Breves esclarecimentos sobre o Direito das Coisas (parte 1)
Breves esclarecimentos sobre o Direito das Coisas (parte 1)
“Direito das coisas é o complexo de normas reguladoras das relações jurídicas referentes aos bens corpóreos” e, o direito real “é o poder jurídico do homem sobre coisa determinada, aderindo a ela, enquanto perdura, e prevalecendo contra todos”.
O Código Civil brasileiro utiliza o título “Direito das Coisas” pela simples razão de ter recebido maior influência da lei germânica e também do Código Napoleônico (de 1804) principalmente no que diz respeito aos direitos que possuem a coisa como objeto imediato. Também utiliza o título “Direito Reais” conforme se constata do art. 1.225 do C.C./2002(ou art. 674 C.C./1916).
Patente está que não há relevante diferença entre as duas expressões utilizadas e corroborando nesse sentido Clóvis Beviláqua explica in verbis: “direito das coisas é o complexo de normas reguladoras das relações jurídicas referentes aos bens corpóreos” e, o direito real “é o poder jurídico do homem sobre coisa determinada, aderindo a ela, enquanto perdura, e prevalecendo contra todos”.
De fato a expressão “real” denota o que é inerente a res, ou seja, a coisa. Os direitos reais são direitos subjetivos patrimoniais. Na relação jurídica real, o objeto não é uma prestação, mas sim uma coisa, ou melhor, um bem jurídico. O sujeito ativo é o titular do direito real podendo ser proprietário usufrutuário, o credor hipotecário.
O pólo passivo da relação jurídica real é composto por todas as demais pessoas da sociedade posto que os direito reais são direitos subjetivos absolutos e, valem perante todos, ou seja, erga omnes.
Assim todos têm o dever passivo de se abster de praticar qualquer ato que interfira de modo ilegítimo, no exercício do direito real pelo seu titular.
Deste modo, enquanto o direito de crédito ou pessoal (apesar da severa crítica doutrinária quanto a essa terminologia) só vale apenas em relação ao devedor (que é a priori pessoa determinada ou determinável), pois à este incumbe o dever jurídico de realizar a prestação de dar, fazer, ou não-fazer alguma coisa.
O direito real vale erga omnes, sendo exigível de todos, o respeito e a abstenção de qualquer ato que interfira no exercício do direito real pelo seu titular.
São direitos típicos, ou seja, taxativamente previstos em lei. Possuem a característica da seqüela posto que aderem à coisa e seguem-na onde quer que esta vá. Qualquer pessoa natural ou jurídica, sem distinção de sexo, idade, capacidade, estado civil, pode ser titular de um direito real.
No entanto, tal regra comporta exceções, a saber: a) art. 11 §2º, §3º, da Lei de Introdução ao Código Civil embora pelo art. 5º, caput da Constituição Federal Brasileira persista a norma que institui a igualdade entre nacionais e estrangeiros, a estes últimos, não deferida ampla liberdade para adquirirem propriedade imobiliária; b) a Lei 5.709, de 7.10.1991 regula aquisição de imóvel rural por estrangeiro residente no país ou pessoa jurídica estrangeira autorizada a funcionar no Brasil; c) Lei 6.634, de 2.5.1979 que dispõe sobre a faixa fronteira e altera o Decreto-Lei 1.135, de 3.12.1970; d) Decreto 74.965 de 26.11.1974 que regulamenta a Lei 5.709/1971 que dispõe aquisição imóvel rural por estrangeiro residente no país ou pessoa jurídica autorizada a funcionar no Brasil;e) arts. 20, VIII, IX, arts. 176 e 177 da Constituição Federal Brasileira.
A exploração de minas e jazidas e fontes energéticas está vinculada à titularidade do poder pública, Código de Minas (Decreto-Lei 227 de 28/2/1967, modificado pelo Decreto-Lei 318/1967, pela Lei 9.314/96, Lei 9.827/99, Lei 6.403/76, Lei 8.901/94 e Lei 7.990/89.
Todas essas restrições acima enumeradas existem para resguardar a segurança nacional. A propriedade de empresa jornalística e de radiofusão, incluindo televisão é terminantemente vedada a qualquer estrangeiro.
Vige a rega geral de que o objeto dos direitos reais é a coisa, no sentido de bem corpóreo. A exceção apresenta-se no âmbito do direito autoral ou propriedade literária, científica e artística, expressão empregada pelo Código Civil.
Desta forma, o direito autoral resulta da simbiose de dois elementos: a obra da inteligência e a matéria-prima que recebe. Assim identifica-se um componente personalíssimo ao lado do componente real.
Surgiram várias teorias para conceituar e estabelecer a natureza posse. Teoria subjetiva da posse foi elaborada pelo alemão Frederick Karl Savigny em 1803, que aos 24 anos publicou seu Tratado de posse, causando grande influência no pensamento jurídico do século XIX, seja no plano doutrinário, seja no plano legislativo.
A teoria de Savigny pressupõe dois elementos básicos sem os quais esta não tem sua configuração existencial:
Corpus – elemento material da posse que significa o poder físico da pessoa sobre a coisa. O que garante à pessoa a faculdade real e imediata de dispor fisicamente da coisa, e de defendê-la das agressões de quem quer que seja.
Animus domini – que é o elemento interior, psíquico ou subjetivo representado pela intenção que tem o possuidor de ser o dono da coisa, é o elemento mais caracterizador da teoria de Savigny e, por tal razão, consagra a tese como subjetiva.
É a conjunção desses dois elementos (animus e corpus) material e interior que resulta na posse. Havendo apenas o corpus sem animus, temos a mera detenção; presente apenas o animus sem o corpus, há mera intenção que é irrelevante para o direito.
Assim, a teoria subjetiva de Savigny posse é um fato em sua origem e sua existência independe de todas as regras de direito. A teoria de Savigny só reconhece a existência da posse quando presente o animus domini ou animus rem sibi habendi (ânimo de ter a coisa como sua).
É preciso distinguir animus domini e a opinio domini. O animus está ligado à posse, e a opinio está vinculada à propriedade, e a fé ou convicção que tem o proprietário de que seja verdadeiramente dono da coisa.
A teoria objetiva da posse se contrapôs à de Savigny e, foi elaborada por Rudolf Von Ihering. A posse é visibilidade de domínio. Referindo-se a seus elementos, conceitou corpus como sendo relação exterior que há normalmente entre o proprietário e a coisa, ou a aparência da propriedade, sem necessidade, contudo, de que haja o poder físico sobre a coisa, pois pode haver posse sem que haja contato direto com a coisa.
É quando temos a divisão da posse direta e indireta, por exemplo, na locação onde o locatário exerce a posse direta e o locador a posse indireta. Sendo ambas as posses protegidas juridicamente.
