Apostila de Sociologia Jurídica

A sociologia pode guiar os juristas, mediante o estudo das estruturas sociais atuais, para descobrir aquelas que eles têm de normalizar com regras jurídicas; pode também auxiliá-los a detectar as reações previsíveis do corpo social às diversas prescrições possíveis, especialmente conforme seu caráter imperativo ou supletivo.

Lévy-Bruhl preconizou estudar os fatos jurídicos em si mesmos e, sem preocupação prática, seguindo um método científico e não só de um ponto de vista técnico.

A sociologia jurídica investiga as causas sociais que produziram essas regras e os efeitos sociais que elas produzem sem se prender à ramo da sociologia geral que se interessa pelos fenômenos sociais no sentido lato, ou seja, por todos os fenômenos sociais nos quais está compreendido um elemento neles se encontre misturado e não estado puro.

A sociologia jurídica engloba ao mesmo tempo os fenômenos primários (que se identificam ao direito ou criam direito) como a lei, a sentença e os fenômenos jurídicos secundários ou derivados, tais como, o da família, a propriedade, o contrato, a responsabilidade.

Distinta também da filosofia jurídica pois, não aplica-se a uma transcendência qualquer dos fatos; utiliza métodos empíricos, “a observação de massa” ou experimentação.

Realiza pesquisas de evolução, para descobrir as grandes correntes que governam as evoluções do jurídico. Faz pesquisa de estrutura. Tem a função documentária e normativa além de teórica e prática.

Durkheim estabeleceu o vínculo entre a sociologia e o direito. Seus discípulos se debruçaram sobre a gênese e a evolução do direito, através da exploração das sociedades primitivas e da história.

Reputa-se o jurista austríaco E. Ehrlich o verdadeiro fundador da sociologia jurídica, outros porém, negam-lhe tal patente e encontram em sua obra um método de interpretação do direito positivo, dentro da abordagem do direito vivo.

Gurvitch inventariou nas sociedades contemporâneas inumeráveis centros geradores de direito além do Estado; organizações internacional, sindicatos, cooperativas, empresas, etc.

Lévy-Bruhl, Hauriou, Duguit, e, sobretudo Carbonnier dedicaram-se à sociologia jurídica e abordaram o direito dentro de uma perspectiva evolucionista.

Weber enriqueceu particularmente a sociologia jurídica e se empenhou em descobrir a essência do jurídico, em oposição aos costumes ou à moral.

As normas jurídicas são, segundo ele, designadas pela presença de um pessoal do direito (o chefe, o juiz, o jurista) encarregado de lhes assegurar o respeito e as sanções da violação delas.

A lei de Weber segundo a qual o progresso do direito se realiza no sentido de uma racionalização, portanto de uma especialização e de uma burocratização constantes.

O realismo do direito de Geiger recusando o chamado direito dogmático e apoiando-se em fatos tirados da etnologia, da história, da prática jurídica atual, e adotam conclusões com símbolos de tipo algébrico.

A escola norte-americana chamada de “Sociological Jurisprudence”, na esteira de Roscoe Pound, apresentou uma teoria sociológica do direito sob dupla ótica a científica e a prática.

Cientificamente liga o direito aos outros fenômenos sociais, inserindo o direito na categoria de “controle social” e que abrange o conjunto dos meios de todos os tipos (educação, arte, costumes, ética, etc.) com os quais a sociedade assegura sua coesão e cujo instrumento principal seria o direito.

Pela ótica prática, apoiando-se na idéia de que a evolução do direito não procede da lógica mas da experiência, tal doutrina preconiza, substituir a dedução pela indução na elaboração da jurisprudência, devendo o juiz investigar sobretudo, em cada caso, quais efeitos concretos terá sua decisão, o que lhe confere grande liberdade para o exercício hermenêutico e, enfim criar o direito.

Numerosas sociologias jurídicas contemporâneas se fundamentam em abordagens psicológicas e, notadamente da psicologia social.

Há um cruel dualismo: de um lado, a sociologia teórica se apóia na reflexão a partir dos livros, documentos e registros e, por outro lado, a sociologia empírica procede mediante pesquisa de campo.

A sociologia jurídica especulativa passa para a sociologia aplicada, o que permite abrir-se para o setor prático, sobretudo em áreas como a família, as fontes de direito, processo, etc. mas conserva o setor teórico onde se evidencia a sua utilidade.

Versa a sociologia jurídica eminentemente dos fenômenos jurídicos e o sistema jurídico e de sua lógica para a realização social.

O fenômeno jurídico corresponde ao que se chama de direito dogmático. O referido fenômeno está pulverizado de diversas classificações.

