656/98; as sociedades seguradoras, no Decreto- Lei 73/66.

Foram excluídas do regime falimentar por se tratar de atividades específicas e relevantes interesse social e econômico, sendo-lhes aplicáveis leis especiais no que diz respeito à sua insolvência.

A doutrina costuma distinguir entre sociedades irregulares e as sociedades de fato. As primeiras são aquelas que possuem ato constitutivo, porém não registrado, ou aquelas em que o prazo de existência da empresa expirou sem renovação dos registros junto ao órgão competente.

As sociedades de fato são as que desempenham atividade empresarial, mas sem sequer possuir contrato social ou ato constitutivo. A única distinção reside na disciplina das relações dos sócios entre si e com relação a terceiros, posto que nas sociedades irregulares, por existir um documento escrito, os sócios têm como provar suas relações, o que não ocorre com as sociedades de fato.

Resume com maestria Carvalho Neto ao afirmar que: “toda sociedade de fato é irregular, mas a recíproca não é verdadeira”. Tais sociedades que não possuem personalidade jurídica, são tratadas pela lei civil com a denominação de sociedade em comum, conforme o art. 986 e seguintes do C.C.

Independentemente de possuírem ou não personalidade jurídica, as sociedades empresárias podem ter sua falência decretada, basta que se comprove o efetivo exercício da atividade empresarial. Do contrário estariam se beneficiando da não-observância das prescrições legais.

As principais conseqüências da falta de registro da sociedade empresária são:

a) impossibilidade de requerer a falência de devedor, pois ,para fazê-lo faz necessária a apresentação de certidão da Junta Comercial comprovando a regularidade de suas atividades.

Todavia, as sociedades irregulares ou de fato podem figurar no pólo passivo de pedido de falência, bem como requerer sua autofalência (art. 97 da Lei de Falências);

b) impossibilidade de requerer benefício da recuperação judicial, pois para requerê-la, o devedor deve comprovar sua regularidade, apresentando o registro de seus atos constitutivos (art, 52, V da Lei de Falências);

Lembremos que a anterior lei falimentar ( o Decreto-Lei 7.661/45) quem não fosse registrado no órgão competente, não poderia requerer o benefício da concordata preventiva, salvo se o seu passivo fosse inferior a cem salários mínimos ( art. 140, I).

O instituto da concordata foi extinto completamente com a Lei 11.101/2005 e foi substituído pela recuperação judicial da empresa.

Além disso, a falta de registro da empresa acarreta a falta de eficácia probatória dos livros contábeis, sua impossibilidade de participar de licitações, responsabilidade ilimitada e solidária dos sócios; impossibilidade de obtenção de CNPJ (Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica) e responsabilização tributária por esse descumprimento e pelos que lhe são correlatos, bem como a impossibilidade de emissão de notas fiscais e de cadastro junto ao INSS e demais sanções advindas, configurando a inexistência de autonomia de patrimônio da pessoa jurídica e de seus sócios, impossibilidade de adoção de forma de microempresa.

A falência se caracteriza pela insolvência jurídica do devedor empresário, a qual se verifica pela impontualidade no pagamento de obrigação líquida superior a quarenta salários-mínimos; a execução frustrada ou pela prática de atos de falência.

Trata-se de execução coletiva, em que todos os bens do falido são arrecadados para uma venda judicial forçada, com a distribuição proporcional do ativo entre seus credores. Entretanto, para a instauração do processo falimentar, além da caracterização do estado de falência pela insolvência jurídica do devedor, é necessária a verificação dos seguintes pressupostos: a) qualidade de empresário do devedor; b) sentença declaratória de falência.

Portanto, são três os pressupostos da falência: a qualidade de empresário do devedor; b) insolvência jurídica e c) sentença da falência.

A insolvência pode ser caracterizada pela impontualidade injustificada no pagamento de obrigação líquida, superior a quarenta salários mínimos, vide art. 94, inciso I da Lei 11.101/2005; execução frustrada ( Lei 11.101/2005, art. 94, inciso II); ou pela prática de atos de falência ( art. 94,inciso III).