Para Ihering é curial que o bem esteja cumprindo sua destinação econômica, sendo irrelevante, neste caso, que haja o contato físico com o mesmo.
Igualmente, não deixa de ser possuidor o sujeito que coloca material de construção no terreno onde pretende realizar determinada obra, mesmo que não mantenha contato físico com o referido material de construção.
Segundo Ihering, o elemento psíquico animus está implícito no corpus e, consiste não na intenção de ser dono, mas na vontade de agir como se proprietário fosse; trata-se da affectio tenendi.
Desta forma, o locatário embora não tenha intenção de ser proprietário do bem, ao menos enquanto for locatário, age como se fosse proprietário. Procura conservar e manter a coisa em bom estado, tudo conforme recebeu por meio do contrato de locação e da vistoria realizada.
Denomina-se a teoria de Ihering de objetiva por dispensar o elemento animus domini, o que a torna bem mais prática do que a teoria de Savigny.
Para Ihering a propriedade é poder de direito exercido sobre a coisa, é poder de fato exercido sobre a coisa, traduzido na exteriorização de um direito real importando na utilização econômica da coisa, ainda que exercida in nomine alieno, ou seja, em nome alheio.
Portanto, possuidor é aquele que exercer, em proveito próprio, qualquer dos poderes (usar, gozar, fruir, dispor, e perseguir com quer que esteja) inerentes ao domínio ou propriedade.
Com efeito, é a teoria objetiva de Ihering que assegura a pessoas como locatário, comodatário, usufrutuário e o depositário o status de possuidor e, ipso facto, garantindo-lhes a legitimatio ad causam para o uso dos interditos possessórios, tanto contra terceiros que porventura esbulhem ou turbem sua posse, como perante o próprio proprietário que decida reaver o bem de forma ilegítima.
Assim Ihering caracteriza a relação possessória como estado de fato do locador em relação à coisa locada, o que não é mera abstração. Verdadeiramente dotado de efeitos práticos e que permite a qualquer destes possuidores a defender-se através das ações possessórias ou interditos quanto a terceiros e mesmo contra o proprietário que eventualmente obste a utilização da coisa.
É a posse um estado de fato correspondente a um estado de direito. É o caso da posse do estado de casado, da posse do estado do filho e, etc.
As hipóteses de detenção é também fixada em lei sob forma objetiva. Sempre que houver um obstáculo legal à configuração da posse, o poder fático sobre a coisa representará mera detenção.
Na conceituação da pose, O Código Civil brasileiro tanto o vigente como o vetusto de 1916 adotaram a teoria objetiva (vide arts. 1.196 do C.C./2002; art. 485 do C.C./1916), embora faça concessões à teoria subjetiva conforme se pode evidenciar dos arts. 1.204 C.C./2002(art. 493 C.C./1916); art. 1.238 do C.C./2002(art. 550 C.C. 1916).
A diferença crucial entre as escolas subjetiva, de Savigny, e a objetiva de Ihering, reside no fato de que para a primeira, o corpus aliado à affectio tenendi gera detenção, que somente se converte em posse quando se lhes adiciona o animus domini; já para a segunda escola, no corpus se encontra implícito o animus, somado ao affectio tenendi geram a posse, que se desfigura em mera detenção na hipótese de impedimento legal.
A classificação doutrinária da posse não encontra uniformidade em doutrina. Não havendo um critério seguro para uma definitiva classificação da posse. Mas, sua classificação é relevante para vários efeitos, como definir o direito de retenção sobre benfeitorias, definir a possibilidade de usucapião e, etc.
A primeira classificação legal da posse está contida no art. 1.196 do Código Civil de 2002 que a desdobra em posse direta e posse indireta. Será direta , a posse onde o possuidor tem a coisa consigo, exercendo um contato físico, direta e imediato, aparente ou visível sobre esta.
Indireta é a posse em que o possuidor exerce um contato indireto, mediato, e não aparente sobre a coisa. Vale realçar que a circunstância de ser possuidor indireto e de não exercer contato físico imediato com coisa, não o impede de se valer dos interditos possessórios com o fito de defender sua posse indireta.
É que pode ocorrer, por exemplo, com o executado, ao ajuizar uma ação possessória, com o fim de tutelar a aposse de determinado bem seu, que foi penhorado e se encontra em poder do depositário. È a figura dos embargos de terceiro.
Isso se dá, pois o executado, até a arrematação ou liberação do bem, conservará sua condição de possuidor indireto, não obstante o contato direto com o bem ser exercido pelo depositário, na condição de possuidor direto.
Já o art. 1.200 do C.C. de 2002 (e art. 489 do C.C./1916) fornece mais dois tipos de posse: a posse justa e a posse injusta. A posse justa é a constituída com base numa causa legítima, perfeita, lícita. Ao revés da posse injusta é a que contém vício possessório (vis, clam et precário).
Vício possessório é todo ato ilícito ou defeito que for encontrado na origem da posse. É bem sintetizado pela expressão, vis, clam et precário, ou seja, violência, clandestinidade e a precariedade que correspondem aos três vícios possessórios existentes.
A violência revela-se no apossamento da coisa por meio da força física ou moral, muito se assemelha ao crime de roubo que é previsto no art. 157 do Código Penal. A clandestinidade revela-se por sua vez, pelo apossamento às escondidas, enganoso fraudulento sem que o autor do vício, para alcançar seu intento, utilize-se da violência ou da grave ameaça. Muito se assemelha ao crime de furto previsto no art. 155 do Código Penal Brasileiro.
A precariedade consiste no apossamento fundado no abuso de confiança, pois a coisa se encontra em poder do possuidor precário e, muito se assemelha ao delito de apropriação indébita previsto no art. 168 do Código Penal brasileiro.
Considera-se precário o possuidor que ab initio possuía a coisa com base em título que lhe legitimava a posse, mas a partir de determinado momento quando lhe é solicitada a restituição da coisa, já não tem a intenção de devolver o bem, uma vez que deseja permanecer na sua posse. Tal circunstância caracteriza verdadeira inversão no título da posse.
Merece destaque o art. 1.209 do C.C. de 2002 que prevê expressamente que os atos violentos ou clandestinos não autorizam a aquisição da posse. Senão depois de finda a violência ou clandestinidade. Encarados como vícios temporários e sanáveis, e somente desaparecem depois de um ano e um dia do ato viciado foi praticado. Saliente-se que a precariedade é considerado o único vício que jamais irá convalescer.
Seguiu o novo codex de 2002 à exemplo do Código Civil de 1916 a corrente objetiva de Ihering posto que não há qualquer exigência quanto ao elemento subjetivo para a caracterização da posse.
Embora não houvesse a total adesão, pois em alguns dispositivos, como por exemplo, os referentes ao usucapião seguisse à doutrina de Savigny. É imprescindível para o conceito legal de posse, os elementares poderes inerentes ao domínio ou propriedade. São a faculdade de usar (jus utendi), a faculdade de fruir ou gozar (jus fruendi), a faculdade de dispor (jus abutendi) e, por fim, a faculdade de reivindicar (jus vindicandi).