Os fenômenos jurídicos primários são fenômenos de autoridade de poder (uma lei ou uma sentença), enquanto que os secundários só representam seu conteúdo ou sua aplicação o contrato ou um contrato particular.

Essa distinção serve para delimitar o conteúdo da sociologia jurídica em comparação à sociologia geral.

Os fenômenos do poder desta forma, contrapõem-se aos “fenômenos sob o poder.”

Há múltiplas investigações sobre o processo de juridicização, distinguem-se por exemplo, os fenômenos-instituições que são compostos de regras, modelos como por exemplo, o casamento. E hoje nos rendemos, também à união estável implementando um novo perfil de família.

E, ainda o fenômenos-casos que são apenas aplicações particulares ao caso concreto (sendo particular ou coletivo).

Todo fenômeno jurídico é um fenômeno social porém, nem todos os fenômenos sociais são jurídicos, temos que caracterizar os critérios de juridicidade. Aliás, a distinção entre o jurídico e o social não-jurídico é objeto de contínua reflexão contemporânea.

Na regra jurídica enxergamos ao mesmo tempo uma regra moral, religiosa, e encontrarmos na coerção, ou contrário, na contestação por cujo efeito, ela poderia ser transgredida, sob o controle de um órgão (o juiz).

A sociologia jurídica versa também sobre “o sistema jurídico” que estuda o direito de uma sociedade global.

Todo sistema de direito é um conjunto cujos elementos constituídos não são fortuitamente reunidos, mas ligados por relações necessárias e interdependentes, mas de modo que esse conjunto é distinto de seus componentes e mais duradouro do que eles.

O sistema jurídico se delimita por um espaço mais humano do que geográfico. Enfim, os sistemas jurídicos têm uma dimensão temporal na qual se transformam, de modo que é preciso estudar-lhes o sentido e as modalidades de sua evolução bem como as relações entre essa evolução e as outras mudanças sociais.

Mas todo sistema jurídico concorre para constituir uma cultura, para formar uma nação, e provocar outros fenômenos psicossociais. É sem dúvida um fenômeno biológico, sociológico e psicológico e, sobretudo antropológico.

A utilidade da sociologia jurídica pela função científica consiste em atingir a realidade cuja intuição, o jurista ainda tem, mas cujo conhecimento exato, cuja medida e composição amiúde, complexa ele tem de ter.

Há de apreender a realidade profunda para além de suas manifestações superficiais. Proporciona o conhecimento dos fenômenos e de sua explicação.

E quanto aos fenômenos-instituições é a partir da comparação de sua gênese nos sistemas jurídicos diferentes que permite deixar evidentes suas leis de evolução.

Já no que tange aos “fenômenos-casos” é reunindo-os num conjunto coletivo, a que chamamos a jurisprudência podemos observar tendências, “arbitrariedades” e outros fatores presentes na evolução ou de reforma do direito e deduzir desses estudos verdadeiras “ leis científicas” em sociologia do direito.

A função prática parece concentra-se sobre a decisão jurídica mas é sobretudo para o trabalho legislativo que se manifesta a utilidade prática.

Pode a dita sociologia servir de auxiliar ao legislador para fazer a opinião assimilar a lei, seja preparando esta, para uma reforma seja divulgando melhor a reforma operada.

Sobretudo, a sociologia jurídica pode por permitir apreender a realidade social, é essencial para o trabalho de preparação legislativa, e pode incentivar o legislador a intervir ou orientar-lhe as escolhas.

Foi nos Estados Unidos, por volta de 1950, que o interesse da utilização da sociologia pareça ter surgido, também em França, no que tange à lei de 14/12/1964 sobre a tutela dos menores e a reforma dos regimes matrimoniais.

O método sociológico, fundamentado em pesquisas de opinião, notadamente por iniciativa do Ministério da Justiça é normalmente de uso corrente. Outros métodos como estatístico, o estudo de casos e outras pesquisas de campo.

Os métodos da sociologia jurídica são variados e podem reporta-se tanto à observação, global ou caso por caso, quanto à experimentação.

A pesquisa sociológica pressupões assim uma apurada definição de seus objetivos, de seus materiais, de uma análise qualitativa, ou seja, um recenseamento de todos os sinais significativos, de todos os documentos ou fatos analisados, qualquer que seja sua qualidade.

Pressupõe também uma análise quantitativa que permite os fenômenos, os fatos, registros e os documentos e que nos leva à lei estatística.

Todos pressupõem a materialidade dos fatos e da neutralidade do pesquisador, isento de qualquer preconceito técnico, moral, filosófico, político, religioso ou outro qualquer.

