Interdição: proteção e reintegração do incapaz

Professor Ms. Arnaldo de Souza Ribeiro*

“Los miedos que conocemos son los de non conocer”

Wystan Hugh Auden que também assinava como W. H. Auden. Nasceu no dia 21 de fevereiro de 1907, Iorque, Reino Unido e faleceu no dia 29 de setembro de 1973, Viena, Áustria. Foi escritor anglo-americano, reconhecido como um dos grandes autores do século XX. Destaca-se entre suas inúmeras obras - O massacre dos inocentes: uma antologia.

Ensina-nos o dicionarista Marcus Cláudio Acquaviva, em seu Novíssimo Dicionário Jurídico, que interdição é:

“Do latim, interdicere: dizer entre, interceder, interpor. Medida judicial que proíbe alguém de reger sua pessoa e seus bens. Ato judicial que declara a incapacidade real de uma pessoa maior para a prática de certos atos da vida civil, na regência de si mesma e de seus bens”.

O instituto da interdição tem por escopo amparar e proteger as pessoas maiores que não estão plenamente aptas para o exercício dos atos da vida civil. O Código Civil Brasileiro trata da interdição nos artigos 1.767 a 1.783.

Preceitua o Código Civil que a incapacidade pode ser absoluta ou relativa e faz a distinção de forma didática, com sabedoria e sem preconceitos, nos artigos 3º e 4º, conforme abaixo transcrito.

Incapacidade absoluta:

São absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil: aqueles que são portadores de enfermidade ou deficiência mental e em razão dela não tiverem o necessário discernimento para a prática destes atos e os que, mesmo por causa transitória, não puderem exprimir sua vontade.

Incapacidade relativa:

São relativamente incapazes a certos atos, ou à maneira de exercê-los: os ébrios habituais, os viciados em tóxicos, e os que, por deficiência mental, tenham discernimento reduzido; os excepcionais, sem desenvolvimento mental completo e os pródigos.

Os pródigos terão capacidade relativa e somente estarão privados de: emprestar, transigir, dar quitação, alienar, hipotecar, demandar ou ser demandado, e praticar, em geral, os atos que não sejam de mera administração.

Sendo sua incapacidade relativa, marcada por tão somente um defeito de personalidade que envolva dinheiro, excluindo os casos supra transcritos, os pródigos poderão praticar os demais atos desacompanhados de seus curadores.

Terão legitimidade para propositura da Ação de Interdição: os pais, os tutores, o cônjuge ou qualquer parente.

A legitimidade ad causam é também estendida ao Representante do Ministério Público nos casos de ausência ou inércia das pessoas acima relacionadas ou, do mesmo modo, se estas também forem portadoras de patologias mentais que as tornem incapazes para a prática dos atos da vida civil.

Comprovada a incapacidade, depois de ouvir todas as partes interessadas e os peritos, o juiz determinará os limites da curatela observando o estado de saúde e o nível de desenvolvimento mental da pessoa a ser interditada, podendo determinar que a interdição seja plena ou relativa.

A Interdição é reversível, na ocasião em que o interditado sentir-se capaz para os atos da vida civil ou desvincular-se do vício que legitimou sua interdição, absoluta ou relativa, e terá legitimidade para requerer sua reabilitação.

Para conseguir o restabelecimento de sua capacidade, seguir-se-á o mesmo procedimento da interdição, ou seja, o pedido será feito ao mesmo juízo que a decretou. Ao fazer o pedido e sendo acolhido, este será apensado nos autos que decretaram a interdição, em seguida o juiz nomeará um perito para fazer o exame de sanidade do interditado. Concluído o laudo, será designado o dia e a hora para a realização da audiência de instrução e julgamento.

O profissional capacitado para elaborar o laudo é o médico com especialização em psiquiatria, por possuir maior conhecimento em relação às patologias mentais e, de tal modo, melhor orientar o julgador.

Nos dias atuais, além do laudo do psiquiatra com o propósito de melhor formar sua convicção, juízes e promotores têm solicitado pareceres de psicólogos e assistentes sociais para melhor conhecer a vida do curador e do curatelado, seus hábitos e os impactos causados em suas vidas, tanto no processo de interdição, quando no processo de restabelecimento da capacidade.

Analisar o sujeito e não somente os atos por ele praticados, tem sido uma notável preocupação dos Tribunais brasileiros. Uma das provas mais insofismáveis desta preocupação ocorreu nos dias 30 de setembro e 1º de outubro de 1994, quando o Tribunal de Justiça de Minas Gerais em acontecimento histórico ofereceu aos operadores do direito e funcionários do Judiciário Mineiro a Primeira Jornada de Psicologia Judiciária de Minas Gerais com o tema “A Legalidade da Subjetividade”. O evento foi realizado em Belo Horizonte e contou com expressiva presença de profissionais do direito, da psicologia, da psiquiatria e da psicanálise, que, durante dois dias, estudaram e debateram o perfil do doente e, sobretudo, a influência das neuroses na conduta do agente.

Aquele histórico e importante encontro abriu espaço para iniciar o debate entre a conduta objetiva e subjetiva, entre o corpo e a mente; destarte, fornecer uma nova ferramenta para melhor entender aquela pessoa que bate à porta da Justiça à procura de ajuda para resgatar seus direitos ou aquele que a ela é conduzido para receber a justa condenação.

Sabemos ainda, que a família é a mais forte, sólida e necessária das instituições para formar e ressocializar o caráter humano. Por esta razão, a interdição vai além do simples fato de retirar ou limitar poderes dos incapazes, objetivando proteger-lhes o patrimônio. Precisamos considerá-la de uma forma mais abrangente, ou seja, como forma eficaz para acolher e proteger aquela pessoa que por falta de discernimento relativo ou absoluto, temporário ou definitivo, precisa de alguém para que seja: seus olhos e sua mente até que ela se reintegre à sociedade e possa por si administrar todos os seus atos da vida civil.

Itaúna - MG, 20 de setembro de 2009.

* Arnaldo de Souza Ribeiro é Mestre em Direito Privado pela UNIFRAN – Franca - SP. Especialista em Metodologia e a Didática do Ensino pelas Faculdades Claretianas – São José de Batatais – SP. Coordenador e professor do Curso de Direito da Universidade de Itaúna – UIT – Itaúna - MG. Professor convidado da Escola Fluminense de Psicanálise – ESFLUP – Nova Iguaçu - RJ. Advogado e Conferencista. E-mail: arnaldodesouzaribeiro@hotmail.com

Notas

1.Texto publicado no Jornal ITAÚNACONTECE, dia 25 de setembro de 2009, Ano III, Edição 122, pág. 10, Itaúna – MG

www.itaunacontece.com.br

2. Texto publicado na REVISTA CIDADE DE ITAÚNA, dia 10 de novembro de 2009, Ano IX, Nº 52, Contra capa, Itaúna - MG