O art. 1.196 do C.C. de 2002 leva em conta apenas as faculdades de usar e de fruir posto que a faculdade de dispor e reivindicar são sempre do proprietário, seja este possuidor ou não.
Não há necessidade para a caracterização da posse, que o sujeito tenha a faculdade inerente à propriedade, bastando que tenha o exercício da faculdade. O exercício da faculdade consiste na efetiva utilização do conteúdo em si da faculdade.
O sujeito pode ter as faculdades inerentes ao domínio, sem, contudo estar no exercício destas, é o caso do proprietário esbulhado. Motivo pelo qual não é possuidor embora tenha o domínio da coisa.
Interessante frisar que a definição legal de posse, atribui a qualidade de possuidor quem tenha o exercício pleno ou não da propriedade. Desta forma, facilmente se evidencia que tem a posse o locatário, o comodatário, o usufrutuário e todos aqueles que tenham o exercício de um ou alguns dos poderes do proprietário.
Mas, vejamos o caso do depositário que não tem sequer o jus utendi já que lhe é vedado utilizar-se da coisa depositada, conforme prevê o art. 640 do C.C/2002.
A princípio, parece que o depositário não tem a posse, mas terá a missão de guardar e conservar a coisa depositada, sendo-lhe atribuído o exercício do uso dentro dos limites necessários à essa guarda e conservação da coisa depositada (art. 627, 629 C.C. de 2002). Assim, o depositário é possuidor, pois tem o exercício limitado da posse da coisa.
Fervem as discussões em torno da natureza jurídica da posse, alguns sustentam que é um direito, enquanto outros sustentam que é mero fato. E os que sustentam ser um direito, ainda discutem se é um direito real ou pessoa. E, outros, ainda sustentam que é um fato e um direito simultaneamente.
O busilis é antigo e vem desde o período clássico do Direito Romano, os jurisconsultos consideravam a posse como um fato, distinguindo-a da propriedade que seria um direito.
Moreira Alves salienta que apenas no período pós-clássico romano é que veio aparecer a idéia de que a posse seria um direito, verificando-se nos textos a utilização das expressões jus dominii (direito de propriedade) e jus possessionis (direito de posse).
Ihering definiu os direitos subjetivos como “interesses juridicamente protegidos”, assim sendo, trata-se a posse, de um direito.
Na mesma esteira, considerando-a como direito, além de Ihering, podemos consignar Accursius, Bartolo, Teixeira de Freitas, Caio Mário e Serpa Lopes, dentre outros.
Em prol dos doutrinadores que consideram a posse um mero fato capaz de produzir efeitos jurídicos, argumentando-se que está só é protegida ocasionalmente, contra atos ilegítimos de esbulho ou turbação, não sendo tutelada quando o proprietário ou titular do direito que lhe atribui a posse da coisa, utiliza-se de meios adequados para reaver o bem.
Se o proprietário de um bem que se encontra na posse de outrem, utilizar-se de violência para reavê-lo, disporá o possuidor de meios judiciais e extrajudiciais para manter-se na posse; se contudo, o proprietário ingressar com a ação competente para recuperar o bem, seja reivindicatória, seja possessória não terá o possuidor a mesma tutela legal.
Ex positis, a posse não pode ser considerada um direito posto que é somente protegida ex occasione. Defendendo a posse como sendo um fato, temos Windscheid, Cujacius, De Filipis, Clóvis Beviláqua e outros.
Savigny, por sua vez, defende a posse como sendo um fato e um direito simultaneamente. José Acir Lessa Giordani trata a posse como um fato que pode decorrer de um relação jurídica anterior que atribua um de seus sujeitos a posse (locação, penhor, comodato) e, aí, nós temos o chamado jus possidendi, ou do comportamento de quem, sem título algum, age em relação À coisa, como se algum direito tivesse sobre ela (jus possessionis).
A posse seja fato ou como direito é protegida não apenas por se tratar de um direito, mas pela sua repercussão social que esta produz. Portanto, a posse só é protegida ex occasione e contra atos ilegítimos (violência, clandestinidade), os quais o ordenamento jurídico repudia; ou então quando existe, alicerçando uma outra relação jurídica como a propriedade, servidão, locação e, etc.
Os civilistas brasileiros, em geral, defendem que a posse é um direito real (Caio Mário, Serpa Lopes, Maria Helena Diniz, Orlando Gomes, Moreira Alves, Marco Aurélio Bezerra de Melo, dentre outros).
É difícil reconhecer a posse como direito real uma vez que esta é uma categoria jurídica taxativamente indicada em lei, apesar de reconhecermos quase todas as características dos direitos reais encontram-se presentes no instituto da posse.
Tanto assim que assinalamos que a posse é exercida erga omnes. Há, contudo, quem defenda posse como direito pessoal e que os interditos possessórios são ações pessoais.
Nesse sentido manifesta-se Cândido Rangel Dinamarco referindo-se à reforma do CPC quanto ao §2º, do art. 10 do referido diploma legal introduzido pela Lei 8.592/94.
O eminente processualista afirma que quando o dispositivo legal não exigiu a participação do cônjuge do autor ou do réu nas ações possessórias, definiu a natureza pessoal da posse.
Uma vez que para a propositura das ações reais imobiliárias, impõe-se a outorga conjugal, bem como a citação do cônjuge do réu em litisconsórcio passivo necessário conforme prevê o art. 10, caput e § 1º, do CPC.
Tais fatos, contudo, não levam a conclusão de que as ações possessórias são pessoas. Na verdade, a ação possessória é real, e, por exceção legal, não requer a vênia conjugal do autor ou a citação do cônjuge do réu.
Para tanto, basta verificarmos, se a regra estabelece que as ações pessoais prescindem dessas formalidades, as ações possessórias são pessoais, por que razão a lei repetiria que as ações possessórias não precisam de participação do cônjuges do autor ou réu?
Não há fundamento para a mera repetição de uma regra geral. A lei somente assim o faz para explicitar uma exceção à regra geral das ações reais imobiliárias. Ademais, o próprio art. 95 do CPC elenca a ação possessória como ação real.
Sustenta José Acir Lessa Giordani que a posse é um fato e que ações possessórias são de natureza real, pois visam proteger a coisa contra esbulho, turbação ou ameaça, de oponibilidade erga omnes.
Todavia, a vigente sistemática do Código Civil de 2002 não insere a posse como direito real, e à luz de uma hermenêutica concluímos que a posse não foi entendida como um direito, no Direito Brasileiro.
A detenção e a posse embora semelhantes são bem diferentes na ótica jurídica, especialmente quanto aos efeitos.