Não pode a sociologia jurídica proporcionar tudo ao direito e não pode levar a conclusões legislativas categóricas.

Deve ser um método de investigação da realidade social e propicia uma preciosa ajuda à decisão jurídica, migrando da observação sociológica para a observação normativa.

A distinção entre as normas jurídicas e morais é baseada, no conhecimento: se o direito é o que está de acordo com o sentimento do dever ser e com a ciência atual, a moral é o que está de acordo com o mesmo sentido de dever ser e com um conhecimento metacientífico. O direito apazigua os homens, a moral apazigua os íntimos.

Tradicionalmente se reconhece que o direito representa um mínimo de preceitos de conduta considerados indispensáveis à convivência social: é o mínimo ético (tão célebre de Jellinek).

A expressão “direito vivo” é usada para designar o que é direito para sociedade, oriunda da célebre frase de Ehrlich onde repousa “o centro de gravidade do desenvolvimento jurídico.”

O direito vivo é o direito mesmo e não o ideal do direito. Ou seja, o “direito positivo” para a sociedade nem sempre é direito, embora, como um todo, esteja, com relativa freqüência, informando de senso de justiça e de conhecimento atualizado.

O controle social atua por meio de força mental e da força física.

Entre as instituições normativas mais importantes temos as familiares, econômicas, políticas ou governamentais e religiosas.

As funções mais universais atribuídas à família seriam: a perpetuação da raça humana; socialização da criança; dar o nome ou status a manutenção dos membros cuidar dos velhos e inválidos e a proteção do grupo contra inimigos.

Controle social é qualquer influência volitiva dominante, exercida por via individual ou grupal sobre o comportamento de unidades individuais ou grupais, no sentido de manter-se uniformidade quanto a padrões sociais.

A universidade do fenômeno jurídico.

Direito é exigência do senso comum, visa proteger e produzir o status quo, daí a imprescindibilidade do fenômeno jurídico.

O símbolo romano dedicado a representar a justiça, corresponde à deusa Justitia, a qual distribuía a justiça por meio da balança que ela segurava com as duas mãos. Ela ficava de pé e tinha os olhos vendados e dizia (declarava) o direito (jus) quando o fiel estava completamente vertical – direito (rectum) perfeitamente reto, reto de uma a baixo (de + rectum).

Ademais, a deusa grega tinha os olhos abertos, ou seus sentidos mais intelectuais (dotada de visão e audição), apontava para uma concepção mais abstrata, especulativa e generalizadora. Já os romanos, com a Justitia mostram uma concepção de direito como um saber-agir, uma prudentia, fruto do equilíbrio entre a abstração e o concreto.

Aliado à isto, acrescente-se que a deusa grega tinha uma espada, pois os gregos associavam o conhecer o direito à força para executa-lo (iudicare) daí a necessidade da afiada espada, enquanto que aos romanos era mais interessante o jus-dicere (dizer o direito), de atividade firme para segurar a balança com as duas mãos.

Da cultura romana para a cultura medieval há o advento do cristianismo que permitiu a distinção fundamental entre a esfera política e da religião.

A distinção entre o social e o jurídico é sutil, porém marcante.

A sociabilidade é uma espécie de gregariedade com o acréscimo da dignidade humana e consciência.

A máxima medieval é Lex e Ordo (lei e ordem) é a base da concepção medieval do direito não foi suficiente para suportar a evolução humana.

Tomás de Aquino define a lei como ordenação da razão direcionada ao bem comum, promulgada por aquele a quem incumbe o cuidado da comunidade (Summa Theologica). Assim, o direito não perdeu o seu caráter de sagrado, é dotado de sacralidade transcendental posto que de origem externa à vida humana, diferente de imanente (dos romanos).

Surge assim, um novo saber prudencial, destinado a conhecer e a interpretar a lei e a ordem de uma forma peculiar.

A ciência propriamente dita do Direito nasceu em Bolonha no séc. XI, sem abandonar o pensamento prudencial introduz-se uma nota diferente, a dogmaticidade.

A origem do pensamento dogmático reside nas resenhas críticas dos textos dos digestos justi nianeus, a Littera Boloniensis.

Até a próxima!!!

Responda:

1. Quais são as diferenças cruciais entre a consciência medieval e a consciência moderna?

2. Até onde podemos dicernir a fé na justiça do direito enquanto ciência?

3. Dentre as inúmeras funções da sociologia jurídica aponte as mais relevantes.

4. Comparando as deusas da justiça (a grega e a romana), qual seria a mais coerente com o nosso tempo?

GiseleLeite
Enviado por GiseleLeite em 01/04/2009
Reeditado em 30/11/2011
Código do texto: T1516752
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