A impontualidade se verifica pelo não-pagamento e, ensina Fábio Ilhoa Coelho que líquida é a obrigação representada por título executivo judicial ou extrajudicial, ou escrituração contábil judicialmente verificada.

Tal impontualidade deve ser injustificada . A prova da impontualidade é o protesto do título. Ainda que os títulos não estejam sujeitos ao protesto obrigatório, por exemplo, a sentença judicial, eles deverão ser protestados para a prova de impontualidade ( art. 94, terceiro parágrafo).

Note-se por fim, que os credores do empresário devedor podem reunir-se em litisconsórcio para que, em conjunto, o montante mínimo de quarenta salários mínimos, necessário para o pedido de falência ( art. 94, primeiro parágrafo).

Verifica-se a execução frustrada sempre que o empresário devedor, ao ser executado, por qualquer quantia, pratica a tríplice omissão, que se compõe de: - não paga, não deposita e nem são penhorados bens suficientes dentro do prazo legal.

Note-se que, ao contrário da impontualidade injustificada, a caracterização da execução frustrada independe da quantia devida pelo empresário devedor.O empresário, ao incorrer em determinadas condutas previstas em lei, revela seu estado de insolvência jurídica.

Assim uma vez verificada a prática de tais condutas, também chamadas de atos de falência, o empresário poderá ter a sua falência decretada.

A Lei 11.101/2005 descreve as condutas abaixo como sendo hábeis a caracterizar a insolvência jurídica do empresário devedor, possibilitando, assim, a decretação de sua falência;

- liquidação precipitada – O empresário realiza a liquidação precipitada do seu patrimônio ou se utiliza de meios ruinosos, ou fraudulentos para realizar o pagamento de suas dívidas ( art. 94, III, alínea a);

- negócios simulados – O empresário devedor, visando retardar os pagamentos ou fraudar seus credores, realiza ou, por atos inequívocos, tenta realizar negócios simulados ou a alienação de parte ou da totalidade do seu ativo a terceiro, credor ou não ( art. 94, inciso II, alínea B);

- alienação irregular do estabelecimento empresarial – O empresário devedor transfere a terceiro o seu estabelecimento empresarial, sem o consentimento de todos os seus credores e sem ficar com bens suficientes para solver as suas dívidas ( art.94, inciso III, alínea C);

- transferência simulada de estabelecimento empresarial – O empresário devedor, visando prejudicar seus credores ou burlar a legislação, ou a fiscalização, simula a transferência de seu estabelecimento ( art. 94, inciso III, alínea d).

-Instituição de garantia real – O empresário devedor reforça ou institui garantia real por dívida contraída anteriormente, sem ficar com bens livres e desembaraçados suficientes para o pagamento de seus demais credores (art. 94, inciso III, alínea e);

- abandono do estabelecimento empresarial – O empresário devedor ausenta-se sem deixar representante habilitado e com recursos suficientes para pagar os seus credores; abandona o seu estabelecimento empresarial ou tenta ocultar-se de seu domicílio, do local de sua sede, ou de seu principal estabelecimento ( art. 94, inciso III, alínea f);

- descumprimento do plano de recuperação judicial – O empresário deixa de cumprir, no prazo estabelecido, obrigação assumida no plano de recuperação judicial ( art. 94, inciso III, alínea g).

Nas hipóteses previstas no art. 94, inciso Iii, da Lei de Falências, não há propriamente impontualidade no pagamento de obrigação líquida devida pelo empresário. Mas, mesmo assim o seu estado de insolvência se exterioriza pela prática de determinados atos que denotam o seu estado ruinoso. É a chamada de insolvabilidade.

Essas são apenas linhas iniciais para entendermos o direito falencial e a recuperação judicial e extrajudicial que são temas insertos do direito empresarial brasileiro.

GiseleLeite
Enviado por GiseleLeite em 09/02/2010
Reeditado em 09/02/2010
Código do texto: T2078218
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