A detenção é um poder que se exerce sobre o bem, porém, desprovido da proteção que a lei confere a posse. O mero detentor não dispõe de ações possessórias, nem pode, em nome próprio, exerce a autodefesa do bem sob seu poder.
Pela teoria de Savigny, na detenção sempre falta o animus domini. Na teoria objetiva, contudo, a detenção existe na medida em que o sistema jurídico, não admite que o poder sobre determinada coisa constituída uma situação de posse.
Portanto, na teoria objetiva os casos de posse são verificados objetivamente no ordenamento jurídico. Assim, ao identificarmos um obstáculo jurídico para caracterização da posse, o poder sobre bem consistirá em mera detenção.
Servo ou fâmulo da posse é aquele que, apesar de gozar de um poder físico sobre a coisa, a detém em nome de outro a quem deve obedecer e seguir instruções, e a quem está unido por um vínculo de subordinação.
É o caso do empreiteiro, do caseiro com relação ao sítio, motorista que leva o automóvel para abastecer em vista das ordens do patrão; o empregado que cuida dos bens pertencentes ao seu empregador.
Não são possuidores e, sim meros detentores e, não podem utilizar os interditos possessórios. E, é ratificado o conceito de detenção previsto no art. 1.198 do C.C. de 2002.
Contudo, o servo da posse pode transformar-se em possuidor, seja por meio de um esbulho, como a hipótese do caseiro que se apodera do imóvel de seu patrão, não mais permitindo sua entrada no referido bem, seja por meio de uma intervenção bilateral, como motorista que compra o carro de seu patrão.
Mesmo sendo servo da posse, o caseiro pode se valer do desforço imediato (que é autodefesa da posse) para proteger o bem do seu patrão que é o real proprietário.
Também não induzem a posse, os atos de mera permissão ou tolerância previstos no art. 1.208 do C.C./2002. Cumpre frisar que tolerância e permissão são coisas distintas.
A tolerância tem uma conotação de indulgência, ou seja, o possuidor, embora sem autorizar expressamente que a pessoa pratique atos em relação ao bem, suporta tal conduta, na crença de ser situação temporária e encontra-se sujeita ao seu livre arbítrio, pois a qualquer momento poderá definitivamente impedir a continuidade de tal comportamento.
A tolerância não pode transformar-se em inércia, sob pena da mera detenção tornar-se posse. Nos atos de permissão há uma autêntica concessão do verdadeiro possuidor, por isso mesmo revogável ad nutum.
É a hipótese do possuidor que permite aos vizinhos, quando lhe pedem, que retirem água do seu açude; que alimentem o gado com seu pasto; ou que se hospedem temporariamente em seus aposentos.
Na permissão sempre há, portanto, a possibilidade a qualquer tempo de negar o benefício. A permissão requer um consentimento expresso por parte do possuidor. Verifica-se que tal consentimento não gera um contrato, mas de mera concordância revogável ad nutum de forma livre e unilateral.
Outra hipótese de detenção é o caso do filho que é acolhido na casa do pai, não mais se encontrando sob seu poder familiar. O filho não é compossuidor do imóvel e, nem possuidor do quarto que ocupa, mas mero detentor. Também não é comodatário.
Mesmo ante a tolerância, o possuidor não pode deixar em momento algum de exercer seu poder absoluto a coisa.
Moreira Alves consigna que a violência ou clandestinidade utilizadas para a preensão da coisa induzem a mera detenção, que se transformará em posse injusta após o término dois vícios possessórios.
Para o ilustre romanista, não se deve igualar o sistema do Código Civil Brasileiro ao Código Francês e Italiano que fixam que a violência e a clandestinidade induzem a pose ad interdicta e não ad usucapionem;
No Brasil seriam mera detenção, e, por outro lado, o art. 1.200 do C.C. de 2002 nos traduz a posse injusta. Para melhor ilustrar a posse injusta, passamos a citar o acórdão do STJ REsp 151.237-MG, 4ª. T., Relator Ministro César Asfor Rocha (24.05.2000) que reproduzimos in verbis:
“Reivindicatória – Concubina – posse injusta.
O falecido adquirira um apartamento e, após anos, iniciara a união com a ora requerente, da qual teria nascido uma filha. Pendente de julgamento investigação de paternidade, outra filha já reconhecida. Prosseguindo o julgamento, a Turma, por maioria, entendeu que, para efeito de tutela reivindicatória (art. 524 do C.C.), a injustiça da posse não se confunde com a posse injusta do art. 489 do C.C, própria dos interditos possessórios: não constitui requisito da reivindicatória a necessidade de a posse ser precária, clandestina ou violenta. Se “a filiação vier a ser apurada na ação própria, o que de direito deve ser postulado nos autos de inventário.”
Há ainda, a detenção quando o objeto é insuscetível de posse, isto ocorre, por exemplo, quando nos referimos aos bens públicos que podem de ser uso comum, de uso pessoal e os dominicais.
Os bens públicos dominicais podem ser possuídos embora não possam ser usucapidos. Somente os bens de uso comum e de uso especial são insuscetíveis de posse. Se alguém invade uma praça pública e lá constrói uma pequena moradia, não passa ser possuidor do bem podendo o Poder Público a que pertencer a área, retirá-lo do imóvel, inclusive destruindo a construção independentemente de qualquer decisão judicial, valendo-se somente de conduta coercitiva auto-executória.
O mesmo se dá se houver a ocupação de uma Universidade Federal, por exemplo, embora existam algumas decisões em sentido contrário, parece-nos que o Poder Público é carecedor de ação, se quiser intentar ação de reintegração de posse de bem público de uso comum ou de uso especial.
Não necessita o Estado da prestação jurisdicional para reaver o bem posto que pode usar auto-executoriedade de seus atos, com auxílio da polícia, retomar o prédio público e, principalmente porque os invasores não são possuidores e, sim meros detentores.
Outros exemplo de mera detenção é a coisa cujo poder por si só, configura um ilícito, é o caso de bem furtado, bem roubado. O receptador exerce mera detenção sobre a res furtiva.
Trata-se também do caso de substância entorpecente ou contrabando, pois o sujeito não possui, mas apenas detém. Igualmente se uma pessoa aprisiona um pássaro silvestre protegido pela legislação ambiental própria, e que não pode e nem deve ser colocado em cativeiro, não se tem sobre ele posse, mas somente detenção.
Da mesma forma, quando na época de desova, a pesca é proibida, mas o pescador infringe a lei,m não adquire a posse dos peixes e crustáceos arrecadados do mar, mas somente a detenção, nesse caso, não possui a proteção possessória.
No período clássico romano não se admitia a posse de coisas incorpóreas. Foi no Direito Justinianeu que esse requisito não é, mais observado, e surge a posse dos direitos. A posse incorpóreos, ou dos direitos não se encontra qualquer limitação a esta posse.
Porém, a dúvida persiste em saber se todo o direito é suscetível de posse ou se só os de natureza patrimonial. O defensor da doutrina de que há posse dos direitos pessoais foi Rui Barbosa que foi responsável pela emenda ao Projeto do Código Civil de Beviláqua que incluiu termo “ou propriedade” na parte in fine do art. 485 do Código Civil Brasileiro de 1916.
Diferindo a expressão “propriedade” uma acepção mais lata do que a expressão “domínio” e que deve ser tomada para indicar o conjunto dos direitos patrimoniais (reais e pessoais), concluindo que existe a posse não apenas de coisas, mas de qualquer direito patrimonial, inclusive o direito pessoal.
Ainda sobre a digressão de posse justa e injusta, cumpre diferenciar a posse injusta em sentido estrito e a em sentido lato. Em sentido estrito é injusta quando a posse contém quaisquer dos vícios possessórios, e está prevista no art. 489 do C.C. / 1916 ou art. 1.200 do C.C. de 2002, ou seja, ou é posse violenta, clandestina ou precária.
Já temos a posse injusta em sentido lato que tanto repugna o Direito, quando é exercida por quem se coloca em antagonismo ao exercício do direito de propriedade. Estabelecendo uma luta entre a propriedade e a posse é a prevista no art. 524 do C.C. de 1916 ou art. 1.228 do C.C. de 2002.
Portanto, não se pode equiparar o exercício do poder de reivindicação ou de defesa à proteção que pretendeu conferir e assegurar ao possuidor. Não figurará no pólo passivo de ação reivindicatória tão-somente aquele exercer posse violenta, clandestina ou precária sobre o bem reivindicado, mas também, toda e qualquer pessoa que se colocar em antagonismo ao direito de propriedade. Este estará possuindo injustamente o bem, nos precisos termos do art. 534 do C.C. de 1916.
Posse de boa fé ocorre onde o possuidor ignora a existência de um vício possessório que impede, legalmente, sua aquisição regular, enquanto que na posse de má fé o possuidor sabe da existência do vício possessório.
Vale suscitar que somente a posse injusta comporta as situações de boa ou má fé. Por isso, o possuidor injusto que por força de próprio fato é um possuidor de má fé. A má fé está contida na posse injusta
.
O art. 490 do C.C. de 1916 ou atual art. 1.201 do Código Civil de 2002 caput utiliza vício e obstáculo com diferente sentido, embora ambas sejam vícios, num sentido amplo.
Os vícios podem ser materiais ou formais. Estes, acrescidos do erro e da incapacidade do agente consistem em obstáculos à aquisição do direito, por serem defeitos que maculam a posse, e o possuidor que os tiver será titular de uma posse injusta.
A previsão legal da boa fé como estado de ignorância do vício, cessará quando o possuidor vier a ter ou puder saber que sua posse é viciosa, quando então se tornará possuidor de má fé.
Portanto, a boa fé poderá cessar no curso da mesma posse. Recomenda a lei para auferir benéficos efeitos jurídicos que a boa fé deve existir durante todo tempo de posse. isso tem enorme importância para fins de usucapião e no que se refere aos frutos.
O art. 1.202 do C.C. de 2002 indica claramente que cessa a boa fé quando:
- ocorre confissão do próprio possuidor de que nunca teve título aquisitivo;
- a existência de elemento que impede a legitimidade de sua posse;
- a manifesta nulidade do título aquisitivo.
Posse com justo título é a posse que se origina de um título que abstratamente considerado, seria utilizado como meio adequado para produzir o efeito jurídico desejado. Se avaliarmos o título concretamente, se apresentar defeito que impede o legítimo apossamento da coisa.
A posse sem justo título não está ligada a qualquer causa pertinente e, portanto, ressente-se de qualquer fundamento, não é adequado para produzir o efeito desejado, como ocorre com quem adquire imóvel mediante mero recibo ou com o possuidor de coisa legada por meio de simples carta.
Além da inadequação dos instrumentos carecem os transmitentes de legitimidade para fazê-lo. O justo título influi na posse de boa fé, pois a presença do título sempre enseja a presunção de boa fé, não obsta exista um defeito original. Trata-se de relativa presunção ou iuris tantum que implica na inversão da regra processual do ônus da prova (art. 333 do CPC).
Caberá à parte contrária e, não ao possuidor com justo título, comprovar cabalmente que este não se encontra em estado de boa fé. O título putativo pode aproveitar A boa fé, pois apesar de inadequado ou inexistente o possuidor sinceramente crê que existe ou é o próprio título hábil a conferir-lhe a posse desejada. É o que ocorre com o herdeiro e legatário aparentes, os quais instituídos em testamento que veio a posteriori ser anulado, sem que soubessem, mas que acabaram por exercer atos possessórios sobre os bens do espólio.
Posse nova é a que conta com até de ano e dia de existência, enquanto posse velha é a que data de mais de um anos e dia. Tal prazo é contado do momento em que é praticada a lesão possessória.
Pode ocorrer uma situação na qual mais de uma pessoa dispute a mesma posse, sem que se consiga se determinar de imediato quem cometeu e quem sofreu a lesão possessória, ou sem que alguém alegue o domínio
Não sendo a hipótese de aplicação dos arts. 1.211, 1.213 do C.C., ou se a posse for indefinida em relação aos litigantes, se todos alegarem posse com menos de um ano e dia, se todos exibirem títulos, ou se nenhum tiver título, ou se todos os títulos exibidos forem iguais, aplicar-se-á o critério baseado na “melhor posse”.
A definição da melhor posse se se baseia nos seguintes critérios:
a) se os litigantes apresentarem títulos, a melhor posse estará baseada no justo título, entendido este como sendo o adequado para conferir jus possendi, apenas excluído o de domínio, já alcançado pelo art. 505 do C.C. de 1916;
b) se forem apresentados títulos iguais ou não havendo a exibição de título algum, melhor posse será a mais antiga;
c) por fim, caso seja possível identificar a presença do justo título, nem de qual seja a posse a mais antiga, então, a melhor posse será a atual.
Depois de utilizados os critérios de preferência, a posse dos litigantes continuar duvidosa, deverá o juiz seqüestrar a coisa deixando-a com um depositário judicial, que poderá ser o oficial, um terceiro ou até mesmo qualquer uma das partes, dependendo da conveniência de se acautelar a própria coisa ou evitarem-se rixas ou violências entre os litigantes.
Nesse caso, a coisa permanecerá seqüestrada até que em ação adequada (seja petitória ou mesmo possessória). Frise-se que a petitória não convive processualmente com a possessória.
A interversão na posse previsto claramente no art. 1.203 do C.C. de 2002 ensina Orlando Gomes consiste na transformação que pode se dá em um título ou uma posse, por força da qual o detentor passar a ser reputado como verdadeiro possuidor e a posse precária então se transforma em posse legítima. Interversão é o mesmo que inversão.
O art. 1.203 C.C. pontifica que a posse mantém o mesmo caráter com que foi adquirida. Porém, toda vez que ocorrer alteração no caráter da posse, interversão na posse haverá. O referido dispositivo legal gera uma presunção relativa. Mas, há uma máxima dos romanos de que ninguém pode mudar, por si só, a causa de sua posse.
Desse modo, o adquirente, a título clandestino ou violento, provando que o ato clandestino ou violento cessou há mais de ano e dia, terá adquirido posse, que passará a ser reconhecia conforme bem dispõe o art.1.208 do C.C. de 2002.
Houve convalescimento dos vícios que a maculavam. O mesmo não se opera sobre a posse precária tendo em vista que a maioria da doutrina entende que tal vício convalesce nunca.
Poderá o possuidor mudar o título ou a causa da posse. Uma posse injusta pode tornar-se justa se o possuidor, que obteve a posse do bem por meio de um ato violento ou clandestino, vier a comprá-lo ou a herdá-lo.
Situação inversa pode se dá quando alguém que vinha exercendo posse justa com base no contrato locatício, mas depois se recusa a restituir o bem, caso em que se transformará em possuidor injusto, visto que estará esbulhando a posse do proprietário.
É curial distinguir propriamente posse velha da posse nova porque somente contra essa última poderá o titular do direito lançar mão do desforço imediato previsto do art. 502 C.C. de 1916 e art. 1.210 do C.C. de 2002, ou obter a reintegração de posse liminar , em ação própria, consoante o art. 926 do CPC.
A posse injusta apesar de viciada pode ser defendida pelos interditos possessórios, não contra aquele de quem se tirou, pela violência, clandestinidade ou precariedade, mas contra terceiros que, eventualmente, desejem arrebatar a posse para si.
Isso porque a violência e a clandestinidade como vícios relativos que, são somente podem ser apontados pela vítima do ato vicioso. Em relação a qualquer pessoa, a posse produz seus efeitos normais.
Os vícios possessórios previstos em lei consistem verdadeiras causa possessionis, fundamento da posse injusta a ser constituída. Se a mudança na causa da posse resultar de um acordo entre o possuidor precedente, ou mediato, que se faz possuidor pleno, ou de outra causa, ou de ato unilateral, por meio do qual aquele que emprestou, com permissão de uso, possa reclamar o bem de volta, haverá a chamada mudança possessionis ou substituição da causa possessionis à causa detentionis
.
Se o possuidor direto que era comodatário passa possuir como seu o bem em comodato ou, a seu talante, transforma-se em locatário, ocorrerá a chamada mudança da causa possessionis que resulta de interversão na posse.
O fenômeno da composse está caracterizado de dois pressupostos: pluralidade de sujeitos e a existência de uma coisa indivisa ou que se encontre em estado de indivisão.A composse é prevista art. 1.199 do C.C. de 2002 é também chamada de compossessão, posse comum ou posse simultânea.
Não obstante a composse aproximar-se bastante do condomínio, esta não pressupõe necessariamente o condomínio, podendo existir com ou sem ele, razão pela qual se pode vincular a composse ao condomínio.
Logo, pode haver domínio comum e posse exclusiva; domínio comum e posse exclusiva; domínio exclusivo e posse comum; e domínio comum e posse comum. Geralmente, o condomínio pressupõe a composse. Há a regra geral no Direito Civil que sempre que uma coisa for possuída, simultaneamente, por mais de uma pessoa nas seguintes hipóteses:
- a) entre os cônjuges que, casados sob o regime da comunhão de bens, exercem uma posse comum sobre os bens que integram o patrimônio do casal;
- b) quando da abertura da sucessão e até o momento da partilha dos bens que integram o acervo hereditário, entre os herdeiros, por força do disposto do art. 1.572 C.C. de 1916 ou art. 1.784 do C.C. de 2002 que determina expressamente a transmissão, desde logo, do domínio e da posse da herança aos herdeiros legítimos e testamentários;
- c) havendo uma sociedade, na qual os sócios exercem composse sobre os bens comuns, salvo se, se tratar de pessoa jurídica;
- d) em todos os demais casos em que couber a ação communi dividundo, ou seja, a ação de divisão da coisa comum;
A composse reflete uma só posse, assim como o condomínio um só direito de propriedade, com a peculiaridade de uma titularidade plural, e esta é única posse exclusiva dos compossuidores.
O art. 1.199 do C.C. de 2002 serve para disciplinar as relações internas na composse entre os compossuidores, também para garantir que cada possuidor não fique excluído das vantagens da coisa.
É necessário na composse, diferenciar posse pro diviso da posse pro indiviso. Na posse pro diviso o compossuidor exerce a posse sobre coisa certa, lugar determinado, a composse subsiste de direito, mas não de fato.
Já na posse pro indiviso o compossuidor não exerce posse sobre qualquer trecho do imóvel, razão pela qual a composse existe tanto de direito quanto de fato. Tratando-se de posse pro indiviso, o possuidor tem direito de ser respeitado na porção da coisa que ocupa, inclusive pelos demais compossuidores.
Caso seja posse pro indiviso, poderá o compossuidor permanecer no trecho não utilizado pelos demais compossuidores, desde que não os exclua do exercício de direitos possessórios.
O art. 1.268 do C.C. de 2002 estabelece que cada condômino poderá livremente usar da coisa conforme seu destino e sobre esta exercer todos os direitos compatíveis com a indivisão.
Cessa a composse quando for extinta a relação jurídica que lhe deu causa ou for extinto o estado de indivisão da coisa que a determina. Assim, a partilha põe fim à composse instituída por lei através do inventário conforme prevê o art. 1.784 do C.C. Com a dissolução conjugal, extingue-se a composse sobre os bens comuns do casal ou da sociedade conjugal. Pela divisão da coisa ou de seu preço, caso se trate de bem indivisível extingue-se o condomínio e, conseqüentemente, a composse também. Toda e qualquer divergência acaso existente entre os compossuidores, de como usar a coisa comum ou como assentar a posse exclusiva de cada compossuidor, não será resolvida pelos interditos possessórios.
Posse originária é aquela resultante suficiente de um ato de investidura do próprio possuidor, que por sua força exclusiva, apossa-se definitivamente da coisa. È o que acontece com o pescador, o caçador.
Posse derivada é a que provém de um ato de transferência (alienação) e pressupõe a existência de posse anterior de quem o possuidor derivado houve a coisa possuída. Sempre envolve dois possuidores: o anterior ou originário que perde o contato material com a coisa e, o posterior que passa a adquirir o contato material com a coisa. São bons exemplos: a compra e venda (alienação onerosa), doação (alienação graciosa), a sucessão causa mortis.
É muito relevante a classificação da posse pois a originária sem vícios poderá garantir a idoneidade da posse derivada. Enquanto que na posse derivada, se acaso existirem vícios esses naturalmente transmitem-se ao novo possuidor ou possuidor derivado.
Vejamos o caso da receptação culposa, pois a pessoa que adquire a pose da res furtiva, terá uma posse viciosa. Se bem que pela teoria objetiva de Ihering terá somente mera detenção.
A doutrina também faz adjetivação da posse em natural e civil. Natural é a posse que requer efetiva detenção material da coisa para caracterizar-se. Civil é a posse que se caracteriza automaticamente como mero efeito da lei, como acontece, por exemplo, no caso do art. 1.784 do C.C. de 2002.
Há ainda a posse ad interdicta e a ad usucapionem. Enquanto a primeira comporta hábil defesa por meios dos chamados interditos possessórios, a segunda é posse que admite o usucapião, considerando que há posses que jamais o comportarão.
Não são usucapíveis:
A) a posse das terras tradicionalmente ocupadas pelos índios, conforme dispõe art. 231,§4º. da CF.
B) as posses vinculadas a relações jurídicas que obriguem o possuidor a restituir a coisa, tais como a do locatário, do depositário, do comodatário e, etc.
C) a posse de bens públicos.
Na realidade, nem todos os bens que estão fora do comércio são insuscetíveis de serem possuídos. os bens gravados com cláusula de inalienabilidade, ou os antigos bens dotais, embora sejam extra commercium, podem ser efetivamente possuídos.
Mas há bens que não podem ser objeto de posse particular por não poderem também ser objeto de propriedade particular. Por natureza, os bens como o ar atmosférico, o oceano e ainda temos, os bens públicos de uso comum e os de uso especial onde só caberá no máximo detenção.
Também não podem ser objeto de posse as coisas que não tenham autonomia estando ligadas à outra em relação de dependência. É o caso de quem quer ter a posse sobre uma árvore mas sem ter a posse do terreno onde está se assente, e sem retirá-la do solo.
A posse violenta (adquirida ex vi) contrariando a vontade de quem detinha a coisa anteriormente. A caracterização da violência não se prende apenas à violência física, modernamente admite-se também, a vis compulsiva, quando o sujeito é desapossado do bem por meio de ameaça ou coação moral.
Na violência moral, verifica-se uma ameaça à integridade física ou moral, ou ao patrimônio do possuidor ou detentor, ou de alguém a este ligado por laços afetivos.
Parta a posse ser violenta , é indispensável a presença de requisitos:
- deve a ameaça deve ser realmente efetiva;
- a ameaça deve ser grave, a gravidade deve ser apreciada pelo aspecto objetivo e aspecto subjetivo.
Sob o aspecto objetivo deve-se observar que o bem ameaçado deve ser, ao menos, de valor equivalente ao bem que se pretende seja desapossado (arts. 98 Código Civil de 1916 e art. 151 do C.C. de 2002).
Sob o aspecto subjetivo, deve-se verificar as condições do agente ameaçador e da vítima da ameaça. É natural que uma ameaça a uma pessoa idosa, senil ou com deficiência física ou visual possua uma gravidade maior que a mesma ameaça feita à uma pessoa normal (art. 152 do C.C. de 2002).
Para a caracterização da posse injusta deve a violência física ou moral ser cometida no momento do apossamento produzido pelo esbulhador. A violência posterior para repelir a agressão do proprietário ou de terceiros não a caracteriza habilmente a posse como violenta.
Se alguém entrega o bem por cumprimento de contrato celebrado sob coação, não há posse injusta; será posse precária. O vício da coação incide no negócio jurídico e, não, exatamente sobre a posse.
A posse não é violenta em razão do vício da vontade, e não pretender solucionar o problema no âmbito possessório. Também não há posse violenta quando conseguida pelo temor reverencial ou mediante ameaça do exercício normal de um direito (art. 153 do C.C. de 2002).
A posse adquirida ex vi mantém-se injusta até que se faça prova no sentido de que cessou a violência (art. 1.203 do C.;C. de 2002). A partir do convalescimento da posse, verifica-se a produção de certos efeitos que até então, a violência impedia.
É o caso dos efeitos da posse, como o prazo de usucapião, que não correrá enquanto não cessada a violência, mas que se inicia tão logo o poder fático passe a ser exercido de forma mansa e pacífica.
Quanto a posse clandestinidade, advinda de vício objetivo caracterizado pelo fato do sujeito se apossar da coisa às escondidas, sem demonstrar publicamente o poder de fato que exerce sobre o bem, especialmente ao legítimo proprietário. Agindo às escondidas, não permite o possuidor clandestino, que as demais pessoas, ou mesmo o titular do direito de propriedade que a lei lhe atribui a posse, tome conhecimento de seu poder.
A clandestinidade torna a posse injusta, tanto quanto a posse violenta. Poderá convalescer a clandestinidade, desde que o possuidor passe a agir publicamente, demonstrando ostensivamente sua posse a todos. Possibilitando que o possuidor anterior tome efetivo conhecimento do esbulho e adote então as medidas judiciais cabíveis. A partir deste momento, a prescrição aquisitiva começará a correr.
A precariedade é vício objetivo e decorrer do descumprimento da obrigação de restituir o bem. È a hipótese do locatário, comodatário, é vício derivado diretamente do abuso de confiança.
Diverge a doutrina quanto a possibilidade de a precariedade convalescer. Classicamente sempre se negou que a posse precária a virtude de convalescer, neste sentido, se manifestam Silvio Rodrigues, José Carlos Moraes Salles.
Há, entretanto, quem entenda que há como convalescer, na medida em que o possuidor altere o título da posse, passando a exercer o poder sobre o bem não mais em virtude do contrato ou relação jurídica anterior da qual a mesma resultou.
Já existe posicionamento jurisprudencial que admite a intervenção da posse decorrente de ato unilateral do possuidor precário que assume oposição ao proprietário. A precariedade na opinião de José Acir Lessa Guimarães é vício objetivo que obsta a prescrição aquisitiva na forma do art. 168, IV do C.C. de 1916, de sorte que a obrigação de restituir não o extingue. Porém, admite o autor a interversão da posse precária, que pode ocorrer em virtude da função social, conforme previsto no art. 170, III da CF.
A inércia absoluta do proprietário ante um antigo locatário que durante longo anos deixou de pagar alugueres, leva a concluir que para o Estado e,para a sociedade que o domínio se consolide nas mãos do possuidor, considerando-se sanado o vício.
É viável a convalescença da precariedade por ato bilateral ou fatos involuntários . È o caso do possuidor precário que compra ou herda o bem possuído ( vide a hipótese prevista no art. 1.207b do Código Civil de 2002).
Ainda sobre aspecto subjetivo, pode-se adjetivar a posse de boa fé ou de má fé. A primeira é francamente prevista no art. 1.202 do C.C. de 2002. È fundamental que além de ignorar existir vícios possessórios, que possuidor tenha consciência de que seu poder sobre a coisa não prejudica ninguém.
É observada a boa fé por exclusão de má fé, sob ponto de vista negativo, ou seja, pela ignorância do vício possessório. Estará de boa fé o possuidor que está agindo em erro, ou seja, com falsa noção da realidade.
Discute-se também se haveria boa fé de quem age por erro de direito, a princípio pelo art. 3º, da Lei de Introdução ao Código Civil, ninguém pode se escusar da aplicação da norma jurídica alegando que a desconhece.
No entanto, tanto a doutrina como a jurisprudência têm interpretado restritivamente o referido dispositivo legal, no sentido de admitir o erro de direito quando o agente que pratica o ato, em função de sua condição cultural , social, econômica e até mesmo geográfica, por não ter meios de conhecer e interpretar corretamente a lei. Não se trata de uma situação comum.
Ademais, o novo codex prevê expressamente em seu art. 139, III, o erro de direito. O ônus de provar a boa fé cabe ao possuidor a não ser que o mesmo tenha justo título (art. 1.201, § único do C.C. de 2002)hipótese em que se aplica em seu favor a presunção iuris tantum de boa fé.
Posse de má fé como fulcrada em elementos subjetivos deve ser apreciada à luz de critérios objetivos, já que é impossível a perquirição subjetiva e psicológica. Pode a posse de boa fé tornar-se de má fé quando demonstrar que o possuidor não mais ignora o vício que o impede de adquirir o bem.
Discute-se, contudo, o momento da transmudação da boa fé para má fé, neste caso. Há quem defenda que a mesma só se dá, a partir do momento da propositura da ação, isto é, uma vez distribuída a ação o possuidor já seria considerado de má fé.
Por derradeiro, o entendimento que tem prevalecido é no sentido de que a mudança se dá a partir da contestação ou do decurso do prazo para esta, pois até este momento o possuidor ainda poderia reconhecer a procedência do pedido na forma do art. 269, III do CPC.
Não se transforma em má fé, a posse em virtude mera notificação, seja judicial ou extrajudicial eis porque a medida não determina certeza jurídica da existência de vício possessório, pois deriva de manifestação sem contraditório e sem prestação jurisdicional de mérito.
Tem relevância com relação a percepção dos frutos (arts. 1.212 a 1.1216 do C.C. de 2002), quanto a indenização de benfeitorias (art. 1.219 e seguintes do C.C. de 2002) e quanto ao prazo da usucapião (arts. 1.238 a 1.242 do C.C. de 2002).
A posse ad interdicta é a protegida pelos interditos possessórios, desde que a posse tenha seus elementos: corpus, animus e affectio tenendi; e a turbação ou esbulho. Não importa que seja ilegítima a posse ou com vício.
Já a posse ad usucapionem é a capaz de atribuir ao possuidor a propriedade do bem. Além dos já citados elementos essenciais tem elementos acidentais como boa fé, o decurso de prazo legal, mansidão da posse, justo título e, etc.
Ius possidendi esclarece Caio Mário é o direito de possuidor, é a faculdade que tem uma pessoa por já ser titular de uma situação jurídica, de exercer a posse sobre determinada coisa. O proprietário, o usufrutuário, locatário têm o ius possidendi sobre o objeto envolvido na respectiva relação jurídica.
Ius possessionis é direito originado da situação jurídica da posse, e independe da preexistência de uma relação jurídica. Aquele que encontra um objeto e o utiliza, não tem ius possidendi, não obstante tenha o ius possessionis, porque procede como possuidor, embora lhe falte um título para possuir. O que cultiva uma gleba abandonada tem jus possidendi. A lei confere ao possuidor com fundamento no ius possessionis, defesas provisórias, ainda por lhe faltar o ius possidendi.
Outras vezes, aliada a posse a outros requisitos que compõem a usucapião, a lei converte o ius possessionis em propriedade, que, a seu turno, gera o ius possidendi sobre a mesma coisa.
Por fim, é relevante tratarmos sobre a extinção da composse, a saber:
1. pela divisão amigável ou judicial da coisa comum;
2. pela posse exclusiva de um dos sócios de modo a isolar uma parte ou toda a coisa, excluindo o poder dos demais;
3. sendo a vida em comum impossível entre os compossuidores e tratando-se de coisa invisível por natureza, deverá ser alienada e, dividido o preço por aplicação analógica do art. 1.322 do C.C. de 2002.
Já na questão relativa à aquisição da posse, com a evidente aquisição da teoria objetiva da posse pelo Código Civil Brasileiro vigente, adquire-se a posse a partir que o possuidor age em relação à coisa como se propriedade sua.
Sob fortes críticas a sistemática civil de 1916 adotou o critério anteriormente previsto no art. 493 que não se coaduna com a doutrina seguida, tendo exibido enumeração para os modos de aquisição da posse, o que estaria mais afinado com a doutrina savignyana do que com a teoria de Ihering.
O novo codex talvez mais fiel a concepção objetiva de Ihering, estabeleceu que a posse é adquirida a partir do momento que se torna possível o exercício em nome próprio de qualquer dos poderes inerentes da propriedade (art. 1.204 do C.C. de 2002).
E, acabou com a enumeração do vetusto Código Civil de 1916 estabelecendo caráter genérico deixando o critério para que a doutrina e a jurisprudência analisem os casos específicos ensejadores da aquisição da posse.
A apreensão da coisa é modo originário de aquisição da posse que ocorre quando o comportamento do possuidor que toma para si o bem, passando agir como se proprietário fosse. A apreensão pode incidir sobre a res derelicta ou res nullius ou a coisa alheia.
É o ocaso do pescador que apreende o peixe no mar, ou da pessoa por ato de violência ou clandestinidade, ou por meio de inversão unilateral do título da posse, se apodera de um bem pertencente a outrem.
Cabe apreensão de coisas móveis e imóveis. Das coisas móveis, se dá pela simples arrebatação ou subtração clandestina desta, pela ocupação da res derelicta, res nullius.
Em virtude da teoria objetiva de Ihering adotada pelo codex civil de 2002 não há necessidade de contato físico direto com coisa, nem mesmo intenção. Já que essa apreensão pode ocorrer até por fatos naturais como no caso de aluvião (que se dá quando detritos são incorporados paulatinamente no imóvel ribeirinho, trazidos pela corrente do rio). Observe que o pescador adquire a posse do peixe mesmo que não esteja presente no momento em que este caiu em sua rede que fora lançada ao mar.
Já quanto às coisas imóveis, a apreensão, configura-se com a ocupação do bem, seja de forma violenta, clandestina ou indevida. Dar-se-á apreensão mesmo quando não se tem a intenção de adquiri-la como no caso de avulsão.
( continua).